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O riso essencial da palhaçaria em Salvador

Paranaense João Lima é um dos responsáveis pelos primeiros cursos na área em Salvador

Por Pedro Hijo

08/12/2024 - 8:00 h
João Lima
João Lima -

Dizem por aí que a menor máscara do mundo é o nariz de palhaço. Basta colocar o objeto vermelho e de plástico no centro do rosto para que, facilmente, todos identifiquem que o espetáculo vai começar. Apesar da clara sinalização, a máscara não é o suficiente para transformar uma pessoa em palhaço. Oficinas e cursos são oferecidos em Salvador para quem deseja levar a sério uma das expressões artísticas mais antigas da humanidade, comemorada nesta terça-feira, 10, Dia do Palhaço.

O paranaense João Lima é um dos responsáveis pelos primeiros cursos na área em Salvador. Chegou à capital baiana em 1998 para se formar em artes cênicas na Universidade Federal da Bahia (Ufba). Foi neste contexto que conheceu a "palhaçaria". O termo surgiu na França, nos anos de 1990, e acompanhou a vertente do Novo Circo, quando artistas circenses saíram das lonas para se apresentar em bares e praças.

João é um dos primeiros em Salvador a participar do movimento que encara o palhaço como um personagem responsável por estimular a expressão das vulnerabilidades humanas. O encantamento com a arte se deu quando participou de um curso do grupo de teatro paulista Lume, em 1999. A escola desenvolve uma metodologia de ensino que busca revelar a comicidade de cada indivíduo por meio de oficinas para o autoconhecimento.

"O palhaço é a dilatação do ridículo de cada um", diz o artista. Para se despir da vergonha, João se juntou ao grupo, recentemente, num retiro de isolamento da sociedade e praticou a palhaçaria durante todo o tempo. "Eu fui eu mesmo da forma mais vulnerável possível, 24 horas por dia".

O ator faz diferença entre a palhaçaria e a arte do palhaço, como é tradicionalmente conhecida. Ele relaciona o exercício circense com a dança. "Todo mundo pode dançar, mas nem todo mundo é dançarino", afirma João, complementando que existem cursos para ensinar a técnica (como andar com perna de pau, fazer malabares e dar piruetas) e oficinas para quem busca pela "liberdade de abrir mão dos disfarces da sociedade" e ser palhaço. "A gente vive essas emoções para contar a história, é de dentro para fora", diz.

Esquetes

Com quase quatro décadas de atuação, a Escola Picolino de Artes do Circo, localizada no bairro de Pituaçu, em Salvador, oferece oficinas de técnicas circenses durante todo o ano. Os cursos são voltados para crianças e adultos e ensinam práticas como acrobacias, tecido e lira. Nas oficinas infantis, os alunos montam esquetes clássicos de palhaço. "Aqui, a palhaçaria vem derivada da contação de história de um determinado espetáculo", explica a professora e coordenadora do Picolino, Nina Porto.

No fim do curso, os alunos se apresentam no espetáculo Viva o circo, que, este ano, será realizado nos dias 13, 14 e 15 de dezembro. "A performance faz parte da formação da pessoa, mesmo que ela não venha a se tornar um artista profissional", diz Nina.

Quase 100 instrutores de circo já foram formados pelos cursos da Picolino, de acordo com a coordenadora. "Tem até quem esteja no Cirque du Soleil", conta, se referindo à companhia de entretenimento canadense.

João Lima foi aluno da Picolino e dirigiu shows de grupos residentes da escola. Um deles foi a apresentação Clássicas, em que três palhaças brincam com os estereótipos de gênero. O feminismo na palhaçaria é um assunto importante para a artista Luiza Bocca. Membro do grupo Nariz de Cogumelo, a baiana tem como meta ampliar a participação de artistas femininas no setor.

"Para a mulher não é dado o direito de ser ridícula", afirma. O Nariz de Cogumelo tem 18 anos e, além de Luiza, a formação atual conta com as palhaças Larissa Uerba, Viviane Abreu e Laili Flórez, além dos músicos Diogo Flórez e Pedro Vieira.

A presença das mulheres no cenário da palhaçaria acompanha as vitórias do movimento feminista, de acordo com Luiza. "Se a mulher se coloca mais na sociedade, isso também chega ao circo", conta. Ela lembra que artistas femininas sempre existiram nos picadeiros, no entanto, a elas cabiam os símbolos da beleza e da perfeição. "Por mais que, nos bastidores, as mulheres gerissem e até fossem donas do circo, para o público elas tinham que ser apenas belas".

Há 25 anos, os espectadores faziam cara de estranhamento todas as vezes que a artista Felícia de Castro se apresentava como palhaça. "Mas, hoje, essa percepção sobre a mulher vem mudando", comenta. Apesar do novo cenário, Felícia diz que é um grande desafio ser mulher, negra e palhaça.

