VEJA VIDEOCLIPES
A vitrine dos festivais de música para artistas baianos
De 2022 para 2023, o número de festivais de música no Brasil deve aumentar em 54%
Por Renato Alban
Em 2020, a cantora e compositora Ana Barroso, natural de Vitória da Conquista, levou o primeiro lugar em um festival de música no sudoeste da Bahia. Com o dinheiro que ganhou, fez o primeiro EP. Três anos depois, Ana tem marcado presença em festivais. Esse é o mesmo caminho de outros artistas baianos em ascensão, como Melly, Hiran e Raonir Braz.
Eles aproveitam a diversidade de plateias, a visibilidade em diferentes cidades e o contato com outros artistas para pavimentar o caminho para novos patamares no mercado da música. E têm crescido junto com o número de eventos desse setor no país, que disparou depois da pandemia de Covid-19.
De 2022 para 2023, o número de festivais de música no Brasil deve aumentar em 54%. A estimativa é da plataforma Mapa dos Festivais, que cataloga informações sobre eventos do setor no Brasil desde 2019. Dos quatro anos de levantamento, este mês deve se tornar o recordista. Serão, no total, 41 festivais em outubro, 12 apenas neste fim de semana, desde sexta-feira, 20, a hoje.
“O aumento do número de festivais nos últimos dois anos tem relação direta com o pós-pandemia e a demanda reprimida”, afirma a diretora de relacionamentos da plataforma de dados, Juliana Castro. Segundo ela, outro resultado da pandemia foi a transmissão dos festivais em meios digitais. “É a herança dita ‘phygital’ do isolamento”.
Ana Barroso conta que usa esses espaços para angariar mais público para sua obra. “Quanto mais somos vistas, cantando, atuando, mais aparecem pessoas a fim de revisitar aquele som, aquela história”. Ela se prepara para shows na Festa Literária de Uauá, no norte da Bahia, em novembro, e no Radioca, em Salvador, em dezembro.
No ano passado, Ana fez o show de abertura do Radioca. “Foi lindo! Acho que a turma gostou, parecia ‘boas-vindas’ pra noite que ia ganhando outras forças”. Na próxima apresentação, estará com outros 10 artistas baianos do coletivo Outras Vozes: “Somos um bando de artistas, da capital e do interior, que nos encontramos para fazer essa cena ser percebida”.
Para a cantora, os festivais têm contribuído para o crescimento de artistas independentes, que não têm recursos financeiros e estruturais de gravadoras. “Costumo dizer que artista independente é patrão e peão, né? Precisa acudir tudo: ensaios, figurino, divulgação... Então, quando se tem um festival com equipe, alivia, posso me concentrar na parte criativa”, explica Ana Barroso. A conquistense acrescenta que fica entusiasmada por cantar no mesmo palco que grandes artistas da música brasileira. “A integração de nomes consagrados convoca o público”.
Revelação do R&B no país, a cantora soteropolitana Melly também se emociona em festivais: “Tenho me apresentado em palcos com muita história, onde já tocaram artistas que me inspiro diariamente”. Ela já fez shows em eventos como o Sangue Novo, Rec-Beat e Festival da Primavera, os três em Salvador, e o MITA, no Rio de Janeiro.
Indicada ao Prêmio Multishow como revelação do ano, Melly já planeja apresentações no Festival Mulheres do Mundo, no próximo fim de semana, e no Rock The Mountain, no início de novembro. Os dois serão realizados no Rio de Janeiro. “Em cada lugar que toco, me impressiono com o público, não esperava que fosse conhecida em tantas cidades”, revela.
Melly diz que muitos curiosos têm se interessado pelo seu trabalho a partir dos festivais. “Passam a procurar saber, seguir, curtir”. Apesar do carinho que tem recebido do público, a soteropolitana admite que é desafiador se apresentar em novas cidades: “Tenho começado a aprender a estar mais à vontade, a me permitir e ser a minha melhor versão”.
Para ela, esse desafio faz parte de um processo de amadurecimento como artista. Os eventos também são espaços para conhecer produtores e profissionais do mercado. Melly sonha em se apresentar no Rock in Rio (Rio de Janeiro), no Afropunk Bahia (Salvador), e no Coachella (Estados Unidos).
A cantora destaca que os festivais também são uma alternativa aos artistas que ainda não topam a empreitada de investir em um show solo. “Os riscos são incontáveis quando se é um artista em início de prospecção”. Mas ressalta que a vantagem financeira para o cantor depende do evento.
