Com mais de 500 imagens, projeto que mostra ângulos inusitados do Farol da Barra vai virar livro

Turista ou soteropolitano, atire a primeira pedra quem já passou pelo Forte de Santo Antônio da Barra e nunca tirou uma foto. Com tantos olhos e câmeras voltados para o cartão-postal mais conhecido de Salvador, é fácil cair no lugar-comum na hora de registrá-lo. Mas não foi para o administrador e artista visual Tunísio Alves, que se desafiou a fotografar o Farol durante um ano, de 2011 para 2012. Hoje, com mais de 500 imagens, o projeto Um Farol, 365 Clicks vai ser transformado em livro, com previsão de lançamento para fevereiro de 2020.

A ideia surgiu para intensificar a dedicação do administrador à fotografia, que até hoje encara como hobby. Via de regra, usava o tempo dos finais de semana para fazer as fotos do projeto. Na busca pelo inusitado, ia para a orla vazia em dias de chuva e saía pedindo para subir nos prédios da região.

Como o inesperado não tem hora, carrega equipamentos fotográficos consigo diariamente. “As melhores fotos são as não programadas. É uma criança que passa, um reflexo que aparece. Quando a maré muda, vejo um lugar, uma pedra que não tinha visto“.

Ao completar 365 imagens postadas consecutivamente no site do projeto, o artista expôs 100 delas no Museu Náutico, no Farol, em 2012. O acervo inclui imagens feitas em outros bairros, sendo o Rio Vermelho o mais distante, as debaixo d’água e até aéreas, feitas com drone e de helicóptero.

Responsável pelo Forte desde 2000, o comandante da Marinha Reuben Bello Costa não havia visto, até a exposição, um projeto como o de Tunísio assim “tão específico” sobre o monumento histórico. “Como ele fez um trabalho de vários ângulos, quem vier a estudar essas fotos depois vai ter uma visão da realidade do momento em que foram tiradas”, avalia, ao falar do aspecto documental do ensaio.

Em verdade, as primeiras fotos de Um Farol, 365 Clicks mostram uma Barra diferente. Dentre as mudanças significativas que aconteceram na região desde 2011, como a transferência da festa municipal de Ano Novo e a requalificação da orla, Tunísio se atém a detalhes, do tipo que só se adquire com intimidade. “Dentro do Forte Santa Maria hoje só tem um coqueiro. Quando comecei, tinham três”, pontua.

Do digital ao papel

Apesar de nunca ter deixado de fotografar o local, o projeto ficou suspenso entre 2012 e 2014. A pausa terminou quando Tunísio criou um perfil no Instagram. Sem compromisso com a periodicidade, vem experimentando pontos de vista mais surpreendentes que os iniciais.

Foi nesse período de retomada que o argentino Dan Lande, 36, conheceu o projeto, há pouco mais de três anos. Professor da Universidade de Buenos Aires, ele usou as fotos de Tunísio na disciplina criatividade e inovação, que ministra no curso de administração. “Gosto de como a constância gera novas buscas no momento de mostrar um mesmo lugar de maneiras diferentes”, ressalta.

O apoio, vindo de pessoas e lugares imprevisíveis, fez o artista lançar um financiamento coletivo online, em setembro, a fim de custear a produção e distribuição de um livro independente com 365 fotos do símbolo soteropolitano. A meta de R$ 60 mil foi batida no mês seguinte. Após o lançamento, cada exemplar deve custar em torno de R$ 140.

O valor seria apenas o necessário para cobrir os custos de impressão. “Faço pela satisfação, não com intuito de recompensa financeira“, diz. Sem pretender transformar a arte em fonte de renda, nem chega a divulgar alguns trabalhos, a exemplo do ensaio selecionado no Festival de Fotografia de Tiradentes, que aconteceu em março. O mesmo vale para as pinturas e aquarelas nas quais se arrisca. Como participante da Cow Parade 2019 em Salvador, enfeitou a vaquinha timbaleira da Praça São Braz, em Plataforma.

Apesar das várias atuações artísticas, não se considera “nem amador, nem profissional”. “Estou meio de gaiato”, brinca com modéstia.