CIÊNCIA
Planetário da UFBA será aberto ao público no dia 2 de abril
Unidade conta com três telescópios e outras atrações
Por Gilson Jorge
Responsáveis técnicos pela implantação e operação do Planetário da Ufba, que será aberto nesta terça-feira, 02,os professores Cezar Orrico e Ricardo Miranda, duas referências baianas em astronomia, conversavam no fim de uma tarde chuvosa, em frente ao novo equipamento, que fica à esquerda da entrada principal do Campus de Ondina a Universidade Federal da Bahia.
Os acadêmicos explicavam à reportagem detalhes do planetário enquanto aguardavam a chegada do advogado piauiense Francisco Lacerda Brito, formado pela Ufba e fã ardoroso dos estudos sobre o universo e que doou à universidade a construção do prédio, três telescópios e um projetor importados dos Estados Unidos, o alumínio trazido de Dubai para ser usado na cúpula e tudo o que foi necessário para implantar o planetário.
Antes que o advogado chegasse, a conversa com os acadêmicos foi interrompida pela aproximação de uma mulher indígena, que lamentava o mau tempo e indagou quando ela poderia contemplar as estrelas.
Era a conhecida líder pataxó mineira Maria Flor Guerreira, que havia chegado a Salvador uma semana antes, para iniciar seu mestrado na Escola de Dança da Ufba, que fica bem em frente ao planetário. As duas unidades são separadas apenas pela portaria da universidade. Flor viu o movimento no planetário e cruzou a rua. “Eu ia para Diogo hoje observar as estrelas, mas desisti por causa da chuva. Aí vi vocês aqui”, declarou.
Foi uma coincidência astronômica. Minutos antes, os professores tinham falado da leitura do universo em diferentes culturas. A maioria dos povos Tupi-Guarani, por exemplo, se refere à Via Láctea como Caminho da Anta. E um dos projetos do planetário é justamente formar professores indígenas em astronomia.
“Queremos oferecer um curso a 40 lideranças indígenas de todo o estado”, afirma Miranda, diretor do Instituto de Física e integrante do comitê gestor do planetário, que chega com a missão de aproximar a sociedade baiana do espaço. Uma missão especial.
Sentado em uma das 85 confortáveis poltronas de couro da sala de projeção, é inevitável relaxar e se sentir um astronauta durante a exibição de um filme de cinco minutos, que começa com o céu sobre a Baía de Todos-os-Santos, registrada em uma fotografia de 180 graus. As luzes artificiais da cidade vão se apagando gradualmente e, em pouco tempo, estrelas, uma nebulosa, um buraco negro, a lua com suas incríveis crateras e diversas constelações crescem na tela, como se fossem um objeto se aproximando da janela de sua casa.
No segundo vídeo, imagens de uma missão espacial com sondas e um astronauta pululam à sua frente, ao som de Rocket Man, o estrondoso sucesso de Elton John, composto por ele e pelo letrista Bernard Taupin. Lançada em 1972, três anos após a chegada do homem à lua, a canção especula sobre o cotidiano de um astronauta com jornada regular de trabalho, que vai ao espaço cinco vezes por semana. Como rotina, pode não ser estimulante, mas o vídeo do planetário dá vontade de escrever para a Nasa e pedir para ir no espaço uma vez.
Além de entretenimento e informação à sociedade, a sala de projeção do planetário vai servir para atividades acadêmicas de Física e de outros cursos de graduação oferecidos pela Ufba. “Se acontecer um eclipse na África do Sul, por exemplo, podemos acompanhar desde aqui”, explica o professor Cezar Orrico, fundador do Observatório Antares, em Feira de Santana, o primeiro da Bahia.
Segundo a própria Ufba, a Faculdade de Comunicação, a Escola de Dança e a Escola Politécnica já procuraram o planetário para desenvolver atividades por ali.
Orrico já está aposentado mas não resistiu quando Lacerda Brito foi procurá-lo com os olhos brilhando como a estrela Sirius para pedir que ele tocasse à frente o projeto. “É o planetário mais moderno do Brasil”, afirma o professor, que demonstra entusiasmo com a nova empreitada.
Uma das prioridades do planetário vai ser a popularização do conhecimento astronômico e o rompimento com o padrão eurocêntrico. “Muitas constelações têm nomes dados por cientistas europeus. Mas a Constelação de Peixes, por exemplo, se você reparar, tem os traços de um berimbau. Nós chamamos de Constelação Berimbau”, diz o professor Rodrigo Miranda, que anuncia ainda para esse ano o curso de Introdução à Astronomia, no Instituto de Física, com o amparo do planetário.
Atrações
Além da sala de projeção e dos dois telescópios, os visitantes terão à disposição um hall com atrações de outro mundo. Ou quase. Como uma cópia impressa em 3D do Meteorito de Bendegó.
