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Prefeituras vão demitir e cortar serviços se houver queda de receita

Mais de 100 cidades devem sofrer perdas milionárias por causa da redução populacional apontada pelo Censo

Publicado sábado, 07 de janeiro de 2023 às 08:34 h | Autor: Dante Nascimento
Durante reunião nesta sexta, os prefeitos mudaram o estatuto da UPB para que entidade possa ingressar também com uma ação coletiva
Durante reunião nesta sexta, os prefeitos mudaram o estatuto da UPB para que entidade possa ingressar também com uma ação coletiva -

O risco de corte de parte dos recursos obtidos por meio do FPM (Fundo de Participação nos Municípios), por causa da queda populacional apontada pelos números parciais do Censo, pode levar cidades baianas a demitirem em massa e acabarem com serviços públicos essenciais na área da educação e saúde.    

De acordo com a base de cálculo do TCU (Tribunal de Contas da União), com referência ao número de habitantes, Camacan, no Sul da Bahia, por exemplo, deixará de receber R$ 10,5 milhões por ano, cerca de R$ 900 mil por mês. Além do prejuízo à economia, a cidade também pode perder duas das 13 cadeiras da Câmara Municipal.

O prefeito de Camacan, Paulo do Gás (Podemos), contou ao A TARDE que a situação é caótica e que, se a queda de receita for concretizada no próximo dia 10, quando é disponibilizada mais uma parcela da verba federal, terá que cortar na “própria carne” para readequar o planejamento financeiro do município. 

“Vamos ter que demitir pelo menos 400 servidores e isso seria um caos para uma cidade de 32 mil habitantes. Merenda escolar, serviços de saúde que a gente hoje tem, de alta e média complexidade, têm que parar. Tem o ‘Melhor em casa’, que é uma equipe multidisciplinar, que atende pacientes, a gente vai ter que cortar. Não é diminuir, não. É cortar mesmo, porque não tem outra opção”. 

Segundo o prefeito, a prévia do Censo mostra que Camacan perdeu cerca de 10 mil habitantes desde a realização do levantamento, em 2010, caindo de 32.023 para 22.460 pessoas. Ele contesta a pesquisa e diz que localidades mais afastadas da cidade não foram consideradas pela pesquisa.    

“Tem seis ‘Portelinhas’ hoje que não existam há 12 anos. Tem um bairro chamado Brogodó, que não existia. A zona de agricultura estava degradada e hoje tem muita gente comprando fazenda e crescendo a zona rural assustadoramente, o que é bom pra gente. A região é bem habitada”, argumenta, ao ponderar que somente através do cartão do SUS, o município tem mais de 27 mil moradores cadastrados. 

Em Mundo Novo, Centro-Norte baiano, a situação não é diferente. A cidade, antes com 27.153 habitantes, agora, segundo o Censo parcial, tem 20.564, quase 7 mil a menos. O resultado será sentido nos cofres municipais, que deixarão de receber R$ 7 milhões por ano de recursos do FPM. O prefeito da cidade, Dr. Adriano (PSB), disse que foi surpreendido com a redução populacional e chamou de inadmissível os dados preliminares do IBGE.      

“Nosso número de eleitores cresceu, o número de nascidos vivos, número de alunos matriculados cresceu. (...) Nós não temos 100% de cobertura dos agentes de saúde, mas mesmo com uma deficiência, nós conseguimos cadastrar no Sistema Únicos de Saúde 23.700 pessoas. Como é que agora Mundo Novo fica só com 20 mil pessoas, onde, em uma área que não está totalmente coberta já tem quase 24mil pessoas?”, questiona.

O prefeito não acredita que os recursos serão cortados, mas se prepara para o pior. “Num município com a extensão territorial imensa já temos dificuldade em manter as estradas, custear a saúde, imagina se nós tivermos essa perda, são milhões de reais em menos de um ano. Vai comprometer consideravelmente a saúde, porque os 15%, que constitucionalmente, os municípios são obrigados a repassar para a saúde, e que já não são suficientes, agora vai comprometer ainda mais, porque nós teremos queda na arrecadação e, como consequência, teremos queda também na devolutiva da saúde”. 

Brejões obtém liminar

A UPB estima que, ao todo, 101 prefeituras sejam afetadas pelos dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). A maioria já ingressou com ações na Justiça Federal requerendo manutenção do valor do recurso do Fundo até finalização da Censo e sua revisão. Pelo menos uma cidade já obteve liminar nesta sexta-feira, 6, Brejões, a 470 quilômetros de Salvador.

Segundo o prefeito da cidade, Alessandro Correia (Rede), a decisão judicial garante o valor sem cortes até pelo menos o próximo mês, quando será concluído o Censo. “A principal receita de Brejões é o FPM, sem isso, inviabiliza, não permite que a gente continue quase nada de serviço. Eu não saberia o que fazer se não tivesse conseguido a liminar. Agora, eu vou respirar mais 30 dias para montar um plano de ação”, explica Correia.  

Nesta sexta-feira, 6, prefeitos da Bahia aprovaram, em mais uma reunião organizada pela UPB, mudança no estatuto da entidade para que se possa ingressar com uma ação coletiva contra perdas no Fundo.

Críticas ao recenseamento do IBGE

O prefeito de Mundo Novo, Dr. Adriano, criticou as condições e a forma como o censo está sendo realizado na cidade. Ele diz que a prefeitura identificou “várias pessoas que não foram recenseadas” e que o IBGE, responsável pela pesquisa, não deveria “se limitar a bater na porta”, mas em “unir os dados de vários sistemas” que atestariam a população do município. 

“O coordenador local do IBGE me relatou que em alguns casos as pessoas estavam fazendo de qualquer jeito [a contagem] e várias foram afastadas [agentes recenseadores]. A forma como encontraram para remunerar os servidores que passaram nessa seletiva estimula a não contagem real das pessoas, estimula para que as pessoas visassem apenas terminar a sua área o mais rápido possível e não para necessidade de contar realmente quantas pessoas havia naquela área”, afirmou Dr. Adriano.

Em nota, a assessoria de Comunicação do IBGE disse à reportagem que Mundo Novo ainda está na fase final de coleta do Censo em quatro dos seus 62 setores censitários (áreas de trabalho), onde estão trabalhando, no momento, quatro recenseadores, um por setor, como é de praxe. O instituto informa ainda que o município teve, no início do Censo, um total de 20 vagas de recenseadores, todas preenchidas, e que “não houve nenhum incidente que levasse a desligamentos desses profissionais por interesse do IBGE, ao longo dos cinco meses de trabalho”. Todos os desligamentos, destaca, ocorreram por iniciativa dos próprios contratados.

O IBGE confirmou que realizou duas Reuniões de Acompanhamento e Planejamento do Censo na cidade, com representantes da prefeitura e da comunidade local e que os recenseadores são treinados e têm atuação acompanhada e avaliada por uma cadeia de supervisão.

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