ESPECIAL INDÚSTRIA
"Bahia tem atributos para contribuir com o novo ciclo de desenvolvimento"
Veja entrevista com Carlos Henrique Passos, presidente da Federação das Indústrias do Estado da Bahia (FIEB)
Por Núbia Cristina

A indústria baiana vive um momento promissor, apesar do cenário econômico nacional instável, com projeção de inflação de 5,58%, acima da meta segundo o Banco Central, que tem promovido a elevação da taxa Selic, com previsão de encerrar o ano em 15%. “Mesmo diante desse cenário de incertezas, aqui na Bahia temos grande expectativa pela retomada da produção de automóveis, com a inauguração da fábrica da BYD em Camaçari. Além disso, a Bahia tem registrado crescimento significativo na área de energias renováveis”, aposta o presidente da Federação das Indústrias do Estado da Bahia (FIEB), Carlos Henrique Passos.
Em entrevista ao A TARDE, ele enfatiza que o estado deve receber, até 2030, cerca de R$ 30 bilhões em investimentos privados na área de energias renováveis, o que demonstra muito potencial. “Temos alguns investimentos anunciados que podem causar grande impacto, dentre eles se destaca a produção de diesel e querosene verdes da Acelen, produzidos a partir de recursos renováveis - no primeiro momento óleo de soja e, em seguida, de macaúba”. Confira esses e outros destaques a seguir.
Confira a entrevista completa
A produção industrial da Bahia registrou crescimento de 2,5% no acumulado do ano até fevereiro, em relação ao mesmo período de 2024, segundo dados divulgados em abril pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Como avalia esse resultado?
R – O resultado está em linha com o desempenho do Brasil no mesmo período. Na Bahia, o resultado positivo no acumulado do ano reflete o desempenho dos setores de Refino de Petróleo, Borracha e Plástico, Metalurgia, Minerais não metálicos, Máquinas e materiais elétricos e Bebidas, que apresentaram crescimento nesse período. Em contraposição, apresentaram queda os segmentos de Produtos químicos, Alimentos, Celulose e papel e Couro e Calçados.
A Confederação Nacional da Indústria (CNI) reduziu de 2,4% para 2,3% a projeção de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) em 2025. Esse seria o menor avanço da economia brasileira nos últimos cinco anos e representaria queda de 1,1 ponto percentual em relação ao resultado do PIB de 2024. A economia e a indústria nacional vivem um momento crítico de desaceleração?
R - Vários fatores interferem diretamente no desempenho da indústria e, consequentemente, nestas projeções. O cenário para 2025 traz desafios, com uma projeção de inflação de 5,58%, acima da meta, segundo o Banco Central, que, em resposta, tem promovido a elevação da taxa Selic para 14,75%, com previsão de encerrar o ano em 15%. No cenário internacional, a desaceleração do mercado chinês, as tensões no mercado do petróleo impactado pela Guerra da Ucrânia e, principalmente, a questão tarifária entre Estados Unidos e China, têm trazido muita incerteza e provocado desdobramentos em todas as economias e setores do mundo. Todos esses fatores impactam negativamente o desempenho do setor industrial e de toda a economia. Por isso, a expectativa é que a indústria brasileira e a baiana sigam em crescimento, porém em ritmo menor do que o registrado ano passado.
Mesmo diante deste cenário de incertezas, aqui na Bahia temos grande expectativa pela retomada da produção de automóveis, com a inauguração da fábrica da BYD em Camaçari. Além disso, os segmentos voltados para a produção de bens finais, como Alimentos, Bebidas, Couros e Calçados, Têxteis e Vestuário devem apresentar algum crescimento, impulsionados pela recuperação verificada dos empregos formais e da massa salarial.
Diante desse cenário desafiador, temos os desdobramentos da Reforma Tributária e o risco de corte de benefícios fiscais para o Nordeste. Qual seria o impacto dessa redução de incentivos para a indústria nordestina?
R - Antes da Reforma Tributária já existia um dispositivo legal que estabelecia o fim dos subsídios das empresas até 2032, acabando, assim, com a chamada guerra fiscal, que é basicamente vinculada ao ICMS. A Reforma Tributária veio para complementar esse dispositivo. O fato é que a atração de novas empresas requer alguns pilares, entre eles infraestrutura, capital humano e mercado. Para atrair investimentos, o estado precisa oferecer condições para que a empresa possa progredir, diminuindo seu custo de produção e oferecendo uma infraestrutura de qualidade.
É preciso oferecer condições logísticas para que o insumo chegue às fábricas e que os produtos sigam até os locais de vendas. Outro aspecto relevante para a atração de novas empresas é a capacitação de mão de obra, já que cada vez mais as empresas buscam profissionais mais qualificados. Neste quesito, a Bahia ainda precisa avançar, melhorando os índices de educação. É aí que entram o SESI, o SENAI e outras instituições, que têm contribuído para elevar a qualificação. Há, ainda, a necessidade de um mercado pujante, com pessoas com renda capaz de consumir os produtos das empresas.
