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Amit Goswami: "Não há razão para sermos solitários e tão isolados do mundo"
Por Márcio Walter Machado | Foto: Uendel Galter | Ag. A TARDE

PhD em física quântica pela Universidade de Calcutá, na Índia, e professor emérito da Universidade de Oregon, nos Estados Unidos, Amit Goswami, 83, é referência nos estudos que unem ciência e espiritualidade a partir do ativismo quântico. Sua teoria baseia-se na ideia de transformação pessoal e das sociedades por meio da apropriação de soluções trazidas por uma nova compreensão da vida, fundamentada na primazia da consciência. Segundo Goswami, essa é “uma porta para que mudemos a nós mesmos e ao mundo. E ele pode ser mais civilizado, mais bonito, sem nenhum desses problemas que pensamos ser eternos e que podem destruir a humanidade”, defende. Com uma biografia repleta de artigos científicos publicados em revistas de economia, psicologia e medicina, o indiano, que também escreveu best-sellers como O Universo Autoconsciente, A Física da Alma e Consciência Quântica (todos publicados pela editora Aleph), conversou com exclusividade com a Muito em seu primeiro tour por quatro cidades brasileiras – Salvador, Brasília, São Paulo e Curitiba. Na oportunidade, ele falou sobre os princípios de sua teoria, explicando conceitos fundamentais para o entendimento do que chama de “nova ciência”. Goswami garante ter respostas para perguntas antigas da humanidade.
O que é física quântica exatamente?
A física quântica tem a ver com mudanças fundamentais na forma como vivemos, como pensamos e como construímos nossa vida, bastando apenas fazermos uma análise profunda de nós mesmos através do exercício da criatividade.
No ocidente, ciência e espiritualidade têm estado em campos opostos por séculos. Como reconciliá-las?
Ciência e religião não se dão bem porque são ambas sistemas nos quais há muitos preconceitos limitadores que se chamam dogmas. O materialismo científico é tão dogmático quanto a religião. Um diz: “A matéria é todo o deus de que precisamos”. O outro diz: ”Ou o meu Deus ou nenhum”. Essas coisas são preconceitos. Por isso, eu pergunto: por que aceitar esses dogmas? A física quântica se inicia com a ideia de que há uma unicidade potencial. A espiritualidade se inicia com a mesma ideia.
Como as suas teorias são aceitas no Brasil?
Os brasileiros, em geral, são muito expressivos em suas emoções. Por isso, são muito receptivos a mudanças, à criatividade, à expansão da consciência, que vocês adquirem por hábito muito rapidamente.
As pessoas vêm a seus workshops em busca de verdades espirituais ou da promessa de uma vida bem-sucedida com a expansão da consciência?
As pessoas vêm aqui por todos os tipos de demanda. Alguns vêm por entender que pode haver um modo melhor de fazer negócios se a gente conseguir mudar a forma de ver o mundo. O modo como vemos o mundo – se ele é amigável ou uma arena de combate – é tudo. No caso dos negócios, embora o mundo possa ser bastante competitivo, transformar a maneira como enxergamos pode trazer tanto prosperidade quanto satisfação.
O lugar onde me insiro é tão importante quanto eu mesmo. Quando nos conectamos, entendemos que podemos resolver todos os problemas
Então, tudo depende da nossa perspectiva?
Tudo depende de como você enxerga o mundo, especialmente em relação a outros seres humanos. Essa é a parte que o intelectualismo não compreende. Quando você pensa que tudo é matéria, então você se torna muito limitado. Isso faz com que, em nosso relacionamento com o mundo, nos tornemos tão centrados em nós mesmos que o exterior praticamente desaparece, até você se transformar na única coisa existente. Essa é uma forma muito perigosa de sentir, porque, assim, não existirão pessoas em quem realmente confiar, nenhum relacionamento real, nenhum amor, nenhum amigo. Mas é isso o que a ciência materialista nos dá. No entanto, as pessoas têm todo o direito de recusar ter relacionamentos. Se quiserem viver como psicopatas, elas têm essa escolha – escolhas são a base da democracia, por isso temos de honrar esse direito. Mas, ao mesmo tempo, tentamos persuadi-las de que não há razão para sermos solitários e tão isolados do mundo. Por que não começar a relacionar-se com os outros? Você pode ter relacionamentos. Tudo o que você precisa fazer é ensinar isso a seu cérebro e aumentar essa habilidade.
