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MUITO

A arte da curadoria nos festivais de música

Eventos reencontram público em retorno após pandemia

Por Vinícius Marques

02/10/2022 - 6:00 h | Atualizada em 03/10/2022 - 12:23
Ismael Fagundes, um dos curadores do Festival Afropunk BA
Ismael Fagundes, um dos curadores do Festival Afropunk BA -

Depois de muito tempo com lives, devido à pandemia de Covid-19, em 2022 os festivais de música, finalmente, se reencontram com o seu público. A curiosidade para saber quem são os artistas nas grades dos festivais é grande. Com tantos lançamentos – de discos a novos artistas –, novidades não faltam.

Desde o começo do ano, Salvador recebe todo o tipo de festival. Alguns apostando numa pluralidade musical, outros com nichos definidos. Nas próximas semanas, a capital baiana vai receber mais três festivais que se aproximam e se diferenciam em muitos aspectos.

O primeiro deles é o Festival Sangue Novo, que chega à quarta edição com uma ideia de expansão no projeto, como conta Fernanda Bezerra, coordenadora geral e curadora do festival.

Pela primeira vez com três datas, entre os dias 21 a 23 de outubro, a festa recebe 11 artistas no palco que será montado no Trapiche Barnabé, localizado no Comércio.

Entre as atrações, na sua maioria mulheres, estão nomes mais conhecidos pelo público baiano como Luedji Luna e Letrux, que se juntam às novidades Marina Sena, Mc Tha, Urias, Bk’, Lamparina, e as baianas Rachel Reis, Sued Nunes, Melly e Vírus Carinhoso.

Essas atrações, uma mistura do novo com o novíssimo, é o principal norte que a curadoria do festival busca apresentar ao público em todos os anos desde sua criação. Já a escolha por uma grade em que sua maioria é formada por artistas mulheres foi um movimento natural, segundo Fernanda.

“Isso veio a partir de um movimento orgânico da música, em que os principais destaques hoje, quando a gente fala da novíssima música baiana e da nova música brasileira, são Rachel Reis, Melly e Sued. E estamos trazendo também Marina Sena, que já fizemos o lançamento dela aqui na Bahia e é o que tem de mais novo na música brasileira, que é a proposta do Sangue Novo”, explica.

Normalmente com apenas duas datas, a curadora revela que o dia extra este ano surgiu porque perceberam que era o momento do festival crescer, além do fato de que não seria possível adicionar mais artistas nas datas já anunciadas.

“Se tivéssemos um espaço que comportasse cinco, seis mil pessoas, a gente conseguiria. Fazer um festival é, na verdade, fazer uma grande conta. É muito caro a logística para trazer artistas. A malha aérea hoje está caríssima. Tem artista que a gente gasta mais com passagem aérea para a equipe do que com cachê”, diz.

Espaços médios

A curadora acrescenta que “os festivais em Salvador não conseguem crescer no volume da demanda do seu público porque não temos espaços médios”. Ela dá exemplos de grandes espaços, como o Parque de Exposições, até os menores, a exemplo do Trapiche, que comporta até três mil pessoas.

“A grande dificuldade, hoje, é poder fazer um line-up num local médio que possa alcançar mais gente, que possa trazer mais pessoas na programação e que a gente possa ter um festival maior e melhor posicionado nacionalmente. Não temos um lugar intermediário para cinco, seis mil pessoas, que é a dificuldade que estamos passando no Sangue Novo”.

No entanto, a coordenadora e curadora do festival celebra esse momento em que muitos festivais acontecem e dá espaço para a pluralidade da música feita no Brasil: “É muito animador ver que os festivais estão voltando com tudo, com possibilidades de acontecer, de o público estar colando”. Ela lembra que quando anunciaram a atual edição e pediram sugestões do público, ficou surpresa com o alinhamento de pensamentos.

"Quando as pessoas começaram a mandar sugestões, eram artistas que já estavam na nossa seleção. Ficamos felizes porque mostra que temos um alinhamento com nosso público. Se você conhece o Radioca, o Sangue Novo, você sabe o que esperar de cada festival. Sabe que o Sangue Novo está flertando com essa música mais pop, mais contemporânea”.

Presente em diversos festivais por todo o país, a baiana Rachel Reis, que se apresenta no palco do Sangue Novo no próximo dia 21, lembra do nervosismo no seu primeiro show, que aconteceu há cerca de 11 meses.

