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24/09/2023 às 3:00 - há XX semanas | Autor: Renato Alban

ABRE ASPAS

Davi Windholz - Cofundador da organização Mãos para a Paz

“Ensinar jovens e adultos a refletirem é uma ação política”

Nas últimas semanas, a Bahia se destacou no noticiário nacional por eventos de violência. Entre eles, o assassinato da líder quilombola e yalorixá Mãe Bernadete, em Simões Filho, a chacina de dez pessoas em Mata de São João, a morte de um policial federal em meio a uma disputa de facções criminosas em Salvador e tiroteios e sequestros em bairros da capital baiana. A situação perpetua a violência já destacada pelo Anuário Brasileiro da Segurança Pública publicado em julho. O documento apontou a Bahia como o estado com mais mortes violentas no país em 2022, com quase sete mil assassinatos. Com esses dados, a Bahia foi escolhida para sediar, junto com outros três estados, o 1º Congresso Internacional de Educação para a Paz e Não Violência, da organização internacional Mãos para a Paz, de 21 a 27 deste mês [Veja programação abaixo]. Para o presidente do congresso e cofundador da ONG, o professor Davi Windholz, é preciso que haja mudanças nas políticas públicas em prol de uma sociedade com menos violência. “Se não temos uma política social, econômica e trabalhista, então, não solucionamos a questão”, diz Davi. A Mãos para a Paz foi criada em 2008 com um modelo de educação para trabalhar com crianças e jovens judeus, muçulmanos, cristãos e drusos em Israel e na Palestina.

O que é possível fazer para que as pessoas repensem comportamentos a favor de uma sociedade menos violenta?

Quanto mais cedo a gente consegue trabalhar no sistema educacional com crianças e adolescentes, mais a gente consegue evitar a violência. Nós seguimos dois pontos. Um é o de Nelson Mandela: "Para odiar, as pessoas precisam aprender, e se podem aprender a odiar, elas podem ser ensinadas a amar". Nosso objetivo é transformar a Educação com base no amor e não no medo, que é o que hoje existe na maior parte do sistema escolar. O segundo ponto é de uma lenda indígena, de que o avô estava com o neto em cima de uma montanha, e conta ao neto que dentro de toda pessoa há dois lobos: um é o medo e o outro é o amor. O neto pergunta quem vence nessa disputa e o avô responde: aquele que a gente mais alimenta. A forma como a gente tem que lidar com a cultura da paz é começar a divulgar a cultura da paz em todos os setores: escolas, comunidade, família, mídia e redes sociais, que estão transmitindo muita violência. Para isso, então, Mãos para a Paz tem uma série de projetos que vão desde temas escolares, passando pela comunidade, até locais de trabalho. Fazemos oficinas de comunicação não violenta no trabalho, oficinas de mediação de conflitos e assim por diante.

Então, o foco é a educação como chave para a mudança comportamental pela paz.

Acreditamos que a Educação não é só um processo de repressão e, sim, de reflexão. É a pessoa entendendo de onde vem o medo, a violência, a inveja, todos os sentimentos que causam violência. A ação de ensinar jovens e adultos a refletir é uma ação política. A educação é uma práxis, é a reflexão da pedagogia e a ação democrática na prática. Mas, num processo de cima para baixo, num sistema político e policial, o sujeito parte dessa violência. Nos países pobres, a violência é maior e, na população pobre, a violência é ainda maior. Não porque eles são mais violentos, mas, por motivo de sobrevivência.

Na última quinta-feira, 21, foi comemorado o Dia Internacional da Paz. É possível pensar num mundo pacífico numa sociedade capitalista que convive diariamente com a desigualdade social?

Depende do que você entende por capitalismo. O brutal que vivemos hoje é que é impossível não ter uma sociedade violenta. Um exemplo: eu moro em Israel e trabalho na mediação entre israelenses e palestinos. Sempre se fala que o processo de pacificação fracassou. Eu digo que não. A educação teve sucesso. O sistema educacional, que apoia o capitalismo, diz que você tem que ser o melhor, ser o primeiro e pensar em si e contra a comunidade. Num sistema capitalista como esse, não existe prosperidade. Mas, se você pensa num sistema capitalista como o welfare state [estado de bem-estar social], em que o sistema privado possa se desenvolver, mas dentro de um conceito humanista, aí podemos criar um processo de pacificação da sociedade. Se compararmos Europa e Estados Unidos, por exemplo, na Europa, vemos mais o sistema do welfare state, onde há uma base cultural muito boa que apoia todas as camadas menos privilegiadas, enquanto, nos Estados Unidos, milhões de pessoas vivem sem assistência médica. É possível ver que o capitalismo da Europa é mais ameno e, principalmente, nos países escandinavos, há muito menos violência.

