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ENTREVISTA - ARNALDO JARDIM

‘A Lei do Combustível do Futuro coloca o Brasil na vanguarda’

Presidente da Comissão de Transição Energética da Câmara Federal discute os impactos da nova legislação na produção de biocombustíveis

Por Divo Araújo

17/02/2025 - 6:00 h
Arnaldo Jardim
Arnaldo Jardim -

Na semana passada, o deputado federal Arnaldo Jardim (Cidadania-SP) esteve em Salvador, onde participou, na Federação das Indústrias do Estado da Bahia (Fieb), de um debate com investidores e grandes players do mercado de combustíveis renováveis. No encontro, falou sobre o Combustível do Futuro, projeto que relatou na Câmara dos Deputados e que se tornou lei em outubro do ano passado, após sanção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Em entrevista exclusiva ao A TARDE, concedida antes do evento na Fieb, Jardim destaca que, apesar do pouco tempo, a Lei do Combustível do Futuro já começou a produzir efeitos. Segundo ele, a legislação foi construída de forma ampla, com debate entre diversos setores, e aprovada por unanimidade no Congresso. “Não é uma legislação de governo, muito menos de oposição. É uma legislação de Estado, com interesse estratégico”, afirma. Saiba mais na entrevista a seguir.

Em outubro do ano passado, entrou em vigor a ‘Lei do Combustível do Futuro’. O que a torna reconhecida, como anunciado à época, o maior programa de descarbonização da matriz de transportes e mobilidade do mundo?

Primeiro, porque o Brasil é um país de dimensões continentais e tem um perfil de transporte muito calcado no transporte rodoviário. E tudo que se faz para a produção de biocombustíveis tem um impacto muito imediato e muito grande. O Combustível do Futuro é uma legislação por mim relatada e sancionada pelo presidente da República na sua integridade. Destaco também que ela foi aprovada por unanimidade no Congresso Nacional. Por que menciono isso? Porque, muitas vezes, nós temos determinadas leis e uma coisa que se costuma dizer no Brasil é: essa lei não pega. Eu tenho firme convicção de que a lei Combustível do Futuro já pegou. Primeiro, porque ela foi construída amplamente. Não é uma legislação de governo, muito menos de oposição. É uma legislação que serve ao Estado, tem interesse estratégico. Independente de que governo tenhamos, tenho certeza que o rumo será mantido. Depois, ela abarca um conjunto de questões. O etanol é uma forma de descarbonizar o uso da gasolina. O biodiesel, uma forma de descarbonizar o uso do diesel. O biometano é uma forma de evitar a emissão de metano, gerando um componente importante de descarbonização para o gás natural. Tem ainda o combustível sustentável de aviação, que será um instrumento para descarbonizar o querosene. Mas não basta isso. O projeto foi além. Estabelece premissas para o chamado diesel verde, que é um diesel totalmente de base biológica. Segundo, estabeleceu o critério de mensuração do ciclo de vida para o ciclo de vida “do poço à roda” e depois “do berço ao túmulo”. Vou explicar o que é isso. Hoje, todas as vezes que você vai medir o impacto ambiental no setor de transportes, tem o período que você mede esse impacto. Quando nós decidimos não só analisar o movimento em si do veículo, mas a origem do combustível, se chama “do poço à roda”. E quando se amplia esse conceito para “do berço ao túmulo” se discute também todo o tratamento anterior – exemplo da produção do veículo -, e todo o tratamento posterior, num processo de logística reversa. Por exemplo, você mede de que forma a bateria do carro elétrico vai ser disposta após o seu uso. Esse conceito amplo é o que faz o Brasil ter um papel de vanguardeiro. Isso nos fortalece como protagonistas da nova economia, da economia de baixo carbono. O Combustível do Futuro não ficou aí. Hoje nós temos uma clara legislação, muito bem constituída, sobre que regras devem ser observadas para sequestro e captura de gás carbônico, o CO2. O Combustível do Futuro é um dispositivo amplo sobre a descarbonização do setor de combustíveis, do setor de transportes.

Como está o andamento da implementação da Lei do Combustível do Futuro?

