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ABRE ASPAS

"Temos visto um aumento de casos de fobia social", diz psicólogo

Eduardo Santos desenvolve trabalho de terapia com crianças e adolescentes

Por Vinícius Marques

04/12/2022 - 6:00 h
Especialista fala sobre como a pandemia afetou os mais jovens
Especialista fala sobre como a pandemia afetou os mais jovens -

Em 2016, Eduardo Santos, psicólogo graduado pela Universidade Federal da Bahia, junto a educadora e psicopedagoga Faezeh Shaikhzadeh, fundou o projeto Arvorar Jovem, que tem como objetivo criar espaços onde pré-adolescentes e adolescentes possam conectar-se a si mesmos, aos seus pares e ao mundo ao redor. Além da graduação, Eduardo possui um MBA em Gestão de Recursos Humanos pela USP, formações na Escola Dinâmica Energética do Psiquismo, em psicoterapia infanto-juvenil pela Abordagem Integrativa, psicoterapia corporal pela Bodynamic e na abordagem EMDR. Nesta entrevista, ele fala sobre a diferença dos espaços de convivência comuns aos adolescentes, da presença das redes sociais e outras tecnologias no dia a dia, e de como a pandemia afetou os mais jovens.

O senhor diz que o Arvorar Jovem nasceu ao perceber que existe a necessidade de alguns adolescentes terem um espaço de convivência e desenvolvimento pessoal. Como isso se diferencia do ambiente escolar, por exemplo?

O que percebi, a partir do atendimento de adolescentes no consultório, é que muitas situações que eram trazidas não eram situações estritamente clínicas, mas falavam muito de desafios na relação, na relação com a família, na relação com o outro. A partir daí foi se confirmando para mim essa necessidade que o jovem tem de um espaço de convivência, de um espaço de estar junto com outros adolescentes. Esse espaço deveria, em primeiro lugar, ser mesmo preenchido pela escola, que é onde o adolescente está passando a maior parte do tempo. Ainda mais nas escolas de tempo integral, que são cada vez mais comuns. No entanto, sinto que muitas vezes as escolas têm dado mais ênfase à questão acadêmica e, especialmente, à preocupação, que eu diria até exagerada, com a preparação para o vestibular, em aplicar provas, fazer trabalhos, e que a relação entre os alunos ficou em segundo plano. É um desafio muito grande para os professores porque eles têm uma quantidade de assuntos para trabalhar em sala de aula, às vezes num tempo muito limitado e com grupos que são muito grandes, o que também é o outro fator. Salas com 30, 40 alunos, e estou falando uma média, há muitas escolas que até têm mais do que isso em sala de aula. Durante a pandemia, foi até um absurdo que muitas salas virtuais tinham 200 alunos. Como que o professor pode se relacionar com tantos alunos assim? Mesmo agora, nas aulas presenciais, digamos 30 alunos como uma média numa sala de aula, é bastante para um professor poder atender às necessidades individuais de cada um, perceber o estado emocional de cada um, e ainda dar conta do seu conteúdo da disciplina que está ensinando. Acho que essa seria a principal diferença do porquê isso não acontece nas escolas. As escolas deveriam ter grupos menores, mais espaço de fala, de convivência também com os professores, com os adultos. Com base nisso, percebendo essa dificuldade, foi que a gente pensou em criar o Arvorar Jovem, isso há seis anos.

E, no geral, fora do Arvorar Jovem, de que forma os adolescentes se conectam com a cidade e uns com os outros?

O que a gente vem observando cada vez mais é que tem uma conexão dos jovens entre si, especialmente intermediada pela tecnologia, pelas redes sociais ou pelas plataformas de jogos online, aqueles com vários jogadores ao mesmo tempo. Muitas vezes existe uma interação, mas uma interação que está restrita ao mundo virtual. Muitos adolescentes se queixam disso também. Vários fatores levam a isso, a gente viver numa cidade com o ritmo de vida que a gente tem hoje em dia, numa cidade com a dimensão da nossa, com as dificuldades de mobilidade, de transporte público, de segurança... Vários fatores vão levando a que muitas vezes os adolescentes fiquem presos, digamos assim, em suas casas, em seus apartamentos, e se conectem uns com os outros através da tecnologia.

