POLÍTICA
De olho no voto, antigos adversários viram aliados

Por Biaggio Talento | Agência A TARDE
Diante das reviravoltas na política, essa “ciência” parece cada dia mais semelhante às artes circenses do equilibrismo e do malabarismo. Só mesmo encarando desse jeito para tentar entender alianças improváveis que sempre ocorrem em anos eleitorais. Talvez uma famosa frase de Winston Churchill caracterize bem os limites dos acordos políticos a depender da ocasião, dos objetivos e dos inimigos: “Se Hitler invadisse o inferno, eu cogitaria de uma aliança com o demônio”, disse o primeiro-ministro inglês da Segunda Guerra.
Embora seja exagerado aplicar essa máxima à política baiana, não deixa de provocar espanto para uns e risos a outros as novas alianças que têm se formado com vistas ao pleito municipal deste ano e acordos visando à eleição de 2010.
Dois pesos e duas medidas são utilizados em alguns casos como ocorre com a estratégia do PMDB que rejeita aliança com o Democratas na capital, mas não faz objeção que isso ocorra no interior, conforme preconizou Geddel Vieira Lima, ministro da Integração Nacional.
Método semelhante é usado pelo PSDB, que integra a base do governador Jaques Wagner, mas aceitaria de bom grado, conforme disse o presidente da Assembléia Legislativa, Marcelo Nilo (PSDB), um eventual apoio do DEM caso o candidato tucano, Antonio Imbassahy, dispute, eventualmente, o segundo turno de prefeito em Salvador contra Walter Pinheiro (PT) ou João Henrique (PMDB).
Estranho no ninho – Contudo, para observadores de fora da cena política, um dos episódios mais estranhos vêm sendo as negociações do governo do Estado para a entrada na base de apoio da administração petista do PR, onde se acomodou antigos integrantes do extinto PFL, legenda que deu as cartas na Bahia por 16 anos e sempre tratou a ferro e fogo as chamadas “esquerdas”.
Dentro dessas negociações, que passavam também pelo apoio do PR ao pré-candidato petista à Prefeitura de Salvador, Walter Pinheiro, o ex-deputado Pedro Alcântara esteve na iminência de ser nomeado para a Secretaria da Agricultura, na eventualidade do atual titular, Geraldo Simões, deixar o posto para ser candidato à Prefeitura de Itabuna, como queria o governador Jaques Wagner.
Isso acabou não ocorrendo, mas a possibilidade concreta de Alcântara assumir um posto de primeiro escalão no governo estadual deve ter dado frio na espinha de petistas históricos, se é que eles ainda existem.
Nos seus tempos de líder do PFL na Assembléia Legislativa, o então deputado Alcântara foi protagonista de um dos maiores escândalos ocorridos na Bahia, que envolvia autoridades do Estado com o crime organizado. Em 1999, irritado com a carga que vinha sofrendo para conceder um habeas corpus com o objetivo de libertar o assaltante de cargas Vander Dornelles, o desembargador Lourival Ferreira produziu um despacho-desabafo, publicado no Diário Oficial, denunciando um deputado e dois colegas desembargadores como autores das pressões. Logo depois, revelou que o deputado era Alcântara, e os colegas os desembargadores Mário Albiani e Walter Brandão.
O escândalo atraiu a Salvador uma subcomissão da CPI do Narcotráfico. Ferreira confirmou sua denúncia aos deputados, que ouviram os vários envolvidos no caso como o ex-policial rodoviário federal Luis Augusto Santos, colega de cela de Dornelles, na penitenciária de Feira de Santana. Ele disse ter ouvido de Dornelles ter pagado R$ 100 mil “a um deputado e autoridades” para ser libertado. O homem encarregado de levar o dinheiro, o comerciante Eidmar Medrado, revelou ter trabalhado como cabo eleitoral de Alcântara.
Reação dos históricos – Na época, os depoimentos foram esclarecedores para o deputado federal Nelson Pelegrino (PT), um dos integrantes da comissão que esteve em Salvador. Pelegrino se disse convencido dessa ligação. “Ficou muito claro para mim de que existe mais coisa por trás disso e, se a comissão tiver tempo, vamos, de fato, comprovar que existe crime organizado atuando na Bahia, o roubo de cargas e o tráfico também”, declarou na oportunidade.
Apesar dos testemunhos e dos indícios, a subcomissão da CPI do Narcotráfico não conseguiu documentos para provar as suspeitas do envolvimento de autoridades com o tráfico. O caso do deputado acabou abafado pelo PFL, que tinha maioria na Assembléia Legislativa, e até hoje não foi devidamente esclarecido.
Quem já conseguiu pular todos os obstáculos e se acomodar no governo de um grupo político a quem combateu por anos foi o ex-deputado Eujácio Simões. Ele ocupa desde o início do governo Wagner uma diretoria da Secretaria da Agricultura. A vida não foi tão fácil assim para Eujácio em passado próximo: em 2003, no PL, ele foi execrado pelos colegas de agora, quando indicado para a direção regional do DNER. Ainda era difícil as esquerdas engolirem o fato de o senador Antonio Carlos Magalhães ter escapado de uma segunda cassação (por causa do escândalo dos grampos) e ainda poder indicar um nome do seu grupo (Eujácio) para cargo federal na Bahia.
Dos cristãos novos, o senador César Borges (PR) teve o confronto mais radical com o PT durante seu período de governador pelo PFL quando enfrentou em 2001 a greve dos policiais militares. Borges apontou os petistas como responsáveis pela paralisação e determinou a exclusão dos cabeças do movimento.
O ministro Geddel disse, no período em que o PT tentava atrair para candidatura de Pinheiro o PR, que os petistas teriam dificuldades para explicar essa eventual aliança. “Porque o meu amigo governador do Estado e o PT, a todo instante, fazem, por exemplo, referência aos desmandos e desacertos administrativos e outros mais dos últimos 16 anos que ocorreram na Bahia. Que face mais visível podem ter esses desmandos ou esses equívocos administrativos tão ressaltados pelo PT do que a figura do senador César Borges?”
Sem reflexos – Essas constantes mudanças de posição política que resultam na briga de aliados históricos ou aliança de adversários ferrenhos não tem reflexos no eleitorado. Pelo menos é o que pensa o sociólogo e cientista político André Pereira César, da CAC Consultoria Política. “O eleitor fica muito aquém disso, não tem capacidade de notar essas nuances do jogo político”. Nessa linha, considera normal a busca de apoio político do governo Wagner nos partidos onde se acomodaram antigos adversários como o Partido Republicano.
“O risco é que esse apoio não é algo sólido, em que se possa confiar plenamente. É como a base de apoio de Lula no Congresso”, comparou. Do mesmo modo, atribui a um “pragmatismo com vistas a 2010” a posição para alguns dúbia de Geddel sobre o Democratas. “Ele é pré-candidato a governador em 2010, isso não se pode descartar, e está formando sua base de apoios no interior”.
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