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Como o turismo rural transforma antigas fazendas do Sul da Bahia
Em todas elas, o cacau permanece no centro, ainda que de maneiras distintas.

Por Divo Araújo

O sul da Bahia vive há anos um movimento crescente: antigas fazendas de cacau, muitas delas afetadas pela vassoura-de-bruxa e pela queda no preço do fruto, passaram a receber turistas brasileiros e estrangeiros. O que começou como um jeito de manter as propriedades funcionando virou, hoje, uma alternativa econômica importante na região. A ideia não é nova, mas ganhou diferentes formatos — visitas guiadas, degustações artesanais e até oficinas de fabricação de chocolate. Em todas elas, o cacau permanece no centro, ainda que de maneiras distintas.
A história da Fazenda Vila Rosa, em Itacaré, exemplifica bem essa mudança. O norte-americano Alan Slesinger, paisagista urbano de Nova York, chegou à Bahia em 2003, dois anos após os atentados de 11 de setembro. A vida acelerada na cidade e o clima que marcou os meses seguintes ao ataque às torres do World Trade Center fizeram crescer nele o desejo de “aprender outra língua”, “fugir do inverno” e buscar uma vida mais simples e conectada à natureza. Ele havia conhecido Itacaré em 1999, voltou e decidiu ficar.
Alan comprou a Fazenda Vila Rosa, construída em 1920, que estava há cinco anos abandonada. A motivação inicial não tinha como foco a lavoura cacaueira. “Era mais sobre o casarão antigo com um jardim em volta. O cacau era bônus.” A primeira tentativa de atrair visitantes para a fazenda, em 2011, não deu certo. O passeio era focado na história da família que viveu ali, na arquitetura e no paisagismo.
A mudança veio depois de uma viagem de surf ao Peru, onde Alan viu uma loja que mostrava a produção artesanal de cacau. O formato inspirou a criação, em 2014, de uma loja de chocolates finos na turística Rua Pituba, em Itacaré.
“Abri a minha própria loja com a ideia de criar uma teia de aranha para capturar o meu próprio turista”, conta. A estratégia funcionou: a loja virou a porta de entrada para o turismo rural na Vila Rosa. “No primeiro mês tivemos mais de 100 visitantes”. Em janeiro deste ano, a fazenda recebeu cerca de mil pessoas.
Segundo Alan, a fazenda se mantém em equilíbrio entre o turismo e a venda de chocolate artesanal. “A nossa renda vem desses dois lados: o passeio e o chocolate. Antes tínhamos hospedagem, mas parei durante a pandemia de Covid”, explica.

Ele conta que o negócio ainda não alcançou grande lucratividade. “Não é algo forte economicamente. É uma balança — um pouco das vendas, um pouco das visitas.” Mesmo assim, segue comprometido com o projeto. “A fazenda ainda é muito mais um trabalho de cuidado e dedicação do que uma fonte de renda estável. Mas é um projeto que eu sustento com carinho.”
Novos significados
Enquanto o turismo rural na Vila Rosa nasceu quase por acaso, a Fazenda Taboquinhas, também em Itacaré, nasceu de um propósito. Seu proprietário, Osvaldo Brito, é carioca e viveu 24 anos em São Paulo, onde trabalhava como taxista e atuava como educador ambiental voluntário. Foi assim que conheceu a permacultura — um sistema de planejamento para a criação de ambientes sustentáveis e produtivos em equilíbrio com a natureza. “A permacultura me abriu uma visão do que eu poderia fazer na Bahia.”
O sonho antigo de viver no estado virou realidade quando encontrou a antiga fazenda de cacau em Taboquinhas, distrito de Itacaré. A propriedade às margens do Rio de Contas estava degradada. Osvaldo começou recuperando as matas e reativando o cacau.
“Imediatamente comecei um trabalho de restauração das matas. E eu tinha uma plantação de cacau para cuidar.” Com o tempo, o fruto ganhou um novo significado e o turismo entrou de forma natural.
Osvaldo recebia visitantes mostrando a lavoura e a relação com a Mata Atlântica. O foco do passeio é o aprendizado.
“O meu principal foco do passeio é mostrar o potencial do cacau. Levar o turista a entender o que é cacau e o que é chocolate de verdade.”
A experiência inclui chupar cacau no pé, ver a fabricação no pilão e aprender sobre culturas tradicionais, além da degustação dos chocolates finos produzidos na fazenda.
O negócio funciona em diferentes frentes. “Temos três eixos: a produção de chocolate puro é a principal fonte de renda. Depois vem o turismo. E a plantação de cacau.” Mesmo com trajetórias distintas, Vila Rosa e Taboquinha encontraram no turismo uma oportunidade de se reinventar. Nos casarões restaurados, nas trilhas sob a sombra da Mata Atlântica e no chocolate feito ali mesmo, o cacau continua sendo o que move o sul da Bahia.
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