Vocês mantiveram encontros online no período mais grave da pandemia. O isolamento afetou muitas pessoas, com muitos enfrentando diversos problemas psicológicos. Como foi para os adolescentes que teve contato?

Muito do nosso discurso, antes da pandemia, era de 'vamos deixar os celulares, os computadores, e criar espaços de encontros reais'. Aí vem a pandemia e na semana seguinte, que é quando começaram a fechar tudo, automaticamente já passamos para o ambiente virtual. A gente precisou aprender a criar esse tipo de ambiente, de convivência, de relacionamento, dentro daquelas circunstâncias impostas pela pandemia, do isolamento social. E isso deu super certo. Durante a pandemia, tivemos relatos das famílias dos adolescentes de que o momento do encontro do Arvorar era o momento mais esperado por eles durante a semana. Para você ter uma ideia, durante aquele período, não conseguíamos nem parar os encontros em dias de feriado porque eles diziam ‘Por que vamos parar? A gente está em casa mesmo’, e aí mantivemos os encontros da mesma forma, porque eles queriam esses momentos. Outra coisa, que era uma diferença entre os encontros da Arvorar e outros espaços virtuais que eles tinham durante a pandemia, como a escola, por exemplo, é que nos nossos encontros todas as câmeras estavam abertas, sempre. Não havia esse problema. Nas escolas, eu entendo que foi um grande equívoco terem formado turmas tão grandes. Os alunos não mantinham as câmeras abertas, às vezes não tinham tecnologia que suportasse isso. Vários fatores levaram a isso, mas de fato isso foi muito prejudicial para o relacionamento das turmas, dos alunos, porque eles ficavam cada vez mais se escondendo atrás desses aparatos, e aí a relação se distanciava mais e mais do que poderia ser uma relação real. À medida que eu abro a câmera, mesmo à distância, eu estou me aproximando do outro. Eu posso ver o outro, posso ver a reação do outro. No Arvorar, eles só se sentiam à vontade porque eram grupos pequenos. Acho que a gente teria tido outra experiência, inclusive educacional, acadêmica, em termos de aprendizagem, se os grupos tivessem sido menores.

Ainda em relação à tecnologia, hoje os adolescentes estão com uma presença muito forte nas redes sociais. Eles produzem e estão expostos a milhares de conteúdos o tempo inteiro. Qual o impacto positivo e negativo que isso causa neles?

Acho que ainda estamos aprendendo sobre o impacto dessas novas tecnologias sobre a nossa vida, o efeito que tem em cada um de nós, independentemente da idade. Isso afeta muito a cada um de nós como adultos também. Podemos perceber que muitas vezes ficamos dispersos no nosso trabalho, nos distraímos indevidamente, perdemos tempo. Tem um desafio aí de lidar com isso que é para todos nós, mas é mais ainda para essas mentes jovens, os adolescentes ou as crianças, que têm menos recursos desenvolvidos para lidar com esses desafios. De um lado, a gente pode dizer que tem um impacto que pode ser muito positivo, no sentido de que gera conexões, abre caminhos e possibilita contatos com pessoas ou com culturas ou com conteúdos, e isso pode aumentar muito o nosso próprio aprendizado, a curiosidade e a criatividade dos adolescentes. A possibilidade de criar vídeos, de fotografar e postar e ter isso reconhecido pelos amigos, ou simplesmente estar se tornando um espaço a mais de expressão, isso tudo é muito positivo. Precisa ser feito sempre com moderação, como em tudo na vida, e precisa também ter um acompanhamento dos adultos responsáveis, que possam também estar acompanhando qual é esse conteúdo que está sendo acessado, qual é esse conteúdo que está sendo produzido, qual é esse discurso que está por trás desse conteúdo, do mesmo jeito que a gente precisa acompanhar o que estamos vendo na TV, acompanhar os grupos com que os nossos jovens e adolescentes circulam, quais são as ideias, os valores desses grupos.

