PROTAGONISMO
Oferta de serviços personalizados movimenta mercado de festas infantis
Autonomia da criança é levada em conta durante celebração, que pode reunir opções educativas e divertidas
Por Thaís Seixas
Quando você pensa em uma festa de aniversário infantil nos dias de hoje, provavelmente visualiza uma decoração temática de um super-herói famoso, um desenho animado do momento ou um clássico escolhido pelos pais. Se der uma volta pelo salão, vai observar que todos os itens estão devidamente organizados e rendem excelentes fotos para as redes sociais. Na parte da animação, adultos vestidos de personagens fazem performances e comandam brincadeiras e competições entre os pequenos.
Agora imagine chegar à festa e – no lugar do Mickey, Homem-Aranha e Mundo Bita – se deparar com o Dinossauro Pirata, o Construtor ou a Fazendinha. Os temas, escolhidos pelos próprios aniversariantes, inspiram atividades criativas e personalizadas de acordo com as faixas etárias do anfitrião e dos convidados, dialogando com pedagogias e métodos educacionais que acreditam na autonomia da criança.
A diferença entre estas duas situações foi o que levou a neuropsicóloga Daniela Cuadra a buscar uma empresa que fugisse do senso comum, para celebrar o aniversário da filha Martina, que faria 3 anos. Daniela é da Nicarágua e, apesar de morar com a família em Salvador, não possuía no círculo de amizades pessoas com crianças pequenas. Ela lembra que, nas poucas vezes em que foi a aniversários infantis, sentiu-se desconfortável com a música alta e o barulho durante o evento, incluindo o dos animadores.
Na pesquisa por algo diferente do que tinha vivenciado, Daniela encontrou a Bandô – na época, a empresa se chamava Brincar –, que oferecia uma proposta individualizada e focada na experiência da criança.
“Conversamos sobre qual era a minha ideia e tiramos dúvidas sobre os tipos de brinquedos. No prédio que a gente mora, tem outras crianças mais velhas, então eu queria que atendesse as crianças de 1 a 3 anos, mas também as de 6 e 7 anos. Foi uma experiência muito boa porque era exatamente o que eu queria, um aniversário pensado para crianças de 3 anos e idades próximas”, destaca a mãe de Martina que, após o resultado da festa, já comemorou o primeiro ano do caçula, Franco, e também os 5 anos da primogênita.
Frustração que virou negócio
A Bandô é uma empresa familiar, que tem como sócios a advogada Stéphanie Correia e o administrador Jorge Nery. Os dois, que são casados, abandonaram as carreiras formais e passaram a investir no mercado infantil logo após o nascimento do filho, Theo, para que pudessem ter mais tempo de qualidade e acompanhar o desenvolvimento da criança. A primeira ideia de Stéphanie foi investir neste segmento, mas o ‘empurrãozinho’ para criar o negócio veio a partir de uma frustração no primeiro aniversário do filho, pois ela esperava uma forma de entretenimento infantil diferenciada, o que não aconteceu.
“Não dá para fazer algo padrão, como se todas as festas de 1 ano fossem iguais. O que se tinha era sempre um brinquedo de plástico ou aqueles profissionais com a animação tradicional, com uma roupa que assusta a criança ou um barulho muito exagerado. São formas de brincar que não estavam afinadas com aquilo que eu entendo para o desenvolvimento de Theo, e que outras crianças deveriam ter acesso”, revela.
Tudo começou durante a pandemia, quando o casal investiu cerca de R$ 120 mil para atuar com aluguel de brinquedos para eventos – muitas vezes reduzidos, em função das restrições sanitárias vigentes. A ideia era oferecer apenas itens em madeira mas, para atender as demandas do mercado, também foram incluídos carros elétricos e objetos de plástico, a exemplo de casinhas, cavalinhos e mesas, que funcionariam como uma porta de entrada para os clientes conhecerem o serviço da empresa. Depois vieram as publicações nas redes sociais e as participações em feiras, que ajudaram a divulgar ainda mais o negócio.
São formas de brincar que não estavam afinadas com aquilo que eu entendo para o desenvolvimento de Theo, e que outras crianças deveriam ter acesso
Opções personalizadas
A Bandô criou um método próprio de entretenimento infantil, que é personalizado para cada evento. O primeiro passo é conhecer a criança – que pode ser a aniversariante ou as convidadas de uma festa –, além da proposta e das características do evento.
