ENTREVISTA - GONZALO ROMERO
‘O maior desafio da aviação civil hoje é incorporar mais aeronaves’
Diretor-geral da Air Europa fala sobre o aumento dos voos diretos de Salvador e os gargalos que o setor enfrenta no Brasil
Por Divo Araújo

A Air Europa acaba de aumentar de três para quatro a frequência de voos semanais de Salvador para Madri, na Espanha. Essa nova operação não só reforça a importância da Bahia na estratégia da companhia aérea, como também amplia a conectividade entre o Brasil e a Europa, beneficiando tanto o turismo quanto o setor corporativo, segundo explicou o diretor-geral da Air Europa no país, Gonzalo Romero, nesta entrevista exclusiva ao A TARDE.
“A Air Europa nunca teve, no passado, quatro voos semanais em Salvador. Sempre foram três. Por isso, é uma mudança histórica”, conta Romero, que esteve em Salvador na semana passada. Durante a conversa, ele também falou sobre os desafios da aviação civil no mundo: “A chegada de novas aeronaves não está acompanhando o crescimento rápido da oferta”. E sobre os gargalos que o setor enfrenta no Brasil: “Os principais são os custos operacionais e o nível de judicialização”. Saiba mais na entrevista a seguir..
A Air Europa aumentou de três para quatro o número de voos semanais entre Salvador e a Europa. O que motivou essa decisão da companhia?
A decisão foi motivada principalmente pelos bons resultados que tivemos em 2024. Os resultados da rota Bahia foram muito, muito bons. Nossas ocupações das aeronaves ficaram em torno de 90%. Então, achamos que com o bom cenário de 2024 e o bom cenário previsto para o ano de 2025, era o momento de acrescentar mais uma frequência no mercado da Bahia. É importante falar que é uma frequência histórica, porque a Air Europa nunca teve, no passado, quatro voos semanais em Salvador. Sempre foram três. E agora, pela primeira vez, depois de praticamente 21 anos voando aqui na Bahia, vamos crescer mais uma frequência, oferecendo quatro voos semanais.
Em 2024, quase 75 mil passageiros viajaram com a Air Europa entre Salvador e Madri. Quais são as projeções da companhia para este ano?
Em quantidade de passageiros previstos, não temos um número projetado, mas nosso principal intuito é minimamente tentar manter as ocupações que tivemos em 2024, perto de 90%. Acreditamos que esse nível de ocupação vai permitir que a quarta frequência seja rentável. Então, nosso principal intuito é manter as ocupações que atualmente temos tido.
A Air Europa opera no Brasil há mais de 20 anos, como o senhor mencionou, com embarques em São Paulo e Salvador. Qual a relevância do mercado brasileiro, especialmente da Bahia, para a companhia?
O mercado brasileiro é um dos principais da América. Depois dos Estados Unidos, o Brasil é o mercado com mais importância. E a Bahia tem um apelo muito importante. Nós iniciamos as operações na Bahia há mais de 21 anos, voando regularmente todas as semanas. Mas no passado, há quase 25 anos, tivemos voos fretados também. Mas, regularmente, foram 21 anos e a Bahia sempre foi um destino muito privilegiado pelos passageiros espanhóis. Você sabe que a Bahia tem uma comunidade espanhola muito forte, principalmente as comunidades galegas e de outras regiões da Espanha. Temos também muitos empresários espanhóis investindo na Bahia, principalmente nas áreas de turismo, hotelaria, mas também na área de energia. Temos um leque de empresas espanholas que mantêm um foco importante na Bahia. E, além do apelo que tem o espanhol com a Bahia, o estado tem uma história muito forte com a gente. Sempre digo que o matrimônio entre Bahia e a Air Europa deu muito certo, e queremos manter esse relacionamento muito forte. O intuito é continuar crescendo.
A gente pode dizer que hoje a Bahia é um dos principais destinos do Brasil para os turistas europeus?
