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20/12/2020 às 10:50 - há XX semanas | Autor: Yumi Kuwano

MUITO

“Sozinhos não vamos a lugar nenhum”, diz a produtora cultural e atriz Selma Santos

A pandemia ainda não terminou, mas já é possível fazer um balanço dos prejuízos deixados por ela. A área cultural ocupava, em 2018, mais de 5,2 milhões de pessoas e movimentou R$ 226 bilhões. É uma das mais afetadas pela crise do coronavírus e o cenário ainda não é nada bom. Mesmo com o retorno das atividades, os eventos culturais ainda estão longe de acontecer como antes. Com futuro ainda incerto, a produtora cultural e atriz Selma Santos afirma: “Com segurança, não dá para planejar nada ainda”. Ela atua na área há mais de 30 anos e é coidealizadora do Festival Internacional de Artistas de Rua da Bahia que, se tudo der certo e houver verba para tal, realizará sua 16ª edição em março, em formato online.

Como os profissionais do setor cultural estão enfrentando a pandemia?

Foi uma coisa que pegou todo mundo de surpresa, a gente não tinha ideia de uma coisa tão louca e, para a nossa área, é mais complicado ainda porque nós fomos os primeiros a parar e os últimos a voltar. Acho que apesar de a gente ser uma parte importante durante a pandemia, porque as pessoas não deixaram de assistir a filmes, peças, ouvir músicas, quem é que sofre mais? O artista. Eu acho que a gente foi esquecido, como já é, praticamente. A pandemia só fez colocar mais em evidência. Já vínhamos passando por momentos terríveis dentro da nossa política cultural. Poderíamos ter sido ouvidos desde o início pelos gestores para pensarmos juntos.

Quem são os mais prejudicados nisso tudo?

Eu fico muito preocupada com todos. Não só com os atores, com os técnicos... É uma loucura. Eu sei também que não vamos voltar de qualquer jeito, mas acho que tem que sentar para ouvir os setores antes de ficar fazendo decreto aí de qualquer jeito. Isso é o que eu sinto falta, de sermos ouvidos, mesmo que a gente chegue à conclusão de que não é melhor abrir, mas acho que a gente precisa ser ouvido, falta diálogo. Também tem o artista, principalmente do teatro. Primeiro, porque a gente não dá uma alta visibilidade para grandes marcas, mais um motivo para que o olhar do gestor público seja voltado para essa leva de artistas que não tem essa projeção de grandes eventos. Tem ainda quem vive de tocar em barzinho, que não tem como levar dinheiro para casa. Eu fico muito triste. São nove meses já, desde março, e não chegou nenhuma ajuda emergencial significativa. Foi prejuízo para todos os lados. As casas de espetáculo todas fechadas, equipamentos parados nove meses. Como vai ser quando eles forem voltar? Qual vai ser o custo e quem vai querer bancar isso? Os equipamentos públicos, tudo bem, mas os particulares vão ter condição?

Vocês haviam feito um plano de crise no início da pandemia para discutir e cobrar dos gestores medidas para minimizar os efeitos no setor cultural. Como está a mobilização?

Eu não vi nada de união, sinceramente. A gente tentou conversar com as pessoas e acabou ficando só o nosso grupinho mesmo e não fomos totalmente ouvidos. A coisa foi ficando por isso mesmo. Mas a culpa é nossa, dos artistas. A gente não tem uma associação que nos represente, não tem um sindicato ativo que nos represente; a gente também não liga para o sindicato e, por outro lado, o sindicato também não se mobiliza, porque está faltando mobilização de nós mesmos. Sozinhos não vamos a lugar nenhum e juntos a gente tem voz. Foi o que aconteceu com o plano de crise. A gente arregimentou naquela semana, fizemos uma conferência, mas, cadê? Todo mundo foi cuidar da sua vida. Nós estamos acostumados a olhar para o nosso próprio umbigo e o outro que fique lá. Falta união e diálogo tanto entre nós, artistas, e com os gestores também.

A Lei Aldir Blanc está sendo aplicada como deve?

O fato de a Lei Aldir Blanc ser aprovada nesse momento foi uma coisa muito boa, mas eles foram se acomodando à espera da lei. Em meados de dezembro ninguém tem nada na conta ainda, uma coisa que era para ser emergencial virou o quê? E pelo que vi também muitos políticos, não é o caso de Salvador, em outros lugares, essa lei ficou parecendo que é um fomento do município. Não dão o verdadeiro crédito à Lei Aldir Blanc, que era para chegar lá nas comunidades ribeirinhas. Outra coisa, em um momento emergencial, você fica louco inventando projeto, para estar disputando edital de igual para igual. Artistas que já têm uma história, outros que estão começando, tem que ter um critério. Não é justo uma pessoa concorrer com quem está começando agora. Custa sentar e ter uma discussão?

Quais os aprendizados que esse período trouxe para a área?

Vou falar mais de mim, uma coisa muito legal durante a pandemia é que comecei a fazer um trabalho de autoconhecimento, para pensar na minha vida como ser humano, como artista, o que vou fazer daqui para frente. Vou continuar me reinventando – não gosto dessa palavra, na verdade – mas é buscar a criatividade dentro das experiências que vamos adquirindo durante o tempo de trabalho.

Durante esse período, no que tem trabalhado?

