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“Existe beleza na complexidade da vida”, afirma psicólogo Alexandre Coimbra

Escritor participa da 10ª edição do programa Fronteiras do Pensamento em Salvador

Por Gilson Jorge

30/03/2025 - 16:00 h
Alexandre Coimbra
Alexandre Coimbra -

Psicólogo, palestrante, consultor de Saúde Mental em empresas e escritor, Alexandre Coimbra, autor de livros como Toda ansiedade merece um abraço, e o mais recente, A esperança a gente planta, mantém ainda o podcast Cartas de um terapeuta, na oitava temporada, e é popular no Instagram, onde tem 229 mil seguidores. Ele estará em Salvador para participar da 10ª edição do programa Fronteiras do Pensamento, que vai promover mesas sobre psicologia e literatura e tratar sobre a subjetividade contemporânea e como construímos nossa narrativa pessoal em um mundo tão diverso e multifacetado.

Nesta entrevista ao A TARDE, Alexandre faz ponderações sobre a importância de refletir sobre os principais eventos de nossa vida cotidiana e a importância de buscar auxílio de amigos. Para ele, compartilhar os problemas com pessoas próximas pode ser tão ou mais importante que fazer terapia. O Fronteiras do Pensamento 2025 [que ocorre na Casa do Comércio, às 20h, com ingressos na plataforma Sympla] vai promover mesas entre os psicólogos Alexandre Coimbra e Ana Suy no dia 8 de abril, e com os escritores Itamar Vieira Junior e Jeferson Tenório, no dia 9.

A sua participação nesta edição do Fronteiras do pensamento gira em torno da discussão sobre como narrar as nossas vidas individualmente e as expectativas da sociedade. Explique, por favor.

Essa é uma ideia muito crucial do humano. Porque não basta viver, a gente precisa falar do que a gente vive. E nesse século atual, a gente tem vivido um problema que é a velocidade em que a vida tem se dado. Essa velocidade atrapalha a nossa capacidade de falar sobre o que a gente vive. Às vezes, de tempos em tempos, temos a sensação de estar soterrados de cenas e de experiências que não tivemos tempo de elaborar o que viveu. E elaborar significa ficar mais quieto, se escutar. Sentir e falar o que a gente tiver vontade de falar, com quem a gente tiver vontade de falar. Esse sentido, vamos fazendo muitas vezes sobre todas as coisas que nos importam, que nos atravessam, ou que são marcantes, a gente vai fazendo isso e vai colocando palavras: isso foi bom, isso foi ruim, isso foi trágico ou foi uma virada de chave. Vamos construindo a vida em cima disso. Então, nós somos basicamente seres de linguagem. Esse exemplo é para a gente conversar sobre o que é que a gente tem feito na nossa vida. Como é que a gente tem se dado tempo para colocar boas palavras, palavras que façam sentido para a gente, que nos representem, que sejam coerentes com o que a gente viveu? Como é que a gente tem feito para colocar essas palavras nas cenas que nos importam?

E o que são as cenas importantes?

As cenas importantes são aquelas que não saem da nossa memória, que ficam apertando a nossa mente, como diria o bom léxico baiano. As cenas que nos importam podem ser desde um orgasmo até uma violência. Todas as emoções humanas podem gerar cenas importantes. Aqui tem uma coisa: tem-se difundido uma ideia falsa de que as cenas importantes são só as cenas felizes, que o que nos importa é a felicidade. Não é verdade. Muitas vezes, grandes viradas na vida e grandes ajustes para a vida ficar mais a nossa cara começam com cenas horrorosas, com cenas de muita dor. Se a gente se debruça sobre essas cenas, se dá tempo para elas serem compreendidas, aquilo pode ser o início de uma jornada de reformulação da própria existência. Cenas importantes são aquelas que a gente sabe, do lado de dentro do peito, que elas não foram cenas ordinárias. Agora cenas importantes também são aquelas cenas vividas com pessoas importantes. Isso também é uma coisa para a gente sublinhar nesse século: a gente tem vivido poucas cenas com pessoas importantes. Um dos questionamentos que temos feito para essa velocidade em que a vida tem acontecido é o quanto eu tenho me disponibilizado a estar com quem me importa. Porque aí eu também sou um agente na produção dessas cenas e não deixo simplesmente que a vida transcorra. Porque se eu deixar que a vida transcorra, eu posso passar um fim de semana inteiro anestesiado, de tela em tela, e esse tempo não ter sido minimamente dividido, multiplicado e vivido com pessoas que possam agregar mais sentido à minha vida.

Aí o senhor fala da importância de não resistir à realidade, de não mascarar situações de desesperança, por exemplo. Para algumas pessoas é difícil enxergar a realidade como ela é. Às vezes, os amigos pontuam que a pessoa está em uma determinada situação, mas ela não vê. Como lidar com isso?

