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Artes marciais japonesas trazem ensinamentos para a vida
Inúmeros são benefícios que as atividades físicas podem proporcionar à saúde das pessoas. No entanto, as artes marciais costumam proporcionar benefícios que transpõem a barreira física e atinge as camadas sociais a qual envolve o indivíduo. Aos mais leigos, a afirmação pode parecer um paradoxo, já que quando falamos em Judô e Karatê, muitos podem intuitivamente associar a enfrentamento ou briga.
Dentro desse contexto, o Portal A TARDE encerra a série de reportagens ‘Conexão Bahia-Japão’ mostrando a importância acerca dos ensinamentos filosóficos que essas duas artes marciais de origem japonesa podem proporcionar às pessoas de todas as idades. Mestres nas respectivas artes marciais na Bahia, Dorismar Caribé e Paulo Fraga falaram sobre os benefícios. No fim das contas, pilares como ‘disciplina’ e ‘autocontrole’ acabam sendo muito mais importantes do que o próprio combate em si.
Presidente da Associação de Karatê da Bahia (Askaba), entidade mais antiga desta natureza em atividade no estado, fundada em 1967, Dorismar Caribé reafirmou os valores que são historicamente prezados e zelados pela organização. Entre os principais benefícios, ele relata a “formação do caráter e da personalidade” nos jovens praticantes.
"Atuamos transmitindo na íntegra os ensinamentos filosóficos dessa arte marcial, realizando um trabalho sério e impondo uma forte disciplina para manter a moralidade e o bom nome dos seus verdadeiros adeptos. É impressionante os relatos de atletas adultos que passaram pela Askaba sobre a importância na formação e na sua educação. Grande parte dos nossos associados são descendentes dos nossos primeiros alunos ou pessoas indicadas por eles. Esse resultado é fruto dos benefícios do Karatê na formação do caráter e da personalidade dos seus adeptos. Tais benefícios abrangem tanto os aspectos físicos quanto os as aspectos espirituais, face a natureza filosófica dessa arte marcial", explicou.
Em atividade na Bahia há mais de 40 anos, o sensei (título utilizado nas artes marciais, que significa mestre) Paulo Fraga especificou os ensinamentos defendidos desde os primórdios pelo sensei e fundador do judô, Jigoro Kano, e que ele busca estar repassando na sua academia ‘Judô Paulo Fraga’, fundada em 1979.
Os inúmeros benefícios trazidos, fizeram com que a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) reconhecesse, em 2013, o judô como o esporte mais adequado para o desenvolvimento de crianças e jovens até 24 anos. Em nota divulgada pelo Comitê Olímpico Internacional (COI), na ocasião, a arte marcial foi classificada como a “"mais completo por promover a amizade e o respeito mútuo".
“Todo o praticante de judô leva para a vida os ensinamentos do sensei Jigoro Kano, fundador do judô. São coisas simples e que deveriam ter em todas as pessoas. Entre elas, estão a polidez, coragem, sinceridade, honra, além de humildade para ajudar o próximo e repassar o ensinamento. Também prezamos por valores como respeito, autocontrole, amizade, superação e disciplina [...] Se você adquiri essa base desde cedo, chega na idade adulta com uma formação profissional e humana muito boa. O judô é o caminho suave da vida”, afirmou Paulo Fraga.
Experiência dos praticantes
Quando mais novo, Maurício Gaspar foi colocado para fazer aulas de judô como forma de adquirir mais disciplina. Ele lembra que ao praticar a arte marcial, as filosofias e ensinamentos adquiridos influenciaram não somente em seu aspecto individual, mas sim, na própria relação em grupo, que ele afirma haver um "maior respeito entre as pessoas".