Quando você faz uma legislação, e a ela me dediquei junto com outros parlamentares que ajudaram muito, você tem que acompanhar também a implementação. Não basta somente fazer a lei, embora seja uma lei bem acolhida, que vai pegar. É preciso acompanhar a sua implementação, para que o seu uso seja feito corretamente e o mais rapidamente possível. Eu constituí um espaço, que convido todos a acompanharem, que chama-se Monitor Energia do Futuro. É um espaço no Instagram e um site onde estão relatadas todas as medidas para a implementação da lei. Portarias, decretos, workshops, audiências públicas que foram feitas. Lá, estão também relacionados todos os investimentos que já foram anunciados, que já estão sendo implementados, a partir das regras que nós estabelecemos nessa legislação. Além disso, o monitor notícia tudo aquilo de novidade positiva que tem em relação a inovação tecnológica, as pesquisas científicas, para que o segmento possa continuar buscando os novos horizontes de eficiência e maior produtividade. Estou muito animado. E estar na Bahia vai ser muito importante para mim. Tenho certeza que vou aprender muito.

O senhor mencionou os investimentos. Na assinatura da sanção da lei, grupos empresariais anunciaram aportes em novos projetos para a produção de biocombustíveis. Essa legislação amplia as oportunidades de mercado para a iniciativa privada?

Amplia de forma muito significativa. Os investimentos já anunciados dos diferentes segmentos que são amparados nessa nova legislação, já superam a casa dos R$ 260 bilhões. É um número extraordinário. Acho que isso inclusive guarda coerência com dois outros projetos que nós aprovamos: o programa Nova Indústria Brasil e o Programa Mover. Com esses programas, o Brasil ganha um impulso para retomar a sua indústria. Nós temos que apostar nos segmentos em que temos vantagens competitivas e comparativas. E nesse segmento de produção de energia renovável, o Brasil é campeão do mundo. É aí que nós vamos fazer crescer a nossa indústria. Em torno da energia eólica, a solar, dos biocombustíveis, que afora o evento em si, causa todo um impacto no setor de equipamentos e pesquisa. A inovação casa muito com essa legislação também.

Essa nova legislação também estabelece um marco regulatório para a captura e estocagem de carbono. Qual o impacto desse avanço na atração de investimentos?

Vou citar um exemplo concreto. Nós temos uma série de pesquisas de empresas que mostram como na produção de etanol pode ser capturado o gás carbônico. Algumas empresas já estão desenvolvendo essa tecnologia. Eu vou cunhar uma frase que estarrece ao mundo e enche de orgulho a todos nós. O processo de produção do etanol pode ser negativo do ponto de vista da pegada de carbono. Ou seja, ao invés de deixar uma pegada de carbono como todos os combustíveis, ele poderá ser essencial à captura de carbono. Você pode, no final, ter o etanol sequestrando carbono, ao invés de emitir, que é o que normalmente se faz num ciclo como esse.

O Programa Combustível do Futuro define novos percentuais, mínimos e máximos, para a mistura de etanol na gasolina e de biodiesel no diesel. Como será a implementação dessas mudanças?

Do etanol nós vamos passar rapidamente de 27% para o patamar de 30%. Os testes já estão quase todos prontos. A conclusão ocorrerá em março, acredito, na reunião ordinária do Conselho Nacional de Política Energética. É o CNPE que vai determinar isso. Eu creio que nesta reunião do conselho em março, essa mistura evolui de 27% para 30%. E depois nós teremos novos horizontes de aumento da mistura. Já o biodiesel está em 14% a mistura e deve ir para 15% também em março. Depois já tem uma previsão de mais 1%, 1%, 1%, 1%, até atingir 20% da mistura do biodiesel. Com relação ao combustível sustentável de aviação, ele precisa ser misturado à base de 1% a partir de 2027, no querosene. E também vai subindo em sequência até atingir 10% do querosene de aviação. São volumes importantes, são aumentos muito significativos. Isso significa cumprir a meta de descarbonização. Vai precisar de investimento, gerar emprego e renda. É uma coisa muito entusiasmante o que está acontecendo no Brasil nesse segmento.

