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15/08/2023 às 6:00 • Atualizada em 16/08/2023 às 13:01 - há XX semanas | Autor: Alan Rodrigues

SIM, EU POSSO!

Programa propõe alfabetizar 4,5 mil adultos em 4 meses

Método cubano, com influência de Paulo Freire, é a base da parceria entre MST, Uneb e Governo do Estado

Sim, eu posso, em Paulo Afonso: sala cheia e alunos atentos em busca da alfabetização
Sim, eu posso, em Paulo Afonso: sala cheia e alunos atentos em busca da alfabetização -

Agricultores, idosos e trabalhadores das mais diversas idades participam de um projeto que propõe uma verdadeira revolução. No lugar das armas, as letras. Movidos pela vontade de superar as próprias limitações, eles buscam não só recuperar o tempo perdido, mas, ampliar seus horizontes e se tornarem protagonistas das próprias histórias.

Em quatro meses, o projeto prevê formar 4,5 mil alunos, divididos em 300 turmas, espalhadas por 16 municípios. “Sim eu posso alfabetizar a Bahia!” é o nome do programa, desenvolvido por meio de uma parceria que envolve a Secretaria de Educação do Estado, a Universidade Estadual da Bahia (Uneb) e o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST).

As aulas são ministradas a partir de uma telenovela, exibida em 64 capítulos ao longo de 16 semanas, com duas horas de aulas, de segunda a quinta, sempre acompanhadas com atividades complementares e avaliação dos monitores.

Estratégia de educação busca verdadeira revolução na educação do estado
Estratégia de educação busca verdadeira revolução na educação do estado | Foto: Alan Rodrigues | AG. A TARDE

O método utilizado foi desenvolvido em Cuba e aplicado pela primeira vez em 1961, utilizando camponeses como professores. A estratégia foi decisiva para a erradicação do analfabetismo na ilha do Caribe.

Na Bahia, coube à Uneb selecionar o corpo docente, formado por profissionais de diversas áreas, sem a obrigatoriedade de serem professores. Para os coordenadores de cada núcleo é exigido nível superior. Já para atuar nas salas de aula basta possuir o ensino médio.

As novelas, produzidas originalmente em espanhol, foram regravadas e contaram com a participação do ator Chico Diaz. Os ‘pen drives’ com os conteúdos de aprendizagem são distribuídos para cada núcleo de 15 alunos, em média, e o compartilhamento é proibido.

O MST é o guardião do método. Síntia Paula Carvalho, coordenadora estadual de educação do MST na Bahia, destaca a inclusão proporcionada pelo projeto. “Tem um público grande de idosos, mas também tem adultos, jovens ciganos, ribeirinhos, quilombolas e moradores de periferia”, detalha. Ela ainda chama a atenção para a necessidade do acolhimento por parte dos alfabetizadores. “Alguns não sabem nem pegar no lápis”.

Eficácia comprovada

O método foi adaptado pela pedagoga cubana Leonela Inez Relys Diaz, falecida em 2015. E, por mais surpreendente que possa parecer, a estratégia já foi testada no Brasil. Ela foi aplicada em estados como Ceará, Minas Gerais, Alagoas e Rio de Janeiro, há mais de uma década. Apenas no Maranhão, foram 10 mil alfabetizados pelo “Sim, eu posso”.

Na Bahia, desde 2019, quando o hoje governador Jerônimo Rodrigues (PT) era secretário de Educação, o MST busca a parceria para a implantação do programa. Devido à pandemia, o projeto teve que esperar, mas, em abril do ano passado, a Marcha do MST de Feira a Salvador recolocou o tema em pauta. Como resultado, há pouco mais de um mês, se iniciarem as primeiras turmas.

A professora Maria do Socorro da Costa e Almeida, doutora em educação e contemporaneidade, atua na pró-reitoria de extensão da Uneb e coordenou todo o processo de seleção dos alfabetizadores. Aliás, para ela, alfabetizar não é um termo correto.

“São pessoas que buscam letramento, não são analfabetos”, diz a acadêmica, lembrando a máxima do patrono da educação brasileira e um dos inspiradores do ‘Sim, eu posso’, Paulo Freire, segundo quem “cada sujeito é leitor do mundo”.

Maria do Socorro considera o programa um trabalho sociopolítico que se utiliza de diversas temáticas, como ecologia, preservação da terra e das nascentes, violência e discriminação, para se aproximar da realidade dos alunos e promover a reflexão.