O congresso homenageia Mãe Bernadete. O que representa o assassinato de uma líder quilombola e yalorixá para a luta contra a violência no Brasil?

Nós escolhemos Salvador para realizar o evento por dois motivos: um pelo que chamamos de periferia. Congressos de educação, psicologia e ciências humanas ocorrem no Rio de Janeiro, São Paulo, Florianópolis, Curitiba ou num resort no Nordeste. Então, decidimos realizar o congresso em Salvador para transmitir a cultura da paz na cidade. Outro motivo é porque escolhemos uma cidade para abranger todos os setores, e estar em contato com secretarias de Educação, Turismo e Cultura. Quando Mãe Bernadete faleceu, nós notamos que não podíamos deixar esse evento de lado, então, colocamos uma homenagem na abertura, como um símbolo da violência que está ocorrendo. Mãe Bernadete representa fortemente pessoas de religiões discriminadas, de uma cor discriminada, de uma comunidade discriminada. Para nós, ela se tornou o símbolo que reúne três elementos de discriminação numa mesma pessoa, uma projeção de todos aqueles que estão sendo discriminados.

A Bahia foi o estado com mais mortes violentas do Brasil em 2022. Considera que há equívocos de gestão de segurança no Brasil e na Bahia?

A educação é um passo importantíssimo para solucionarmos o problema e implantar uma cultura da paz e não violência na próxima geração. Mas é preciso uma mudança total de políticas para solucionar a violência atual. Se não temos uma política social, econômica e trabalhista, então, não solucionamos a questão. Têm que vir também educação e processos socioeconômicos, e por isso, acreditamos nesse sistema holístico. Os três setores, público, empresarial e civil, têm que estar em comum acordo de que temos que acabar com a criminalidade.

As redes sociais têm ampliado o ódio e a insatisfação das pessoas. De que forma a internet pode se tornar um lugar mais seguro para o respeito à diferença?

Por um lado, é possível combater a violência nas redes sociais, e, por outro, criar um paralelo que transmita uma mensagem de paz, de não violência. Mas, quando a pessoa está por trás de um perfil, ela acha que pode falar o que quiser. Grupos extremistas, racistas, antissemitas, nazistas, homofóbicos e islamofóbicos acham que podem transmitir mensagens de forma aberta, sutil ou agressivamente. Na Educação, é importante que não tratemos o celular e a internet como negativos. É preciso introduzir esses elementos para que crianças e jovens tenham um pensamento crítico e possam fazer uma análise das informações que recebem nas redes sociais. Paulo Freire disse que o sonho do oprimido que não tem uma educação para a liberdade é se tornar o opressor. O oprimido que está na rede social pode se tornar o opressor se não passar pelo processo de educação, que é justamente o objetivo de Mãos para a Paz.

Como surgiu a ideia de montar a organização e qual é a filosofia do grupo?

Surgiu em 2008. Nós trabalhamos com israelenses, palestinos, judeus, mulçumanos, cristãos e drusos. O objetivo era, dentro de Israel e Palestina, fazer atividades comuns com toda a população. Isso pode ser um exemplo para o Brasil e, especialmente, para Salvador, onde um dos objetivos é criar atividades nas quais a gente misture as comunidades, criando um sistema heterogêneo. Em Israel, começamos com 40 crianças e, hoje, temos 20 mil. Na Palestina, temos uma associação que trabalha conosco, com mais duas mil crianças. Em Israel, trabalhamos com judeus e israelenses e também com a população na Palestina. Quando eu vi o Brasil, surgiu a ideia de criar uma rede internacional de Educação para a paz e não violência e juntar o saber. Como diria Paulo Freire, “não há saber mais ou saber menos: há saberes diferentes”.

SERVIÇO: CONGRESSO EDUPAZ*

Caminhada: Será realizada hoje a Caminhada Mãos para a Paz, em homenagem à Mãe Bernardete e contra a Violência, com início às 9h, a partir do Farol da Barra, em Salvador.

Presencial: De 25 e 27 de setembro acontecem em Salvador os Círculos de Escuta e a Maratona de Oficinas, com atividades presenciais, na Unijorge.

Quanto: Para participar da Maratona de Oficinas, o preço é de R$ 150 [Estudantes e pessoas com adversidades financeiras têm 50% de desconto]. Basta usar o cupom EDUPAZSOCIAL, que está no carrinho de inscrições para o Congresso.

*Programação completa e inscrições no site: congressoedupaz.com.br

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