Como tem sido para os adolescentes esse momento de retorno ao convívio social? Quais são os resquícios da pandemia neles?

O retorno ao convívio social tem gerado reações diferentes, dependendo de como cada um e como cada família experienciou a pandemia. Eu diria que a maneira como os adolescentes, e mesmo as crianças, lidaram com a pandemia foi também um reflexo direto de como os próprios adultos estavam lidando com a pandemia. Com isso, a gente precisa reconhecer que foi mesmo algo, e está sendo, agora com essa nova onda, um desafio muito grande para todos nós, e isso toca em muitos pontos de vulnerabilidade, ativa muitos medos, inseguranças. Medo da morte, medo da doença, medo do desconhecido. A experiência da pandemia pode ser mais ou menos intensa e geradora de ansiedade para uns do que para outros. Da mesma forma, o retorno à convivência, aos espaços sociais, pode também gerar graus de ansiedades diferentes. Aqueles adolescentes que ficaram mais reclusos, com mais medo do contato com as pessoas e medo de que esse contato pudesse trazer um risco de contaminação pelo coronavírus, esses adolescentes vão ter, sim, mais dificuldades, estão tendo mais dificuldades, do retorno ao contato social e, infelizmente, temos visto um aumento de casos de fobia social, de ansiedade generalizada e várias dificuldades nesse retorno.

Questões como baixa-estima e timidez muitas vezes são desenvolvidas ainda durante a adolescência e permanecem por toda a vida. Como os pais e responsáveis podem auxiliar os mais jovens nesse sentido?

Na adolescência, estamos numa fase do desenvolvimento em que adquirimos maior consciência sobre nós mesmos. Uma capacidade de raciocínio e uma capacidade de pensar e de estar no lugar de observador de si mesmo, que, digamos, estava menos disponível em fases anteriores da infância. Isso faz com que a gente se analise mais, se observe mais e, por vezes, se compare mais. Comparando o eu que eu vejo com o eu que eu idealizo, e da expectativa que o outro coloca sobre mim. Todas essas coisas elas vêm ao mesmo tempo no período da adolescência, toda essa consciência desses múltiplos olhares de mim mesmo e dos outros e as expectativas. Isso pode gerar, sim, um desafio, uma dificuldade na construção da própria autoestima, da construção da própria imagem e da autoestima com relação à minha autoimagem, à minha identidade, a quem eu sou, ao que eu quero. Esses são aspectos que a gente trabalha bastante nos grupos, aspectos de percepção pessoal, de desenvolvimento pessoal, de construção da própria identidade. É importante que os adultos façam um acompanhamento próximo desse adolescente para poder ajudar a desfazer percepções que são negativas sobre si mesmo e que não são reais. Com relação à timidez, costumo dizer que não é um defeito. Timidez pode ser apenas uma característica, uma qualidade de uma pessoa. O que a gente precisa se dar conta é se essa timidez, que pode ser um traço da minha personalidade, uma forma de ser, se ela está sendo um obstáculo para o meu desenvolvimento. No sentido de que a timidez está dificultando meu relacionamento com meus amigos, dificultando o momento que eu preciso levantar a mão na sala de aula para tirar uma dúvida com o professor. Se ela está causando esse tipo de dificuldade, sim, aí eu preciso olhar e ver como eu posso ajudar a superar esses desafios, mas não a timidez em si mesmo. Às vezes, o desafio pode ser oposto. Às vezes, a pessoa que é super extrovertida, é também aquela pessoa que enfrenta um desafio por não saber o momento adequado de falar certas coisas, por não saber como dar espaço para o outro também na conversa, no diálogo, por não saber a hora de escutar e a hora de levantar, falar e participar. Então, é importante desmistificar também esse peso que, às vezes, a gente dá para a questão da timidez como se fosse um grande problema.

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