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26/10/2024 às 10:10 | Autor: Gabriel Vintina*

ECONOMIA

Mais mulheres estão na chefia de famílias

Números divulgados ontem revelam mudanças significativas na estrutura familiar no Brasil

Chefe de cozinha Railene Cunha (centro), mãe de Rodrigo e Beatriz: ‘É um desafio’
Chefe de cozinha Railene Cunha (centro), mãe de Rodrigo e Beatriz: ‘É um desafio’ -

Os resultados divulgados ontem, pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), trouxeram novas luzes sobre a estrutura familiar no Brasil. Em 2022, a Bahia registrou uma mudança significativa: as mulheres passaram a ser a maioria na chefia de domicílios, representando 51% das lideranças familiares, contra 39,9% em 2010. Salvador também se destacou, consolidando-se como a terceira capital do país com maior proporção de chefes de família mulheres, alcançando 55,8% das residências sob liderança feminina.

A socióloga Kelly Venas explica que a autonomia financeira proporcionada pela maior inserção das mulheres no mercado de trabalho é um dos principais fatores desse cenário. “O crescimento no nível de escolaridade das mulheres amplia sua participação no controle financeiro, influenciando diretamente a gestão familiar. Outro fator importante é a maior expectativa de vida feminina, o que faz com que muitas mulheres, especialmente acima dos 50 ou 60 anos, liderem domicílios por mais tempo”, ressalta.

Segundo ela, esse movimento reflete também uma transformação cultural. “O discurso de empoderamento feminino tem incentivado mulheres a se enxergarem como plenamente capazes de gerir suas famílias, especialmente em cenários de mães solo.”

No contexto baiano, o aumento de mães solo é notável. Em 2022, esse grupo representava 16,5% das famílias no estado, colocando a Bahia na quarta posição nacional nesse indicador. Railane Cunha, chef de cozinha e mãe de dois filhos, compartilha que, após sua separação, tornou-se a principal provedora da família. “Desde o divórcio, a responsabilidade aumentou, mas meus filhos se tornaram meus parceiros. Foi preciso muito diálogo para enfrentar os momentos apertados juntos", relata.

A funcionária pública Deni Souza, 46, mãe solo de um menino de oito anos, reflete sobre a sobrecarga emocional e logística que acompanha a chefia familiar. “Administro as demandas do trabalho, da casa e do meu filho, mas é um desafio encontrar tempo para mim. Além disso, muitas mães solo ainda enfrentam o julgamento social por não terem um parceiro”, diz. A falta de apoio, segundo ela, amplia a pressão psicológica e pode afetar a saúde mental dessas mulheres.

Para Railene Cunha, 49, chef de cozinha e mãe de dois filhos, Beatriz e Rodrigo, de 23 e 25 anos, respectivamente, ser também chefe de família é desafiador. “Temos uma preocupação constante em manter um padrão de educação, alimentação e saúde para os filhos, e essa preocupação às vezes se torna excessiva. Há momentos em que estamos tão focadas nisso que acabamos esquecendo de nós mesmas”, conta.

Segundo a chefe de família, os julgamentos são o que mais incomoda ao ser chefe de família. “Acredito que o maior desafio seja a preocupação com os filhos e o julgamento das pessoas sobre a criação deles. Se algo acontece, a culpa sempre recai sobre as mães, seja por parte dos pais ou dos familiares. É uma visão primitiva, mas ainda prevalece. Isso traz uma ansiedade, um medo de errar”, explica Rai.

Fatores principais

Para Mariana Viveiros, supervisora de Disseminação de Informações do IBGE na Bahia, o aumento da chefia feminina é resultado de três fatores principais: demográfico, econômico e cultural. “Os fatores econômicos têm a ver com a ascensão das mulheres no mercado de trabalho, fazendo com que muitas delas acabem como as principais provedoras de suas famílias. Esse papel econômico tem relevância na definição da chefia do domicílio. Muitas mulheres moram sozinhas ou são mães solteiras, e essa importância econômica e autonomia financeira pesam na atribuição de responsabilidade no domicílio”, explica.