Veterana de festivais em todo o país, a também soteropolitana Luedji Luna, concorda com Melly: “Só compensa financeiramente quando o evento arca com os custos de produção, como passagem e hospedagem, e não barganha o cachê do show”.
Com passagens pelo Rock in Rio, Radioca, Festival de Verão (Salvador), Zepelim (Fortaleza) e Encontros Tropicais (Salvador), Luedji concilia uma turnê solo pelo país com a participação em festivais. Com 12 anos de carreira, a cantora se apresentou neste sábado, 21, no Festival No Ar Coquetel Molotov (Recife) e faz show na próxima semana no Prio Blues & Jazz (Rio de Janeiro).
A baiana destaca que esses eventos fazem artistas iniciantes serem vistos pelo mercado. “É também uma boa oportunidade de conquistar uma nova audiência”, afirma. Até mesmo o número de seguidores é impactado pelas participações em eventos musicais, segundo Luedji, que já foi indicada ao Grammy Latino e abriu o show da cantora americana Alicia Keys.
Com 20 anos de carreira, a sambista soteropolitana Ju Moraes reconhece a importância desses eventos no crescimento de artistas, mas ressalta que no gênero em que atua, há uma marginalização das cantoras. “Os festivais de samba seguem como sempre foram, além de extremamente masculinos, não dão oportunidade para os artistas locais. Gostaria de ver novos artistas”.
Estrutura
Na contramão, o Festival Novíssimos Labs foi criado há dois anos para impulsionar a carreira de novos cantores. A próxima edição será em dezembro e entre os 11 selecionados está o rapper soteropolitano Raonir Braz. O artista tem crescido junto com a cena trap no país e se tornou produtor musical e sócio de uma gravadora.
Em festivais, tem aproveitado para apresentar o trabalho e fazer contato com mais artistas: “Os eventos tiram a gente da zona de conforto e atraem a galera que não conhece o trampo”. Raonir ressalta que apesar da diferença de público em locais onde já se apresentou, como Salvador, São Paulo e Fortaleza, a estrutura tende a ser semelhante.
Essa é uma vantagem que aponta em grandes eventos. “Festival tem uma estrutura incrível, até para colocar mais músicos e crescer o show”, diz Raonir. O rapper soteropolitano Hiran enxerga essa qualidade nos festivais que têm participado: “Você tem a mesma estrutura de uma pessoa consolidada, o que ele vai ter de som, você vai ter também”.
Presença frequente em eventos em Salvador, como Sangue Novo, Virada Sustentável e Festival Zona Mundi, Hiran já sonha em tocar em mais festivais. “Coachella, por favor”, diz o artista. Ele destaca, no entanto, que apresentações nesses eventos precisam ser adaptadas: “Normalmente, é um compilado de quem você é para um público que provavelmente não te conhece”.
“O corre é muito doido no backstage, montagem e desmontagem, o tempo no camarim é menor”, revela Hiran. Ele compara essa experiência com a do show solo: “Na sua turnê, a gente tem um camarim próprio, mais tempo para montar e fazer o show”, diz o rapper, que também já abriu uma apresentação de Emicida em Salvador.
Organização
A Bahia tem um cenário consolidado de festivais de música, com eventos como o Festival de Verão, criado há 24 anos, e o Festival de Inverno (Vitória da Conquista), com 18 anos. Também tem eventos mais novos, como o Radioca, com sete anos, e o Festival Sangue Novo, que chegou à quinta edição neste fim de semana e no próximo.
Sócio do Radioca, o produtor Luciano Matos afirma que houve um crescimento na demanda por festivais no estado, mas essa alta procura provocou um aumento nos custos de realização dos eventos. “Quando fomos fazer o primeiro depois da pandemia, a gente tomou um susto porque estava muito acima do que tínhamos planejado”, revela.
Luciano explica que a produção de festivais é um negócio arriscado e que nem sempre ele e os outros sócios do Radioca conseguem lucrar com o evento. “Em algumas edições, a gente ganha; em outras, a gente tem que tirar do bolso para pagar. Fazer festival é como ter banda nesse campo da música independente”, diz o empresário.
Para o produtor, os festivais têm o papel de apresentar e alavancar novos artistas. “Vários nomes da música baiana passaram no Radioca, Luedji Luna, por exemplo, quando tocou no festival em 2018, não tinha a mesma evidência que tem hoje”.
