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Lixo eletrônico gera lucro para pequenos empreendedores

Publicado domingo, 08 de setembro de 2019 às 13:00 h | Atualizado em 08/09/2019, 15:16 | Autor: Regina Bochicchio | Foto: Rafael Martins | Ag. A TARDE
Robson conta que a Recicle vende 10 t de sucata por mês
Robson conta que a Recicle vende 10 t de sucata por mês -

Sabe aquela placa de PC antigo, processador de celular e smartphone velho ou monitor de TV LCD que não funcionam mais e se joga fora? Vale dinheiro e, às vezes, literalmente, ouro. De olho no mercado de lixo eletrônico, ou do e-lixo, que cresce a partir do consumo cada vez maior de eletrônicos pela população, pequenos e médios empresários têm investido neste setor, que, aqui na Bahia, está em expansão, o da chamada logística reversa de eletrônicos. A lógica, como diz o nome, é inversa: vai do consumidor final à indústria.

E com propósito ambiental. A matéria-prima do negócio são os objetos que, já sem utilidade, não podem ser descartados em aterro sanitário porque contêm substâncias que prejudicam o homem e o meio ambiente (mercúrio, cádmio, chumbo...). Daí que o trabalho dessas empresas é o da prospecção de doadores de sucata eletrônica – população e, principalmente, empresas que doam o e-lixo. O material é desmontado e adequado para a destinação final: venda para reciclagem ou reúso de algumas partes do equipamento, como teclados, monitores.

Os clientes? No caso de peças soltas, normalmente o consumidor comum, que barganha em plataformas como Mercado Livre ou OLX. Mas com o e-lixo sofisticado, como placas e processadores, por exemplo – que contêm metais nobres, como ouro, platina, paládio, ródio em pequeníssimas quantidades –, quem compra são empresas multinacionais especializadas na reciclagem e depuração (separação) dessas substâncias nobres e, por sua vez, sua reutilização. E é justamente esse o cliente mais cobiçado e onde cresce o mercado.

O mercado do e-lixo é milionário. "De acordo com a ONU, o Brasil recicla apenas 2% de seu e-lixo, em um mercado que movimenta cerca de R$ 2,5 bilhões por ano", diz Eduardo Garrido, analista do Sebrae-BA, para quem o segmento deve se expandir nos próximos anos.

Empresas baianas

Na Bahia há pelo menos 10 empresas atuando no segmento, mapeou a reportagem. A Sucatex, localizada em Salvador, é uma das maiores. Há mais de 10 anos, Elder Nogueira, 48 anos, percebeu esse nicho de mercado. "As pessoas enxergavam a separação de sucata eletrônica como brincadeira de final de semana. Eu via negócio ali", conta.

Quando iniciou, investiu na compra de um carro adequado para buscar material, publicidade, aluguel de um pequeno galpão de armazenamento e pessoal de apoio para desmonte. Hoje, Elder tem mais de 200 parceiros que doam sucata eletrônica (shoppings, grandes empresas...), dois pontos na capital e comercializa de sete a oito toneladas de e-lixo ao mês. Quanto lucra e para quem vende? Prefere não revelar. "Questão de mercado. Tem a concorrência", diz.

Empresas como a Sucatex recolhem o e-lixo de graça em residências ou empresas. Para a população, é uma forma de se livrar do que não tem serventia sem "sujar" o meio ambiente. Para empresas, contudo, trata-se de seguir o que diz a Lei nº 12.305/2010, que dispõe sobre a Política Nacional de Resíduos Sólidos. Ao doar o e-lixo, recebem da empresa que faz a coleta um certificado de isenção de qualquer responsabilidade sobre o resíduo gerado. O Brasil ainda não possui uma lei específica que regule a logística reversa.

O que existe é uma proposta de acordo para a implantação de Sistema de Logística Reversa de Produtos Eletroeletrônicos de Uso Doméstico e seus Componentes, que está em consulta pública pelo Ministério do Meio Ambiente. As indústrias fabricantes de eletrônicos também têm interesse na regulamentação, para execução de novos negócios.

"A economia circular provoca um repensar do modelo produtivo, impactando desde o design do produto e provocando um novo mindset de negócios. O diferencial competitivo é a geração de valor. Nesse contexto, o Brasil tem todas as condições para liderar essa economia circular, por possuir os três elos essenciais: mercado consumidor grande, ampla gama de fabricantes e mercado de reciclagem forte", diz a Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee), por meio da assessoria de imprensa.

Reciclar sem poluir

Neste negócio, tão importante quanto emitir o certificado para quem doa no ato da coleta (no caso de empresas) é conhecer bem para quem vai vender o e-lixo, diz Robson Fernando Souza, da Recicle – Logística Reversa de Eletrônicos, em Salvador. O comprador tem de garantir que vai reciclar o material sem poluir. A Recicle vende cerca de 10 toneladas ao mês para uma megaempresa de reciclagem de sucata eletrônica, com filiais em 12 estados.

"Só trabalho com quem faz tudo corretamente", diz Robson. Ali na Recicle, além de vender material para reciclagem, também se comercializa parte de aparelhos para reúso, o que representa parte do faturamento da empresa. Robson é analista de sistemas e vislumbrou o crescimento deste mercado. A empresa começou aos poucos, com cinco coletas ao mês. Hoje, diz, faz cerca de 10 coletas por dia. "O consumo de eletrônicos está cada vez maior. É um mercado próspero. Existe demanda e material para coleta". Ele avalia que o investimento inicial para quem inicia no ramo hoje seja de mais de R$ 120 mil.

Investimento inicial

Na avaliação do técnico do Sebrae Eduardo Garrido, o investimento inicial para montar uma empresa de reciclagem de lixo eletrônico de pequeno porte gira em torno de R$ 160 mil, desconsiderando gastos relacionados à aquisição do imóvel e de matéria-prima.

"Esse mercado tem apresentado boas opções para novos investidores. No entanto, o custo operacional desse negócio é relativamente expressivo caso o empreendedor queira executar todas as tarefas de reciclagem de lixo eletrônico. 

Dessa forma, para os pequenos empreendedores pode ser interessante, desde que adequadamente estruturados, inclusive com parcerias que assumam a reciclagem de componentes que são altamente tóxicos e que exigem maquinário específico", diz Garrido.

Mas há quem trabalhe como microempreendedor individual e mantenha um negócio de menor porte, como é o caso de Lourivaldo Januário Cordeiro Neto, dono da Descarte, aberta há cinco anos. Ali também se vende e adequa objetos para o reúso. "Com o consumismo e obsolescência programada, as pessoas jogam fora equipamentos que poderiam usar. Existe mercado para esses objetos, anunciamos na internet. O que não pode ser reusado, vendemos para as empresas que reciclam ou retornamos para o próprio fabricante", diz.

A Descarte recolhe de 300 a 400 quilos por mês de e-lixo. "Para iniciar um negócio pequeno, com uns R$ 20 mil consegue, se já tiver carro e um local de armazenagem", diz Lourivaldo, que diz tirar cerca de R$ 3 mil a R$ 4 mil ao mês. Ele dá a dica: objetos mais antigos (computadores, celulares) contêm mais minério e metais preciosos e, por isso, são mais caros na revenda. Outra coisa para quem quer entrar no ramo, diz, é ter uma boa logística para coleta.

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