O original, encontrado por uma criança em Monte Santo, na Bahia, em 1784, foi transferido para o Rio de Janeiro em 1888 por determinação de Dom Pedro II. Um ano antes do imperador perder o cargo com a Proclamação da República. Foi o próprio museu que imprimiu a cópia enviada a Salvador.
Perto do objeto, há fotos de uma tentativa de transporte da pedra e um quadro que ilustra o momento da queda do meteoro. “Em breve, teremos na parede uma reprodução da foto de Albert Einstein em 1925, no Museu Nacional, ao lado do meteoro”, conta o professor Rodrigo Miranda. O físico e teórico veio ao Brasil seis anos depois que um eclipse solar em Sobral, no Ceará, comprovou a sua teoria da relatividade geral.
Outra atração do planetário é uma coleção de imagens de estrelas e objetos astronômicos presas ao teto do hall, que podem servir de fundo instagramável para quem não dispensa postar na internet suas andanças pelos mundos. E a nova unidade da Ufba traz também uma balança especial, em que os visitantes conseguem obter de uma só vez a informação sobre o quanto o seu corpo pesaria nos outros planetas do Sistema Solar.
O desenvolvimento do software durou um ano e foi feito por acadêmicos baianos em parceria com a fabricante da peça. “Essa é a primeira balança do mundo em que se pode obter os diferentes pesos ao mesmo tempo. Em outros planetários, há uma balança para cada planeta”, afirma Orrico, que já visitou mais de 50 planetários.
Orgulhoso como uma criança que vê se materializar o seu sonho, Brito descreve o planetário como um espaço que reproduz o céu de forma fidedigna. “Aqui você pode ter planetas, estrelas, nebulosas e constelações em destaque, em 360 graus. Mas, além do planetário, há um espaço para observação astronômica com três telescópios, para observação direta dos astros”, conta o advogado.
Anéis de Saturno
No observatório, vai ser possível ver em detalhes as crateras da lua, os anéis de Saturno e o planeta Júpiter. Mas em vez de ir direto ao ponto e oferecer apenas os telescópios, o planetário foi pensado de uma forma a permitir que as pessoas percebam o céu a partir da cidade. “As pessoas vão ter uma noção do céu de Salvador e depois agendar uma visita posterior para a observação direta”, afirma.
Sobre a diferença da observação entre telescópios amadores e os equipamentos do planetário, o advogado descreve: “Quando você vê os anéis de Saturno em detalhe, eles são encantadores. Às vezes, você vê crianças dizendo que não acreditavam que os anéis fossem tão bonitos”, declara o advogado.
O projeto do Planetário da Ufba foi desenvolvido pelo arquiteto Gustavo Charão, inspirado na Sequência de Fibonacci, sequência progressiva de números inteiros em que o primeiro e o segundo termos numéricos valem um cada e os termos seguintes valem a soma dos anteriores. Ou seja, 1+1=2, 1+1+2=4, etc, o que resultou numa forma arquitetônica arrojada, que destoa dos prédios comportadinhos do Campus da Ufba.
Vamos olhar para o céu?
O planetário começou a ser sonhado por Lacerda Brito em 2018, enquanto ele escrevia sobre o universo e passou a sentir o desejo de que a população em geral pudesse ter a experiência de contemplar o universo.
Ele se juntou aos amigos físicos André Bahia e Cássio Pigozzo para escrever o livro Vamos Olhar para o Céu?, que deve sair em breve, e paralelamente foi articulando a idéia do planetário até apresentar o projeto à universidade em 2020.
Durante os próximos três anos, o planetário será gerido conjuntamente pela Ufba e pelo Instituto de Astronomia Brito Castelo Branco (IABCB), uma ONG criada pelo doador, Lacerda Brito. Após três anos, o equipamento deve passar a integrar o patrimônio da universidade. “Eu coloquei no estatuto do instituto a proibição de receber qualquer valor de pessoa física e, principalmente, do poder público”, garante Brito.
Mas para não onerar a universidade com as despesas de manutenção, o comitê gestor estabeleceu a cobrança de entrada para o planetário, sendo R$ 30 (inteira) e R$ 15 (meia). O agendamento para visitas ao planetário deve ser feito pela plataforma www.sympla.com.br ou pelo site do planetário www.planetario.ufba.br.
Devido às peculiaridades do ambiente, o planetário estabeleceu uma política de visitação. Como as temperaturas no interior da unidade devem ficar em torno de 18 graus, recomenda-se aos visitantes levar uma blusinha de frio. Não é permitida a entrada sem camisa ou em trajes de banho. Até porque o lugar é frio, não há necessidade. E não serão permitidos animais de estimação. Apenas cães-guias acompanhados do tutor terão acesso às dependências.
O planetário também estabeleceu uma política de estímulo à visita de estudantes da rede pública. Os alunos das escolas estaduais e municipais poderão fazer visitas gratuitas em grupo, mas o transporte dos estudantes fica a cargo da secretaria de educação correspondente.
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