Investimento
O maior festival de música negra do mundo, o Afropunk, ganhou edições em Salvador em 2021 e 2022 e voltará a ser realizado na cidade no próximo mês. Com origem nos Estados Unidos, o evento reuniu mais de 25 mil pessoas na última edição baiana.
“Essa ideia surgiu da vontade dos organizadores de se aproximarem da população diaspórica brasileira”, conta a coordenadora de Redes, Conteúdo e Criatividade do festival na Bahia, Ágatha Ferreira. “Por se tratar de um evento preto, nada melhor do que ter Salvador como o ponto de partida do Afropunk no Brasil. É voltar para onde tudo começou”.
Segundo Ágatha, a Bahia já tem público e estrutura para receber grandes festivais de música, como o Afropunk, apesar de não ter a mesma variedade de equipamentos do Sudeste. Para ela, é necessário maior investimento público e privado em qualificação e manutenção das estruturas baianas.
Segundo Luciano, mais empresas deveriam patrocinar eventos independentes. Ágatha destaca que esse patrocínio deve ser em todo o país. “Pensar em um festival fora do eixo do Sudeste é pensar em revolucionar. É uma estratégia visionária”, afirma.
A cantora Melly conta que, em festivais que participou fora da Bahia, percebeu um apoio maior do governo e da iniciativa privada. “O estado precisa estar mais alerta à música como parte vital da estrutura de uma sociedade. Como que a Bahia não investe incansavelmente naquilo que mais exporta?”, questiona a artista.
SERVIÇO – Festivais de música na Bahia em 2023*
Festival Sangue Novo
Dias 28 e 29 de outubro no Trapiche Barnabé (Av. Jequitaia, 5, Comércio, Salvador).
Festival Recôncavo Instrumental
De 28 de outubro a 4 de novembro nas cidades de São Francisco do Conde, Madre de Deus, Candeias, São Sebastião do Passé, Saubara, Cachoeira e Salvador.
Festival Opará
Dias 4 de novembro e 9 de dezembro em Juazeiro no Lounge da Via Show (Rua Pedro Pacheco, 493, Piranga, Juazeiro).
Candyall e Tal
Dias 11 e 12 de novembro no bairro do Candeal, em Salvador.
Afropunk Bahia
Dias 18 e 19 de novembro no Parque de Exposições, em Salvador (Av. Luís Viana Filho, 1590, Itapuã).
Festival Reggae de Itacaré
Dias 24 e 25 de novembro em Itacaré.
Blues Jazz Festival
Dias 24, 25 e 26 de novembro em Serra Grande, Uruçuca.
República do Reggae
Dia 25 de novembro no Wet Salvador (Av. Luís Viana Filho, 9581, Paralela).
Radioca
Dias 16 e 17 de dezembro na Fábrica Cultural (Largo da Ribeira, 33, Ribeira).
Rap Game Festival
Dia 16 de dezembro na Arena Fonte Nova, em Salvador (Ladeira da Fonte das Pedras, s/n - Nazaré).
Universo Paralelo
De 27 de dezembro a 3 janeiro de 2024 na Praia de Pratigi, Ituberá.
* Fonte: El Calbong
ASSISTA AOS CLIPES DOS ARTISTAS:
Ana Barroso
Há três meses, a cantora Ana Barroso lançou a parceria com o cantor e compositor Fatel. O forró não ganhou clipe, mas está disponível nas plataformas de música e no canal da cantora no YouTube.
Melly
A cantora Melly se juntou ao rapper Hiran no single Ceder. O clipe foi lançado há um ano e foi a música mais recente lançada pela artista.
Hiran
O cantor Hiran se juntou a Ivete Sangalo na música Voz do Destino, segunda faixa do álbum Jaqueira, lançado este ano pelo artista.
Raonir Braz
Com milhões de ouvintes nas plataformas de música, o rapper baiano Raonir Braz lançou o clipe do single Normal 3x, que está disponível no canal do YouTube.
Luedji Luna
Parte da versão deluxe do disco “Bom Mesmo É Estar Debaixo D'Água” da cantora Luedji Luna, a música “Lençóis” conta com clipe com participação de Liniker.
Ju Moraes
A sambista Ju Moraes lançou o single Ai Vou Dizer e a faixa contou com um clipe que pode ser visualizado no canal da cantora no YouTube.
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