“A gente precisa entender quem serão as crianças, de qual faixa etária, qual o espaço disponível (se é fechado ou aberto), qual a duração e o tema do evento. A gente monta uma proposta dentro dos nossos serviços: temos o Espaço Brincar, que é uma estrutura com brinquedos de estímulos variados, para que as crianças possam brincar a festa inteira; as oficinas criativas, com a criança metendo a mão na massa, com um leque infinito de possibilidades de acordo com o tema da festa e os interesses dos brincantes; e as oficinas recreativas, que são as brincadeiras de corpo e movimento”, explica Stéphanie.
A oferta das atividades e dos brinquedos tem como base diferentes pedagogias, a exemplo da montessoriana, que preza pelo desenvolvimento lúdico, livre e espontâneo, respeitando as habilidades e necessidades da criança, e da abordagem Pikler, normalmente aplicada até os 3 anos, que defende o aprendizado da criança por ela mesma.
Na prática, a opções são inúmeras: em uma festa com decoração do personagem ‘Harry Potter’, por exemplo, os convidados podem participar de uma oficina de poções mágicas; ou vão aprender a fazer doces em um evento que tenha como tema a arte da confeitaria; quem preferir, pode criar um vulcão na era dos dinossauros, e assim por diante.
Oferta das atividades da Bandô tem como base diferentes pedagogias, a exemplo da montessoriana e da abordagem Pikler
Mercado em alta
Identificar lacunas, criar soluções e investir no mercado infantil podem trazer resultados positivos para as empresas que atuam no segmento, no sentido de contemplar diferentes demandas: são aniversários, batizados, chás revelação, formaturas da escolinha e eventos não necessariamente voltados para crianças, mas que as têm entre os participantes.
O especialista em pequenos negócios do Sebrae Bahia, Fabrício Barreto, destaca o crescimento do setor, que tem oportunizado a oferta de mais serviços. “Hoje, nós já enxergamos empresas que são formatadas com foco exclusivamente nesse público infantil. São salões de beleza, empresas de eventos, locação de espaços, que tinham esfriado até um pouco antes da pandemia, e agora chegaram com um novo formato. É um mercado que vem crescendo bastante. Apesar de ser uma tendência, que gera oportunidade de negócio, a nossa orientação para quem vai empreender é que analise bastante e avalie as ameaças e oportunidades do segmento”.
Uma destas oportunidades, segundo Barreto, é a ‘contramão’ do uso das telas. Se o mercado digital tem atraído cada vez mais crianças e adolescentes aficionados em games e tecnologia, oferecer o produto analógico – incluindo brinquedos de madeira e outros itens – pode gerar o interesse deste público.
“O resgate do acesso às brincadeiras e aos brinquedos tradicionais, com o objetivo de distanciar esse público do digital, também é uma realidade. O Sebrae tem atendido empresas de diversos setores, e a nossa análise é que elas precisam trabalhar principalmente na questão científica, difundindo as informações, porque a gente sabe do desafio que os pais têm em afastar as crianças do digital e trazer para o analógico”, avalia.
Escolhas da criança prevalecem
Com quatro anos de história, a Boutique 03 organiza eventos sociais, corporativos, festas infantis, batizados e casamentos, oferecendo serviços de produção, decoração, cenografia e até pós-festa. Segundo a proprietária da empresa, Marília Aguiar, atualmente cerca de 70% dos eventos mensais organizados por ela são para o público infantil.
A empresária analisa que, já a partir dos 3 anos, as escolhas da criança que prevalecem quando o assunto é tema ou diversão nas festas. “Os eventos são muito permeados pelo universo e a individualidade da criança. Então, se ela tem um esporte favorito ou um animalzinho de estimação, tudo isso acaba sendo levado para a festa. Mesmo que, eventualmente, tragam temas comerciais, estas festas têm um toque afetivo, porque refletem a identidade daquela criança”.
Orçamento
O valor investido em uma festa infantil varia de acordo com cada evento, seja em relação ao número de convidados, espaço ou tipos de serviços contratados. Marília Aguiar explica que uma festa conceitual, personalizada e afetiva pode custar mais, mesmo que tenha menos participantes. Segundo ela, o investimento total pode variar de R$ 2 mil a R$ 30 mil.
Da mesma forma, a Bandô faz orçamentos de acordo com o cliente pede. Stéphanie Correia esclarece que não há um valor padrão e nenhuma proposta é igual à outra, pois cada festa é única. Por mês, a empresa fatura de R$ 55 mil a R$ 60 mil com a organização dos eventos.
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