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Os novos projetos da cineasta Camila de Moraes, diretora do documentário O caso do homem errado

Por Gilson Jorge | Adilton Venegeroles | Ag. A TARDE

29/05/2019 - 10:00 h | Atualizada em 05/06/2019 - 9:46
A diretora deseja representação plena de sujeitos negros no cinema
A diretora deseja representação plena de sujeitos negros no cinema -

Quando a cineasta gaúcha Camila de Moraes veio de férias com a família a Salvador pela primeira vez, em 2001, tinha 14 anos e ficou fascinada. Não apenas pelo clima, comida e praias. A predominância de negros na capital baiana fez com que a adolescente, vinda de uma cidade onde os negros somam 3% da população, se sentisse em casa e optasse por mudar para cá anos depois. Embora seu pai, o jornalista e poeta Paulo Ricardo de Moraes, já usasse cabelo com dreadlocks, foi aqui que ela se animou a trançar os cabelos e mergulhar na cultura negra.

A mudança veio em 2010, quando ela se deu de presente um ingresso para o show de Beyoncé, no Parque de Exposições, e resolveu ficar por aqui. A música que combinava com o seu momento, porém, seria uma versão às avessas da canção dos conterrâneos Kleiton & Kledir: deu pra ti, Porto Alegre.

Mas antes de arrumar as malas, ela concluiu a graduação em jornalismo no Centro Metodista do Sul, com um livro-reportagem sobre a execução do operário Júlio César de Melo Pinto por parte da Brigada Militar. O crime aconteceu em 1987, na porta da casa da vítima, que era padrinho do irmão de Camila, então com 23 dias de vida.

Júlio saiu para ver um assalto que acontecia na rua e, depois de uma crise de epilepsia, caiu no chão. Foi jogado dentro de uma viatura policial e, posteriormente, apresentado à imprensa como um dos bandidos, não fosse um detalhe.

Um fotojornalista registrou sua entrada no veículo sem nenhum ferimento e, depois, o desembarque do corpo banhado em sangue após o disparo de duas balas que o mataram dentro do carro. “Foi um caso específico, em 1987, mas que mostra como hoje as pessoas negras continuam sendo assassinadas por conta da pele”, diz Camila.

A história ganhou as manchetes de jornal no Sul do país da época, como O caso do homem errado, nome do filme produzido por ela, 30 anos depois, e que no último dia 2 de maio ganhou uma resenha no San Francisco Bay View, site voltado para a comunidade negra dos Estados Unidos.

Ela segue na batalha para que o documentário, que foi pré-selecionado entre as 22 obras que brigaram para representar o Brasil no Oscar 2019, ganhe mais visibilidade. “Acabamos de fechar um contrato para a exibição do filme, com legendas em inglês e espanhol. Um desses contratos é com uma companhia aérea”, comemora.

O filme foi lançado inicialmente no Rio Grande do Sul, onde ficou em cartaz durante duas semanas, e depois ela teve que viajar pelo país acertando a exibição em diferentes praças, pois não contava com uma distribuidora.

No dia 23 de fevereiro de 2018, Camila enviou um e-mail à direção da Sala de Arte, solicitando pauta. Um mês depois, entrou em cartaz no Cinema do Museu. “A gente não conhecia nem Camila nem o documentário, mas a temática era muito interessante, pois trata de uma situação que estamos vivendo”, diz a coordenadora de programação da Sala de Arte, Suzana Argollo, que organizou sessões seguidas de bate-papo com estudantes negros e suas mães.

Suzana conta que houve depoimentos emocionantes de mulheres que experimentaram a perda de filhos de forma violenta. E, além disso, era um público novo, que normalmente não vai ao cinema. “É um filme honesto e maduro. Estamos felizes em participar dessa trajetória”, diz Suzana.

Mas Carla quer falar também sobre outras coisas. Sente necessidade de que os negros sejam representados nas produções audiovisuais brasileiras não apenas como vítimas da violência, mas como pessoas completas, que amam, trabalham e ocupam seu espaço na sociedade.

Cor da pele

Curiosamente, dois dos poucos filmes brasileiros de sucesso em que os protagonistas são negros sem que a cor da pele seja determinante para o enredo são de um gaúcho. Jorge Furtado escalou o baiano Lázaro Ramos para os papéis principais de O homem que copiava (2003) e Meu tio matou um cara (2003).

Foi em busca dessa naturalidade que a cineasta procurou o professor e poeta Lande Onawale, autor do poema Bandeira, cujo verso “Reaja à violência racial: beije sua preta em praça pública”, escrito em 2011, tornou-se um slogan da militância negra.

Os dois estão trabalhando um roteiro para um outro documentário, em fase de pré-produção, que pretende explorar as relações afetivas de dez casais negros, hétero e homossexuais. “Ela estava pensando em desenvolver outro projeto de filme e lhe ocorreu que esse tema da afetividade seria algo importante a ser tratado”, afirma Lande.

Ao mesmo tempo em que vai retratar as relações, o filme se propõe a contar como o poema reverberou progressivamente nas redes sociais e acabou estampando a capa de uma edição do jornal Ihron, editado pelo Movimento Negro Unificado nas décadas de 1990 e 2000.

“Diferentemente de O caso do homem errado, uma produção independente, desta vez estamos com uma produtora aqui da Bahia”, assinala Camila.

O contato com Dayse Porto, da produtora de conteúdo Movida, aconteceu em setembro do ano passado, durante a realização do Festival Ela faz Cinema, que pela primeira vez aconteceu em Salvador.

Camila foi convidada para conduzir uma oficina de direção e comentou sobre o seu novo projeto com a produtora. “Nossa! Pra ontem!”, reagiu Dayse, ao receber o convite.

Em sua primeira investida como produtora-executiva, ela tem como missão comunicar ao mercado a natureza do filme para atrair potenciais apoiadores. “Essa vai ser uma experiência mais ousada, no sentido poético e estético”, afirma Dayse, que projeta o começo das filmagens para dentro de um ano.

“Camila tem muito chão pela frente, muito para aprender. Mas é jovem. Tem o mundo para ensinar. Acho que ainda nos emocionará muito”, afirma a atriz Vera Lopes, mãe da cineasta, que há seis anos também largou sua terra natal para morar com a filha em Salvador. Cidade que classifica como “encantadoramente negra”, mesmo com todas as mazelas de uma metrópole desigual.

Os olhos de Camila lacrimejam e a voz embarga ao falar sobre o choque de realidade que foi ver, na cidade encantada das férias, a enorme quantidade de pessoas negras morando nas ruas e pedindo esmolas. Ainda não dá para mudar totalmente de assunto.

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