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Ateliê Mão de Mãe valoriza o trabalho e o talento de crocheteiras

Nova coleção do espaço foi apresentada na São Paulo Fashion Week

Publicado segunda-feira, 20 de junho de 2022 às 06:00 h | Autor: Álene Rios
Patrick Fortuna (roupa marrom) e Vinicius Santana (roupa rosa), diretores criativos do Ateliê Mão de Mãe
Patrick Fortuna (roupa marrom) e Vinicius Santana (roupa rosa), diretores criativos do Ateliê Mão de Mãe -

As diversas cores exibidas nas paisagens do pôr do sol, o rio e o céu azul de Maragogipinho, distrito de Aratuípe, localizado no Recôncavo Baiano, foram inspiração para a marca baiana Ateliê Mão de Mãe, que apresentou sua nova coleção no início deste mês na São Paulo Fashion Week. A primeira vez que participou foi em 2021, através do projeto Sankofa, e agora com o reconhecimento como line-up na maior semana de moda da América Latina.

A marca tem como propósito a valorização da mão de obra artesanal, com foco especialmente no crochê, e é por esse mesmo motivo que os diretores criativos e desenvolvedores das peças, Patrick Fortuna e Vinicius Santana, homenageiam a comunidade, um dos maiores polos do artesanato brasileiro.

A história de Vinicius Santana com a moda tem uma forte ligação com a fotografia. O que começou como um hobby, em horas extras no seu antigo trabalho, se tornou uma necessidade quando ele se viu sem essa fonte de renda três meses após a sua mãe, a artesã Luciene Brito, se mudar para a sua casa devido aos impactos da pandemia sobre a atividade que desenvolvia.

Foi dentro de casa, passando mais tempo nas redes sociais, que ele observou as tendências expostas nesses meios e, através de um Instagram criado para exibir os trabalhos de Luciene, também crocheteira e inspiração para o nome da marca, ele teve a ideia de ir além do que é oferecido por outros perfis do mesmo nicho ao mostrar as roupas de crochê em corpos reais.

“São peças que carregam muito mais do que um valor monetário, é um valor sentimental, construídas ponto por ponto pelas mãos de mulheres fortes que estão buscando estar no mercado de trabalho, ser valorizadas e que entregam toda a dedicação, todo o talento e amor nas peças”, diz ele.

Além do carnaval

Por trás de todo o glamour e luzes das passarelas, para as pessoas que trabalham nos bastidores desenvolvendo as peças e buscando os meios de realizar um desfile, estar num espaço como a São Paulo Fashion Week é uma experiência que abre portas, mas ao mesmo tempo traz muitas reflexões, especialmente para marcas menores que contam com nenhum ou pouco apoio. 

E no caso de criadores nordestinos, esse peso é maior ainda pois transporta aspectos da própria cultura para outra localidade, apresentando, por exemplo, uma Bahia que está para além das festas de carnaval.    

“É uma experiência incrível, muito louca e até um pouco difícil, para ser bem sincero, principalmente para a gente que está no Nordeste, conseguir apoio e viabilizar a participação nesse evento para conseguir ocupar esses espaços. É uma sensação muito boa mas vem também com muita responsabilidade. É um evento muito caro e, para a gente, como marca pequena, é sempre um desafio. É um misto de sensações tanto de felicidade como também de preocupação”, diz Vinícius.

A seleção apresentada na recente temporada marcou a entrada de peças em tecidos planos para o Ateliê, que costumava trabalhar exclusivamente com o crochê. Dentre os mais de 25 looks apresentados para diversas ocasiões, as roupas exibem recortes de alfaiataria num misto de contemporaneidade e tradição.

São casacos que remetem aos anos 1940, peças que fazem alusão à leveza e uma paleta de cores escolhida para dialogar com a paisagem da localidade homenageada. Todas com fios 100% naturais de baixo impacto ambiental, com a curiosidade de que alguns deles levaram até 18 dias para ser finalizados. A marca, que começou com três crocheteiras, hoje emprega 48 mulheres de famílias que sobrevivem dessa arte.

Comportamento

O universo da moda e da criação sempre deslumbrou Patrick Fortuna, que desde os 18 anos trabalha nesse ambiente. O diretor criativo do Ateliê é o tipo de pessoa que era parada nas ruas só para comentarem sobre o seu estilo: “Sempre gostei dessa coisa da criação, da composição de looks e principalmente do comportamento, da forma com que as pessoas usavam as roupas para se manifestar”.

Com tanto gosto pela moda, Patrick logo sentiu a necessidade de criar algo que estivesse além da composição de looks e tivesse ainda mais autoria. Ele também enfatiza a dificuldade que pequenas marcas em ascensão enfrentam pela falta de apoiadores e conta uma das motivações que fez com que Vinicius quisesse mudar a sua realidade: “Ele viu a mãe dele vender, por muito tempo, os produtos por valores ínfimos para manter a família”.

Para Patrick, a participação na SPFW foi muito importante porque marca a entrada da Mão de Mãe nesse universo mas “também representa a valorização de um patrimônio cultural que é a arte de fazer com as mãos, tão pouco requisitada e tão pouco valorizada no nosso país. Acho que essa mensagem que a gente traz é muito de conscientização porque muitas gerações sobreviveram disso”.

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