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27/11/2022 às 0:30 - há XX semanas | Autor: Gilson Jorge

ABRE ASPAS

Yuri Silva: "Houve um desmonte da política de igualdade racial”

Jornalista e ativista foi convidado a participar da transição de governo

Yuri falou sobre o desmanche das políticas públicas para minorias durante o Governo Bolsonaro
Yuri falou sobre o desmanche das políticas públicas para minorias durante o Governo Bolsonaro -

Aos 27 anos, o jornalista baiano Yuri Silva acumula uma experiência profissional e como ativista digna de um veterano. Foi coordenador nacional do Coletivo de Entidades Negras (CEN), é editor-chefe da revista Socialismo e Liberdade e, desde 2020, é o coordenador de Direitos Humanos do Instituto para Reforma das Relações entre Estado e Empresa (Iree), com sede em São Paulo.

Ex-militante do PT e atualmente filiado ao Psol, tendo sua ficha de inscrição abonada por Guilherme Boulos, Yuri foi convidado a participar da transição de governo coordenada pelo vice-presidente eleito Geraldo Alckmin e faz parte do grupo de trabalho sobre igualdade racial.

Em entrevista a A TARDE, onde trabalhou como repórter no início da carreira, Yuri fala sobre o desmanche das políticas públicas para minorias durante o Governo Bolsonaro e o que se pretende propor à administração que começa em janeiro que vem.

O relatório do grupo de transição de igualdade racial deve ficar pronto no próximo dia 30. Já se pode traçar um panorama do que foi avaliado?

Estamos na fase de consolidação de dados. O que dá para falar agora é que se observa um desmonte orçamentário da política de reduções das desigualdades raciais que vai chocar o país. Saímos de uma política que no auge já alcançava um nível de razoabilidade para uma política que, além das nuances governamentais que a levaram para outro caminho, foi precarizada em sua estrutura de cargos, de orçamento e de execução orçamentária. Até agora, o que podemos dizer é isso, que houve um desmonte da política de igualdade racial, que é tão importante para o Brasil, porque não se trata de uma política setorial, mas uma política-meio, que articula com todas as outras políticas para atender as demandas e promover os direitos de 56% da população. Isso tudo foi simplesmente extinto por dentro da institucionalidade. E, sem dúvida, fez parte de um projeto de ódio, um projeto ideológico que tem a população negra e suas especificidades, os quilombolas, os povos de terreiro e as comunidades tradicionais de uma forma geral como inimigos. Um governo que se apoderou do Estado brasileiro para apontar a nossa população como inimiga.

Podemos falar em números?

É difícil falar em números agora porque estamos consolidando, mas o que eu posso dizer é que no auge a gente chegou a executar R$ 47 milhões em política de igualdade racial. Hoje, isso é menor do que um quarto desse valor. De forma genérica, posso dizer que quanto à força de trabalho e definição de política pública, isso foi reduzido drasticamente. Hoje, a secretaria de política racial é uma secretaria pequena, dentro do Ministério da Mulher. Isso já mostra qual foi a direção dada nesse período e as dificuldades estruturais, inclusive. A Fundação Palmares foi colocada dentro de uma pasta na Cultura. Eu a visitei nesta semana e ela tem necessidades desde as instalações físicas, um prédio que não consegue finalizar uma obra, não tem elevador, iluminação...

Temos essa transição de governo, mas ao mesmo tempo temos um bolsonarismo ainda atuante. Não temos a dimensão real do bolsonarismo, mas temos um Congresso à direita. E embora Lula esteja conseguindo montar sua base de apoio, há um conservadorismo no parlamento e na sociedade. A extrema direita bateu muito nas questões identitárias. Questões caras ao movimento negro, às mulheres e à população LGBT+ acabaram virando bandeira de combate na extrema direita. Como você vê o enfrentamento das pautas raciais, das necessidades das populações negras, em um contexto de reacionarismo?

