CADERNO IMOBILIÁRIO
Objetos de demolição são reutilizados em novas obras
Por Fábio Bittencourt
Janelas, portas, portões, gradis, pisos, esquadrias, mobiliário, entre muitos outros, do que era o antigo prédio da Acbeu, no Corredor da Vitória, encontram-se agora em pelo menos 20 novas obras. O imóvel foi demolido para dar lugar ao Alive – empreendimento de alto padrão lançado esta semana, já 100% comercializado –, e os objetos reinseridos em outras construções.
O reúso dos materiais foi possível graças a uma parceria entre as incorporadoras responsáveis pelo edifício – Capa, Leão Engenharia, Civil e Dona – e o escritório Arquivo, pioneiro no país no reemprego de elementos da arquitetura, conta Pedro Alban, 28 anos, sócio ao lado de Natália Lessa.
Neste caso em particular, as peças foram todas doadas. A Arquivo, no entanto, possui um acervo completo com itens à venda – originados da desmontagem de outros imóveis. O espaço, temporariamente instalado em Ondina, foi cedido pela Civil. As visitas são agendadas, e interessados podem conferir o catálogo em www.arquivoreuso.com.br.
“Alguns materiais recebemos como doação, mas sempre avaliamos antes, tem um processo de curadoria, muitas coisas não tem reúso viável simplesmente porque saíram de moda e não existe um mercado para elas, por exemplo”, diz Alban.
Ele explica que o movimento de reutilização de material de construção ainda é novo por aqui, mas que remonta à Antiguidade.
“O reúso de elementos tem uma longa história. Era prática comum na Antiguidade e até a Revolução Industrial, tendo se tornado cada vez mais raro a partir da Segunda Guerra Mundial. Hoje em dia, poucos são os materiais com mercado de reúso ativo. Ferros-velhos e lojas de antiguidade são provavelmente os principais atores do tipo no Brasil”, conta o arquiteto.
Ainda de acordo com Alban, a tendência, porém, é de crescimento. “A partir do interesse cada vez maior por questões envolvendo sustentabilidade nas esferas pública e privada. O reúso tem, nas últimas décadas, crescido principalmente no contexto europeu”, fala.
Desmontagem
Sócio-diretor da Capa, Carlos Andrade destaca que o respeito à natureza e ao entorno são apenas alguns dos muitos cuidados do Alive, nas palavras deles, um projeto com “várias experiências internacionais em inovação”. “Poderia estar em qualquer lugar do mundo, mas está em Salvador”, diz.
Entre os muitos destinos que tiveram, as peças da Acbeu foram parar em uma fazenda de café na zona rural de Ibicoara, Chapada Diamantina. Júlia Galvão, publicitária e sócia, conta que a ideia da reutilização de materiais partiu das arquitetas, e que, por exemplo, todo o deck de madeira da casa é composto do que era o palco do teatro. “Desde o minuto zero do projeto, ela já sugeriu a quantidade de janelas e esquadrias que a casa deveria ter, de acordo com quantidade de itens disponíveis, tanto da Acbeu como de um imóvel demolido no Horto Florestal”, fala.
Trabalho mesmo deu transportar todo o material até o “vale”, ela conta.
Proprietária ao lado de outros dois arquitetos de um casarão tombado e de uso misto na Rua Chile, a professora de arquitetura da Universidade Federal da Bahia (Ufba) Naia Alban conta que o prédio, há 14 anos em obras, “tem experimentado em sua arquitetura uma série de elementos de reúso”.
Segundo ela, no imóvel foram reinseridos o assoalho do teatro e o gradil da fachada principal, com desenho icônico do projeto original feito por Gilberbert Chaves (mesmo arquiteto da Casa de Jorge Amado e Zélia Gattai, no Rio Vermelho).
“Tudo tem de ser flexível, o reúso faz você pensar a partir do material que se tem à mão, e não a partir do espaço, da concepção. A consciência ecológica hoje é urgente, o planeta está altamente desgastado pela ação do homem, em especial nos últimos 50 anos. Vivemos uma crise, e a pandemia evidenciou as diferenças. Reúso é fundamental”.
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