DIA DAS MÃES
As inspirações maternas de chefs baianas
Veja histórias de superação com bastante sabor
Por Gilson Jorge
Quando morava na casa da avó com a família em Natal, no Rio Grande do Norte, a soteropolitana Nina Pessoa sentiu uma saudade enorme dos sabores baianos. Tinha, então, 15 anos de idade quando pediu à sua mãe, Soraya Pessoa, que lhe ensinasse a fazer moquecas e acarajé, a comida do dendê, para resolver o problema.
"Comecei a cozinhar para ter acesso aos pratos que a gente não encontrava em outros lugares. Hoje em dia, já se acha uma moqueca, mas naquele tempo, não", explica Nina.
A massa do feijão fradinho usada no acarajé e no abará era enviada por amigos da Bahia para o Rio Grande do Norte e Dona Soraya se encarregou de ensinar a filha a bater a massa. Até porque, como dizia Dorival Caymmi na canção A Preta do Acarajé, "todo mundo gosta de acarajé, o trabalho que dá pra fazer é que é".
A ausência de Salvador e a companhia materna foram fortes estímulos para o ingresso da jovem no universo da culinária. Mas o tempo vivido com os parentes potiguares foi fundamental para que, anos depois, mãe e filha voltassem a Salvador com um trunfo para entrar no mercado de gastronomia: a Torta Presidente, uma tradição natalense para festas caseiras e em docerias, com finas camadas da massa do bolo, de sequilhos e de um doce, repetidamente.
Era um trunfo que a família tinha, a receita ensinada pela avó materna. "Minha mãe sempre foi uma cozinheira muito boa e ela sempre fez bolo para vender. De casamento, de aniversário. E foi assim que eu entrei na gastronomia, fazendo bolos com ela", conta Nina, que hoje é chef do Allê Varanda, no Santo Antonio Além do Carmo.
Quando começou a trabalhar com sua mãe, Nina tinha um emprego de publicitária, mas em datas comemorativas se manteve fazendo brigadeiros, ovos de Páscoa, panetones e outros doces, porque além do prazer que sentia na cozinha, via entrar um dinheiro extra. Com a Torta Presidente, Nina e a mãe conseguiram entrar no circuito de confeitarias.
Há dez anos, Nina foi trabalhar como publicitária na Feira da Cidade e conheceu alguns nomes da gastronomia soteropolitana, incluindo Fabrício Lemos, sócio de alguns dos restaurantes mais badalados da capital baiana. "Eu perguntei a ele se deveria fazer faculdade de gastronomia para entrar para o ramo. Ele me disse para fazer o curso do Senac, ter uma experiência em um curso de alta gastronomia e depois bater à porta dele", lembra Nina.
Depois de trabalhar em quatro restaurantes do empresário, ela assumiu a subchefia de uma cozinha pela primeira vez em 2020, em um hotel no Rio Vermelho, foi convidada a ser chef de um restaurante asiático na Pituba e, desde janeiro deste ano, comanda a cozinha do Allê. A cozinha do restaurante é especializada na costa amalfitana, no sul da Itália. As mães que aparecerem vão poder degustar massas e frutos do mar.
Perfume
Chef e proprietária do Solar Bar e Restaurante, no Rio Vermelho, Andrea Nascimento lembra de ser acordada quando criança pelo perfume na cozinha sempre que sua mãe, Dona Adenita, ou simplesmente Nita, cozinhava. "Eu sentia o cheiro, levantava e ia para lá. Eu costumava dar uma beliscada na panela", conta Andrea.
Nas lembranças da cozinha da mãe estão o malassado, o arroz de hauçá e as moquecas. Especialmente, a moqueca de carne. O cheiro que subia enquanto a carne era refogada no alho, cebola e pimenta. Depois, acrescentava-se azeite de dendê, camarão seco e, opcionalmente, ovos. O acompanhamento era uma farofa.
"Outra lembrança que me veio, conversando com minha irmã, foi o peixe à escabeche que minha mãe fazia. Ninguém a enganava com o peixe, que tinha que ser fresco mesmo", conta Andrea, que compra essa proteína nas mãos dos pescadores do Rio Vermelho. Para o Dia das Mães, Andrea pretende fazer a moqueca de carne, também conhecida como roupa velha, e o peixe à escabeche.
Já Giovana Gallardo, dona e chef de O Peruano, na Barra, lembra de cozinhar ao lado de sua mãe, Catalina, em Lima, desde os 12 anos de idade. O primeiro prato que recorda ter feito foi o tradicional arroz de pato, receita típica do norte do Peru e amplamente consumido em celebrações familiares.
"É um arroz verde, que lá é muito comum, e o pato vai dentro dele. É como se fosse o churrasco de vocês", afirma Giovanna, que declara não ser fácil encontrar todos os ingredientes aqui em Salvador.
Comidas da infância
O restaurante que a peruana abriu na Barra, na reta final da pandemia, tem tudo a ver com maternidade. A história remonta à sua chegada ao Rio de Janeiro para tentar a sorte. Na Cidade Maravilhosa, ela já tinha recebido a visita da mãe, que lhe trouxe coisas que ela gosta de comer desde criança.
Pouco antes da explosão da Covid-19, Giovana e um amigo peruano receberam um convite para trabalhar em um restaurante peruano no centro de Salvador. Pouco depois da chegada da dupla, os restaurantes e todo e qualquer negócio que aglomerasse pessoas tiveram que fechar as portas.
Desempregados, os dois decidiram planejar a abertura de seu próprio restaurante na frente da casa em que moravam. O amigo acabou desistindo do projeto e voltou para o Rio. Giovanna, que decidiu tocar a ideia adiante, engravidou e abriu as portas do restaurante pouco tempo antes de dar à luz Catarina. Sua mãe e sua irmã vieram do Peru especialmente para ajudar nos cuidados da pequena e do negócio.
Para o Dia das Mães, o Peruano vai manter o seu cardápio tradicional de ceviches, arroz de chaufa e outras especialidades. Mas Giovana diz que pretende fazer uma sobremesa especial: "Vamos ter algo diferente, a torta gelada, à base de gelatina e bolo".
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