O principal discurso da extrema direita no mundo é o ataque ao que é diferente, ao outro. Com a crise econômica e as dificuldades financeiras, a conta foi colocada nas costas das minorias. A extrema direita construiu um discurso em que os negros, as mulheres, a população LGBTQIA+ e os imigrantes são o alvo e se tornaram o motivo, no discurso deles, de o trabalhador perder o seu emprego. A desindustrialização que tem como motivo o crescimento da reivindicação de direitos pelas minorias. Isso fez com que em diversos países representantes da extrema direita tenham sido eleitos. Bolsonaro no Brasil, Orbán na Hungria...Marine Le Pen na França não foi eleita, mas sempre tem chances de vitória. A volta do fascismo na Itália, um episódio assustador desse processo, e o próprio Donald Trump nos Estados Unidos. Mas tem um lado positivo que eu destaco disso, que os democratas do mundo e mesmo pessoas com perfil mais conservador de centro no espectro político precisaram se juntar para dar respostas a essas pessoas e a gente começa a colher, na minha avaliação, os resultados dessas respostas. Como no próprio governo estadunidense. Quando Joe Biden faz a nomeação de afrodescendentes, de pessoas ligadas aos povos indígenas e de mulheres em cargos estratégicos, ele dá uma sinalização nesse sentido. No Brasil, o discurso de campanha do presidente Lula também foi no sentido de reconhecer que poderia ter sido feito mais em seu governo, e a centralidade que essa pauta precisa ter no seu novo governo, ainda que seja uma frente ampla.

Como você avalia então a declaração feita durante a última campanha pelo ex-candidato do PDT, Ciro Gomes, de que peculiaridades identitárias são baboseira do esquerdismo? O campo progressista forçou a barra nas pautas?

Não, de jeito nenhum. Ciro é que parece não reconhecer a importância das pautas, que não são identitárias. Para ele, talvez, possam ser, mas são pautas que dizem respeito à centralidade do combate à desigualdade no país. As pautas das mulheres e da população negra são parte de um debate de combate à desigualdade entre a diferença de direitos entre a maioria privilegiada e as minorias vulnerabilizadas. É importante para o Brasil. Tratar como peculiaridade identitária ou baboseira questões que são tão vitais na estruturação da sociedade brasileira é irresponsável, é um discurso que flerta com o discurso da extrema direita. Há questões dessas minorias que, obviamente, têm de ser tratadas no seu lugar, são transversais à pauta geral de combate à fome, de combate à desigualdade, de promoção do desenvolvimento social e regional, mas estão longe de ser baboseira. São questões que estão diretamente relacionadas a como a sociedade brasileira foi estruturada, sob o jugo da escravidão e, consequentemente, do racismo, sob o jugo da desigualdade de gênero e da exclusão das mulheres de espaços de poder e de direitos. As mulheres não podiam votar até 1932. Então, tratar isso como subalterno no ranking das políticas públicas relevantes só pode partir de alguém que não entendeu nada sobre as novas formas de fazer política e sobre as expectativas que o eleitor ou o povo subalternizado, o oprimido, tem sobre um novo jeito mais permeável e mais arejado de fazer política. A política velha, ortodoxa, não cabe mais nem para os velhos comunistas. O campo progressista não forçou a barra. Quem tem forçado a barra é Ciro Gomes, um cara que eu respeito muito, com quem já estive e já dialoguei. É um grande político do nosso país, até então um progressista. Não sei como ele se identifica hoje. Mas dizer isso sobre nossas pautas é faltar com a responsabilidade com o país, que precisa pagar uma dívida histórica, praticamente impagável, com o povo que foi oprimido, escravizado e desumanizado em nossas terras. É muito chocante ouvir esse tipo de fala.

No início do Governo Bolsonaro, você falava da necessidade de a esquerda se comunicar melhor com os jovens da periferia e com os evangélicos. Há alguma estratégia para agora dialogar com essa parte do eleitorado?

A primeira coisa que a esquerda progressista precisa fazer, imediatamente, é descer do pedestal. O pedestal da esquerda brasileira distancia o nosso discurso do povo pobre, que não tem escolaridade, que não tem curso superior e que está dialogando em outro patamar. Fazer campanha dizendo que nós temos Chico Buarque e que Bolsonaro tem Gustavo Lima não ajuda em nada. A maioria do povo brasileiro não ouve Chico Buarque, ouve sertanejo universitário, o pagode nos paredões da Bahia, o funk nos bailes do Rio de Janeiro. Descer do pedestal já nos ajudará muito a dialogar. A segunda coisa é entender as igrejas evangélicas, ainda que a gente tenha questionamentos à cúpula, pelo uso que faz do poder econômico e político, por formar base parlamentar para propor a destruição de direitos. Mas essa igreja também é um lugar de assistência social, significa para a mãe negra da periferia que o seu filho está fazendo teatro ou em um grupo de jovens e não suscetível às forças do tráfico de drogas. Então, olhar também de uma perspectiva mais humanista e menos arrogante para aquelas pessoas que são base em suas religiões nos ajudará a pensar em alternativas e saídas que o estado brasileiro deve propor. As igrejas evangélicas, os pentecostais, têm desempenhado um papel muito parecido ao que o estado brasileiro deveria prover.

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