“O judô traz para as crianças um valor muito importante que os japoneses priorizam bastante, que é a disciplina. Uma coisa que às vezes a própria escola tem dificuldade em passar para os alunos mais novos. O judô vem com essa ferramenta e eu pude perceber entre meus colegas, que tínhamos uma disciplina no dia-a-dia. Havia um maior respeito com as pessoas. Essa é a principal coisa que levo até hoje, mesmo depois de já ter parado de praticar. Além disso, também estimula a coesão de um grupo”, comentou Maurício.
Melhorias cognitivas, como 'equilíbrio', 'raciocínio' e 'concentração' foram alguns dos benefícios mencionados por Bernardo Soares durante o período em que esteve praticando o karatê. Entre os aspectos físicos, ele destacou um avanço na questão da coordenação motora e também na postura.
“A prática do Karatê me ajudou bastante no aspecto da própria coordenação motora. Você trabalha todo o corpo, não dá para exercitar partes isoladas. Existe uma correção na postura, fora os benefícios na força, flexibilidade e equilíbrio, este último tanto no aspecto físico, quanto no psicológico. O raciocínio estimula bastante, então minha concentração também melhorou”, descreveu Bernardo.
Cenário olímpico
Quando observados, atualmente, as duas artes marciais terminam ocupando momentos distintos dentro do aspecto esportivo. Enquanto o judô já é considerado algo consolidado, o karatê dará seus primeiros passos como esporte olímpico na atual edição, cuja abertura será realizada ainda nesta sexta-feira, 23.
Dentro do Brasil, as discrepâncias são ainda maiores. Isso porque, o judô é justamente a modalidade individual aonde o país conseguiu o maior número de medalhas, com 22 conquistas no total. Dentre essas, estão quatro de ouros, três de pratas e 15 de bronze. Segundo o shihan Paulo Fraga, esse histórico termina também influenciando na adesão de novos praticantes.
“Na Olimpíada de Munique, em 1972, ocorreu a primeira medalha conquistada pelo judô. Um bronze com o sensei Chiaki Ishii. Entre as edições dos jogos de 1984 e 2016, conseguimos medalhas em todas as edições consecutivas. Tivemos ouro em 1988, com Aurélio Miguel; com Rogério Sampaio, em 1992; com Sarah Menezes, em 2012; e com a Rafaela Silva, em 2016. Essas medalhas elevaram o patamar do judô. Como é um esporte que sempre traz conquistas, novos praticantes acabam ingressando com o intuito de seguir os ídolos. A primeira medalha individual feminina brasileira, veio no judô, em 2008, como bronze de Ketleyn Quadros. Então toda essa história torna o judô visível no Brasil e incentiva novos praticantes”, relembrou.
Estreante nos Jogos Olímpico de Tóquio-2020, o karatê terá que passar por essa primeira edição ainda sem nenhum representante brasileiro, uma vez que o país não conseguiu classificar nenhum de seus atletas para a modalidade.
Mesmo assim, Dorismar Caribé afirmou que a inclusão foi um importante passo para a arte marcial de um modo geral, principalmente na captação de novos adeptos. No entanto, ele também ratificou o aspecto social, defendido pelo karatê praticado na Askaba. Segundo ele, “vencer um combate é visto como a consequência e não como o objetivo”.
"Considerando o prestígio alcançado pelos esportes olímpicos face a grande visualização, enxergamos como benéfica a participação do Karatê nos Jogos olímpicos. Essa é mais uma oportunidade de crescimento dessa arte marcial e oportunidade de influenciar principalmente as novas gerações em busca desse esporte, mesmo considerando que o foco do karatê praticado na Askaba não seja a competição, e sim, o aperfeiçoamento do caráter humano, com ênfase na auto disciplina e auto realização. Assim, vencer um combate é visto como a consequência e não como o objetivo", revelou Caribé.
Por fim, independente de qual seja a finalidade buscada pelo indivíduo no momento em que for praticar qualquer uma das artes marciais, certamente a mesma virá acompanhada de benefícios e ensinamentos que serão levados para toda a vida.
