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13/01/2024 às 6:50 - há XX semanas | Autor: Daniel Dórea

ENTREVISTA

“Esporte me ajudou a me aceitar”, diz baiana campeã parapan-americana

Raíssa Machado é fenômeno da categoria de lançamento de dardo

Raíssa Machado, ouro no Parapan de Santiago
Raíssa Machado, ouro no Parapan de Santiago -

Medalha de prata na Paralimpíada de Tóquio, ouro no Parapan de Santiago, no ano passado. Raíssa Machado, baiana de Ibipeba, é uma estrela do lançamento de dardo e um exemplo além do âmbito esportivo.

A atleta de 27 anos é também referência nas redes sociais, nas quais é uma das esportistas paralímpicas com mais seguidores. Nelas, a campeã no atletismo fala de auto-aceitação, luta contra o racismo e tudo o que diz respeito a uma pessoa negra que venceu na vida pela via do esporte mesmo com uma má formação congênita nas duas pernas que a impede de se locomover sem o auxílio de cadeira de rodas.

Nesta entrevista, que encerra a série com os atletas baianos medalhistas no Parapan de 2023, Raíssa conta sobre uma vida cheia de reviravoltas. Da Bahia a Minas. Da ginástica à dança. Da dança ao atletismo. Do sonho à depressão. Da frustração absoluta ao sucesso. Próxima parada: Paris.

Curiosidade: Já foi a Paris?

Já. É uma cidade encantadora, a torre [Eiffel] e tudo mais, o clima, muito bom. A única coisa que peca muito é a comida. Mas, fora isso, é tudo maravilhoso.

Você comeu o que lá?

Macarrão. Mas foi incrível. Tirando a comida, porque a gente que é brasileiro tem muita fartura, é muito tempero e tal. É afeição também pelas coisas daqui. Mas tirando isso, foi tudo maravilhoso, porque Paris é Paris.

Quando a gente pensa em Paris, pensa nas belezas da cidade. Mas, em 2024, você deve ter em mente em outra coisa.

Qom certeza. Quero subir ao pódio, independentemente da cor da medalha. A gente está treinando para o ouro, mas quero acima de tudo trazer uma medalha para o Brasil novamente.

Conte um pouco de sua história. Você ainda guarda alguma coisa da Bahia, já que é nascida em Ibipeba, mas logo criança se mudou para Minas?

Eu falo que sou metade baiana e metade mineira. Baiana por parte da minha mãe e mineira por parte do meu pai, apesar de eu não conhecê-lo. Mas eu fui criada em Minas, em Uberaba. Nasci na Bahia, em Ibipeba. Só minha mãe e alguns tios meus que moram em Uberaba. Mas a minha família toda por parte da minha mãe, e minha família é muito grande, mora na Bahia. Então, sempre que posso, vou à Bahia. É sempre bom também voltar às nossas origens, renovar as energias, porque, você sabe, a Bahia é diferenciada.

Você se sente um pouco assim também, diferente?

Eu me sinto diferente, acho que é a minha raiz mesmo. Se você for parar para ver, a maioria dos baianos e nordestinos está entre os melhores no esporte, sempre trazendo medalha, sempre representando bem o Brasil. É porque a gente vai na raça mesmo. Não só os baianos, mas a gente brasileira é muito da raça. É muito de coração.

Fale um pouco de sua infância, o interesse pelo esporte. Sei que no início não tinha tanto. Preferia a dança e depois a ginástica. Como foi essa virada?

A minha infância foi bem normal. Os meus conflitos com a minha deficiência, com várias questões dentro de mim, vieram quando eu descobri o esporte. Descobri que nós, deficientes, poderíamos ser atletas. Mas eu sempre falo que não fui eu que escolhi o esporte, foi o esporte que me escolheu. Porque eu não queria ser atleta. Eu comecei na ginástica, fui me adaptando. Lógico que eu não fui nenhuma Daiane dos Santos, mas eu consegui.

Mas você queria ser, não é?

Eu queria ser, era meu sonho. Mas eu consegui realizar o sonho de fazer ginástica. E depois fui fazer jazz. Aí depois do jazz, aí veio o atletismo. Todo mundo olhava para mim e falava: ‘cara, você nasceu para ser atleta’. E eu: ‘não, eu não quero ser atleta’. Eles diziam: ‘Você nasceu, e você um dia vai me agradecer’. Essas pessoas foram anjos que de alguma forma Deus colocou na minha vida para me levar para o meu caminho. E hoje eu tenho certeza do meu propósito. Porque o esporte não só salvou a minha vida, mas ele também me ajudou a aceitar a minha deficiência, aceitar a Raíssa. Porque eu não sou só deficiente, eu sou muito diferente. Penso diferente. Sempre me senti muito fora da casinha. Nunca me encaixei. Então, o esporte me fez entender que ser diferente não é errado. Ser diferente é ser único, sabe? Apesar de eu não o querer muito, ele me quis. E eu falo que quando eu desisti de mim, o esporte e Deus não desistiram. A viradinha de chave para eu acreditar que realmente eu nasci para o esporte foi no Rio.