É do humano se defender do encontro com o que é mais difícil. Isso vai acontecer sempre. Mas a questão é que os grandes dramas da vida, as grandes questões, vão nos encontrar. Se a gente evitar prestar atenção nelas, esses sintomas vão crescer e isso vai passar de ser um sussurro a um grito. Quanto mais aumenta o volume desse sintoma, desse problema, mais difícil fica não dar atenção para ele. Maturidade significa compreender que não podemos ser regidos somente pela busca do prazer. A sustentação da vida inclui você enfrentar aquilo que é mais doloroso e que te faz desanimar mais na sua própria vida. O que eu defendo é que essas circunstâncias da vida não precisam ser vividas de forma solitária. A gente tem escutado mensagens dizendo que você tem que dar conta de tudo sozinho, que sucesso é você se superar sozinho. Eu desacredito nisso fortemente. Eu acho que a gente só sai de grandes imbróglios, de grandes tretas, grandes dificuldades e desafios da vida coletivamente. Mesmo as pessoas que se consideram grandes heróis de suas próprias vidas podem estar invibilizando uma série de pessoas responsáveis por esse processo de superação. Quando a gente pensa na vida coletivamente fica mais fácil imaginar esse processo de deixar de se defender para encarar o problema de frente, se você estiver de mãos dadas com outras pessoas.

E aí chegamos a um ponto curioso. O senhor falou que a terapia, sozinha, pode ser ineficiente, e que tão importante quanto a terapia é a decisão de compartilhar sua vida com amigos...

Se você for pensar, a terapia acontece uma hora por semana. E o que você faz nas outras 23 horas do dia e nos outros seis dias? Como é que você leva a sua vida? A terapia não produz sentido para a vida, necessariamente. A terapia é um processo reflexivo. Produção de sentido na vida acontece fora da terapia, inclusive. Você vai usar essas reflexões da terapia para pensar como fazer a sua vida florescer, como fazer que ela tenha mais a sua cara. Só a terapia, realmente, não adianta. A terapia pode ser excelente, bem-sucedida, o profissional pode ser ótimo. A pessoa pode estar muito aderida à terapia, mas ela precisa de muito mais coisas para que a vida dela se transforme numa vida interessante para ela. Além disso, o que estou querendo dizer é que pessoas que não fazem terapia podem ter uma vida belíssima, podem ter uma vida muito interessante e plena de sentidos. Basta que elas se escutem e percebam, de tempos em tempos, o que está precisando acontecer na sua vida para que ela tenha mais a sua cara, que coisas estão incomodando e que você não vai deixar de escutar, não anestesiar o seu incômodo para servir a alguém. O que você vai fazer com esse incômodo sobre a sua vida? Que transformações fazer a partir daí? A pessoa não precisa fazer terapia para se fazer essa pergunta.

Vamos voltar à ênfase absoluta na felicidade a partir de uma frase sua. O senhor diz: "A vida é uma aventura de curvas surpreendentes atravessada por chuvas de granizo entre sóis e noites". De um lado, temos pessoas com dificuldades em focar nas coisas boas que lhes acontecem. Mas também há o contrário, pessoas que agem como se o sol estivesse sempre presente em suas vidas. É saudável essa postura de que está tudo lindo, que nunca há problemas?

Não é saudável porque ela não corresponde à realidade. Não é saudável porque você está fazendo uma ocultação de uma parte da vida. E tudo o que a gente soterra e deixa de perceber, voluntária ou involuntariamente, não vai necessariamente desaparecer. Existe beleza na complexidade da vida. Existe beleza em todos os estados humanos. Existe beleza na saudade, existe beleza na tristeza. Existe beleza no medo. Quando uma criança sente medo e se aproxima do pai e da mãe e vive um abraço gostoso, tem beleza naquele abraço. Quando a gente vive um luto e chora a perda de uma pessoa querida com uma outra pessoa tem beleza nesse abraço. Existem belezas possíveis de serem vividas em todos os estados humanos. Quando a gente despreza um pedaço da vida para considerar que só os felizes é que valem a pena, a gente está vivendo pela metade. Isso para dizer o mínimo. Agora, a maturidade é uma das buscas do humano, a gente atinge graus de maturidade e diz assim: "Eu não troco a minha vida de hoje pela de ontem" porque eu consigo ver a vida com muito mais profundidade. A gente atinge a maturidade quando consegue olhar para todos esses estados da vida, quando consegue perceber a vida em toda a sua complexidade.

O psicanalista Contardo Calligaris (1948-2021) disse certa vez que ele não queria ser feliz, mas ter uma vida interessante...

Esse conceito do Contardo é maravilhoso, porque ele está fazendo o contraste com essa ideologia da felicidade, que é uma grande burrice do nosso tempo. Essa preocupação em ser feliz tem retirado do humano a possibilidade de aprender com todos os estados da vida.

O senhor tem uma forte atuação no Instagram, uma rede social que tem um ambiente em que as pessoas costumam ostentar felicidade. É uma rede muito calcada na imagem que se quer projetar para o outro. Como é o exercício da psicologia em um ambiente como o Instagram?

O Instagram é uma grande vitrine de ideais. E eu acho que a gente já ganhou alguma maturidade para lidar com essa rede. Para entender essa rede inclusive como um lugar tóxico. Porque ela se apresenta e se estrutura dessa forma. Eu já sinto as pessoas mais sábias para usar essa rede, inclusive para deixar de seguir pessoas que estão o tempo inteiro performando uma adequação e um ideal de si que é uma mentira que elas estão contando para si mesmas e para o mundo. Uma coisa importante no uso do Instagram é saber quem você segue e prestar atenção a como você fica em relação aos conteúdos que você está seguindo. Como esses conteúdos produzem bem-estar ou mal-estar em cada um de nós.

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