Outro fator nesse cenário é o demográfico, que pode ser conectado a outros dados do IBGE também divulgados ontem. “As mulheres são maioria na Bahia e no Brasil, e essa maioria se ampliou entre 2010 e 2022. Isso se deve, em parte, à maior longevidade feminina, mas também à sobremortalidade masculina, especialmente entre os jovens”.

A sobremortalidade masculina é um dado preocupante. Entre 2021 e 2022, 55,9% dos óbitos na Bahia foram de homens. “Essa disparidade atinge seu pico entre 20 e 24 anos, mas é significativa em todas as faixas etárias até os 79 anos”, explica Mariana. Ela associa essa mortalidade elevada a causas externas, como violência e acidentes, e a um menor cuidado com a saúde entre os homens. "Esses fatores não são a causa direta do aumento da chefia feminina, mas ambos os fenômenos se cruzam", pondera.

O aumento da chefia feminina não é apenas numérico; ele também carrega implicações culturais e sociais. Kelly Venas ressalta que a liderança de mulheres negras, cada vez mais expressiva, é um reflexo das desigualdades estruturais. “As mulheres negras enfrentam uma espécie de solidão que muitas vezes não é percebida como uma questão racial. São vistas como pessoas ‘fortes’, que suportam melhor as adversidades e que, portanto, podem lidar sozinhas com as responsabilidades familiares. Esse estereótipo as priva da possibilidade de expressar fragilidade e, muitas vezes, libera o parceiro ou ex-companheiro da responsabilidade de compartilhar os cuidados com a família”.

Outro aspecto relevante destacado pelo IBGE é o envelhecimento da população e o aumento de idosos que vivem sozinhos. Na Bahia, mais de 53% das pessoas idosas que moram sozinhas são mulheres. “No Brasil, as mulheres são maioria, mas, na Bahia, elas são minoria no total e em quase todas as faixas etárias. Apenas entre os idosos que moram sozinhos na Bahia as mulheres representam quase 60%, sendo a única faixa etária em que elas são maioria entre as pessoas que moram sozinhas [...] isso apresenta um viés demográfico, já que as mulheres são predominantemente idosas entre as pessoas que vivem sozinhas, pois tendem a viver mais do que os homens. Essa mudança no perfil das pessoas que moram sozinhas, portanto, é um pouco esperada”, comenta Mariana Viveiros.

Apesar dos desafios, Kelly Venas aponta que a maior representatividade feminina na chefia familiar pode gerar transformações positivas. “Essa maior representatividade feminina na chefia de domicílios pode ser positiva, pois muitas mulheres conquistam autonomia financeira e a liberdade de decidir sobre a gestão de seus lares. No entanto, esse cenário também revela uma sobrecarga, já que a responsabilidade pelo cuidado frequentemente recai unicamente sobre elas. [...] Assim, essa mudança reflete não apenas uma conquista, mas também um desafio, expondo desigualdades e dificuldades que essas mulheres enfrentam ao assumir sozinhas a liderança familiar”, analisa.

A falta de reconhecimento social e a pressão para corresponder às expectativas familiares são obstáculos frequentes, segundo as entrevistadas. Railane lembra que o preconceito não se limita à maternidade. “No meu trabalho, vejo que ainda há resistência em reconhecer a liderança feminina. Mesmo sendo chef de cozinha há mais de 20 anos, sinto que muitos homens ocupam os postos de maior prestígio.”

A socióloga Kelly Venas defende que, para que a transformação seja completa, é preciso promover uma divisão mais justa das tarefas entre homens e mulheres, além de políticas que reconheçam e valorizem o papel das mães solo. “Para melhorar a qualidade de vida das mulheres chefes de família e mães solo, políticas públicas e apoios sociais são essenciais. Seria fundamental promover políticas que incentivem o cuidado infantil, proporcionando às mães locais seguros onde possam deixar seus filhos enquanto trabalham e garantir incentivos para que elas participem do mercado de trabalho, assegurando que possam ocupar posições desejadas sem receio de perder o emprego devido à maternidade”, sugere.

*Sob a supervisão da editora Isabel Villela.

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