O senhor disse ter sido materialista desde os 14 anos. Tornar-se espiritualista implica que o senhor acredita em Deus, uma vez que escreveu um livro intitulado Deus não está morto – evidências científicas da existência de Deus?
Eu fui materialista por muito tempo. Mas um dia eu me libertei da tristeza e da falta de alegria oriundas do materialismo, e isso aconteceu por um simples pensamento que me chegou como um evento da sincronia: “Por que viver dessa forma?”. E a resposta veio de modo claro e inequívoco: eu não tenho de viver uma vida sem alegria, sem satisfação. Eu posso ser feliz e estudar física ao mesmo tempo. Essa convicção me tornou o homem que você está vendo agora.
O senhor uma vez afirmou: “Se você deseja algo que não esteja em consonância com o movimento da consciência, você terá um obstáculo”. O que é essa consciência?
A consciência é a habilidade de conexão ‘não localizada’ que nós temos, essa interconectividade. O que não é algo que a matéria pode encontrar. Uma vez que você reconheça isso, poderá entender que há algo do qual a matéria mesma emana, algo de que essa própria matéria é criada. A matéria se torna o hardware para expor, expressar e explorar a consciência. Portanto, nós somos essa consciência, que não tem uma definição particular. Quem somos? Somos fundamentalmente consciência. E essa consciência ‘não localizada’ é a base do ser que conecta todas as coisas.
O princípio da ‘não localidade’ é um dos conceitos básicos de seu pensamento. Como o senhor o explica?
‘Não localidade’ significa comunicação sem sinalização. Em outras palavras, significa minha habilidade de me comunicar com você como se fôssemos apenas um. Eu não preciso de sinais para me comunicar comigo mesmo. A física quântica diz que você pode fazer isso com todas as pessoas através da meditação intencional e dos sentimentos emanados do coração, pois somos potencialmente ‘não localizados’ em relação uns aos outros, mas precisamos ativar essa ‘não localidade’ em nós mesmos. No entanto, eu não posso alcançar isso se mantiver o pensamento racional porque o pensamento lógico exclui a ‘não localidade’.
Um dia eu me libertei da tristeza e falta de alegria oriundas do materialismo, e isso aconteceu por um simples pensamento: “Por que viver dessa forma?
Como, num mundo cada vez mais materialista, podemos nos abster do pensamento lógico e entender a conexão universal entre as almas?
Esse entendimento nos é dado através da física quântica, na qual temos como base o conceito de ‘não localidade’, que é experimentável e verificável. Dessa forma, não nos resta dúvida sobre ele.
E como podemos alcançar esse entendimento?
É justamente por isso que temos de aprender as coisas. E é por isso que eu tenho dado palestras em todo canto a fim de ensinar as pessoas. Já progredimos bastante até aqui, não apenas com os workshops, mas agora há cursos de mestrado e PhD nos quais podemos instruir as pessoas em como construir relacionamentos e fazer do mundo um lugar melhor.
Durante o workshop, o senhor pediu às pessoas que fechassem os olhos e expandissem o pensamento, primeiro envolvendo as pessoas dentro do auditório e, depois, envolvendo todo o planeta. Como esse tipo de atividade pode nos conectar às pessoas e à consciência universal?
Podemos nos transformar de tal modo, tendo em mente a consciência de comunidade, que, talvez, consigamos modificar as coisas de maneira que a minha transformação chegue mesmo a alcançar outra pessoa que sequer fez parte do exercício, e, assim, o cérebro dessa outra pessoa automaticamente sofrerá mudanças.
E o que é a alma?
