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Festas fora dos circuitos tradicionais levam multidão para as ruas

Iniciativas na cidade garantem a folia antes dos dias oficiais do Carnaval em Salvador

Por Gilson Jorge

12/02/2023 - 6:00 h | Atualizada em 12/02/2023 - 13:03
O Urso da Meia-Noite, na última quinta, no  Santo Antônio
O Urso da Meia-Noite, na última quinta, no Santo Antônio -

Por volta das 14h da última quinta-feira, dia 9, duas jovens saídas da Praia da Preguiça, com os shorts ainda molhados pelos biquínis, postaram-se em frente às bandejas de comida a quilo no Bar e Padaria San Vicente, no Dois de Julho, para pedir o almoço.

A menos de três metros delas, duas comerciantes locais discutiam as quantidades de copos plásticos necessários para a noite de sexta-feira, quando aconteceu o primeiro desfile de bloco no bairro dos últimos anos. No meio da conversa, surge o comentário sobre a falta de recursos que a vizinha Preguiça enfrenta este ano para realizar o tradicional Banho de Mar à Fantasia.

Unidas pela Rua Visconde de Mauá, Preguiça e Dois de Julho enfrentam o período pré-carnavalesco com ânimos e objetivos diferentes. No fim da Visconde de Mauá, onde se encontra o Centro Cultural Que Ladeira é Essa?, a organização do Banho à Fantasia articula como garantir atrações musicais que garantam a permanência do público de classe média na área ao longo do dia e gerem clientes para cerca de 250 vendedores ambulantes, muitos deles moradores da região.

O tradicional Banho de Mar à Fantasia na Ladeira da Preguiça: 40 mil pessoas em 2020
O tradicional Banho de Mar à Fantasia na Ladeira da Preguiça: 40 mil pessoas em 2020 | Foto: Raul Spinassé| Ag. A TARDE

"Estamos tentando pelo menos garantir o escoamento do material que foi comprado pelos ambulantes", afirma o diretor do Centro Cultural, Marcelo Teles. Ele lamenta a falta de patrocínio e de apoio do poder público para uma festa que em sua última edição antes da pandemia atraiu para a ladeira, segundo seus cálculos, cerca de 40 mil pessoas.

Em uma nota de esclarecimento emitida essa semana, Teles destaca a importância do modelo de economia criativa para a geração de renda em uma comunidade com alto grau de informalidade no mercado de trabalho.

No Dois de Julho, por outro lado, a organização do estreante bloco Chupeta Doce pretende superar a imagem do bairro como um ponto de serviços (segurança, bombeiros e saúde) durante a folia e seguir o exemplo do Santo Antônio Além do Carmo, que com seus 14 bloquinhos atrai para o bairro em oito dias de folia milhares de soteropolitanos de outros bairros.

Parte desse público acaba voltando ao longo do ano para a Rua Direita do Santo Antônio, que se transformou em um pequeno polo gastronômico. E foi de um produtor cultural que participou durante cinco anos do pré-carnaval no Santo Antônio que surgiu a proposta do Chupeta Doce. "Eu nasci e cresci no Dois de Julho. Fazer um bloco aqui é um sonho antigo", afirma Chico Gomes, que mora e trabalha no bairro.

Chico Fomes traz o bloco Chupetinhas para o Dois de Julho.
Chico Fomes traz o bloco Chupetinhas para o Dois de Julho. | Foto: Raphael Muller | Ag. A TARDE

Incomodado com a participação do largo na folia se limitar a ponto de armazenamento de latas para reciclagem e módulos da polícia, bombeiros e serviços de saúde, Chico decidiu botar seu bloco na Rua.

Com o apoio da Associação Comunitária do Largo Dois de Julho e Adjacências (Aclaj) e depois de audiências com a Saltur, o projeto para o Chupeta Doce fechou dois dias antes do evento o patrocínio da Bahiagás, que garantiu a contratação de um minitrio para a apresentação de Armandinho Macedo.

A depender da repercussão, pode ser um embrião para que surjam novas atrações no futuro e mais pessoas se animem a virar à direita na Rua Carlos Gomes para frequentar o largo. "Desde o início, o Dois de Julho tem esse perfil boêmio. E a gente tem essa vontade de que tenha uma vida cultural, que ofereça entretenimento para as pessoas", diz o diretor da Aclaj, o fabricante de cachimbos artesanais Aldir Leal.

O pensamento da Associação é criar um Carnaval diferente bem no centro da cidade, com repertório musical das folias mais antigas, gerar uma maior visibilidade para o bairro e ajudar a movimentar o comércio. "A gente tem aí o modelo do Santo Antônio", admite Leal.

"O principal bloco do bairro é o De Hoje a Oito, que saiu ontem e costuma levar muita gente", diz o DJ Guerreiro, presente no Carnaval do Santo Antônio há cinco anos e que vai estar na quarta-feira, dia 15, no bloco Gravata Doida, junto com Armandinho, Alexandre Peixe e Magary Lord.

O modelo do Carnaval dos bloquinhos não é, entretanto, unanimidade entre moradores e comerciantes daquele bairro. Em uma postagem no Instagram, o Brechó do Cabral definiu o Carnaval no Santo Antônio e no Carmo como "um péssimo negócio para os comerciantes ali estabelecidos", referindo-se à retirada de mesas na área externa no momento da passagem dos blocos. Há também queixas sobre o uso das ruas como sanitário público. Alguns estabelecimentos da rua principal cobram de R$ 3 a R$ 5 pelo uso do banheiro.

