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A MÃO

Artesanatos baianos conquistam mais pessoas e reforçam economia

Neste ano, 11 unidades produtivas do estado venceram o Prêmio Sebrae TOP 100 de Artesanato

Por Ruan Amorim*

04/12/2022 - 6:00 h
Mila e Mirinha produzem baianas, sereias e orixás
Mila e Mirinha produzem baianas, sereias e orixás -

Ele preserva memórias, legados e afetos, materializa a ancestralidade e pode ser sinônimo de renda extra ou a única forma de sustento para muita gente: o artesanato. Com tantas características, o mercado de produtos feitos à mão na Bahia tem crescido, conquistado mais adeptos, ganhado destaque e reforçado sua importância na economia.

De acordo com dados da Coordenação de Fomento ao Artesanato (CFA), órgão público responsável por executar as ações de incentivo às produções artesanais baianas, atualmente o estado tem 16 mil artesãos cadastrados no sistema, 2 mil a mais que em fevereiro, quando o número era 14 mil. Além disso, com as criações manuais que esbanjam técnica, cultura e criatividade, a força do artesanato baiano vem sendo reconhecida nacionalmente.

Neste ano, 11 unidades produtivas do estado venceram o Prêmio Sebrae TOP 100 de Artesanato, que tem entre seus critérios de avaliação qualidade estética, qualidade simbólica e compromisso socioambiental. Uma das organizações foi a Associação de Artesãos de Santa Brígida (AASB), gerida pela artesã Anaiza Rosa, 25.

Foi com a produção de cestas, porta-jóias e sousplats - criados com fibra do licuri, e de entalhe de pássaros da caatinga - produzidos de madeira de umburana seca reaproveitada da natureza -, que a AASB conquistou o pódio na premiação.

Para Anaiza, que desde dos 18 anos trabalha com o artesanato, a conquista tem grande valor afetivo, pois a entidade que está à frente hoje é um legado do seu avô, o mestre e artesão José Valdo Rosa, que em vida também conseguiu o feito. “Tem um valor sentimental enorme pelo legado de meu saudoso avô. É muito bom saber que ele foi premiado e agora eu, sua neta, também. Me dá força para seguir”, diz.

Para além do impacto emocional, o reconhecimento também alcançou as finanças da AASB, que é fonte de renda para 35 artesãos. “O resultado elevou nossas expectativas no mercado de artesanato. Depois da premiação, recebemos mais pedidos e vendemos mais”, conta Anaiza. Contudo, o bom movimento não vem de agora. “Mesmo no pico da pandemia, tivemos uma boa saída dos produtos. A comercialização online aumentou”, conta.

Quem também vive um bom momento com o artesanato é Mirinha Leal, 58, que desde 2015 tem uma empresa no segmento. Ela e a sua sócia, Milla Leal, estão conseguindo um bom retorno financeiro com a criação de baianas e sereias - produzidas de coco seco e biscuit -, e orixás em dobradura em papel (origami). “Estamos em uma crescente de vendas no estado e também fora. Isso porque o nosso trabalho está conseguindo mais reconhecimento, sobretudo por ser um produto cultural, reciclado e sustentável”, afirma Mirinha.

Esse momento favorável do artesanato para Mirinha é um afago, principalmente pelos prejuízos que a pandemia gerou para o seu negócio, fomentado pelo turismo. “Fomos muito prejudicadas pela crise sanitária, uma vez no momento que tudo fechou, as lojas, hotéis e demais clientes deixaram de fazer pedidos e nossos produtos ficaram sem saída, sobretudo porque eram os turistas que impulsionavam as compras”, diz a artesã.

Agora, com a melhora no setor, as expectativas para o comércio são as melhores. “Temos uma boa perspectiva e esperamos prosperar ainda mais com as nossas produções, que têm valor sentimental, cultural e são feitas com dedicação e amor”, completa Mirinha.

A tendência de melhora no artesanato baiano também é vislumbrada pela socióloga e coordenadora estadual do CFA, Ângela Guimarães, 41. De acordo com ela, há um crescimento da demanda desse setor no estado, que demarca um conhecimento passado de geração para geração e reflete os modos de viver e de se organizar do povo baiano.

“O setor artesanal encontra-se em expansão. Hoje, temos investimento de mais de 5 milhões/ano (no país) com perspectivas para o ano que vem de ampliação com a retomada dos convênios com o Programa do Artesanato Brasileiro em plano federal”, comemora Ângela.

Engajar e valorizar

Para além da atuação do poder público, segundo o consultor de artesanato Rodrigo Lyra, o engajamento dos próprios profissionais do segmento para contornar os entraves que acometem a profissão tem impulsionado o artesanato na Bahia. “Esse setor tem crescido e se estabelecido graças à movimentação dos artesãos para quebrar as barreiras de entrega, logística e acesso a matéria-prima”, conta.