“Acho engraçado quando vejo os vídeos hoje e parece que é outra pessoa e como os festivais têm sido minha escola de palco, como tenho aprendido a entender meu espaço no palco, aprendido a entender o público. Sinto como se eu tivesse numa escola e isso tem me trazido muitas coisas boas”, diz ela.

Rachel, que na última semana lançou seu primeiro álbum completo, Meu Esquema, já se apresentou em grandes festivais, o mais recente sendo o Coala Festival, em São Paulo, que contou com nomes como Gilberto Gil, Djavan, Gal Costa e Maria Bethânia. “Estar nos festivais, com o nome ao lado de pessoas que admiro, que escuto desde criança, é muito importante”.

Apesar de se considerar uma pessoa caseira, Rachel assume que gosta de frequentar alguns festivais, a exemplo do Feira Noise, que acontece em sua cidade natal, Feira de Santana. Para ela, os festivais são oportunidades para descobrir bandas novas, ver os shows de artistas de quem ela é fã, além de conhecer novas pessoas.

Luciano Matos, curador do festival Radioca
Luciano Matos, curador do festival Radioca | Foto: Rafaela Araújo | Ag. A TARDE

O jornalista e curador do Festival Radioca, Luciano Matos, lembra que estava presente em um dos primeiros shows de Rachel Reis e, desde então, tem acompanhado a explosão que tem sido a carreira dela nos festivais. Ele revela, inclusive, que a cantora quase foi uma das atrações do Radioca: “A gente queria Rachel na nossa grade, achava importante contar com ela, mas ela não tinha nem data para tocar no Radioca. É isso, faz parte”, lamenta.

Matos conta que é comum encontrarmos artistas como Rachel, Marina Sena e Duda Beat nas grades dos festivais porque, segundo ele, essas são as artistas do momento. “São nomes que surgiram ou cresceram na pandemia”, explica. “Tem artistas que se repetem muito nas grades, sim, mas tem perfis de festivais. Alguns acabam indo na coisa certa, e acabam dando essa impressão que se repetem, mas tem muita diversidade”.

No Radioca este ano, que acontece nos dias 12 e 13 de novembro, 12 artistas se apresentam em dois palcos, montados na Fábrica Cultural, espaço multicultural na Península de Itapagipe, na Ribeira. Entre as atrações estão Russo Passapusso e Antonio Carlos & Jocafi em show inédito, Otto, Zé Manoel, Luísa e os Alquimistas, Mariana Aydar, Ilê Aiyê, Bixarte, A Trupe Poligodélica, Ana Frango Elétrico, Alessandra Leão, Bagum & Vandal e Ana Barroso.

Segundo Matos, o desejo da curadoria é levar um público mais amplo para conhecer artistas que em sua maioria estão fora do mainstream. “Sabemos que existe um cenário novo, interessante e que a maioria das pessoas não conhece. A gente não quer atingir só um público específico”.

Este ano, eles anunciaram os ingressos às escuras, antes de divulgar a grade completa, com o lema de “confie na curadoria”. Matos explica que isso surgiu como parte do retorno do público do festival, que chegava para eles e informava que não conhecia os artistas, mas que confia muito no trabalho da equipe. “A gente sente a responsabilidade e o dever. É muito legal saber que o Radioca já conseguiu esse respaldo”, celebra o curador.

Para Matos, uma das grandes dificuldades que festivais menores, como o Radioca e Sangue Novo encontram, é a falta de interesse de marcas em patrocínio. Ele usa como exemplo o caso do festival Salcity, que aconteceria este ano e, por não conseguir nenhuma empresa parceira, teve de ser cancelado. O Radioca possui parceria com a Oi e a cerveja Devassa.

“Espero que mude para melhor, que mais marcas se abram, que seja mais fácil de produzir. É uma dificuldade do poder público, do empresariado, entender que são importantes eventos como esse. Qualquer festival bem estruturado com artistas vai gerar emprego e a economia circulando, além de atrair turistas. O poder público deveria olhar mais para isso, não só pela cultura, mas pelo lado econômico que os festivais e esse setor contribui muito. Eles não olham com tanto carinho, com tanta atenção ou como deveria”, comenta.

Coração aberto

Apaixonado por festivais, Matos acredita que no Radioca o público vai poder se dedicar algumas horas a mergulhar em música, algo que a cantora Ana Barroso, presente na programação do festival, se identifica. Ela, que lançou seu primeiro álbum no passado, conta que “o grande barato de festivais como o Radioca é estar de coração aberto para ser tomado por diversas linguagens, assuntos, formatos”.

