PAN 2015
Dupla badminton: "Somos atletas porque só tivemos o esporte"

Por Juliana Lisboa

Além de trazerem para o Brasil a inédita medalha de prata do badminton, nas duplas femininas do Pan, as irmãs Luana, de 21 anos, e Lohaynny Vicente, 19, emocionaram o país com sua história de vida. Depois de perderem o pai, que era chefe do tráfico na favela do Chapadão, no Rio de Janeiro, elas conheceram o esporte através de um projeto social. Hoje, conseguem se sustentar, ajudam em casa e são as principais atletas da modalidade no Brasil.
Vocês conquistaram medalha inédita no Pan, e Lohaynny ainda conseguiu um bronze nas duplas mistas. Como se sentiram ao fazer história?
Luana: A ficha não caiu de imediato. Agora que a gente voltou, que teve toda essa recepção, que está caindo aos pouquinhos.
Como foi chegar em casa?
Luana: Todo mundo bateu palmas, fez festa... Foi muito bonito, eu não esperava. Não moramos mais na mesma comunidade de quando éramos pequenas, mas passamos na casa da minha mãe (na favela do Chacrinha, no Rio). Ela ficou muito, muito emocionada. Não pudemos deixar as medalhas com ela, levamos para Toledo, no Paraná (onde estão disputando o Campeonato Nacional), porque a confederação nos deu outra recepção.
Por ser sede da Olimpíada, o Brasil tem garantidas vagas para a chave de simples no badminton, não para as duplas. Vocês podem conseguir a classificação?
Lohaynny: A gente pode conseguir. É difícil, mas é possível. Vai depender da confederação, do Comitê Olímpico Brasileiro (COB), porque no que depender da gente vamos fazer o que for possível. A gente está perto. Somos a dupla 37 do mundo e precisamos ser a 25 para a classificação. Se a gente disputar mais torneios e garantir resultados bons até lá, podemos conseguir.
Vocês já participaram de várias competições internacionais. Mas o que é ganhar a prata no Pan?
Luana: Quando você sobe naquele pódio, pensa em tudo que sofreu, tudo que você teve que passar para chegar nesse lugar. Foram quatro anos! É muito trabalho. Então tem um gostinho diferente, porque a gente sabe do peso que tem o Pan-Americano.
E a atmosfera? É diferente de outras competições?
Luana: Ah, sim, é bem diferente. A gente conhece mais histórias, mais atletas, troca experiências. Ficamos próximas do pessoal da ginástica artística e do polo aquático, feminino e masculino, porque eles ficavam no mesmo ginásio da gente. E a gente assistiu a algumas partidas, também. Do polo, mesmo, vimos a semifinal. Foi muito legal sair da quadra e chegar na arquibancada, fazer barulho com a torcida brasileira e com os canadenses, que estavam em todas.
Vocês têm uma história de vida de superação. Como chegaram ao badminton?
Lohaynny: Conhecemos o badminton num projeto social. Comecei a jogar bem pequena, com seis, sete anos, e com 12 eu vim pra seleção. Para a Olimpíada de 2012, a seleção só mandou o Daniel (Paiola), porque não tinha como mandar todo mundo. Eu continuei jogando, treinando, até quando deu, mas logo eu tive que parar por um tempo, por falta de verba. Foi difícil nessa época, porque não tinha dinheiro mesmo, nem incentivo, nem muita verba. Mas a infraestrutura da confederação melhorou muito depois de 2013, acho que depois que souberam que a Olimpíada seria aqui viram o esporte com outros olhos e então passaram a investir mais.
Você comentou que é complicado conseguir patrocínio no badminton. Como vocês fazem para treinar e ir para os campeonatos?
Luana: A confederação banca tudo para a gente. Dá estrutura, equipamento, cobre gastos com viagem. Às vezes não tem como você ir para tudo, porque é caro mandar para uma competição, especialmente internacional. E assim fica mais difícil se classificar para a Olimpíada. Não vamos poder disputar o Mundial, por exemplo (começou nesta semana, na Indonésia). Os meninos vão jogar, mas só porque estão pagando tudo do próprio bolso.
De que forma o esporte mudou a vida de vocês?
Lohaynny: Eu hoje vivo do badminton. A gente paga nossas contas e ajuda a nossa mãe em casa. Ela trabalha, mas a gente também ajuda, né? Graças a Deus, nossa vida mudou muito por causa do esporte, não só financeiramente, e eu agradeço demais por isso.
O badminton não é um esporte conhecido no Brasil. Vocês sentiram algum tipo de estranhamento ou até preconceito quando decidiram ser atletas dessa modalidade?
Lohaynny: Não, nenhum preconceito. Só estranhamento, mesmo. No início alguns amigos não entendiam o que era, não conheciam, falavam 'bad o quê?'. Mas hoje conhecem mais, acompanham a gente. Mas preconceito, não.
Vocês inclusive fizeram um apelo para que as pessoas patrocinassem o esporte, porque vocês não têm patrocínio. Alguém apareceu?
Luana: Não, ainda ninguém veio patrocinar. Pelo menos não que a gente saiba... Mas estamos esperando! Na verdade, a gente está de férias, caímos de 'gaiatas' neste Nacional.
Vocês sempre jogaram juntas em duplas?
Lohaynny: Quando a gente era pequena, disputava entre a gente, e a Luana sempre ganhava. Mas hoje jogamos em duplas, e só eu continuo jogando nas simples. Luana operou o joelho ainda pequena e por isso ela agora só pode jogar as duplas. Mas nem tem comparação, ela é bem melhor do que eu (risos).
Quem começou primeiro?
Lohaynny: Ela (Luana) que começou, e me chamou pra ir também. Ela chegou em casa um dia, me disse que era um esporte legal e começamos a jogar em casa mesmo. Daí eu comecei a jogar e acabei gostando.
Vocês embarcaram para outro campeonato, desta vez no Brasil, uma semana depois do Pan. Como é o calendário esportivo de vocês?
Luana: Está muito cheio, a gente praticamente não tem férias. O clube precisa de apoio, e inscreveram a gente (no atual Campeonato Nacional) acho que para dar mais visibilidade, por conta da medalha. A gente quer ganhar, claro. Mas tem bastante gente jogando bem e que pode chegar à final. Está muito disputado.
Quando vocês decidiram que seriam atletas profissionais de badminton?
Lohaynny: Bem novas, porque a gente só tinha isso. Quando entramos na seleção, começamos a ganhar campeonatos e vimos os resultados, passamos a acreditar mais na gente.
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