Quando falamos de passageiros espanhóis em geral, eles têm muito conhecimento da Bahia, muito. A Bahia, principalmente no mercado da Espanha, se posicionou muito bem ao longo de todos esses anos. E, com certeza, os resultados que hoje temos pode ser explicado por isso. Além dos passageiros baianos que viajam para a Europa, temos também muitos passageiros europeus vindo para cá. Praticamente 50% de nossas aeronaves são de passageiros europeus e 50% de brasileiros. O equilíbrio na quantidade de passageiros está ótimo.
Como funciona a parceria da Air Europa com o governo da Bahia? Ela é estratégica para a expansão dos voos entre Salvador e a Europa?
Sempre tivemos parceria com o governo da Bahia. Hoje a motivação principal para crescer a frequência de vôos para a Europa é justamente os bons resultados que temos tido. Estamos conversando ainda com o governo da Bahia para tentar chegar a um acordo. Mas, independente disso, os resultados que temos hoje na Bahia não são só da Air Europa. São frutos também das ações do governo para promover a Bahia na Europa. E é resultado também do trabalho das agências de viagens. E também dos passageiros que gostam de nossos produtos. O resultado de todo esse trabalho está dando certo.
A imagem no Brasil sempre foi muito prejudicada pela questão da violência. O senhor vê alguma mudança nesse sentido?
Sempre temos coisas para melhorar no Brasil, não vou dizer que não. Sobre essa questão da violência, não posso falar muito, mas eu acho que o passageiro europeu confia no destino. Não temos ouvido comentários ruins, vamos dizer assim, de europeus que não querem vir ao Brasil por causa da violência. Acho que hoje esse ponto não está na fala dos europeus, não é uma grande preocupação. Mas, com certeza, é um ponto que temos que ter cuidado daqui para a frente.
A Air Europa tem investido em elementos 100% recicláveis e biodegradáveis na oferta gastronômica dos voos. Qual é a importância da sustentabilidade ambiental para a companhia?
Hoje, o principal desafio que temos é a sustentabilidade. A Air Europa sempre teve duas coisas na mente que não deixamos de lado. A principal é a questão da segurança.Tudo o que nós fazemos, falamos e criamos, no dia a dia, é sempre pensando na segurança. O segundo ponto é o impacto ambiental. A Air Europa tem hoje mais de 45 boas práticas que estamos desenvolvendo para melhorar e ainda ser mais sustentáveis. O principal ponto é a frota. Atualmente temos a frota mais moderna da indústria de aviação como um todo. Hoje já temos uma aeronave que é o Boeing 787 Dreamliner. Essa aeronave é super sustentável e consome até 20% menos de combustível. Isso ajuda muito na sustentabilidade. Também estamos trabalhando muito forte com a União Europeia e com os diferentes governos para a implementação do SAF (Sustainable Aviation Fuel). Você sabe que o SAF é o biocombustível que atualmente nossa indústria está desenvolvendo para alcançar nos próximos anos . Queremos incrementar a utilização do SAF conjuntamente com o combustível convencional. Com essas iniciativas, estamos pensando em 2030, em 2050. Parece muito longe, mas não é. Todas as nossas empresas estão trabalhando muito forte nisso. Além disso, também temos um monte de iniciativas. Todo o material que utilizamos nos serviços de nossas aeronaves é reciclável. Atualmente, os veículos que estamos utilizando em diferentes aeroportos do mundo são os elétricos. Temos planos de voos feitos com inteligência artificial para que o percurso da aeronave seja o mais direto possível e consuma menos combustível. Então, temos um monte de iniciativas que hoje a indústria como um todo e a Europa também estão desenvolvendo para nos próximos anos ser uma indústria sustentável em todos os aspectos
Como o senhor falou, os voos dessa rota são operados com aeronaves Boeing 787, um dos modelos mais avançados da categoria. Considerando que a Air Europa não adota uma estratégia de preços mais baixos, o uso dessas aeronaves representa um diferencial competitivo para a companhia?
