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CRÔNICA DO JAGUAR

Em Roma, comi Miles Davis

Por Jaguar | Cartunista

21/04/2018 - 11:02 h
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Célia, filha de italiano, cismou de passar seu aniversário em Roma. Tive que fazer um monte de charges e crônicas antecipadas. No Tom Jobim (o maestro soberano não merecia, aquilo não é um aeroporto, é uma tortura) Célia e eu fomos poupados de caminhar quilômetros por aqueles intermináveis terminais. Ela, com o joelho avariado, lembrança de um tombo em Istambul, eu, um velhinho de 86 anos fingindo ter 96, em cadeiras de rodas a todo vapor. A curtição dos empurradores das cadeiras era tirar fino em japoneses.

Nosso destino era Roma, num pacote promocional que saía pela metade do preço. Aí nos deram o golpe do up grade. Nas véspera do embarque, o hotel NH Collection, onde tínhamos reserva, mandou um e-mail dizendo que em vez de ficar no 4 estrelas da Via Veneto Villa Borghese, passaríamos para um 5 estrelas. Presente de grego: era perto do Termini, a Central do Brasil deles. Trocamos Copacabana, cheio de bares e restaurantes , pela Praça da República, em frente à Central do Brasil, lúgubre e deserta.

A vantagem de ir pela enésima vez a Roma é que você já viu as maravilhas dos museus... e está liberado para curtir as boas bebidas e comidas

O NH em que ficamos era suntuoso, até demais. Mas o serviço era de lascar. Quando entramos no apartamento, só tinha um roupão no banheiro. E se você pede uma lata de cerveja, cobram uma taxa de entrega de 5 euros. Um táxi do hotel até uma cantina decente fica em torno de 40 euros (320 reais), para vocês terem uma ideia, o preço de uma garrafa de Rosso de Montalcino DOC.

O assunto do momento era o show de Sílvio Berlusconni: enquanto um locutor lia um discurso eleitoreiro na TV, ele fazia a mímica e gesticulação. “O karaokê de Silvio rouba a cena” foi a manchete de La Republica. Os italianos adoram odiar Berlusconi. Maluf tem muito a aprender com ele. A vantagem de ir pela enésima vez a Roma (Célia que não me ouça) é que você já viu as maravilhas dos museus, o Vaticano, a Fontana de Trevi, o Coliseu e , como dizia Nelson Cavaquinho de Ouro Preto, aquele monte de pedra velha. E está liberado para curtir as boas bebidas e comidas. Eu, depois que meu fígado se desintegrou, nem isso.

Para piorar, em Roma só servem uma cerveja sem álcool francesa, Tourtel, a mais rala que já provei. E cobram até 8 euros (32 reais) por uma latinha. Na véspera de voltar fomos ao Charity Café Jazz & Blues. É um micro bar, só cabem 25 pessoas (mal) sentadas: 10 tamboretes no balcão e três táboas, tipo arquibancada de circo do interior, sem encosto. Em cada tábua , se espremem 5 pessoas segurando sua cerveja. Mas a música é de alto nível, vale o sacrifício. Naquela noite tocava um trio italiano, Elastic Jazz (piano, contrabaixo e bateria). Até o cardápio é jazzístico. Os nomes dos sanduíches: Sarah Vaughn, Miles Davis, Chet Baker. Escolhi o Miles: presunto cru, funghi, mozzarella e champignon na torrada. Fez jus ao nome. Foi a minha grande farra na Europa e resolvi deixar de ser abstêmio durante um canecão de Guinness . Pensei: ver Roma, beber uma cerveja e depois morrer. Mas meu plano não deu certo.

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