CRÔNICA
E agora, aonde vamos? (Parte 2)
Crônica publicada na edição deste domingo, 11 de setembro, da Revista Muito

Por Evanilton Gonçalves*

Embora eu viva em uma cidade litorânea, não sei nadar. É fato inconteste que a ignorância sempre esteve ao alcance de todos. Todos temos, afinal, alguma. Quem tem coragem de assumir sua própria ignorância? Reparo que algumas pessoas andam em solo brasileiro irritadas com a ideia de serem ignorantes. De tanto assimilarem um arsenal de mentiras que incute ódio, foram perdendo habilidades humanas fundamentais, como as que permitem enxergar a vida em suas múltiplas formas. Assim, acredite se quiser, temos um contingente que prega o direito de violar direitos.
Quando penso nisso, uma imagem se forma nítida pra mim: um trator desgovernado avança contra nós, todos nós. Dentro de sua cabine, é possível ouvir dizeres delirantes, como “liberdade de expressão sem limites”, enquanto o condutor, cheio de orgulho e rodeado de pessoas penduradas em sua máquina, faz manobras arriscadas e passa por cima dos variados direitos a que temos direito. Alguma autoridade restaura a ordem, aplica uma multa devida. E então podemos escutar a resposta do condutor em coro com seu bando enfurecido: Viram? Ditadores!
Outro dia me vi incrédulo com as atitudes de algumas pessoas que pareciam possuídas pela malignidade do ódio, embora se apresentassem como religiosas. Então fui conferir se alguma coisa tinha mudado na bíblia, livro norteador de muitas dessas pessoas, mas claro que não, o versículo de 1 João 4:20 estava intacto: “Se alguém afirmar: ‘Eu amo a Deus’, mas odiar seu irmão, é mentiroso, pois quem não ama seu irmão, a quem vê, não pode amar a Deus, a quem não vê”.
Se não há verdade, não há saída. Mas há verdade e há saída. É claro que o caminho da felicidade ainda existe. Onde estávamos com a cabeça quando nos esquecemos em algum momento disso? Pra me proteger, guardo palavras de sabedoria: “Eu decidi ficar com amor. O ódio é um fardo muito grande para carregar,” disse o pastor e ativista pelos direitos civis Martin Luther King Jr.
O querer bem tem mais força do que atitudes odientas, minha gente. Pisar com força sobre a terra pra quê? Somos feitos de histórias, geografias, estações. Se encontrar algum cidadão com olhar aflito sobre solo brasileiro e este indagar: E agora, aonde vamos? Vamos, com nossa vida breve, a caminho da Primavera.
A frieza de nosso tempo invernal está indo embora. Você não percebe? A Primavera se aproxima. Ela traz consigo as tantas cores que nos animam e nos fazem lembrar da dimensão afetuosa que nos constitui como seres humanos. É com a Primavera que vem o cheiro bom de tempo renovado. Já pressinto o tempo agradável que se avizinha. Observo a firmeza do movimento das nuvens. Depois abro um livro que transborda calor humano. Na poesia encontro a resistência autoconfiante que me impulsiona a acreditar em dias melhores. Repito como um mantra os versos da poeta Mariana Paim: “a mudança / ainda / que lenta / sempre vem”. E eu espero que venha pro nosso bem.
*Evanilton Gonçalves é autor de Pensamentos supérfluos: coisas que desaprendi com o mundo (Paralelo13S)
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