Importante destacar que os incentivos fiscais para a região Nordeste, através da SUDENE, para redução do imposto de renda modalidade pessoa jurídica (IRPJ), serão mantidos.
A Bahia ainda precisa avançar, melhorando os índices de educação. É aí que entram o SESI, o SENAI e outras instituições, que têm contribuído para elevar a qualificação. Há, ainda, a necessidade de um mercado pujante, com pessoas com renda capaz de consumir os produtos das empresas
A indústria da mineração na Bahia vivencia momento de expansão e atração de investimentos. Até 2028, serão investidos US$ 9 bilhões na mineração do estado, cerca de 16% do total de investimentos do setor no Brasil. Esses novos investimentos vão alavancar os resultados gerais da indústria baiana?
R - A diversidade de reservas minerais é um fator que coloca a Bahia em destaque. Mais de 200 municípios baianos sediam projetos minerários, de acordo com o Instituto Brasileiro de Mineração (IBRAM). Esses novos investimentos anunciados refletem a crescente importância da Bahia no cenário nacional da mineração, impulsionando o desenvolvimento econômico e social do estado. Este é um segmento relevante para a economia do nosso estado, que emprega mais de 14 mil pessoas. No ano passado, a indústria da mineração foi responsável por arrecadar R$ 168 milhões em CFEM na Bahia, representando 2,5% da arrecadação nacional, mantendo o estado como o quarto maior arrecadador do país, atrás apenas de Pará, Minas Gerais e Goiás. Para um desenvolvimento mais expressivo e sustentável, o setor da mineração precisa de infraestruturas modernas, de elevada capacidade, com destaque para a conclusão da FIOL, Porto Sul e da rede da Ferrovia Centro-Atlântica modernizada.
No ano passado, a indústria da mineração foi responsável por arrecadar R$ 168 milhões em CFEM na Bahia, representando 2,5% da arrecadação nacional, mantendo o estado como o quarto maior arrecadador do país
Poderia destacar outros segmentos promissores, com novos investimentos e potencial para turbinar o crescimento da indústria local?
R - Com vasta oferta de recursos naturais e humanos, a Bahia tem atributos necessários para contribuir com o novo ciclo de desenvolvimento, pautado pelas novas tecnologias e aproveitando as oportunidades geradas pela necessidade de descarbonização da economia global, os negócios ligados à bioeconomia e à chamada economia verde. Essas oportunidades já estão se traduzindo em investimentos no estado, mas também trazem os desafios de desenvolver novos produtos e serviços (de maior valor agregado), que geram empregos qualificados e mais bem remunerados.
A Fieb colaborou com o Programa de Transição Energética da Bahia (Protener), lançado pelo governo do estado em abril deste ano. Qual a importância desse programa e o que esperar dessa iniciativa?
R - A Bahia tem registrado crescimento significativo na área de energias renováveis. Para se ter uma ideia, dados do Observatório da Indústria da FIEB estimam que, até 2030, a Bahia deve receber cerca de R$ 30 bilhões em investimentos privados na área de energias renováveis, o que demonstra o grande potencial do estado. Temos alguns investimentos anunciados que podem causar grande impacto, dentre os quais se destaca a produção de diesel e querosene verdes da Acelen, produzidos a partir de recursos renováveis - no primeiro momento óleo de soja e, em seguida, de macaúba.
Na região Oeste, foram anunciados projetos de biomassa de etanol de milho, por exemplo. É por conta desse cenário promissor que o Protener é um marco importante para posicionar a Bahia como referência no setor
A FIEB vem atuando no fortalecimento do setor de energias renováveis na Bahia. Uma ação recente neste sentido foi a criação do Comitê de Energias Renováveis para discutir uma agenda positiva a ser encaminhada aos governos estadual e federal, com o objetivo de minimizar os gargalos que ainda limitam o crescimento desse setor tão estratégico para a nossa indústria.
A Bahia tem registrado crescimento significativo na área de energias renováveis. Para se ter uma ideia, dados do Observatório da Indústria da FIEB estimam que, até 2030, a Bahia deve receber cerca de R$ 30 bilhões em investimentos privados na área de energias renováveis, o que demonstra o grande potencial do estado
Estão abertas as inscrições para o Prêmio Fieb Indústria Baiana Sustentável 2025. De que maneira essa premiação contribui para a disseminação das boas práticas e da gestão sustentável na indústria local?