Outro ponto de impulso, segundo ele, é a valorização da identidade regional por parte do consumidor. “Essa tendência mostra o reconhecimento de elementos que antes não eram considerados importantes”, diz.

Foi nesse cenário, percebendo uma boa recepção do público para com as peças artesanais, que a advogada e influencer Larissa Alves juntamente com a sua mãe, Miriam Alves, decidiu apostar em uma marca de roupas e acessórios fashions de crochê, a Linha e Agulha.

A empresa foi criada em 2021 com intuito de fomentar o mercado de moda por meio de designers pensados para elevar a autoestima da população preta. De acordo com Larissa, o pontapé para a Linha e Agulha ganhar visibilidade foi o Afropunk Bahia, festival de cultura preta, do ano passado, em que suas peças chamaram a atenção do público.

“O festival foi um divisor de águas no sentido de mostrar que nosso trabalho estava sendo notado e que as pessoas gostaram e começaram a buscar por nossas peças. Isso foi um incentivo para continuar investindo”, diz Larissa.

Por conta do sucesso, as peças da Linha Agulha novamente marcaram presença no Afropunk, dessa vez com um lançamento exclusivo. Para isso, Miriam, que é crocheteira da marca, ao longo do ano, foi dando vida e cor aos desenhos de Larissa, Maiana Gleide e Macio André Menezes, designers da marca.

“Nos juntamos para desenvolver a coleção Incendia. São peças inspiradas no estilo baddie, muito utilizado por grandes figuras pretas do mundo, como as cantoras Rihanna e Ludmilla. O intuito do lançamento foi trazer à tona a individualidade e autenticidade do povo preto, em cores quentes e chamativas, demonstrando a beleza e o poder que nos foi negado por tanto tempo ao longo da história”, ressalta Larissa.

Apesar de trabalhar com modelos exclusivos e ter como alicerce a experiência cultural e profissional de Miriam, que desde os 13 anos movimenta o artesanato com as linhas de crochê no interior baiano de Madre de Deus, a Linha e Agulha ainda não consegue assumir o status de provedor principal das família das pessoas que a integram e materializam as roupas, mas tem o seu papel na renda e planos de expansão.

“Aos poucos, com um passinho de cada vez, a marca vem ajudando a complementar a renda mensal dessas pessoas, Isso já significa um avanço e traz perspectiva e esperança para a construção da estabilidade financeira desses indivíduos”, pontua Larissa.

Outra marca que vem consolidando seu lugar na cena de artesanato na Bahia é a Majeko - Artesanal & Orgânico, da artesã Dina Santos, 64, que percebe um movimento de valorização do artesanato este ano. “O consumo de produtos artesanais a cada dia vem conquistando novos públicos. O consumidor brasileiro está tendo um olhar mais aguçado para o artesanato, que é uma arte rica em informações”, relata Dina.

Foi há mais de 20 anos que Dina passou a ter um “pé no artesanto”, prática de família que lhe encantou desde cedo. Ela cria produtos como estátuas alusivas aos Orixás, flores ornamentais e prendedor de guardanapos. Os artigos têm como principal matéria-prima a palha do milho, fator que se soma à descendência yorubá de Dina e nomeia a marca. “Majeko é uma palavra yorubá que significa "plantação de milho ou milharal”, conta a artesã.

Toda produção da Makejo é um resgate cultural e ancestral que quebra as barreiras geográficas e chega a pessoas físicas e jurídicas de todo o Brasil. Nesse cenário, Dina, apesar de ainda não conseguir se sustentar apenas com as artes artesanais, vislumbra um futuro promissor para o setor. “É um mercado em ascensão, mas ainda precisa ser mais divulgado e ter mais investimento. Só dessa forma as artesãs e artesãos vão conseguir viver unicamente, se quiserem, dessa arte”, pontua Dina.

Para que o artesanato se consolide, para aqueles que querem, como a principal fonte de renda, muitas ações precisam ser realizadas em consonância com a produção. É o que explica a gestora de artesanato do Sebrae Bahia, Tatiana Martins.

“O aperfeiçoamento precisa ir além dos limites do ‘fazer’ artesanal. Técnica, qualidade e criatividade são essenciais, mas é preciso investir em capacitação, gestão, formação de preço, técnicas de venda, saber contar sua história, posicionar seu produto e apresentá-lo para o mercado”, explica a especialista.

*Sob supervisão da editora Cassandra Barteló

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Tags:

artesanato baiano negócios prêmio Sebrae top 100

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