O senhor mencionou a aviação, um dos destaques da nova legislação. Dado que o setor é um dos maiores emissores de gases de efeito estufa, quais serão os principais impactos das novas diretrizes?

O setor de aviação de fato é um grande emissor de gases de efeito estufa. As regras que nós estamos estabelecendo guardam coerência com as regras da IATA, que é o órgão internacional que normatiza o combustível de aviação. Tudo isso vai ser muito importante. O Brasil não só vai cumprir as suas metas, mas vai se transformar em uma plataforma importante, porque nós temos muita competitividade. Nós vamos ser exportadores de combustível sustentável da aviação.

A produção de biocombustíveis no Brasil atingiu recordes históricos. Qual é a importância desse setor, não só para o meio ambiente, mas também para a geração de emprego e renda?

Nós mantivemos, nessa ampliação prevista para o biodiesel, o componente chamado selo social. Um percentual de no mínimo 20% daquilo que se usa como matéria-prima tem que vir de pequenas propriedades e agricultura familiar. Nós identificamos e estimulamos também uma diversidade de origem. Hoje, o biodiesel do óleo vegetal vem da soja, mas pode vir da mamona, da palma. Tem diferentes produtos que estão sendo utilizados e temos estimulado muito a construção de biorrefinarias de menor porte. A ideia é regionalizar, descentralizar a produção do biodiesel. O biodiesel vem do óleo vegetal, ou seja, você pega uma semente e tira o óleo dela, a exemplo da soja, milho, mamona e tudo mais que eu mencionei. Só que há outra forma de extração que pouca gente conhece. É o biodiesel de origem do sebo bovino. Metade do biodiesel que mistura no diesel no Brasil vem do sebo bovino. E nós temos uma produção crescente de carne. O Brasil é o primeiro exportador de carne bovina do mundo, o segundo de carne de frango e o quarto maior exportador de carne suína. E nós temos particularmente o sebo bovino que é altamente propício à produção de biodiesel. Com isso vai se fechando o ciclo de produtividade. Estimula a produção de mais carne, barateia a carne porque tem esse osso e assim vai.

A legislação também prevê incentivos para o biogás, que desempenha um papel crucial no suprimento de energia do país. Quais são os principais avanços nesse sentido?

Foi outra coisa que nós avançamos. Os gases de efeito estufa, que causam a mudança climática e geram o aquecimento do planeta, são dois basicamente: o dióxido de carbono, o CO2, e o metano, o CH4. Só que o impacto do metano sobre a atmosfera é 12 vezes maior do que o CO2. Você pega uma molécula de CO2 e uma molécula de metano. O impacto que ele tem é 12 vezes superior ao da molécula de CO2. Há muito tempo os Estados Unidos propuseram um acordo só para diminuir a emissão de CO2. De onde que vem o metano? Da decomposição de matéria orgânica. Aquilo que fica na natureza apodrecendo. Galhos, folhas, resíduos sólidos, lixo, estrume de vaca, cama das granjas de frango. Tudo isso eram questões muitas vezes descartadas. Com o biogás você passa a ter um uso nobre. Você passa a produzir o metano. Você recolhe o metano e usa ele. Ao invés de deixar ele ir para a natureza, poluir e produzir gases de efeito estufa, você recolhe ele e produz energia. É um jogo de ganha, ganha. Nós estabelecemos um dispositivo para produzir biometano. Tem muitas iniciativas já em andamento de pequeno, médio e grande porte. E o Brasil, com isso, vai reter uma parcela importante do que emite de gás de efeito estufa - no caso, o metano.

O senhor participou aqui em Salvador de um encontro na Fieb com o tema ‘Transição energética, oportunidades na Bahia’. Como o senhor vê o potencial do nosso estado para liderar essa transformação?

