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Ataque em SP acende alerta para alto índice de violência nas escolas

Pedagoga e psicóloga apontam medidas educativas e de prevenção para redução de casos

Publicado sexta-feira, 31 de março de 2023 às 19:42 h | Autor: Rafaela Souza
Agressões no ambiente escolar apresentam índices elevados no Brasil
Agressões no ambiente escolar apresentam índices elevados no Brasil -

O ataque à Escola Estadual Thomazia Montoro, em São Paulo, que deixou uma professora morta e quatro pessoas feridas na última segunda-feira, 27, acendeu o alerta para a discussão de medidas que coíbam a violência nas salas de aula do país, além da prática de uma educação antirracista. Antes de realizar o atentado, o agressor de 13 anos já havia apresentado comportamentos agressivos e racistas com outros colegas de turma.

As agressões no ambiente escolar apresentam índices elevados no Brasil. Segundo uma pesquisa da Nova Escola, 8 a cada 10 professores relataram casos de violência nas escolas onde trabalham. O levantamento foi feito em agosto de 2022 com 5300 educadores de todo o país. Entre os que já foram alvo, 51,23% relatam terem sofrido violência verbal. A violência psicológica é relatada por 22,89%, já a violência física representa 7,53% dos casos. 

De acordo com os profissionais, 50,46% dos respondentes alegam que os estudantes são os principais agressores. Em seguida, 25,6% relatam os pais dos alunos; 11,4% apontam que os agressores são os gestores das escolas e cerca de 9%, citam outros professores ou colegas. O estudo ainda aponta que 7 a cada 10 professores perceberam aumento na violência nas escolas com o retorno na pandemia, principalmente entre os próprios alunos.

Tendo em vista o combate da violência, a pedagoga e CEO da Nova Escola, Ana Lígia Scachetti, disse ao Portal A TARDE que é fundamental a implementação de uma ‘cultura de prevenção’ para evitar que outros ataques aconteçam no país. Ela explica que o trabalho deve ser desenvolvido pelas instituições de ensino em parceria com as famílias das crianças e dos adolescentes.

“A principal solução que temos para esses casos é a prevenção. Precisamos criar na escola uma cultura de combate à violência, de identificação e reflexão para que esses casos não aconteçam. Uma vez que eles aconteçam, a gente tem que acolher, refletir, reconstruir essa escola. Todo mundo ali, alunos, professores, funcionários, familiares, todo mundo está passando por um processo de luto profundo. Então, para não acontecer isso, a gente precisa trabalhar na prevenção que deve acontecer o tempo todo”, aponta.

Quanto às iniciativas alinhadas ao objetivo de prevenção, a pedagoga recomenda a realização de atividades que envolvam toda a comunidade escolar, como capacitações, palestras, a fim de estimular a escuta e o diálogo no ambiente escolar.

“É importante pensar em formações com especialistas para falar sobre o tema com os professores para que eles sejam preparados, para que as famílias consigam em casa refletir sobre o que a família pode fazer. Criar espaços de escuta e encaminhamento. Então, se eu percebo que o aluno tenha algumas características que podem levar a algum ato violento, o que eu faço com esse aluno? Eu tenho que ter um processo para lidar com isso, tem um psicólogo, um professor que seja referência nesse assunto que vai me ajudar com isso? De que forma a equipe pedagógica da escola vai fazer? Tudo isso tem que se identificar e encaminhar para que essa criança e esse adolescente seja ouvido e encaminhado para outro tipo de comportamento”, sugere.

Acesso à internet

Além da atuação na escola, a pedagoga alerta para a postura da família em casa em relação ao uso da internet pelas crianças e adolescentes. Segundo ela, a ‘cultura digital’ deve ser pensada de forma conjunta para que as crianças consumam conteúdos adequados na internet.

“Os pais precisam pensar sobre quais informações os filhos estão acessando. No caso de São Paulo, há a informação de que o menino acessava grupos ligados à violência e comportamento extremos. Os pais têm que evitar que isso aconteça, saber quais acessos são liberados, com quem ele está conversando. É algo que tem que ser feito e junto à escola construir essa reflexão”, acrescenta. 

 Assim como a pedagoga, a psicóloga Tatiana Mendes reitera a necessidade de acompanhar a rotina e o acesso das crianças e adolescentes à internet. Ela diz que os pais precisam saber e filtrar os conteúdos consumidos pelos filhos para que tenham segurança do que estão consumindo, além de estabelecer um horário para essa atividade.

“A internet é um mundo sem fundo, a gente pode pesquisar sobre tudo. Então, se o pai ou mãe não tem o cuidado de filtrar aquele acesso. Isso acaba sendo muito perigoso e falo pelo lado violento da coisa, já que as crianças na inocência são atraídas pela facilidade de acesso. É importante estabelecer o horário que ela vai ter acesso e se vai ter alguém monitorando. Hoje a gente vê crianças de 2 anos com tablet, celular e a internet tem sido usada para ocupar as crianças para o desencargo dos pais”, frisa.

Racismo

Sobre o ataque em São Paulo, a psicóloga pontua que o caso está ligado ao racismo e não deve ser tratado como um atentado motivado por bullying, já que o agressor teria usado termos racistas durante uma discussão com um colega anteriormente.

“O fato dele assemelhar uma pessoa preta a um macaco é racismo. Por isso, a gente precisa diferenciar os termos. O bullying existe, mas ele não pode ser trocado pelo racismo quando se profere xingamentos a pessoas pretas. A gente precisa ter uma educação antirracista não só no sentido pedagógico, mas uma educação também dentro de casa. Quando a gente fala de crianças, elas têm comportamentos muitos genuínos. Então, a gente tá vendo uma criança de 13 anos que aprendeu isso em algum lugar”, argumenta.

Outra pesquisa da Nova Escola aponta que, no Brasil, em novembro de 2022, 53,2% dos profissionais pretos e pardos declararam ter presenciado situações de racismo em ambiente escolar nos últimos 5 anos. Enquanto, 23,71% dos professores negros alegaram que já foram alvo de discriminação.

A psicóloga ressalta que os impactos do racismo devem ser abordados na sala de aula de forma constante a partir de uma prática antirracista. “Também precisamos discutir como isso vai interferir na autoestima da vítima. É importante falar sobre o assunto em outras situações, não esperar um caso como esse acontecer, além de destacar que o racismo é crime também”, completa.

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