Nascida em Vitória da Conquista e criada em Jequié, ela vai apresentar um show acústico, utilizando sopros, clarinete, clarone, flauta, percussão e violão. Ana Barroso diz que se apresentar no Radioca “é um grande presente porque essas coisas normalmente colocam a gente num outro nível, esse tipo de evento coloca a gente num degrau acima e é um privilégio mesmo poder cantar no Radioca”.

Ainda em novembro, nos dias 26 e 27, no Parque de Exposições, o Festival Afropunk Bahia realiza sua primeira grande edição, após uma versão menor realizada no ano passado. “Ano passado a gente tinha restrição de público, aconteceu no meio da pandemia. Era um evento fechado para 100 pessoas. Acabamos fazendo um evento gigantesco para três mil, dentro do que poderia ser, e agora vamos para um festival muito maior com expectativa de 20 mil pessoas por dia”, conta Ana Amélia Nunes, uma das curadoras do festrival.

Furar a bolha

Nomes como Margareth Menezes, Emicida, Baco Exu do Blues, Liniker, Black Pantera, ÀTTØØXXÁ e Karol Conká, Psirico, Mart’nália com Larissa Luz convidando Nelson Rufino, A Dama com MC Carol, Nic Dias, Ministereo Público Sound System, Yan Cloud, N.I.N.A e os artistas internacionais Dawer X Damper e Masego já foram anunciados na grade do Afropunk, que busca conectar o público negro de toda a Bahia, como analisa o curador Ismael Fagundes.

“A gente quer se conectar com o menino que está em Cajazeiras e o cara aqui na Federação, bairro onde moro, e periférico. O Afropunk quer furar essa bolha. Trazemos esse público que não costuma ir a festivais com esse perfil”, afirma Fagundes.

A terceira curadora do festival, Raína Biriba, revela que desde o início pensaram quem seria esse público negro dos festivais. Para ela, quando se olha para os festivais de música independente de Salvador, eles são conectados a um público mais restrito. “São festivais menores”, diz.

“A gente pensa no público jovem, preto, periférico, não só Centro-Barra-Ondina, e essa amplitude mesmo de Brasil. Falando de pessoas pretas, a dança, a vibração é uma coisa ancestral. Nosso público é esse que vibra, dança, pula e traz essa energia”, acrescenta.

No total, o Afropunk receberá mais de 30 atrações e, de acordo com os curadores, uma das maiores dificuldades foi conseguir compilar todos esses talentos em apenas dois dias de festivais. “Trazer essas pessoas, artistas pretos, falando da Bahia, alcançando os gostos de um país inteiro, é muito difícil. Fica a sensação que a gente queria uma semana de Afropunk”, conta Ana Amélia. “Já temos material para o ano que vem”, brinca Ismael.

Raína conta que, se o Afropunk Bahia não fosse “filho” de um festival Global – um braço do festival que acontece originalmente no Brooklyn, em Nova Iorque –, dificilmente teriam atrações internacionais. “Salvador não é um palco internacional”, lamenta a curadora. Por isso, ela reconhece que há uma grande expectativa por parte do público.

Ismael, responsável também pela emissão de passagens aéreas, diz que entende agora como é difícil viabilizar shows em Salvador. “É saber lidar com gostos, desejos, viabilidade, mas nem por isso estamos deixando de viabilizar um festival que tem uma brasilidade, que é importante para romper essas barreiras do eixo Rio-São Paulo. Acredito que o Afropunk tem essa cara de Brasil, esse Brasil preto com artistas consolidados e nomes que estão despontando, como Yan Cloud, de Salvador, como Nick Dias, que vem do Pará, uma artista nortista e afro-indígena”, afirma.

O artista baiano Yan Cloud, que faz parte da programação, conta que se sente realizado não apenas pessoalmente, mas coletivamente. Para ele, todos os colegas da cena independente que trabalham com ele saem vitoriosos com a chegada do festival no estado. “Quando a gente soube que ia poder tocar foi uma sensação. A gente vê o rolê sendo gringo e sente que isso é muito distante. Estar nesse lugar de atração é essa onda de realizar uma parada muito coletiva”, celebra.

Ele conta que os novos artistas locais têm uma dificuldade de romper a bolha, sair daqui e fazer com que o som rompa algumas barreiras. “A projeção que o Afropunk pode dar é nacional e talvez para o exterior. É um holofote, um passo gigantesco não só para mim, mas para esse bonde que vem junto”, finaliza Yan.

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