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Leonardo Araújo: "sofrimento psíquico deve ser tratado com seriedade"

Psiquiatra e psicoterapeuta elenca sinais de que alguém precisa de ajuda psicológica

Por Renato Alban

10/09/2023 - 11:00 h
O psiquiatra e psicoterapeuta
O psiquiatra e psicoterapeuta -

“Se um problema causou sofrimento, começou a atrapalhar as atividades da vida diária, trouxe irritabilidade, desesperança e insônia, aí o sinal vermelho é acionado”. Esse é o alerta do médico psiquiatra e psicoterapeuta Leonardo Araújo. No mês da prevenção ao suicídio, o Setembro Amarelo, o especialista elenca sinais que podem ajudar as pessoas a notar se elas ou alguém próximo precisa de ajuda profissional, como automutilação, depressão, inquietude e pensamentos recorrentes sobre morte.

“É preciso que a gente aborde esses temas de maneira clara, sem tabus”, afirma Leonardo, que atende no centro de saúde mental Holiste, e esclarece que a pessoa em sofrimento deve recorrer a um profissional da área para uma intervenção. Leonardo destaca ainda que é possível solicitar apoio emocional do Centro de Valorização da Vida (CVV) pelo telefone 188 ou pelo site www.cvv.org.br.

O tema da saúde mental é abordado no Brasil com a responsabilidade e amplitude que merece?

A abordagem desse tema melhorou muito no país nos últimos anos, mas ainda está aquém do necessário. Observo um cuidado da mídia em não publicar mais vídeos de suicídio, cartas de despedida ou fotos da pessoa. O tema também tem sido tratado de forma mais abrangente nas redes sociais, o que faz com que o assunto chegue a uma população maior e o debate seja mais disseminado.

Como o cuidado com a saúde mental e a prevenção ao suicídio deveriam ser abordados nas escolas e famílias?

Esse é um assunto muito importante. Para se ter ideia, nos Estados Unidos, a terceira causa de morte entre crianças de 10 a 14 anos é o suicídio. É preciso que a gente aborde esses temas de maneira clara, sem tabus e sempre reforçando que o sofrimento deve ser tratado com seriedade, e não de maneira romantizada. O suicídio é o ápice desse sofrimento psíquico. Essa é a principal forma de informar uns aos outros no núcleo familiar e nas escolas. Também é fundamental trazer sinais que despertem o interesse do outro para a saúde mental não tão satisfatória.

Quais são esses sinais?

O principal sinal de que alguém pode vir a ter pensamentos de morte é quando ele passa a ter sentimentos de desesperança vinculados à vida. Esse sentimento é o mais associado ao pensamento de idealização, planejamento e tentativa de suicídio. Além disso, sinais de automutilação, depressão, irritabilidade e inquietude. Normalmente, o suicídio vem acompanhado de um transtorno mental. Segundo alguns estudos, entre 90% e 98% das pessoas que se suicidam têm transtornos mentais. Mas esses transtornos não vêm isolados. Por exemplo, pode acontecer bipolaridade com abuso de álcool ou depressão com abuso de algum outro tipo de substância. São patologias que descrevemos como “duais” e que fazem com que o sofrimento se potencialize e culmine no suicídio.

Ao perceber esses sinais, qual atitude a pessoa em sofrimento deve tomar?

Dividir esse sentimento de desesperança é fundamental para que ela dê oportunidade ao outro de buscar um profissional de saúde mental que possa intervir o mais precocemente possível. O suicídio é o ápice da maior gravidade da doença mental, então, existe um amplo caminho que a gente pode intervir antes que se agrave a tal ponto. A medida mais importante é buscar um profissional de saúde mental. Existe também o Centro de Valorização à Vida. Caso a pessoa não queira compartilhar com alguém próximo que ela está tendo pensamentos de morte, ela deve acionar o Centro.

Qual é a diferença da reclamação da vida banal e de um desgosto pela vida?

A todo o momento em que qualquer insatisfação gere um sofrimento genuíno na pessoa, esse sofrimento deve ser tratado enquanto transtorno de saúde mental. De fato, vivemos numa sociedade em que existem muitas complicações e a vida traz muitos problemas, no entanto, essas questões, a depender da capacidade de resiliência do indivíduo podem ser sanadas sem nenhum cuidado maior. Mas, se um problema causou sofrimento, começou a atrapalhar as atividades da vida diária, trouxe irritabilidade, desesperança e insônia, aí o sinal vermelho é acionado.

