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Christiane Machado: “Alzheimer não tem cura, mas tem tratamento”

Por Yumi Kuwano

19/10/2020 - 7:18 h

Com o passar dos anos ficamos mais expostos a doenças relacionadas à idade. O Alzheimer é uma delas. No Brasil, o Ministério da Saúde estima que exista 1,2 milhão de casos, a maioria ainda sem diagnóstico; e, no mundo, são mais de 35 milhões de pessoas diagnosticadas com a doença. O Alzheimer é o um dos tipos e o mais frequente de demência, cerca de 40% do total de diagnósticos de demência é de Alzheimer.

Neste mês foi comemorado o Dia do Idoso, e setembro foi marcado pelo Dia Nacional de Conscientização da Doença de Alzheimer. Sobre esse assunto, conversamos com a médica geriatra Christiane Machado, membro da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia (SBGG) – Seção Bahia e professora de geriatria da Universidade Federal da Bahia.

Quais são os sinais para identificar o Alzheimer?

O mais importante é que existe um declínio, o paciente expressa isso. Ele tem um padrão cognitivo prévio, ele tem um desempenho, pode ser uma pessoa com muita atividade intelectual ou com pouca atividade intelectual, mas, para o padrão dele, começa a ficar aquém disso. Começa a existir uma estranheza por parte das pessoas que observam esse indivíduo, geralmente um familiar ou alguém muito próximo. O que mais chama a atenção é o domínio cognitivo, que é mais afetado. Primeiramente, é a memória, então a pessoa começa a ter esquecimento, só que tem que ser um esquecimento sustentável ao longo do tempo, não é um esquecimento aqui outro ali. Outros domínios também podem ser acometidos logo no início, que é o domínio da linguagem, quando a pessoa começa a ter um empobrecimento do discurso, dificuldade de se expressar, é um sintoma que pode aparecer. Não existe um padrão na manifestação, é uma doença que se manifesta de forma bem individual e cada paciente tem um grau de acometimento, que depende da forma de como a doença está atingindo o cérebro daquele indivíduo, da forma como se distribui a patologia. É como se fosse um degrau. A pessoa tem um patamar e ela desce esse patamar dela mesma.

Como é o diagnóstico clínico?

O diagnóstico é baseado na narrativa, na história clínica que é contada para o médico. Geralmente, vou te passar um cenário típico, é alguém que vai acompanhado ao médico. Quando existe alguma preocupação com o que está acontecendo é muito comum que alguém leve a pessoa ao médico. Para o médico, é muito importante a terceira pessoa, até porque é um critério diagnóstico que alguém confirme a queixa. Pode acontecer do paciente não perceber ou achar que está tudo bem, que é do próprio envelhecimento. E tem pacientes que percebem, sim. Na história clínica, você vai entrevistando o paciente, perguntando o tipo de esquecimento que vem ocorrendo, com que frequência.

E existem estágios da doença.

Isso. Na fase leve, há o acometimento de memória que atrapalha um pouco a pessoa fazer tarefas do cotidiano. Uma pessoa que faz crochê muito bem e começa a esquecer como faz o crochê, perde o ponto; ou um advogado que no seu trabalho passa a se atrapalhar com os processos, aquela organização que ele tinha antes, a capacidade de fazer tudo corretamente, começa a perder. Tem um detalhe nisso que quando a pessoa é muito inteligente, ela dribla isso no início do problema, ela faz as atividades, mas à custa de um sacrifício mental. Há algumas perguntas que a gente faz na anamnese que são bem emblemáticas. Se a pessoa repete as perguntas com frequência, pergunta uma coisa, esquece e pergunta de novo ou então reconta histórias, como se não tivesse contado são sinais. Agora, não basta isso para dar o diagnóstico. São alguns exemplos. Tive uma paciente que morava com filho que saiu de casa. Em um determinado dia ela voltou para casa e ficou esperando o filho chegar. Naquele dia, ela simplesmente esqueceu que o filho não morava ali mais. Quando chega nessa fase, o diagnóstico não é muito difícil. Na fase leve, pode ter esses sinais, mas a pessoa preserva a capacidade de realizar as tarefas mais básicas. Mas para que você tenha um critério de demência, seja de Alzheimer ou outra doença, é necessário que haja um comprometimento da capacidade funcional. A habilidade que ele tem de realizar tarefas do cotidiano. São dois tipos de tarefa: as básicas e tarefas mais complexas, as instrumentais. As básicas são tomar banho, fazer higiene, vestir a própria roupa, comer; as instrumentais que a gente chama é fazer um telefonema, pegar um transporte, sair para fazer uma compra, nessas atividades ele começa a ter dificuldade. Às vezes, o paciente deixa de fazer as coisas que fazia, como se estivesse desinteressado em fazer. Ele não faz porque ele percebe que não está mais tendo capacidade de fazer, então, ele nem se expõe ao problema, ele simplesmente se retrai. Tem um outro sinal, por exemplo, que é um certo isolamento social, não vai mais para reunião de família porque ele não consegue participar tanto da conversa, não consegue acompanhar, então, prefere nem ir.

