ENTREVISTA
'Padronização facial' é falha técnica, alerta médica dermatologista
Confira o Abre Aspas com Renata Pedreira, médica dermatologista
Por Pedro Hijo
O conjunto de procedimentos dermatológicos que busca o equilíbrio das proporções faciais ganhou fama há alguns anos depois que celebridades passaram a aparecer com os rostos alterados. Os cantores Anitta e Lucas Lucco e os atores Stênio Garcia e Dedé Santana são alguns dos famosos que optaram por fazer a harmonização facial. Lábios mais preenchidos, sobrancelhas mais arqueadas, maçãs do rosto proeminentes e maxilares marcados dominaram as redes sociais e se tornaram demandas comuns em consultórios dermatológicos. No entanto, essa padronização dos rostos parece ter acendido um alerta que vai contra o conjunto de tratamentos da moda. De acordo com a médica e dermatologista baiana Renata Pedreira, resultados que causam estranheza são, geralmente, ocasionados por profissionais que não respeitam a individualidade do paciente. “O bom médico tem que ter a visão artística e deve entender o paciente”. E completa: “É ele que deve saber até onde ir”. Renata é especialista em cosmiatria, subespecialidade da dermatologia que trata especificamente da estética da pele. Para A TARDE, a médica fala nesta entrevista sobre preços de tratamentos, procedimentos indicados para quem deseja a redesignação de gênero e a busca por uma pele perfeita. “Os exageros estão cada vez mais fora de questão porque as pessoas não querem parecer editadas. As pessoas querem parecer que nasceram com o rosto harmonizado”, opina.
O que é harmonização facial?
Quando a gente fala sobre dermatologia, harmonizar é equilibrar proporções, embelezar e melhorar toda a estrutura do rosto, mantendo a identidade e fisionomia. É por isso que a gente precisa de vários tipos de tratamentos para, justamente, atuar nas frentes de envelhecimento. Porque, com o tempo, o corpo humano perde ossos, perde colágeno. A gente reabsorve as camadas de gordura com o passar dos anos. E para um rosto ficar harmônico, ele precisa ser tratado com todos esses procedimentos.
Quais são os procedimentos mais comuns na harmonização?
Os mais comuns são a toxina botulínica, o botox, que age paralisando as musculaturas da mímica da face, que são responsáveis pelas rugas de expressão. O botox talvez seja o tratamento mais famoso porque ele suaviza as linhas de expressão e reduz, portanto, as rugas que podem se tornar fixas. Num primeiro momento, na juventude, essas rugas aparecem apenas quando a pessoa se expressa, mas depois elas ficam marcadas na pele. Outra forma de tratamento na harmonização é o preenchimento com ácido hialurônico, que tem diversas espessuras. A gente pode usar para reestruturar um rosto, para devolver volume ou para projetá-lo. Então, o preenchimento trata tanto a questão do suporte ósseo, ou seja, devolve os volumes perdidos ou aumenta – como é o caso do famoso preenchimento labial, por exemplo, ou da reposição da olheira. Por último, temos também o bioestimulador de colágeno injetável, que vai melhorar a qualidade da pele, que, depois dos 30 anos, reduz a produção de colágeno gradativamente. Ele melhora a flacidez, a qualidade e a espessura da pele.
Alguns médicos têm criticado os procedimentos de harmonização apontando uma suposta “padronização facial”. Grande parte das críticas indica que esses tratamentos replicam traços para alcançar um padrão de beleza. Qual é a sua opinião sobre isso?
Eu também faço essa crítica e acho que esses casos de “padronização facial” são uma falha de técnica médica. O bom médico tem que ter a visão artística e deve entender o paciente. Qual é a personalidade, o desejo, a anatomia daquele paciente? Para você manter a individualidade e a identidade de alguém, é preciso ter mais do que uma boa técnica: é preciso um bom olhar técnico. Essa padronização vem de não entender o indivíduo. Ninguém quer ser igual. O que a harmonização facial permite é que você seja você mesmo, mas numa versão melhorada, de acordo com o seu desejo. Todo mundo tem que ter barba? Todo mundo tem que ter um olhar arqueado? Todo mundo tem que ter um lábio maior? Não. Cada um é cada um, e isso faz parte da boa técnica do médico. Na clínica, eu percebo que a tendência mais forte depois de tantos resultados desarmônicos é a busca pela naturalidade e pela elegância. Para isso, a gente combina essas técnicas para colocar um pouco de cada tratamento e gerar um resultado mais sutil e natural. Os exageros estão cada vez mais fora de questão porque as pessoas não querem parecer editadas. As pessoas querem parecer que nasceram com o rosto harmonizado.