R- A premiação serve como instrumento de sensibilização e incentivo para que as indústrias adotem práticas sustentáveis de forma integrada. Ao final da premiação, divulgamos todos os projetos inscritos para que eles possam servir de inspiração para outras empresas. A última edição do Prêmio, em 2023, contou com 94 projetos inscritos, com a participação de empresas de diversos portes, que apresentaram seus esforços e os resultados alcançados para promover o desenvolvimento sustentável do nosso estado. Este ano, a FIEB realiza a 15ª edição do prêmio, que está com inscrições abertas até 18 de junho.
A formação de trabalhadores qualificados sempre é um desafio e alvo de investimentos do setor. Nesse sentido, que ações ou programas recentes do SESI e Senai podemos destacar?
R - Referências nacionais, o SESI e o SENAI Bahia utilizam metodologias para a formação integral e qualificação de pessoas. A Rede SESI oferece Educação Regular (Fundamental I e II e Ensino Médio) em 12 escolas no estado, além de milhares de vagas gratuitas anuais em Educação de Jovens e Adultos, agora também numa modalidade que conjuga capacitação profissional com o SENAI.
O SENAI oferece formação profissional nos níveis jovem aprendiz, escola técnica, pós-técnico, graduação e pós-graduação, mestrado e doutorado, por meio de uma educação conectada com o mercado, integrando teoria e prática. Na Bahia, a instituição conta com uma Unidade de Inovação e Tecnologias Educacionais (ITED), que produz cursos e conteúdo em aprendizagem digital, com oferta de formações customizadas para instituições diversas.
Nos níveis de graduação e cursos de pós, a Universidade SENAI CIMATEC forma profissionais muito alinhados às demandas do mercado industrial e tecnológico, pois tem como diferenciais infraestrutura avançada, com laboratórios de P&D e parcerias internacionais para intercâmbios.
O complexo industrial SENAI CIMATEC Park, localizado em Camaçari, vive um momento de expansão. Que projetos de expansão serão concluídos ao longo deste ano?
R - O SENAI CIMATEC é referência nacional em tecnologia e inovação. Com seis campi, tem desenvolvido competências para enfrentar diversos desafios da indústria contemporânea, a exemplo da transformação digital e da transição ecológica e energética. O CIMATEC Park é um desses campi e passa por um momento de expansão. Estamos construindo um prédio de engenharia, que vai permitir a ampliação da infraestrutura do Centro de Desenvolvimento e Tecnologia da Ford no Brasil, que atualmente conta com 1.500 engenheiros. Também estão em andamento as obras do Science Park, que será um polo colaborativo para o desenvolvimento científico conectado com os desafios das indústrias baianas e do Brasil. Esses equipamentos têm previsão de entrega para o ano que vem.
Além desses, temos diversos projetos em fase de implantação, como os que são em parceria com a Shell e a Petrobras: a planta de produção de nós sísmicos submarinos OD OBN (On-demand Ocean Bottom Nodes), voltada para o gerenciamento de reservatórios de petróleo, especialmente no pré-sal brasileiro; e o Laboratório de Desenvolvimento de Produção (LDP), que vai desenvolver e validar tecnologias, equipamentos e sistemas de exploração e produção de óleo e gás. Temos ainda a planta piloto de hidrogênio verde, em parceria com a Galp; a planta piloto para produção de etanol de primeira geração a partir do agave, em parceria com a Shell. Como disse, são apenas alguns exemplos que mostram a relevância do SENAI CIMATEC Park para o desenvolvimento de tecnologia e inovação aplicada à indústria.
Como avalia o programa de interiorização de Fieb? Há avanços para celebrar?
R - A interiorização de serviços e ações do Sistema FIEB tem avançado, com o objetivo de ampliar a oferta de serviços de forma integrada. Até 2028, estão previstos R$ 665 milhões de investimentos em obras de construção, ampliação e requalificação de unidades para SESI e SENAI. As cidades de Feira de Santana, Alagoinhas, Jequié, Guanambi e Senhor do Bomfim são as que receberão os maiores investimentos. Já em Salvador e Região Metropolitana, além da unidade do SESI de Itapagipe, Lauro de Freitas e Candeias são os principais investimentos neste ano.
As entidades do Sistema também têm investido numa série de ações no interior, a exemplo do Programa de Educação Profissional para a Competitividade da Indústria, intermediação de linhas de crédito e consultorias para empresas de micro, pequeno e médio porte, qualificação de fornecedores de cadeias industriais e defesa de interesses.
Para além do investimento na construção e requalificação desses equipamentos, desde que assumi a presidência da FIEB tenho visitado as principais regiões do estado para aproximar o Sistema FIEB e as entidades que o integram das indústrias locais. Foi a partir desta escuta mais próxima que constituímos o Fórum dos Distritos Industriais do Estado, e a partir dele levantamos as necessidades dos distritos em todo o estado. Com iniciativas como esta buscamos contribuir para o aumento da competitividade e a melhoria do ambiente de negócios em todo o estado.
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