O movimento dos bloquinhos de Carnaval fora do circuito oficial em Salvador, no entanto, não é novo e não se limita aos bairros centrais. Por toda a cidade, os motivos para botar o cordão na rua vão desde os econômicos até a preservação da identidade cultural e a celebração com vizinhança num clima tranquilo, até porque muitos foliões de bairro não frequentam depois os circuitos Dodô e Osmar.

Na visão de Goli Guerreiro, PhD em antropologia, há duas dinâmicas opostas organizando o Carnaval. "Há os bairros da cidade criando os seus microcontextos e seus blocos, tentando se manter na comunidade, e há os megaeventos e os grandes blocos, que cada vez mais ganham espaço. Há uma tensão entre esses dois modelos", afirma Goli.

Ela acrescenta que há ainda o modelo de eventos pré-carnavalescos como o Fuzuê e o Furdunço que se mostram cada vez mais vigorosos. Para ela, a tensão entre modelos carnavalescos não é exclusividade do Carnaval soteropolitano e pode ser observada em outras grandes cidades brasileiras.

Visão parecida com a de Arthur Daltro, sócio do bar Velho Espanha e um dos responsáveis por duas iniciativas carnavalescas em Salvador. Ontem, foi realizado pela 15ª vez o Carnaval Etílico do Movimento Etílico dos Barris, com um baile à fantasia no Passo.

E na quarta-feira e na segunda-feira de Carnaval, respectivamente, acontece o desfile dos blocos Moraes e Moreira. As agremiações, criadas em homenagem ao cantor baiano, em 2019, saem primeiro nos Barris, onde moram os fundadores, e depois na Mudança do Garcia, com os dois blocos simulando uma rivalidade entre si. Na verdade, é uma citação à frase "Na Praça não cabe disputa", da canção Por que Parou, Parou Por que?, de Moraes. Aliás, os bloquinhos desfilam esse ano com o tema Carnaval da Saudade, já que é a primeira folia sem Gal Costa, Riachão e o próprio Moraes.

Movimento nacional

Sobre a expansão dos bloquinhos, Arthur destaca que isso vai além de Salvador: "Há um movimento nacional de valorização do Carnaval de rua". Aliás, São Paulo, maior metrópole da América Latina e que já foi chamada de túmulo do samba, passou nos últimos anos de uma tentativa de competir com os desfiles de escola de samba do Rio a um dos mais animados carnavais de rua do país, com blocos ocupando as ruas do centro paulistano antes mesmo da folia oficial. O que levou o jornal Estado de São Paulo a publicar um irado editorial, reclamando o direito de ir e vir, sob o título "Mesmo no Carnaval, as leis valem".

O doutor em antropologia Tedson Souza faz uma distinção entre dois modelos de blocos pré-carnavalescos. De um lado, ele aponta o que considera a gourmetização dos bloquinhos em bairros como Rio Vermelho e Santo Antônio.

"São festas de pessoas brancas de classe média, universitários, artistas, gente cult. Você não vê ninguém carregando um cooler. Não há a corda física, mas há uma perpetuação do folião branco e do ambulante negro", destaca Tedson, recém-admitido como professor de jornalismo na Universidade Federal do Tocantins.

Por outro lado, o acadêmico vê iniciativas populares de manutenção do velho espírito momesco, a diversão acessível a todos, em bairros como Mussurunga, o Nordeste de Amaralina e o Subúrbio Ferroviário.

Menorzinho

Mas afinal, como diz a canção do Ilê Aiyê, que bloco é esse? Ou melhor, que bloquinho é esse? O que leva as pessoas às ruas para brincar antes do Carnaval? Em Paripe, aconteceu ontem pelo oitavo ano a Festa de Caretas de Tubarão, em que moradores desfilam pelas ruas com caretas, uma tradição trazida do Recôncavo Baiano por migrantes há mais de quarenta anos e que foi retomada numa iniciativa da Associação Cultural Quilombo Aldeia Tubarão, Quial Tubarão.

"Nós chamamos vários artistas, mas esse ano a gente resolveu fazer o evento menorzinho. Quisemos garantir diversão, mas sem pensar muito em como custear. A gente antes gastava muito tempo pensando em como conseguir dinheiro. Quem quiser, se chegue", explica a ativista cultural Mãe Natureza, fundadora da Quial Tubarão.

Na Vila Laura, a ideia de lançar um bloquinho de rua surgiu há cinco anos com a conversa de amigos em um boteco do bairro. Como o objetivo não era ter lucro, pensou-se em um modelo em que as camisetas do bloco Sagalera fossem trocadas por doações. No início, eram alimentos não-perecíveis doados ao Lar da Criança, em Brotas.

Atualmente, a troca é por duas latas de leite que são entregues ao Hospital Martagão Gesteira. No total, são 500 camisas. Mas além das pessoas que fazem a doação, há moradores que mesmo sem camisa se juntam ao bloco. "Estimamos um público de mais de mil pessoas", afirma Leandro Nascimento, um dos criadores do Sagalera. O bloco desfilou nas ruas da Vila Laura no último dia 4.

Mais modesto e em seu primeiro ano, o Água Dura Minha Porra reuniu 120 pessoas no Setor L de Mussurunga, no último domingo, ao som de uma charanga. "O nome do bloco é uma homenagem a Seu Zuza, morador antigo do bairro que sempre passava pela rua gritando esse bordão", afirma o publicitário Rafael Lemos, um dos fundadores do Água Dura. O bom da festa assim, em pequeno porte, é que diminui a demanda por banheiros. Mas de qualquer forma, haja fígado para tanta folia!

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