Com certeza. Essas aeronaves são muito modernas e muito sustentáveis. E são muito mais caras, vamos dizer assim. A nossa indústria é muito complexa. Não tem muito segredo, mas é muito complexa. E trabalhamos muito nos custos. Quando falamos em controlar os custos, fazemos isso para oferecer mais serviços para o passageiro. Melhorar a aeronave, o entretenimento a bordo, a internet, a gastronomia. Tentamos controlar todos os custos possíveis para oferecer esses serviços para o passageiro. E, com certeza, hoje o passageiro procura aeronaves modernas, além da pontualidade do horário. Uma coisa que a Air Europa não faz é mexer na programação, Tentamos sempre cumprir nossos horários ao máximo. São pequenas coisas que a nossa empresa leva em consideração para continuar crescendo.
Como o senhor avalia o cenário atual da aviação civil no mundo e quais são as perspectivas para o futuro do setor?
O setor já tem superado a demanda de passageiros a nível global. A demanda global tem superado a do ano de 2019. Já em 2024, a demanda global de passageiros superou 2019. A indústria continua crescendo a nível global. E a América Latina é a região que mais cresce no mundo em demanda de passageiros. É a região que mais se recuperou após a pandemia e já superou a demanda global de 2019. Nossa expectativa é que a indústria, nos próximos anos, continue crescendo. É uma indústria muito complexa, mas vai continuar crescendo. O principal desafio que tem a indústria como um todo é a incorporação de aeronaves. Esse é o principal empecilho que temos hoje para continuar a crescer. A chegada de novas aeronaves não acompanha ou não está acompanhando o crescimento rápido da oferta. E precisamos que esse crescimento da oferta seja acompanhado com a chegada das aeronaves ao mesmo tempo. Hoje, portanto, o principal desafio que temos com a indústria é que as novas aeronaves novas comecem a chegar um pouco mais rápido.
E, no Brasil, quais são os principais gargalos que dificultam o desenvolvimento da aviação civil?
O principal gargalo que temos no Brasil é, com certeza, o custo operacional. O custo operacional é um gargalo importante. E também o nível de judicialização do mercado brasileiro, que também é um ponto importante. Mas, no geral, tem outros pontos que são muito positivos, como o tamanho do mercado. O Brasil tem um mercado gigantesco e muitas oportunidades. Então, esses empecilhos são compensados pelo tamanho do mercado, o tamanho da demanda. Mas diria que os principais gargalos são os custos operacionais e o nível de judicialização.
Por que se busca tanto a Justiça, no Brasil, para resolver questões entre clientes e companhias aéreas?
É uma questão muito complexa, porque hoje o Brasil é um dos países que têm mais pontualidade a nível mundial. Quando você compara com outros países, o Brasil tem um nível de pontualidade muito alto, mas, realmente, tem muita judicialização. Então, não condiz uma coisa com a outra. Tem muita pontualidade e, por outro lado, muita judicialização. A principal questão aqui no Brasil é que qualquer motivo de cancelamento ou demora que seja alheia à empresa aérea, mesmo assim ela tem que arcar com todos os custos. Por exemplo, se um aeroporto está fechado por chuva forte ou por nevoeiro. Muitas vezes as companhias aéreas são judicializadas por esse motivo. E as companhias aéreas não têm responsabilidade sobre o fechamento de um aeroporto. Em outros países isso não acontece. Em outros países, quando o aeroporto fecha, o passageiro já está ciente que é uma razão alheia à companhia aérea. Por isso, não existe muita judicialização nesse momento. Nós, aqui no Brasil, damos o máximo atendimento aos passageiros. Damos o máximo suporte quando acontecem essas coisas. A gente oferece alimentação, hotel, todas as alternativas. Mas, apesar desses esforços, a judicialização está aí. É muito complexo.
Você viaja muito pelo mundo e vem à Bahia com frequência. Quais são as impressões que um cidadão do mundo, como o senhor, tem do destino Bahia?
A Bahia tem um potencial gigantesco a nível cultural, gastronômico, de praias e de pessoas, porque as pessoas aqui são muito acolhedoras, muito boas. Eu acho que a Bahia ainda tem muito mais para evoluir na recepção de passageiros estrangeiros, mas é um destino maravilhoso. A Bahia tem crescido muito a nível geral. Acredito que a Bahia está em um bom caminho para se tornar um destino global, pensando nas praias, na gastronomia, na cultura. O estado tem muito ainda para dar.
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