CRÔNICA
Minha futura família olímpica
Confira matéria da revista Muito deste domingo
Por Clara Cerqueira
Findados os jogos olímpicos, fico com aquela sensação de vazio que me acomete quando uma série ou um livro muito bons acabam e nada será capaz de substituir aquele momento de prazer da mesma forma. Quando se trata de uma série, faço a conta do tempo que falta para a próxima temporada e trato de me conformar, já com os livros, tiro um tempo para digerir o que li e começo a vasculhar minha estante à procura de novas aventuras, até encontrar algo que me apeteça. Alguns com certeza dão mais trabalho de substituir que outros, foi muito difícil desapegar da escrita de Isabel Allende, por exemplo, mas terminei encontrando Toni Morrison e deu tudo mais que certo.
Como lidar, porém, com algo que só será reeditado daqui a quatro anos? Eis o meu atual dilema.
Depois de passar dias acordando, ligando o streaming com os jogos e passando um café para começar a vida, como viver sem as competições do skate que aprendi a amar há exatos quatro anos por causa da Fadinha, sem todo o brilho das meninas da ginástica, sem o frio na barriga das partidas de vôlei de quadra, sem a final emocionante do vôlei feminino de praia e sem o atletismo – as corridas, os saltos, as varas? Sinceramente, não consigo pensar em pessoas mais bonitas que aquelas, correndo e pulando como seres mágicos, desafiando todas as leis da física. Fico sem palavras para descrever como eles me emocionam. Até o surf eu aprendi a amar.
Não que o esporte não mereça ser amado, mas eu não fazia a mais remota ideia de como funcionava a competição, então achava que não gostava. Tudo mudou quando assisti as finais e entendi que quem manda ali é o mar e se os atletas não estiverem em sintonia fina com ele não vão conseguir mostrar nada do que sabem. É muito louco ver o povo clamando por Poseidon e pedindo “pelo amor de Deus uma onda”, porque o mar estava uma piscina e de repente ver uma onda incrível chegar, como que atendendo a pedidos, e torcer para o atleta que está lá no meio do deserto de água saber ler a onda e se posicionar bem, conseguir remar, subir na prancha, entrar no tubo, permanecer no tubo o maior tempo possível, sair dele com elegância e conseguir mais manobras para subir a pontuação, até dar de cara com uma barreira de corais capaz de matar qualquer um só de susto. Que Poseidon proteja e abençoe esses seres do mar.
Então, chegamos ao fim. Os jogos olímpicos acabaram e eu aqui nessa solidão. Quatro anos é tempo demais, o que vou fazer até lá? Foi então que decidi duas coisas: a primeira delas é que preciso que o mesmo canal de streaming que transmitiu as olímpiadas transmita os jogos paralímpicos, as olimpíadas de inverno, pelo menos os mundiais de skate, ginástica, ginástica rítmica e surf e o campeonato nacional de futebol feminino – eu não falei delas antes né, acho que bloqueei a final da memória por motivos que me parecem óbvios, mas elas jogam muito; fora isso, decidi também que quero um atleta olímpico na família.
Não me interessa que eu não tenha nenhuma aptidão para os esportes, vou cobrar da próxima geração sim. Preciso que eles providenciem pelo menos um atleta de ponta para chamar de meu. Já decidi até quem é que tem que fazer esse esforço hercúleo, só falta o jovem de 14 anos em questão concordar comigo. Vocês hão de convir que uma pessoa que faz natação, basquete, judô, karatê e futebol de salão pode muito bem escolher uma dessas atividades e treiná-la para fazer minha vontade nas olimpíadas de 2028, quando teremos que brigar com os gringos em casa. Ainda digo mais, se os brasileiros com membros na família com idade propícia para treinar para os próximos jogos fizerem essa campanha, o Brasil sobe bonito no quadro de medalhas. Fica a dica!
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