Foi na Olimpíada, então.

Na Rio-2016. Foi onde eu perdi para mim mesma. Foi a pior competição da minha vida, mas foi a melhor competição da minha vida, porque eu levei um tapa na cara, mas também falei assim: se eu não levantar, nunca mais eu volto.

Você imaginava que ia conseguir a medalha...

É, porque desde quando eu comecei no esporte, eu sempre me destaquei. No Rio foi diferente, eu não consegui. Porque uma Paralimpíada não é igual a um Parapan, não é igual a um Mundial. Você pode treinar um ciclo, mas se não for o seu momento, se você não estiver preparado para receber aquela medalha, você não recebe. O Rio fez isso comigo. Me mostrou que a gente tem que dar valor às coisas. Fiquei no sexto lugar, quase entrei em depressão, mas eu consegui voltar. E quando eu consegui voltar, me destaquei.

Pensou em desistir?

Sim, eu não queria mais o esporte. E aí foi que outros treinadores chegaram e falaram: ‘você não pode desistir. Você nasceu para ser atleta’. Foi o que eu mais escutei na minha vida. Hoje eu acredito. Na verdade, eu sempre duvidei muito dos meus potenciais. Principalmente pelo fato de eu ter TDAH, então eu sempre falei: ‘nossa, eu sou muito burra’. Mas o esporte me proporcionou coisas que eu jamais imaginei. Que poderia conseguir. Quando eu era mais novinha, tentei me matar, enfim, porque eu questionava muito Deus. Por que eu vim assim? Entende? Acho que todo deficiente passa por esse tipo de dificuldade. De se encontrar, se encaixar, se aceitar. Mas quando você começa a se aceitar e quando você acredita em si, tudo flui. E o principal é se amar e fazer o que se ama. Quando eu entendi que eu amo o esporte, tudo fluiu.

E aí você começou a se amar e hoje é uma das atletas paralímpicas mais seguidas nas redes sociais. Como é essa Raíssa influencer?

Até a Paralimpíada do Rio eu alisava cabelo. Mas sabe quando é tudo muito artificial? Depois da Paralimpíada eu não conseguia me olhar no espelho mais, porque eu não me encontrava. Aí foi que eu fiz a transição capilar, que eu comecei a olhar mais pra mim. Quando eu fui pra São Paulo treinar, tive uma virada de chave na minha auto-estima. Porque eu tinha acabado de cortar o cabelo, tava parecendo um homão, um ‘negão’ fortão. Eu estava treinando muito naquele momento, estava passando por uma transição bem complicada, principalmente no meu corpo. E tudo começou a mudar. Larguei minha família toda em Uberaba. Larguei meu namorado na época. E fui sozinha, eu precisava daquilo. E hoje eu entendo que foi tão necessário, porque comecei a me aceitar de verdade. Com o meu cabelo, com a minha cor. Entendi que não existe só Barbie branca. Existe a Barbie ‘negona’ também. Eu sempre me comparava com as outras pessoas. E hoje eu sinto que se eu me comparar, eu volto pra depressão. Então, eu preciso seguir o meu caminho. As redes sociais me ajudaram muito. Eu achei que eu ia receber muitas críticas, muito hate. Não, pelo contrário. Meus seguidores falam que sou uma inspiração. Eu falo: ‘Não. Vocês que são inspiração pra mim’. Porque eles sempre estão ali. É como se Deus os colocasse.

Voltando ao esporte, a Paris. Você foi prata em Tóquio, mas qual a chance de evoluir para o ouro neste ano?

Vai ser uma competição muito acirrada. Eu não posso te falar: ‘vou pegar o ouro’. Mas vou dar o meu melhor nesse período, nas últimas competições, pra chegar na Paralimpíada e fazer o meu melhor. E se o meu melhor for receber a medalha de ouro, que seja bem-vinda. Mas eu vou atrás de subir ao pódio, independentemente da cor da medalha.

E se não vier nenhuma?

Acho que com a maturidade que eu adquiri durante esse tempo, a experiência dentro do esporte de saber que nem tudo é ganhar, saber respeitar o seu momento, o momento de Deus, sei que isso é o mais importante. Se eu não subir ao pódio, lógico que eu vou ficar muito frustrada, porque eu sou atleta. Nós, atletas, somos treinados para ganhar. Mas acredito que não vou ficar igual a como fiquei no Rio. Acho que eu vou conseguir entender melhor e não desistir, e sim continuar.

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