Uma mudança de comportamento é que há alguns anos, quem buscava as clínicas de estética e dermatologia eram pessoas mais velhas buscando o rejuvenescimento. Atualmente, pessoas de 20 ou 30 anos, procuram por uma prevenção...
Sim, e que bom! Esses resultados que você citou, que causam estranheza, normalmente são de pessoas que já têm um envelhecimento mais avançado e que precisam de uma reposição maior do volume, o que pode gerar resultados mais inestéticos. Se o paciente opta por tratamentos desde jovem, desde os primeiros sinais de envelhecimento, a tendência é que ele faça poucos procedimentos ao longo da vida e que os resultados sejam mais elegantes. Essa conscientização de ter um tratamento mais individualizado pode vir da juventude que usa as redes sociais, mas, também pode vir da própria cautela do médico. É ele que deve saber até onde ir.
Há alguns meses, o influenciador Eliezer admitiu estar arrependido dos tratamentos estéticos que havia feito no rosto. Segundo o criador de conteúdo, ele não se reconhecia mais no espelho. Esses procedimentos podem ser revertidos? Aconselha um acompanhamento psicológico para quem está pensando em se submeter a esses procedimentos?
O botox é temporário. Ele tem uma durabilidade máxima de seis meses. Já o preenchimento pode ser revertido com uma enzima que quebra o ácido hialurônico. No consultório, o único que não é reversível é o bioestimulador, ele permanece na pele. Quanto ao tratamento terapêutico, acredito que ele se torna relevante quando o paciente passa do ponto. Se o paciente não enxerga as mudanças e quer sempre mais, pode ser o caso de ele estar suprindo outras faltas com aqueles procedimentos, o que pode se tornar excessivo. Mas, como a gente não trabalha com tratamentos permanentes, esse acompanhamento não é tão necessário, como eu acredito que seja no caso de uma cirurgia plástica, por exemplo.
Um caso recente que chamou a atenção da mídia foi o resultado dos procedimentos feitos pela influenciadora Maya Mazzafera após se descobrir uma mulher trans. Quais são os tratamentos indicados para pessoas que passam por esse processo?
O preenchimento é um excelente auxiliador para pessoas trans porque a gente consegue reestruturar e modificar o rosto. É possível, por exemplo, feminilizar um rosto ao aumentar o lábio e a maçã da face. Já o botox reduz a força do maceta, que é o músculo da mastigação que deixa o rosto mais largo. Os lasers melhoram a textura da pele, já que a do homem é mais espessa. Também é possível afinar o rosto com ultrassom microfocado, arquear a sobrancelha com botox... É super possível feminilizar o rosto com tratamentos estéticos. É fácil.
Os homens têm buscado mais os tratamentos?
Sim, bastante. Mas, os homens são mais discretos. Eles querem ver resultados mais imediatos e, por isso, buscam por procedimentos mais exatos. E são mais comedidos também. A maior parte dos homens não quer que o resultado seja notado. As mulheres gostam que as pessoas percebam que o lábio aumentou, por exemplo, enquanto 99% dos homens presam pela discrição. A maioria faz botox, estímulos de colágeno e prefere tratamentos menos invasivos.
Qual é o preço que um procedimento estético pode chegar?
O céu é o limite! Mas, o ticket médio pode ir de uma aplicação de botox que custa R$ 1,5 mil até um bioestimulador de colágeno, um procedimento mais caro e que pode variar no preço a partir da quantidade que é usado. Porque não é só o preço do produto, mas também a quantidade de produto aplicada. Uma pessoa mais velha vai precisar de muito mais seringas do que uma pessoa de 30 anos, por exemplo. Se um paciente tem 30 anos, provavelmente, ele vai gastar R$ 5 mil, no máximo. Já um paciente de 35 anos, pode gastar até R$ 7 mil. E o preço vai aumentando conforme o volume de produto que precisar ser usado.
É possível encontrar locais que oferecem tratamentos com preços menores...
Sim, mas existem inúmeros riscos. O material, por exemplo, pode ser falsificado. Já existem casos de botox contaminado, que não dura na pele, por exemplo. Não há garantia de que esses produtos estão sendo mantidos em locais adequados. Estamos falando de um produto que será introduzido no corpo de um paciente. O local que oferece esse serviço deve assegurar que todo o material é próprio para uso injetável. Aplicar botox ou fazer preenchimento em locais sem recomendação confiável pode gerar diversas complicações, desde a queda de uma sobrancelha e a falta de simetria de um sorriso até complicações vasculares que podem levar a risco de saúde. Os riscos existem e o médico está capacitado para resolver com prontidão e evitar sequelas.
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