A alma é um aspecto verificável de nós mesmos. Quando exploramos esses arquétipos aos quais eu frequentemente me refiro, como verdade, amor, beleza, justiça, quando nós os exploramos, o fazemos com o pensamento e as emoções, os quais não são pensamentos e emoções comuns, que não elevam, que não expandem nossa consciência. Pensar nesses arquétipos e senti-los expande nossa consciência. Se pegar, por exemplo, o arquétipo da justiça e for justo com outra pessoa, então você sentirá que incluiu o outro em sua consciência – a inclusão é expansão.
Um dos exercícios no workshop foi justamente a busca interior pelo arquétipo de cada um, o qual teria sido escolhido numa vida passada. Algumas pessoas disseram ter conseguido acessar esse arquétipo. Como podemos ter certeza de que as respostas encontradas vieram de uma vida anterior e não simplesmente do pensamento presente?
Não podemos ter certeza absoluta. Mas há alguns indícios, como o fato de podermos lembrar de algo com surpresa, de termos lembranças descontínuas. Outro bom indício é quando repentinamente nos tornamos muito seguros de que este (arquétipo) é o certo, sem que haja nenhuma dúvida. Esses são sinais que nos conectam à consciência suprema. Se a minha consciência se expandir, essa expansão virá como surpresa, pois é um movimento descontínuo. E eu terei certeza disso, porque vem do fundamento do ser.
Como as almas continuariam a viver após a morte do corpo?
Certas memórias que nós acumulamos, especialmente as advindas de algum novo aprendizado, como quando aprendo a cantar ou a resolver cálculos matemáticos, existem no princípio da ‘não localidade’, o qual torna possível que, além de mim, outras pessoas de diferentes épocas e lugares também as usem. Por isso, dizemos que existe uma lei da consciência pela qual cada pessoa estaria ligada a uma série de outras pessoas através do tempo e espaço e que elas estariam ligadas como pérolas num colar.
A física quântica pode nos responder questões fundamentais da humanidade, como “de onde venho?”, “o que é o amor?”, “o que acontece depois da morte?” e, principalmente, “quem sou”?
(Risos) Sim, a física quântica começa com esta última pergunta. E uma vez que esta questão é respondida, todas as outras poderão ser também. Esta última questão é a chave, ela diz que eu sou o mundo inteiro. Eu posso não saber disso agora, no entanto, posso explorar e descobrir que uma questão responde a tudo. A física quântica me deu respostas para coisas sobre as quais eu jamais pensei quando preso ao pensamento científico. Esta é a beleza da nova ciência: ela abriu uma porta para que mudemos a nós mesmos e ao mundo. E ele pode ser mais civilizado, mais bonito, sem nenhum desses problemas que pensamos ser eternos e que podem destruir a humanidade. Eles são pequenos obstáculos que há no movimento da consciência através da qual nós podemos nos transformar, transformar o mundo e ver que tudo pode ser maravilhoso.
Como a física quântica pode transformar o cenário caótico em que o mundo está mergulhando em termos político-econômicos, de relações humanas e do aparente colapso de instituições tradicionais, como a família?
Porque a física quântica é baseada nesses princípios fundamentais que nos permitem ver o mundo como uma família, eu não faço as coisas de forma egoísta, mas para o bem de todos. Essa atitude de consciência comunitária é de extrema importância porque passamos a perceber o todo. O lugar onde me insiro é tão importante quanto eu mesmo. Quando nós nos conectamos, entendemos que uma porta foi aberta e que podemos resolver todos os problemas.
Esse seria o caminho para a felicidade plena?
Não existe apenas um caminho. Mas a primeira coisa que devemos ter em mente é a criatividade. Por isso, todo o indivíduo tem de encontrar seu próprio caminho, usando de alguma individualidade, mas sem excluir os outros. Nós podemos ser cooperativos, nos movendo em nosso próprio caminho criativo, com o total entendimento de que amamos e que o amor nos dá toda força positiva e aumenta nossas chances de obter sucesso e de manifestar o que somos.
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