Quais outros fatores estão relacionados ao suicídio que não os transtornos mentais?

Muitas vezes o que ocorre são questões que estão vinculadas ao ajustamento de uma situação. Pode ocorrer algo muito inesperado na vida do sujeito e, mesmo sem nenhum transtorno mental diagnosticado, ele vê a morte naquele momento como a única solução. Sobretudo se ele já for uma pessoa impulsiva. Mas essa é a imensa minoria dos casos. Normalmente, aquele indivíduo mais impulsivo é que age assim, mesmo em situações de ajustamento. São aqueles que possuem um transtorno mental de base.

Como fazer com que a campanha do Setembro Amarelo chegue a grupos com menos acesso a tratamentos de saúde mental?

Temos as estruturas de Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), que são financiados pelo SUS, mas, que, de fato, são muito cheios e o acesso é demorado. Por isso, para que essa informação circule, precisamos da ajuda da mídia, jornal, TV e redes sociais, através de campanhas que previnam o suicídio. Vale salientar que algumas das medicações, tanto das mais baratas quanto das de alto custo, são oferecidas pelo SUS.

Como a Bahia está colocada em termos de cuidados à saúde mental em comparação a outros estados? E em acometimento da população?

A Bahia está num lugar muito semelhante ao restante do Brasil no que tange à Saúde Pública e atendimento à saúde mental. Mas, no âmbito privado, nós temos unidades de saúde que dispõem de tratamentos de ponta, inclusive, vinculados ao pensamento de morte, com programas específicos para transtornos mentais. É um nicho muito experiente e muito voltado para sanar esse sofrimento. Em relação à epidemiologia, quantidade de pessoas que adoecem, a Bahia não se difere muito do resto do Brasil. São doenças muito homogêneas no que diz respeito à prevalência e incidência.

O Brasil é um país muito conservador e religioso. Acredita que existe alguma influência desses dogmas na nossa percepção da importância do cuidado com a saúde mental no país?

Acredita-se que a religiosidade nos transtornos mentais leves e moderados é protetora do suicídio. Assim como casar e ter filhos. Mas, em situações em que o transtorno mental é extremamente grave, a busca do cuidado exclusivamente na religiosidade não protege o sujeito. Ajuda bastante nos casos mais leves, mas pode atrapalhar nos mais graves. Acontece de o paciente relatar que o orientador religioso disse que os remédios vão intoxicá-lo, por exemplo. Nesses casos graves, quando há essa interferência, existe sim um maior nível de chances de suicídio. O ideal é que haja uma sinergia entre dogmas e tratamento, que pode acontecer sem nenhum atrito, porque essa conversa pode ser muito produtiva, desde que se respeitem ambos.

O uso de remédios é o maior tabu da saúde mental?

É um dos mais importantes. O uso de medicação, assim como o internamento psiquiátrico, tem um estigma muito forte. E muitas pessoas confundem o uso do remédio com o estado de estar louco, psicótico, e não é necessariamente o caso. Quando falamos de um paciente psicótico, falamos de alguém desconectado da realidade. Mas o que nós vemos, na grande maioria dos casos, são pessoas que estão sofrendo com transtornos de humor, ansiedade ou depressão em que o uso da medicação pode ajudar. Os remédios não viciam e, de acordo com a evolução do paciente, podem ser desmamados e suspensos. O paciente pode viver muito bem, aliando a medicação à psicoterapia e à prática de atividade física. Ou seja, a gente pauta o tratamento não só no medicamento, mas na prática de atividade física, remédio e psicoterapia.

Outro estigma que se relaciona com a pessoa que comete suicídio é o de que ela é alguém que fracassou. Mas é muito mais complexo que isso, certo?

Sim, o indivíduo que comete suicídio está num nível de sofrimento tamanho que só consegue visualizar a morte como solução do problema, e não necessariamente o fracasso. Geralmente, já foi submetido a vários tratamentos que não deram certo, o que faz a pessoa perder a esperança. Mas é uma esperança que deve ser mantida. Novos tratamentos estão em andamento para atuar exatamente no pensamento de morte. Temos hoje medicações que remitem esse pensamento de morte em até 24 horas. Então, a mensagem maior é que quem comete suicídio não é uma pessoa fraca, mas alguém em extremo estado de sofrimento.

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