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07/05/2023 às 8:32 | Autor: Antonia Damásio*

CRÔNICA

A maioria em mim

Confira a Crônica da Revista Muito deste domingo

Imagem ilustrativa da imagem A maioria em mim
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As pessoas ganham dinheiro de um modo no mínimo exótico hoje em dia. Diga-me o que vendes e te direi quem você pensa é. A tendência entre os adeptos às dietas da moda já foi revirar os próprios dejetos, descrever as características sensoriais da sua produção idiossincrática, investigar a capacidade de flutuação. Você é não apenas o que você come, mas aquilo que planejou devorar. Nessa festa, não se entra sem fantasia, delírio ou alegoria.

Avançamos para o transplante do pô dos magros. O intestino finalmente obteve a atenção que merecia, não apenas por sua arquitetura não-vulgar, repleta de dobraduras peculiares. Ganhou status de segundo cérebro. As microvilosidades, a microbiota, revelam que o intestino é hype. Favor não confundir com hippie. Não se trata de jogo de palavras, creia. É uma farta oposição de conceitos, com valor intrínseco e agregado.

Voltando ao penduricalho, ora vejam vocês a face do verdadeiro alpinista social. O segundo cérebro agora ocupa um lugar de destaque na área da saúde. Tem gente vendendo conhecimento sobre as gradações da flatulência, a sonoridade, a robustez. Inodora era a água. Existem experts garantindo que o pum saudável não pode cheirar mal. Vocês já comeram couve-flor regado a brócolis? É quase uma hecatombe numa salada com ovos de codorna. A ciência explica, mas a questão é crônica. Mudemos o rumo dessa prosa.

Esse papo escatológico não começou assim. Ele emerge diante da circunstância banal da vida. Ela caga para nós outros. Vou por na conta do ícone barbudo que curtia um charuto clássico. Antes que suscite um incidente bipolar, o erudito em questão é Freud. Ele espertamente revelou que as fontes de angústia derivam de 3 situações: a relação com o próprio corpo (que, naturalmente, pela escatologia, ou pela via régia, escapa ao nosso controle); a lida com a natureza (nem preciso detalhar, pois é consenso que nós somos meros fantoches do verdume da pá virada); e, finalmente, a ingrisilha de conviver com a alteridade. Para os não iniciados, ingrisilha é um dos nomes da bagaça, que também atende por nó nas tripas. Tudo aquilo que a gente não consegue decodificar e que a psicanálise facilmente chamaria de Real. Não bastassem as ameaças alienígenas, o inferno não é apenas um outro, mas aqueles tantos residentes em nós mesmos.

Pire aí. Não estamos no campo das múltiplas personalidades. Temos mais bactérias e organismos estranhos em nosso corpo, que matéria eminentemente oriunda do nosso DNA. Se você achou confusa a película Divertidamente, imagine a complexidade que em todos nós há. Nem precisa olhar para fora do umbigo para convocar uma guerra de milhões. Essa sinfonia corpórea, para performar com o mínimo de harmonia, tasca fogo nas nossas entranhas. A vida tem seus fluxos, contrafluxos e nós? refluxo. Quem pode deter um corpo que cai? A gravidade imprime sua marca e comprime nossos artelhos...

Titanicamente, “o pulso, ainda pulsa”. Repulsa.

Na real, é possível encontrar tutorias sobre quase tudo. Recentemente, uma grande controvérsia foi criada em torno da necessidade de ajudarmos os pássaros a encontrar material para fazer seus ninhos. Pegue no compasso. Estamos no nível dois da angústia – a relação com a natureza. Foi grande a discussão, uma vez que muitos entendiam que, desde que o mundo é mundo, os instintos dos pássaros lhes forneciam o necessário para que se organizassem com total autonomia. Seria assim, se a gente não derrubasse as árvores e construísse loucamente, aqui, ali e em Stella Maris, destruindo biomas. As aves que aqui gorjeiam, não têm mais onde morar.

Tá osso. A vida em sua literalidade. Os laços se dissolvem, os enlaces se pulverizam e a gente se recolhe. O amor pulou o muro em tempo de estrepar. Não usamos mais rimas para amenizar o insucesso. Nasci no mesmo dia que o poeta de Itabira. Deveria crer menos na rima e mais no remo. Entrei numa aula de canoagem, para não desperdiçar o sol, o mar, o vento e as belezuras de Itapoan. Não posso reclamar da minha geolocalização, mas poderia ter nascido antes, assim os alcançaria. Acho que passou da hora de falar sobre o terceiro degrau da angústia. Depois dos músicos e dos literatos, os outros são os outros. E só.

*Psicanalista

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