Um potencial muito grande. Primeiro, pelas condições da própria natureza. A Bahia tem um grau de irradiação solar espetacular. É a Bahia dos ventos, que impulsiona a energia eólica. A Bahia é produtora agrícola de grãos e proteína, que dá uma vertente muito grande para o biometano. Bahia de áreas que podem ser recuperadas, como é o projeto espetacular da Acelen, que propõe transformar 100 mil hectares de região de vegetação rasteira, plantando macaúba, que significa sequestrar carbono. Faz bem para a natureza, restaura a biodiversidade, além de usar a macaúba para produzir combustível sustentável de aviação. Uma coisa espetacular. E isso somado às energias renováveis e as outras iniciativas. Eu quero aplaudir o governo do Estado por compreender essa importância. Por ter estabelecido uma legislação estadual que guarda coerência, sintonia com tudo isso que falei. Estou muito feliz porque estarei no Estado que pode ser líder da transição energética, da produção de biocombustíveis, da produção de energia renovável.

O senhor, no Congresso, é também um dos principais representantes do setor agro. Na sua avaliação, a meta de zero carbono ou até carbono negativo é viável para a agricultura?

No Congresso, tenho três responsabilidades que me orgulham e me permita destacar. Eu sou presidente da Comissão de Transição Energética da Câmara, que produziu esse marco regulatório do hidrogênio de baixo carbono, do Combustível do Futuro, das debêntures de infraestrutura. Eu sou presidente da Frente do Brasil Competitivo e sou vice-presidente nacional da FPA, que é a maior frente do agro. Quando definimos a legislação sobre o mercado de carbono, deixamos o agro de fora entre os setores que vão ter que cumprir a meta. Nós deixamos de fora porque o agro ainda não tem metodologias de avaliação bem estabelecidas. As metodologias que tem são do Hemisfério Norte, de países que tem Inverno, que só têm uma cultura por ano. É diferente da nossa agricultura tropical. A gente planta lá em Luís Eduardo Magalhães, duas culturas por ano, em alguns casos até três. Mas estamos trabalhando com uma série de entidades para ter essas referências. Essas referências estabelecidas, eu não tenho dúvida de que a nossa atividade agro é sequestradora de carbono. É carbono negativa, porque nós retiramos mais do que emitimos carbono na atividade de produção.

Para concluir, o Brasil vai sediar este ano a COP 30 em Belém. Qual a sua expectativa em relação ao evento? E aproveitando, como o senhor avaliou a decisão de Donald Trump de retirar os Estados Unidos do Acordo Climático de Paris?

Eu começo pela decisão de Trump, que eu lamento. Os Estados Unidos podem ter até um ganho momentâneo porque vão aliviar algumas exigências que precisam ser cumpridas. Mas acho que a médio prazo é um prejuízo. Porque está claro que o mundo vai seguir no rumo das energias renováveis para reduzir as mudanças climáticas. O que pode fazer com que os Estados Unidos paguem um preço alto, porque vai perder a corrida da inovação tecnológica, do uso das fontes renováveis. Por outro lado, essa decisão abre uma grande oportunidade porque o Brasil tinha que concorrer com políticas de incentivo que os Estados Unidos estavam praticando. Tinha gente indo produzir energia solar lá, energia eólica lá. O nosso hidrogênio, por exemplo, com essa mudança, se torna muito mais competitivo. E o Brasil deve aproveitar bem o momento da COP 30 para expor os seus compromissos. Nós temos a matriz elétrica mais renovável do planeta. Nós temos a partilha de combustível mais inovadora e o Combustível do Futuro vai ser ainda mais. Nós precisamos pedir ao mundo que reconheça esse esforço e que nos ajude a valorizar os nossos ativos ambientais para manter as nossas florestas de pé. O Brasil deve sair da COP solicitando esse compromisso ao mundo.

Raio-X

Nascido em Altinópolis (SP), Arnaldo Jardim é engenheiro civil formado pela USP e iniciou sua trajetória política como líder estudantil. Eleito pela primeira vez em 1986 como deputado estadual por São Paulo, foi o relator do anteprojeto da Constituição Estadual. Exerceu quatro mandatos como deputado estadual e está em seu quinto mandato como deputado federal. Em 2015, foi secretário de Estado da Agricultura e Abastecimento de São Paulo. Na Câmara, preside a Comissão de Transição Energética, a Frente do Brasil Competitivo e é vice-presidente nacional da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA).

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