Todos os coordenadores e alfabetizadores selecionados pela Uneb passaram por uma capacitação intensiva, de cinco dias, em regime de internato, num hotel fazenda na cidade baiana de São Gonçalo dos Campos. Uma das coisas que se aprende no treinamento é que qualquer lugar pode ser sala de aula.

O "Sim, eu posso" acontece em igrejas, associações comunitárias, assentamentos do MST, terreiros de candomblé, nas casas dos alfabetizadores, em garagens e, até, em escolas. “Se o prefeito quiser apoiar, ótimo, mas o programa acontece a despeito disso”, diz Maria do Socorro.

Compromisso

Em Dias d´Ávila, região metropolitana de Salvador, o acampamento Monte Belo é um dos 8 núcleos que abrigam o "Sim, eu posso". As aulas acontecem à noite e a maioria dos alunos comparece depois de passar o dia no trato com a terra.

“Trabalho até a tarde, vejo a novela e venho pra aula”, diz seu João Borges, que parou de estudar há muito tempo. Mesmo com um nível de instrução um pouco acima dos colegas, ele faz questão de não perder uma aula. “A gente tá numa comunidade que a gente tem que incentivar a si e aos outros“, justifica.

Adauto Bispo é o coordenador do programa no município e explica como é feito o recrutamento dos alunos, que não precisam ter nenhuma instrução prévia. “É só querer participar”, diz. Segundo Adauto, os próprios alfabetizadores fizeram uma busca ativa nas residências do acampamento, para divulgar o programa.

Lilian dos Santos, 25 anos, é a responsável pela turma do Monte Belo. Com o ensino médio completo, ela alimenta o sonho de se tornar professora, principalmente depois da experiência que passou a viver nas últimas semanas.

“É uma coisa que a gente se orgulha”, diz Lilian, que dedica atenção especial aos mais idosos na hora das atividades e valoriza a troca de experiências com a turma. “Vocês aprendem comigo e eu aprendo com vocês”, ela sempre repete para os alunos.

Na parede, cartazes com os nomes de cada um dos integrantes da turma, escritos por eles mesmos, comprovam a eficácia do aprendizado. A metodologia associa as letras a números e facilita a construção das palavras.

D. Maria Neuza, ou Liu, como é conhecida, é uma das mais ativas da turma e, mesmo com dificuldade de locomoção, não dispensa uma aula. “Trabalho na roça, tem dia que não aguento nem me segurar. Mas, quando é de noite tenho que vir pra aula, gemendo, subindo a ladeira, mas eu venho”, conta.

Práticas de ensino inovadoras focam na  emancipação dos alunos
Práticas de ensino inovadoras focam na emancipação dos alunos | Foto: Alan Rodrigues | AG. A TARDE

Emancipação

A dedicação e o valor atribuídos pelos alunos ao projeto comprovam a importância do letramento, mesmo para os mais idosos. Tem a ver com emancipação social, como explica a professora Maria do Socorro. “O idoso já viveu, tem filhos, netos, o programa é um passaporte para o mundo, afirma o protagonismo do sujeito”.

Ela explica que a inclusão desse e de outros públicos no programa serve como baliza para o planejameento dos municípios, e cita como exemplo as mulheres ciganas, que fazem parte do programa mas não estão matriculadas nas escolas regulares, devido à obrigatoriedade de ter um acompanhante do sexo masculino. "Elas não entram na estatística dos municípios".

Uma vez concluídas as aulas, cada participante é estimulado a produzir uma carta contando a própria história. Além disso, depois de aprender a escrever, todos terão a chance de tirar uma segunda via do documento de identidade, substituindo a impressão digital pela própria assinatura. Síntia Paula diz ainda que a parceria com a secretaria de educação prevê o ingresso dos concluintes nas turmas do EJA (Educação de Jovens e Adultos) da rede estadual.

A partir da conquista da cidadania, os responsáveis pelo programa esperam que surjam demandas ainda mais ambiciosas. “Essas pessoas vão querer mais. Leitura e escrita é empoderamento, pensamento crítico. Por que Paulo Freire foi exilado?”, lembra a professora, fazendo referência ao criador do método revolucionário de alfabetização que deixou o Brasil em 1964, durante a ditadura militar, passando 15 anos no exílio. “Essa é a força revolucionária da proposta, a revolução do pequeno, do invisível”, conclui.

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