OPINIÃO
O problema do mundo pequeno
Por Marcio Luis Ferreira Nascimento*
Em 1929 o autor, poeta e jornalista húngaro Frigyes Karinthy (1887 - 1938) escreveu um pequeno e visionário conto chamado Láncszemek (que pode ser traduzido por conexões, elos ou mesmo links) contido no livro Minden masképpen van (algo como “Tudo é diferente”). No conto foi proposto um curioso jogo para demonstrar como as pessoas estavam cada vez mais conectadas entre si do que nunca: ao escolher qualquer um entre os bilhões de seres humanos, Karinthy apostava que, usando não mais do que cinco indivíduos, um dos quais fosse alguém conhecido, seria possível entrar em contato com qualquer outro usando nada além de uma rede de conexões entre pessoas. E ilustrou o caso de alguém que conhecia alguém... que conhecia um Prêmio Nobel de Literatura.
Karinthy errou por pouco na conta do conto. Tempos depois esta ideia passou a ser considerada como algo muito relevante, e se tornou conhecida como a “teoria dos seis graus de separação”, a partir de um estudo científico feito pelo psicólogo americano Stanley Milgram (1933 - 1984), professor de Harvard. No artigo intitulado The Small World Problem, publicado no Psychology Today 2 (1967), págs. 60 - 67, Milgram propôs uma curiosa tese em que bastam no máximo seis elos ou laços de amizade para que duas pessoas quaisquer estejam conectadas.
Para alguns, ter um amigo famoso chama muita atenção, cria alguma reputação ou mesmo prestígio. Para outros, é absolutamente relevante ter um grande número de conexões, seja para fins pessoais ou mesmo profissionais
Isto de fato acontece com muita gente. Mesmo muito distante de casa, alguns se surpreendem ao encontrar pessoas que conhecem amigos próximos, reforçando o clichê sobre um “mundo pequeno”. Tente fazer isto – e se ainda não o fez, provavelmente irá se surpreender. Eu mesmo conheço alguém que conhece um ex-presidente, e outro que conhece um papa, apenas para ficar em dois exemplos de grau número dois...
De fato, é isto que torna interessante o uso das redes sociais – na verdade a teoria de Milgram é a base destas redes, um produto de sociedades modernas, um retrato da insistência em mantermos laços, reforçados pela rápida e crescente facilidade de comunicação fornecida pelos avanços tecnológicos. Se não, observe: para alguns, ter um amigo famoso chama muita atenção, cria alguma reputação ou mesmo prestígio. Para outros, é absolutamente relevante ter um grande número de conexões, seja para fins pessoais ou mesmo profissionais.
Rede
Um resultado interessante da teoria dos seis graus de separação pode ser visto num jogo da internet chamado “Oráculo de Bacon” (The Oracle of Bacon: www.oracleofbacon.org). Tal brincadeira foi elaborada por Brett Tjaden (n. 1970), um cientista da computação americano e professor da Universidade James Madison (www.jmu.edu), que se interessou por uma entrevista do astro americano Kevin Norwood Bacon (n. 1958) em 1994. Nesta, Bacon afirmava que tinha trabalhado com todo mundo em Hollywood, ou com alguém que tinha trabalhado com algum artista hollywoodiano. Este jogo mostra, portanto, como Bacon se relaciona com artistas, sejam de filmes americanos ou não, resultando num número.
Desde 2012 o Google tornou possível a pesquisa do número de Bacon de qualquer artista. Basta escrever Bacon number e o nome de qualquer astro. Por exemplo, o premiado jornalista, diretor e ator brasileiro Wagner Maniçoba de Moura (n. 1976) tem um número de Bacon de 2, pois foi um dos protagonistas do excelente filme de ficção científica Elysium em 2013, contracenando com o ator paquistanês-americano Faran Haroon Tahir (n. 1964), que havia atuado com Bacon no filme Paixão de Ocasião (Picture Perfect) em 1997.
O termo rede não é um acaso: sugere que cada nó está conectado aos demais. Ou seja, cada nó representa alguém, e as relações entre as pessoas podem ser vistas como conexões ou ainda linhas (links) entre um e outro nó. Matematicamente, a solução para ser amigo do amigo... do amigo de qualquer um, mesmo uma celebridade, pode estar no sexto elo. Mas isto não é o mais interessante da teoria: uma das mais importantes conclusões reside no fato de que não somos assim tão isolados quanto imaginamos. Outra é que a paz é possível, pois bastam apenas alguns poucos apertos de mão para conhecermos qualquer pessoa a partir de algum conhecido. O mundo é mesmo muito pequeno!
*Professor da Escola Politécnica, Departamento de Engenharia Química e do Instituto de Humanidades, Artes e Ciências da Ufba
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