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Uma praça pioneira

Instituto dos Arquitetos do Brasil promove concurso público nacional de projetos de mobiliário urbano

Publicado domingo, 22 de outubro de 2023 às 03:30 h | Autor: Gilson Jorge
Projeto-piloto será na praça do Largo do Papagaio, na Ribeira
Projeto-piloto será na praça do Largo do Papagaio, na Ribeira -

Há dois anos, a Prefeitura de Salvador foi procurada pela Urban95, uma ONG de origem holandesa que atua no Brasil desde 2017 e que tem como missão ajudar a conectar as cidades com os pequenos cidadãos que estão por volta dos três anos de idade, que têm, em média, 95 centímetros de altura.  Daí o nome da instituição, que presta consultoria a gestores municipais interessados em tornar a cidade mais amigável para a primeira infância, que compreende indivíduos de 0 a 6 anos. 

As conversas evoluíram, a prefeitura criou este ano o Núcleo Especial de Apoio à Primeira Infância, ligado à Secretaria de Governo. Na quinta-feira passada, representantes da prefeitura e da Urban95 estiveram no Largo do Papagaio – onde deve ser construída a primeira praça acessível à Primeira Infância de Salvador – para ouvir sugestões de crianças e de cuidadores infantis.  

O local foi escolhido para o projeto piloto porque daqui a dois meses serão inauguradas no largo duas escolas públicas para crianças.  O Centro Municipal Infantil Baronesa de Sauípe, para crianças até 5 anos de idade, e a Escola Municipal Alfredo Amorim, para crianças a partir de 6 anos. 

Coordenadora do Núcleo, Simone Café explicou o objetivo do projeto.  "A gente precisa levar as crianças para os espaços públicos, principalmente as crianças pequenas, de 0 a 6 anos. Elas precisam compreender que a cidade também é delas", afirma Simone. 

A coordenadora explica que a praça deve funcionar como uma extensão da escola para as crianças. A ideia de ocupar os espaços públicos desde cedo.  

Mas essa transição da casa e da escola para a rua não é tão tranquila. Os futuros pequenos ocupantes da praça, que estão provisoriamente estudando em um imóvel alugado pela prefeitura na Rua Rafael Uchoa, a 400 metros do largo, deveriam ter chegado ao local às 8h30. Mas houve um atraso de mais de uma hora na chegada. O caminho deveria ter sido feito a pé, mas a prefeitura escolheu usar um ônibus. A reportagem apurou que houve receio dos gestores pela presença de traficantes de drogas na região. 

Depois que as crianças chegaram, os técnicos da prefeitura e os representantes da ONG observaram como os pequenos se moviam dentro da praça. O acesso lateral, que fica em frente às novas escolas, foi bloqueado para automóveis e os organizadores fizeram desenhos com giz no asfalto para observar a interação dos mini-cidadãos.  

"Precisamos entender o que elas querem para o espaço delas. Ontem (quarta) fizemos uma audição para saber o que elas queriam e saiu de tudo. Teve uma menina que pediu uma quadra com areia onde ela possa correr descalça", conta Simone. Outros pedidos feitos pelos pequenos incluíam escorredor, pula-pula, água e um armário para guardar os sapatos – e que a praça tenha gente circulando. 

As sugestões recebidas das crianças e dos responsáveis por elas devem servir parcialmente de inspiração aos projetos que serão enviados por arquitetos de todo o Brasil para o Concurso Público Nacional de Ideais de Mobiliário Urbano com Foco na Primeira Infância da Cidade de Salvador, lançado na sexta-feira pelo Instituto dos Arquitetos do Brasil (IAB), um dos parceiros nacionais da Urban95. 

Consultora da Urban 95 no Brasil, Aída Pontes, explica que ao sugerir a praça para a primeira infância à Prefeitura de Salvador, a ONG se coloca como consultora e formadora dos técnicos. A construção será inteiramente feita com recursos do município. "O concurso foi uma forma de fazer o mobiliário urbano para a primeira infância, dado que existe a Desal, que é algo bem específico.  Eu não conheço outra empresa pública voltada à produção de mobiliário urbano", afirma Aída, ressaltando que as peças construídas para esse projeto-piloto no Largo do Papagaio podem servir eventualmente para outras praças na cidade. 

O arquiteto e urbanista Pedro Rossi, coordenador técnico do projeto IAB/Urban95, fez um paralelo com a acessibilidade para pessoas com deficiência (PCD) para ressaltar que o mobiliário urbano para a primeira infância não deve ser pensado como projetos específicos para um lugar. Ou seja, não deve haver praças para crianças ou lugares para PCDs. 

"Todos os espaços públicos devem ser inclusivos", afirma Rossi. O arquiteto defende ainda a construção de um mobiliário flexível.  "Um banco não precisa ser apenas um banco estático, pode ser flexível, lúdico", sugere o arquiteto. 

Ideias

A consultora e facilitadora da Urban95, Marieta Colucci, confirma que após dois dias de escuta das crianças e frequentadores do Largo, para colher insumos, a ONG deve desenhar o projeto. “O que existe são as maquetes que fizemos na quarta-feira com as crianças para recolher as ideias delas", reforça. 

Nesse momento, a ONG mantém parcerias com 27 municípios brasileiros, inclusive Ilhéus e Uruçuca.  A Urban95 é um projeto da Fundação Bernard van Leer, instituída em 1949 na Holanda por um empresário que decidiu fazer ações filantrópicas depois da Segunda Guerra Mundial. Ao assumir a fundação na década de 60, após a morte de seu pai, Oscar van Leer decidiu focar em ações filantrópicas para a primeira infância, acreditando que isso poderia mudar dramaticamente o futuro das crianças beneficiadas. A fundação se instalou no Brasil em 1970 e o programa Urban 95 surgiu em 2016, sendo aplicado por aqui em 2017. 

Itapagipano que cresceu frequentando o Largo do papagaio, o presidente da Desal, Virgílio Daltro, afirma que o projeto da nova praça vai respeitar os jovens que já usam o espaço para jogar futebol, vôlei e basquete.  "O concurso vai incluir equipamentos para a primeira infância, mas o projeto já está pronto", afirma Daltro, que estima um custo acima de R$1 milhão para a reforma do equipamento.  A Desal presume que uma vez definido o projeto de mobiliário urbano para a primeira infância no concurso, a execução de todo o projeto deve levar cerca de oito meses.

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