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Vivi Seixas: "Eu brinco que a música eletrônica é o novo rock’n’roll"
Por Aline Valadares
![Há 13 anos, a DJ Vivi Seixas, filha de Raul Seixas, trabalha com música eletrônica](https://cdn.atarde.com.br/img/2018/05/1200x720/vivi-seixas-raul-seixas-abre-aspas_2018521132628473-ScaleDownProportional.webp?fallback=https%3A%2F%2Fcdn.atarde.com.br%2Fimg%2F2018%2F05%2Fvivi-seixas-raul-seixas-abre-aspas_2018521132628473.jpg%3Fxid%3D4278588%26resize%3D1000%252C500%26t%3D1738662329&xid=4278588)
“Não tem preço produzir a própria música e tocar seu som em uma pista de dança, ver as pessoas reagindo, é muito gostoso”, diz a DJ Vivi Seixas, filha do mito Raul Seixas e de Kika (Ângela Costa). Há 13 anos, a paulistana se dedica à música eletrônica e, se no começo enfrentou críticas dos fãs do pai, hoje acredita que fez a escolha certa. Em 2013 gravou o EP Geração da Luz, com versões de Metamorfose Ambulante e Rock das Aranhas. Foi premiada como melhor DJ feminina de Deep House e Nu Disco pelo DJ Sound Awards 2015. E no ano passado produziu o EP autoral RSVP, depois de um curso que fez na Pyramind, Media & Music Production School, na Califórnia. Vivi esteve recentemente em Salvador para se apresentar na abertura da nova filial do clube Amsterdam, no Rio Vermelho. De acordo com ela, a primeira coisa que faz quando está por aqui é sair para comer lambreta. Nesta entrevista, além de analisar o cenário da música eletrônica brasileira, ela também contou que seu pai era um homem de poucos amigos e que está assinando contrato para a realização de um filme de ficção sobre o lendário compositor de Ouro de Tolo e Sociedade Alternativa, entre outros clássicos. Para Vivi, na verdade, sempre tem uma música do pai para uma situação que esteja passando.
Qual a sua impressão sobre a cena da música eletrônica no Brasil?
Acho que a música eletrônica no Brasil está com uma força muito grande. Eu brinco que a música eletrônica é o novo rock’n’roll. Um dia desses, reparei que um terço das músicas que toco durante minha apresentação é de produtores brasileiros. Isso é muito legal. Acho que com essa alta do dólar, que vem acontecendo há um tempo, e com a crise, os produtores de festa começaram a valorizar e a convidar mais DJs brasileiros. Isso deu uma visibilidade maior para a gente. Antigamente, a cereja do bolo era sempre DJ internacional.
Você sofreu preconceito por ser uma DJ mulher?
Nunca sofri preconceito por ser mulher, mas um cara já comentou que eu toco que nem homem. Foram um ou dois comentários em 13 anos de carreira. Acho legal a figura feminina, considerada frágil, chegar lá, botar banca, tocar para caramba, botar todo mundo para dançar. Eu me divirto muito com isso, a gente cala a boca de muitos homens.
Qual sua inspiração na música eletrônica?
Tem tanta gente que me inspira, mas aproveitando essa onda de mulheres, posso dizer que estou muito orgulhosa com a mulherada atualmente. Além de DJs, estão se tornando ótimas produtoras. Tem a DJ e produtora Blancah, DJ Anna e DJ Devochka, que são meninas que me inspiram bastante.
Inclusive você produziu no ano passado o EP autoral RSVP...
Não tem preço produzir a própria música e tocar seu som em uma pista de dança, ver as pessoas reagindo, é muito gostoso. Neste trabalho, tive oportunidade de chamar produtores que admiro muito para fazer as versões remixadas das minhas músicas originais. O RSVP, que significa répondez s’il vous plaît, foi feita por causa de uma pessoa que não respondia meus e-mails e eu fiquei danada, achei muita falta de educação e decidi fazer esse trabalho. Me inspiro muito em coisas que acontecem no meu cotidiano, em volta de mim.
Além da música eletrônica e do trabalho de Raul Seixas, que você cresceu escutando, qual outro estilo musical você ouve?
Brinco que desde a barriga de minha mãe eu escuto música boa, então tudo isso me influenciou. Acho muito importante para um DJ escutar de tudo, não dá para ficar bitolado em uma coisa só. É muito importante a gente ter os ouvidos abertos. Por mais que eu não goste de algum estilo musical, nunca digo não para conhecer uma música nova. Mas tem um compositor que eu sou apaixonada, que se chama Leonard Cohen. Acho que é um compositor tão incrível quanto meu pai. Eu gosto muito de música nordestina também, como Luiz Gonzaga, Alceu Valença, Zeca Baleiro, interesse que herdei do meu pai.
Tem algo marcante da personalidade do seu pai que te influenciou na carreira de DJ?
As letras do meu pai estão sempre passando a mensagem para a pessoa fazer o que quiser, o que ama, de não se importar com a opinião dos outros. Isso me deu muita força. Na verdade, as músicas do meu pai vêm em momentos bem diferentes na minha vida. Sempre tem uma música para uma situação que estou passando, e as músicas que escutei bastante, na fase em que as pessoas estavam me criticando, foram Por Quem os Sinos Dobram e No Fundo do Quintal da Escola. Essas duas falam de coragem, de que, se você quiser, vai conseguir, que não importa o que digam. Então, isso me motivou bastante a continuar, é como se fosse uma mensagem para mim.
