PERFIL
O ativismo inspirador de Mario Amici
Médico incentivou arborização e transformou paisagem no Alto do Itaigara
Por Renato Alban
Em cinco anos, o espaço asfaltado em meio a prédios no Alto do Itaigara se transformou em uma praça, com gramado, bancos e plantas. A calçada, antes diretamente sob a luz do sol, recebeu a cobertura de copas de árvores. A mudança ocorreu pelas mãos dos moradores do loteamento, liderados pelo vizinho e médico Mario Amici.
“Era um espaço de concreto para estacionamento. Olhei e pensei em como aquele espaço precisava de árvore”, conta Mario. No local, ele colocou uma placa: “Uma pracinha vai surgir aqui”. “Essa plaquinha ficou mais de um ano lá, ninguém nem levava mais fé”. Até que, finalmente, Mario recebeu liberação da prefeitura para montar a praça.
Com a ajuda de outros moradores do Alto do Itaigara, o médico plantou 18 mudas de árvore no que se tornaria a Praça do Alto, recém-inaugurada com bancos e até casinha de passarinho. “Quando você planta uma árvore, você planta também um lugar de convivência. O amor nasce dessa conexão, desse abraço”, afirma.
Foi com essa concepção que o médico mudou toda a paisagem do Alto do Itaigara. Antes da Praça do Alto, na rua Doutor Hosannah de Oliveira, ele já tinha sido pioneiro no plantio de árvores, nas calçadas do loteamento, e na criação do Recanto São Francisco, na rua Reitor Macedo Costa. “Comecei a montar uma calçada, que virou um canteiro, uma praça e, depois, o Recanto”.
Com horta, fonte e árvores de diferentes espécies, o Recanto teve o apoio da prefeitura de Salvador para a instalação de iluminação e doação de equipamentos reutilizados, como bancos. Esse contato com a administração municipal é uma estratégia do médico para a viabilização dos projetos.
À frente da Secretaria de Sustentabilidade, Inovação e Resiliência entre 2014 e 2020, o engenheiro ambiental André Fraga foi procurado por Mario em diversas situações. “Admiro em Mario essa capacidade de estar sempre articulando, em movimento, dialogando com vizinhos, empresários, poder público, de meter a mão na massa e não só reclamando, ele vai lá e faz”, diz André.
Apesar do apoio público, Mario defende que a iniciativa que comanda é obrigação de moradores de bairros mais ricos. “Salvador é uma cidade em que mais de 80% das pessoas vivem em situação precária. Achar que a prefeitura pode resolver tudo, não pode. O recurso deve ser distribuído para quem precisa”.
A arborização do Alto do Itaigara começou com a chegada do médico no loteamento, há 13 anos. “Era muito abandonado. As áreas verdes que tinham eram um matagal”, lembra. Ele mobilizou alguns vizinhos, conseguiu autorização e, logo, árvores começaram a compor o cenário do local.
Diretor de uma unidade do colégio Sartre no Alto do Itaigara há dez anos, o biólogo Emanuel Ribeiro destaca as mudanças no local promovidas pelo médico. “O bairro hoje é muito mais arborizado, organizado, iluminado e seguro graças ao trabalho incansável de Mario”. Ele conta que o Recanto São Francisco é muito frequentado por alunos da escola.
Emanuel destaca que o local onde está o Recanto era um espaço abandonado, usado para descarte de entulho e lixo. “Mario é um guerreiro implacável, altruísta e focado no bem geral da comunidade, a pauta ambiental dele é autêntica”, afirma o diretor. Para ele, o médico é uma inspiração para adultos e jovens que moram ou frequentam o bairro.
Legado
Quando se mudou para o Itaigara, conta Mario, a esposa estava grávida da primeira filha do casal, Marina, e, ao mesmo tempo, ele descobriu que estava com câncer. A doença fez o médico ter ainda mais vontade de mudar o local onde a família mora. “Pensei: ‘Como minha filha vai ficar órfã e não vai saber do amor que eu tive por ela?’, e aí decidi deixar um legado para Marina”.
Mario estudou sobre o plantio de árvore e as diferentes espécies. Começou a arborização na própria rua e o projeto cresceu, dando origem também a uma associação de moradores. Já curado, o médico conta que são mais de 3 km de calçadas arborizadas. “Parei de contar quando chegou em 270 árvores”. Todas as mudas têm gradil de proteção e acompanhamento no crescimento.
Amigo e vizinho do médico, o engenheiro Alexandre Vita afirma que Mario “é um exemplo de inconformismo”. Morador do Alto do Itaigara há oito anos, ele participou do plantio de árvores com a esposa e a filha. O engenheiro destaca ainda a atuação da associação de moradores criada por Mario para garantir a segurança.
A paixão pelas árvores, rememora o médico, surgiu pouco antes de se mudar para o Alto do Itaigara, quando perdeu o pai. “Quando ele faleceu, comprei umas 20 mudas de árvore e plantei no sítio do meu pai. Chorava e plantava as árvores. Ali, entendi o ciclo que se completava: um morria, mas nascia uma árvore. Minha verdadeira catedral é a natureza”.
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