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O que é que os botecos têm? Festival faz rota de sabores na Bahia

Festival Comida di Buteco chega à 16ª edição em Salvador com 56 bares participando da competição gastronômica

Publicado domingo, 21 de abril de 2024 às 10:00 h | Atualizado em 21/04/2024, 10:08 | Autor: Gilson Jorge
Croquete a carroceiro da Fazenda Music Bar
Croquete a carroceiro da Fazenda Music Bar -

Nascido em Cabeceiras do Paraguaçu, Alan Martins da Silva veio para Salvador em 2007 em busca de trabalho. Arranjou emprego de garçom no Quiosque do Galego, no Imbuí, e, depois de ficar por alguns anos na mesma função na Churrascaria Q'Delícia, abriu o seu próprio bar com a ajuda de seu ex-patrão, primeiramente em Itapuã e, desde o final de 2022, em Paripe.

>>> Confira os locais participantes do Comida di Buteco

Agora, com menos de dois anos de existência, o Fazenda Bar, que traz no cardápio e no ambiente a essência da roça, o negócio de Alan estreia no Comida di Buteco, um dos principais concursos de bares do país, criado no ano 2000 em Belo Horizonte, Minas Gerais, e que se espalhou por outras 24 regiões do Brasil, e na capital baiana está na 16ª edição. A grafia do nome do concurso reproduz a maneira com que os mineiros pronunciam a palavra boteco.

Ao estrear no evento, Alan, que trabalhou com carroça, transportando carne de porco antes de vir para Salvador, resolveu criar um petisco que remetesse à sua história e assim surgiu o Croquete à carroceira, à base de carne suína. "Eu lembrei dessa história, foi uma vida sofrida", conta Alan. O petisco do bar A Fazenda é feito com costela de porco, geleia e um molho álho e óleo, ervas finas e aromatizado com vinho tinto.

Apesar do pouco tempo, o bar já tem atraído a atenção, inclusive de celebridades. O ator Alexandre Barillari esteve recentemente no boteco. "A gente virou uma referência na região", comemora Alan, com uma fala recheada de cautela, como quem não quer parecer presunçoso.

Este ano, participam 56 barzinhos, sendo que 26 são estreantes no concurso. "Houve muita procura de bares querendo participar do Comida, e também tem a relação com o público, que indica estabelecimentos", afirma o coordenador regional Salvador do Comida di Buteco, Max Rogers. Em relação a 2023, são 11 bares a mais competindo pelo prêmio de melhor petisco, todos com valor de R$ 35.

Rogers, que mora em Belo Horizonte, passa pelo menos 15 dias por mês em Salvador, de janeiro a março, preparando o evento, e depois permanece na capital baiana durante a realização do Comida di Buteco. Em junho, a organização começa a entrar em contato com estabelecimentos que almejam participar da edição do ano seguinte.

Afrofuturista

Outra novidade do Comida di Buteco deste ano é o Maré Gastronomia Afrofuturista, que funciona no Mercadão da Bahia, em Lauro de Freitas, que completa dois anos de existência em junho deste ano. "A gente trabalha dentro de uma perspectiva ancestral africana e brasileira", explica Anderson Carvalho, um dos três sócios do restaurante, junto com Helton da Hora e Bruno Reis.

O petisco do Maré chama-se Mini-Po'Boys, sanduíches cuja proteína animal emula o hambúrguer, mas feitos de bode, siri e camarão. O nome é inspirado no poboy, abreviatura de poor boys, que em inglês significa garotos pobres. Essa é uma receita clássica do sul dos Estados Unidos, com pão baguete e uma variedade de proteínas. O sanduíche foi criado em 1929 por dois donos de restaurante em solidariedade a rodoviários que iniciaram uma greve.

"A gente decidiu abrir o restaurante justamente pela necessidade de reafirmação da nossa ancestralidade, mas que também fosse um palco para a comida de verdade. A gente tem uma relação muito grande com produtores da agricultura familiar, pescadores e marisqueiras", afirma Anderson.

Prato Carmen Miranda do boteco Sushili
Prato Carmen Miranda do boteco Sushili |  Foto: Aline Loureiro | Divulgação

Pequena notável

Tricampeão do concurso, com o boteco Sushili, o casal Aldo e Lindiane Filgueiras concorre mais uma vez. "Cada ano é um novo ano, mas a emoção é sempre a mesma", afirma Lindiane, responsável pela cozinha do empreendimento instalado no Rio Vermelho.

Para a edição atual, o barzinho inspirado na culinária japonesa traz um petisco que remete à portuguesa que se tornou um dos ícones do Brasil, a cantora Carmen Miranda, que dá nome ao prato baseado em camarão e chuchu.

A mistura foi eternizada na canção Disseram que voltei americanizada, de Luiz Peixoto e Vicente Paiva, e foi feita para que a portuguesa rebatesse os rumores de que seu sucesso no Hemisfério Norte a distanciara da cultura brasileira. A música termina com os versos: "Enquanto houver Brasil, na hora das comidas eu sou do camarão ensopadinho com chuchu".

Lindiane diz que a homenagem à pequena notável Carmen Miranda traz também uma referência à força feminina. "Ela era uma mulher empoderada e quem faz o sushi é uma mulher", destaca Lindiane, a sushiwoman do negócio. O prato com camarão traz uma maionese de fabricação própria com coco e coentro, e um ceviche de chuchu, o cevichu.

O Sushili, que vai completar oito anos de existência, foi criado pelo casal, ambos ex-industriários que perderam o emprego na mesma época, mas já era um sonho da dupla antes de se tornar a fonte de renda familiar. Eles pretendiam ter um negócio próprio como investimento, mas o destino os obrigou a colocar a mão na massa. Aldo cuida do atendimento aos clientes e Lindiane, que já era apaixonada por sushi, aprendeu a fazer o prato.

Ao longo do ano, o boteco serve os sushis tradicionais, mas também aposta em criações da casa, como a feijoada de bacalhau. Durante o Comida di Buteco, o fluxo de clientes aumenta entre 30% e 40%, estima Lindiane. "É sem explicação, parece um Carnaval", brinca a empreendedora que não se considera uma chef, mas cozinheira. "Eu sou chefe da minha cozinha", afirma.

Em Salvador, o Comida di Buteco prossegue até 5 de maio. 

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