Deve haver algumas vantagens em ser filha de Raul Seixas, mas quais foram as dificuldades na sua trajetória?
Quando estava crescendo, como toda pré-adolescente, tive meus momentos de crise existencial. Por ter um pai muito famoso, genial, eu ficava na dúvida do que iria fazer da minha vida. No começo, quando virei DJ, os fãs de meu pai me criticaram um pouco, esperavam que eu tocasse guitarra, que eu cantasse. Então, me agarrei muito às músicas do meu pai, às letras dele, para me dar força de continuar seguindo meu caminho. Hoje em dia, sou muito feliz pela minha escolha, e as coisas mudaram de 10 anos para cá; os fãs do meu pai abriram um pouco mais a cabeça e aprenderam a respeitar meu desejo.
Você tocou recentemente na abertura da nova filial da Amsterdam Salvador. Qual sua relação com a música eletrônica da Bahia?
Sempre tive vontade de tocar em Salvador, terra natal do meu pai, e essa boate é voltada para um público LGBT, e eu adoro essa galera porque é animada, da paz. Então, a felicidade é dupla. Inclusive não teve como não tocar uma música do meu pai, senão o pessoal não me chama de novo. Toquei house porque é a minha pegada, com groove. Mas na Bahia, de forma geral, frequento muito o Festival Universo Paralelo, que acontece de dois em dois anos. É gigantesco, para cerca de 10 mil pessoas; inclusive no ano passado eu toquei, tive o prazer de retornar e já foi a minha quarta participação.
Você declarou certa vez que adora a música Rock das Aranhas, de Raul. Não acha um pouco machista?
É verdade, é bem machista mesmo. Inclusive minha mãe conta que ela e a xará Ângela, namorada de Cláudio Roberto, foram dormir e deixaram meu pai e o parceiro dele compondo. Quando acordaram, estava essa letra escrita e minha mãe disse que achou um horror.
Você tem uma relação afetiva com a Bahia?
Tenho com meu tio querido, Plínio, que é irmão do meu pai. Minha mãe me dizia que meu pai adorava lambreta e eu provei um dia em homenagem a ele. Sempre que posso estou visitando a minha família baiana, e quando vou para Salvador faço questão que meu tio me leve para comer lambreta.
No CD Geração da Luz (2013), você declarou que deu uma modernizada nas músicas de seu pai. Foi por causa da batida eletrônica?
Dei uma nova roupagem. Apesar de esse disco ter sido uma homenagem, é uma forma de apresentar Raul para essa nova geração que, de repente, curte música eletrônica e pode achar que Raul Seixas é algo que o tio escuta. Foi muito emocionante para mim fazer esse disco, porque eu estava ali com a voz dele, parecia que tinha acabado de sair do estúdio, então eu chorei, me arrepiei, ri.
Você está produzindo um novo disco?
Acabei de lançar um EP com o duo carioca Keskem, do Rio de Janeiro. Futuros projetos... eu acho que por enquanto é isso mesmo.
Você e sua mãe têm planos para algum nova produção, ou uma biografia, sobre Raul?
Não, por enquanto a gente não está com nenhum plano de biografia. Mas daqui a alguns anos vai sair um filme de ficção sobre meu pai pela produtora O2. O filme não tem nome ainda, a gente está assinando contrato, mas vai ser um filme de ficção desta vez, e não um documentário.
Na época do lançamento no filme Raul, o Início, o Fim e o Meio (2012), você declarou que a morte do seu pai foi retratada de forma piegas. Como você acha que deveria ter sido a abordagem?
Acho que foi muito sexo, muitas drogas e pouco rock’n’roll. Faltou falar coisas interessantes como o que inspirava ele a compor. E certas pessoas que foram entrevistadas e apareceram não eram tão relevantes na vida do meu pai. Faltaram pessoas importantes, como Jerry Adriani, que trouxe meu pai para o Rio de Janeiro; Rick Ferreira, guitarrista que tocou anos com ele, apareceu muito pouco. Teve muita gente que não foi importante.
E Paulo Coelho? Foi realmente importante na vida de seu pai?
As pessoas acham que eles eram amigos, mas nunca foram amigos, meu pai era uma pessoa de poucos amigos. Eu só tinha 8 anos quando meu pai morreu, mas Paulo Coelho nunca foi na nossa casa. Até porque ele é de uma época diferente, minha mãe é do final dos anos 70, Paulo Coelho é do começo. Mas uma pessoa que a gente mantém contato até hoje é o Sylvio Passos, fundador do primeiro fã-clube do meu pai, o Raul Rock Seixas. É uma pessoa maravilhosa, meu pai adorava Sylvio. Ele entende tudo de Raul Seixas, e quando às vezes eu e minha mãe temos uma dúvida, a gente liga para Sylvio. E tem o Marcelo Nova também, que eu tenho muito carinho.
No Dia de Finados, os fãs de Raul vão ao túmulo em Salvador para homenageá-lo, tocar as músicas dele. Você já veio também?
Eu nunca fui junto com os fãs, mas já fui sozinha uma vez. E, no ano passado, eu estive na passeata que acontece em São Paulo todo dia 21 de agosto. Milhões de pessoas param a Avenida Central, na Praça da Sé. Hoje em dia, tem palco com show e é lindo. O que acho legal mesmo é que vejo criança, adulto, velho, punk, executivos de terno. Muito legal ver como meu pai atinge todas as idades, todas as classes sociais.
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