E isso, para as pessoas próximas perceberem, pode ser até mais complicado, porque pode parecer uma mudança de comportamento apenas.

Exatamente. Pode parecer uma depressão, aliás pode ser uma depressão também, mas outros sinais podem ocorrer. Essa mudança de comportamento é importante, porque é um outro grupo de manifestação, que são as não cognitivas, que a gente chama de comportamentais. Ele pode ter, por exemplo, manias. Achar que precisa guardar muitas vasilhas, porque na mente dele algo vai acontecer que precisa disso. Ou achar que tem ladrão e começa a trancar toda a casa.

Esses estágios vão existir para todos com o diagnóstico ou vai depender de cada indivíduo?

Se o diagnóstico for de doença de Alzheimer, em que você tem a certeza do que está ocorrendo no cérebro, porque hoje a gente tem testes em que você pode praticamente isolar isso, é uma doença que não tem muito freio. Há um erro na síntese proteica e é como se fosse uma linha de montagem, em que há um defeito no processo e esse defeito não pode ser corrigido. Todo produto que vem dessa síntese proteica vem como se fosse um lixo celular que vai se depositar entre os neurônios, vai matá-los, e isso vai se espalhando. Se o paciente passa por todas as fases, ele desaprende tudo que ele aprendeu, inclusive a comer. É uma doença que não tem tratamento modificador. Você tem uma fase leve, em uma questão de tempo passa para a fase moderada. Se fosse fazer uma linha, é a progressão da perda de capacidade funcional. Na fase moderada, a dependência vai crescendo e o paciente começa a precisar de uma certa supervisão nas atividades cotidianas. Até que na fase mais grave, ele já tem necessidade de ajuda para tomar banho. E, por incrível que pareça, a fase mais longa é a fase mais grave, em que a pessoa pode levar 10 anos ou mais completamente ou progressivamente sem capacidade de interação.

Como é o tratamento?

O Alzheimer não tem cura, mas tem tratamento. O tratamento tem duas vertentes, o farmacológico e o não farmacológico. O tratamento não farmacológico sempre tem que existir, que é a aprendizagem das pessoas que cuidam e como lidar com as dificuldades que o paciente tem. São várias técnicas de cuidar, de comunicação, de compreender pessoas que têm dificuldade em comunicar e outras abordagens. Existe a reabilitação cognitiva, que é como se fosse uma terapia de estimulação cognitiva que exercita os neurônios. A musicoterapia é uma abordagem bem interessante, como se fosse um exercício cerebral. Também tem a terapia ocupacional. Já o tratamento farmacológico se baseia justamente no fato de que a doença de Alzheimer destrói os neurônios de uma determinada neurotransmissão. Então, existe uma substância que serve de neurotransmissor. São três substâncias no mercado que têm resposta similar, a diferença entre elas é a quantidade por dia, o custo, formato. Para cada paciente a gente encontra o que é melhor, e os pacientes podem receber gratuitamente.

Existe idade mínima para ter a doença?

Não existe idade mínima, mas a prevalência dobra a cada cinco anos a partir dos 70, porque, na verdade, há dois tipos de Alzheimer. O precoce, que acomete indivíduos mais jovens. Na quinta década de vida você pode ser acometido, isso é raro, mas pode acontecer, que foi o caso do [filme] Para sempre Alice. Nesse caso você tem uma alteração genética significativa que determina tudo isso. Já o Alzheimer mais comum vai incidir mais adiante. Aos 85 anos estima-se que cerca de 40% das pessoas tenham a doença de Alzheimer.

Tem como prevenir?

A coisa mais moderna sobre Alzheimer é sobre a prevenção. Agora em julho saiu uma publicação de um consórcio que revisou uma estatística de nove fatores de risco. Entre eles hipertensão, diabetes, obesidade, sedentarismo, tabagismo, perda auditiva, trauma craniano (pancadas na cabeça), alcoolismo, depressão, o isolamento social, inatividade física e poluição do ar. Em 2017, identificaram nove fatores e em 2020 acrescentaram mais três nessa lista. O que isso quer dizer: esses fatores juntos são responsáveis por 40% da chance de um indivíduo desenvolver o Alzheimer. Ou seja, você pode potencialmente modificar, prevenir ou retardar a doença se você tem esses fatores sob controle.

Pode ser genético ou hereditário também?

Sim. Você pode ter um defeito enzimático na enzima responsável pela síntese proteica. Esse defeito enzimático é bastante transmissível entre família, e geralmente eles são responsáveis pelos casos de Alzheimer precoce. Você tem outros defeitos, que são na verdade hipóteses ainda, que, por exemplo, o Alzheimer nas pessoas idosas tem uma carga hereditária, mas é menor do que aquela de Alzheimer precoce. Mas não são determinantes, não é algo que você pode fazer uma pesquisa para saber se tem o gene, porque não é obrigatório que você vai ter. Você pode ter o gene, mas pode ser que não desenvolva, talvez por esses fatores de risco que foram identificados.

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