"No começo, na Escola de Teatro da Ufba, eu me sentia frequentemente deslocada, e olha que estamos falando dos anos 1990", diz. Ela conta que não era vista como uma "artista séria". "Então, eu tive coragem para trancar o curso de graduação e ir atrás de outros desafios".

Ela seguiu não só com a carreira de palhaça, mas também se aprofundou nos estudos sobre o tema. “Foi um processo muito solitário, sendo artista, professora, pesquisadora, tudo ao mesmo tempo”, afirma.

Outro artista que também mergulhou na pesquisa foi o baiano Demian Reis. É dele a autoria do livro Caçadores de risos, o maravilhoso mundo da palhaçaria, lançado há 10 anos. A pesquisa traz uma análise da dramaturgia do palhaço e um cenário do circo no Brasil no século 20.

Projetos

Para Demian, os palhaços são “usinas de procedimentos”. “A bagagem de recursos cênicos do palhaço é muito rica”, afirma. “Desde a improvisação, até a escuta da plateia, o palhaço não tem medo do ridículo e faz disso comédia, é uma usina sem fim”. Nas oficinas de palhaçaria oferecidas pelo artista, há profissionais de diversos tipos como professores, advogados e médicos que buscam por mais liberdade.

Segundo Demian, o palhaço é a chave que dá acesso a atitudes mais livres de normas. “Eu acho muito bonito essa busca pelas oficinas porque isso está conectado a reflorescer nossos desejos e nosso futuro”, opina.

O artista é criador de Pé de Alegria, um personagem que combina a palhaçaria e a militância a favor do meio ambiente. A “floresta itinerante”, como resume Demian, é um alerta para que as pessoas convivam mais em espaços abertos, saiam da frente das telas eletrônicas e busquem por mais educação ambiental. “O camarim do meu palhaço é o meu jardim”, diz.

A educação também foi uma porta de entrada para as performances do baiano Igor Sant’Anna. O trabalho como palhaço Caxambó foi a principal fonte de renda do artista enquanto se especializava como educador na universidade.

"Dentro de mim, houve um encontro entre a palhaçaria e a educação", diz o baiano. Foi neste momento que Igor cunhou o conceito de "palhaço educador". "A arte do palhaço está conectada à vida de cada um e esse campo educacional foi contemplado dentro da minha vivência", conta.

O artista percebeu que quando estava vestido de Caxambó, um processo educativo acontecia. O palhaço também aparecia quando Demian atuava como educador. "Isso incrementava as relações, a empatia, me ajudava a aprender a lidar com as vulnerabilidades".

Para o artista João Lima, o palhaço é uma ferramenta educacional. A troca entre o personagem e o público, diz ele, amplia os conceitos de adequação e beleza: “O palhaço é um personagem desajustado em relação ao que a sociedade deseja, é um ridículo, e quando a plateia sente empatia com essa pessoa cheia de defeitos, ela começa a aceitar suas inadequações também”.

As ruas testemunharam a mudança de postura da artista Luiza Bocca. Antes das apresentações, era comum que ela ouvisse de professores que a palhaça deveria ter roupas largas e poucos traços associados à feminilidade. “Era como se a palhaça fosse um anjo neutro”, lembra.

Com o avanço das pautas de gênero, Luiza reavaliou a sugestão. “Se a palhaça sou eu, por que eu tenho que anular a minha sexualidade? O meu corpo?”. O grupo Nariz de Cogumelo encena espetáculos cômicos que brincam com os clichês da sociedade. “Tem um número em que a gente chama quatro homens da plateia e a gente manda e eles obedecem, há um status de poder muito educacional nisso”.

Serviço:

Circo Picolino –

Com 39 anos de atuação, o espaço multicultural oferece oficinas de técnicas circenses durante todo o ano. Confira programação pelas redes da Picolino.

Instagram: @circopicolino

Felícia de Castro –

Atriz e doutoranda em artes cênicas, Felícia realiza oficinas de "palhaçaria" feminista onde trabalha a desobediência ao patriarcado, a descolonização do corpo e a liberdade de ser quem se é.

Instagram: @feliciadecastroartist

João Lima –

Ator, diretor e palhaço, João Lima faz parte do grupo de teatro ViaPalco e integra a Cooperativa Baiana de Teatro.

Instagram: @joaolimateatro

Nariz de Cogumelo –

Criado em 2006, o grupo é composto pelas palhaças Larissa Uerba, Viviane Abreu, Luiza Bocca e Laili Flórez, além dos músicos Diogo Flórez e Pedro Vieira.

Instagram: @narizdecogumelo

Palhaço Caxambó –

Pai de três crianças, o artista Igor Sant'Anna deu vida ao Caxambó e utiliza o personagem para falar sobre educação e paternidade.

Instagram: @caxambo

Palhaço Tezo –

Criados pelo ator, diretor e doutor em artes cênicas Demian Reis, os palhaços Tezo e Pé de Alegria divertem e alertam sobre a importância do cuidado com o meio ambiente.

Instagram: @demianreis

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