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Ipac exibe mostra de Patrimônios Culturais Imateriais da Bahia
Por Gilson Jorge

Baianos puristas podem entrar em crise existencial ao consultarem as listas de patrimônios imateriais dos Estados brasileiros. Enquanto o frevo permanece essencialmente um produto cultural pernambucano, atividades como rodas de capoeira e ofícios de baianas de acarajé estão registrados nos livros de saberes de todas as unidades da Federação: Rondônia, Acre, Santa Catarina, Rio Grande do Sul. Dá para imaginar um tacho de dendê no Centro de Blumenau ou na Oktoberfest? Tem nada não. A gente se vinga com os churrasquinhos na farofa.
Bairrismos à parte, o site do Iphan apresenta a Bahia como o estado dos patrimônios imateriais. Segundo dados do Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural (Ipac), órgão estadual, a Bahia tem neste momento 38 itens catalogados como patrimônios imateriais. São 25 permanentes e 13 temporários.
Algumas dessas manifestações culturais foram contempladas com recursos da Lei Aldir Blanc e renderam livros, documentários e websites e estão em exposição até o próximo mês de julho na diretoria de Patrimônios Imateriais do Ipac, no Pelourinho. Ao todo, foram R$ 9 milhões em verbas que normalmente iriam para a produção de espetáculos teatrais, livros e CDs.
Como a pandemia travou a produção cultural, esses recursos captados junto à iniciativa privada foram revertidos para a promoção de bens imateriais, como o Carnaval de Maragogipe, com suas máscaras ludicamente assustadoras.
"Temos também o ofício de vaqueiro, registrado em 2011 e presente em todo o território baiano e a Festa de Santa Bárbara, que abre o calendário de festas populares da Bahia", afirma o diretor de Preservação do Patrimônio Cultural do Ipac, o psicólogo Roberto Pellegrino, irmão do ex-deputado federal Nelson Pellegrino.
Folclore
Antes da Constituição de 1988, a maior parte do acervo cultural espalhado pelo país era encarada como folclore. "Mário de Andrade, lá atrás, já chamava a atenção para as manifestações que via em suas viagens pelo país. O Iphan tinha um centro de folclore, mas é a Constituição que reconhece como patrimônio", diz.
O gestor destaca o sentido de oportunidade, dentro de um panorama caótico. "A pandemia é uma tragédia. Mas houve essa possibilidade e nós propusemos ao diretor geral do Ipac que esse dinheiro fosse usado para fazer a salvaguarda. E ele teve muita sensibilidade ", afirma.
Salvaguarda, que significa a oferta de proteção por parte do poder público, é um termo usado no âmbito do patrimônio cultural desde que a ONU criou, em 2006, a Convenção da Unesco para a Salvaguarda de Patrimônios Culturais Imateriais.
Assinada pelo Brasil naquele mesmo ano, a convenção busca proteger manifestações culturais feitas através de instrumentos e objetos que sejam associadas a uma determinada comunidade.
Ainda que muitas vezes as autoridades não tenham clareza sobre o que fazer em questões concretas que afetam os agentes do patrimônio cultural, a burocracia estatal aposta na noção de colocar o assunto em discussão.
Dendê
Um exemplo disso é a escassez no mercado de dendê, matéria-prima das baianas de acarajé. A produção do azeite caiu em 37% ao longo dos últimos quatro anos, por questões que envolvem falta de mão-de-obra para a colheita, e dificuldades tecnológicas. Como resultado, o preço do produto subiu 146% e há risco de faltar o óleo de palma, base para o azeite e que também é ingrediente para alguns biocombustíveis.
Até agora, ainda não se materializou uma solução para esse impasse de um dos bens imateriais mais expressivos da cultura baiana. Mas a ansiedade das baianas com o assunto vai ser tema de uma roda de conversa no Ipac amanhã, dia 28, com o professor Alcides Caldas, titular do Instituto de Geociências da Ufba e coordenador do projeto de pesquisa e extensão Indicação Geográfica do Azeite da Costa do Dendê.
"Não vai se encontrar uma solução, mas pelo menos coloca o assunto em discussão", afirma a coordenadora de educação patrimonial do Ipac, Daiana Sacramento.
Técnico em Patrimônio imaterial, o sociólogo Nestor Sales ressalta a importância de se patrimonializar manifestações culturais que são relevantes em suas comunidades, mas que não são conhecidos pelo grande público, como a Zambiapunga e os vaqueiros.
"Essa diretoria de patrimônio imaterial é importante porque é ela que fornece os estudos, os dossiês, o arcabouço necessário para o processo", afirma Sales.
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