Uma das vantagens que vejo é poder estar criando. Estou fazendo a produção dos eventos online da Avante – Educação e Mobilização Social, que é uma ONG com a qual tenho aprendido muito. Há três meses eu estou nisso e tem sido muito legal, porque era uma área que eu não estava tão envolvida, a de educação. Foi muito enriquecedor, especialmente com a Educação Infantil e a primeira infância. Tive contato com os mais renomados educadores do Brasil e a sorte de acompanhar todas as lives. Foi muito calor humano. Outro trabalho, foi a produção do novo espetáculo de Frank Menezes, Pai Lavoisier. Também fiz um comercial, como atriz que sou. E, graças a Deus, eu tinha uma pequena reserva que estava guardando para minha velhice, que chegou mais cedo [risos], mas muitos colegas não conseguiram se manter e isso me incomoda muito, eu não fico tranquila. E espero realizar o Festival Internacional de Artistas de Rua, que faz parte dos eventos calendarizados, e deve acontecer em março, se tiver verba para isso.

Como será essa edição do festival e no que ela difere das outras?

Por conta da pandemia, tivemos que pensar num novo formato, o online. A princípio relutamos muito, mas com o coronavírus fica realmente difícil fazer qualquer evento presencial. Tomamos o cuidado de não deixar perder a qualidade e originalidade do festival. A 16ª edição do Festival Internacional de Artistas de Rua da Bahia está prevista para acontecer de 12 a 14 de março, das 17h às 20h. Será transmitida ao vivo, através da plataforma Sympla. Um palco será montado no Mercado Iaô, onde acontecerão as apresentações durante os três dias com 10 grupos a cada dia. Em substituição às oficinas, faremos uma live-aula com Clarisse Abujamra e a dançarina de flamenco Ale Kalaf, do Studio Ale Kalaf, de São Paulo. Essa live será direcionada a atores, dançarinos, bailarinos, jovens e crianças e a qualquer pessoa que tenha afinidade com a arte da dança e do teatro.

E como você vê o cenário do teatro de rua em Salvador?

Acho que tem um bom movimento de teatro e arte de rua em Salvador. Só precisa de mais incentivo e de um olhar mais cuidadoso dos órgãos e gestores de cultura do estado e município, assim como toda a área cultural, fora dos grandes eventos e grandes shows que têm grande apoio da mídia. O baiano é criativo e Salvador por si só é uma cidade dos eventos de rua, só precisamos valorizar mais o artista que não tem uma grande mídia por trás, dar visibilidade a esses incansáveis fazedores de cultura.

O que você pensa dessa mudança de formatos, principalmente no teatro, de apresentações que migraram para o espaço virtual? Como é a sua experiência como espectadora e como produtora?

Eu acho que esse formato veio para ficar. Depois que a pandemia passar ou a vacina se mostrar eficiente, nada nos impede de fazermos as apresentações presenciais e online ao mesmo tempo. A minha experiência, como produtora com Pai Lavoisier ao vivo do palco do Teatro Módulo, foi excelente. Tivemos espectadores até da Austrália e Europa. A apresentação foi totalmente online, sem presença de público. Como espectadora, tenho também assistido a muitos espetáculos de vários lugares do Brasil, a exemplo do espetáculo do Elias Andreato, da Bethe Coelho, a própria Clarisse Abujamra, Ana Lúcia Torre e Du Moscovis, Wilson di Santos, dentre outros, sem ter que viajar quilômetros para assistir àquele espetáculo que tanto desejava ver.

Mas acha que, em relação à cultura, houve prejuízos para a sociedade?

As pessoas estão buscando outras formas. Por exemplo, Frank Menezes criou um espetáculo na pandemia. A gente fez uma apresentação no dia 21 de novembro e íamos fazer outra agora em dezembro, mas cancelamos por causa do decreto da prefeitura, porque não fica claro se pode fazer live ou não, aí a gente consulta e está tudo suspenso. Estou vendo casamentos e a gente cancelou. Volto para a coisa do diálogo, porque não tenta se entender com quem faz? Estavam envolvidas 10 pessoas quando a gente fez essa primeira apresentação do Frank. Não pode? Tem que ter um critério. Não pode ser resolvido e pronto, tem que ouvir as pessoas.

Com a liberação no município dos cinemas e teatros com até 100 pessoas em setembro, os teatros não retornaram?

Não dá. Não tem como. Como vai bancar? Para abrir o teatro para fazer uma peça já entra logo com R$ 1,5 mil. Aí tem gasto com iluminação, bilheteiro, porteiro, limpeza… Com 100 pessoas pagando R$ 40 ou R$ 50, como vai conseguir sustentar? Então, quem vai abrir? Ninguém é maluco. Se dissessem assim: “Olha, vou isentar o IPTU, o ISS por tanto tempo”, mas não tem uma contrapartida.

Como você pensa que deve ficar o cenário pós-pandemia?

Eu acho que as pessoas vão estar ávidas por eventos e cultura, mas não dá para a gente realmente prever nada, sinceramente, eu não sei. As pessoas estão cansadas, não estão levando a sério. Eu fico abismada, vou fazer compras no supermercado e todo mundo está sem máscara, as pessoas perderam no medo. Não dá para a gente se planejar. O que eu sinto no meu íntimo é que só vamos estar seguros para frequentar teatro, cinema, circo, quando houver realmente a vacina. A não ser que o teatro abra metade online e metade presencialmente. Agora não dá para planejar com segurança.

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