DIVIDIDOS, MAS NEM TANTO
Antipetismo aproxima atual gestão da direita mais radical em Conquista
Eleitores de Bolsonaro não descartam aliança para barrar PT de reconquistar prefeitura
Por Alan Rodrigues
Terceiro maior colégio eleitoral da Bahia, com mais de 250 mil eleitores, Vitória da Conquista abriga hoje tendências políticas que, em princípio, sugerem uma diversidade de pensamentos mas, na prática, a polarização do eleitorado é flagrante e a cidade se divide entre o petismo e o antipetismo.
Por 20 anos, Conquista foi governada por prefeitos do PT. A interrupção do ciclo petista se deu em 2016, no auge da lava-jato, com a vitória de Herzem Gusmão (MDB) sobre Zé Raimundo, do PT, com uma margem folgada de votos. Na reeleição, em 2020, o petista chegou a vencer o primeiro turno, mas, a virada aconteceu, mais uma vez com vantagem confortável, evidenciando o desgaste do partido dos trabalhadores no município.
Entre uma eleição e outra, o fenômeno do bolsonarismo ganhou peso decisivo na política local. Aliado de primeira hora do ex-presidente Jair Bolsonaro, Herzem, falecido em 2021, após a reeleição, atraiu os votos da direita conservadora.
Mas, Sheila Lemos (União Brasil), que assumiu a prefeitura após a morte de Herzem, se distanciou desse eleitorado ao apoiar ACM Neto, candidato de seu partido ao governo do estado, e adotar uma postura neutra na disputa presidencial no primeiro turno, declarando apoio a Bolsonaro somente no segundo.
Essa cisão alimenta o desejo do PL, partido de Bolsonaro, de construir uma candidatura própria, seguindo a orientação do presidente estadual do partido, o ex-ministro João Roma. Mas, a possibilidade de reaproximação não está descartada.
Correndo por fora dessa polarização a três, a vereadora Lúcia Rocha (MDB), segunda mais votada para deputada estadual no município, com 25.161 votos, aparece como alternativa mais viável e vem liderando as pesquisas até o momento. Oposição a atual gestão, ela participou ativamente da campanha do governador Jerônimo Rodrigues (PT) e pode ser um nome de consenso.
Legado
Contra todas as articulações da atual gestão e do eleitorado mais à direita, o PT entra nas eleições conquistenses defendendo o legado de duas décadas de administração. O deputado federal Waldenor Pereira, mais votado do município, com 32.071 votos, é o principal nome do partido para a sucessão municipal, mas defende o respeito ao cronograma do partido e ao processo de discussão interna.
Ele acredita que, apesar de todo o antipetismo consolidado no eleitorado de Conquista, o PT tem muito a defender no município. “Nosso partido tem 20 anos de muitas realizações. O povo de Conquista é politizado”, acredita Waldenor.
Ele destaca o investimento em saneamento básico, “um dos 10 melhores do Brasil”, além da implantação de educação de nível superior e programas estaduais e federais, como o Luz para todos, incentivo à agricultura familiar, o hospital Afrânio Peixoto, policlínica, e 14 mil unidades residenciais do Minha Casa, Minha Vida.
Para Waldenor, a eleição de Herzem Gusmão em 2016, foi resultado da conjuntura política nacional, com o grande desgaste provocado pela operação lava-jato, além de um cansaço natural após gestões sucessivas.
Sobre a reeleição, o deputado credita ao período de pandemia, que prejudicou a campanha petista. “O PT tem tradição de campanha nas ruas”, afirma o ex-reitor da UESB, destacando a perseguição política imposta ao partido, bem como o impeachment da presidente Dilma Roussef e a prisão de Lula. Apesar disso, ele vê desgaste no projeto liderado pelo grupo que comanda o Executivo atualmente. “Prova disso é que Zé Raimundo (candidato do PT nas duas últimas eleições) venceu no primeiro turno”.
Waldenor acredita que, com a eleição de Jerônimo e o retorno de Lula à presidência, o desgaste da atual gestão deva se acentuar. “Eles estão enfrentando muitas dificuldades, a avaliação é negativa, postos de saúde fechados, falta de medicamentos, dificuldade no transporte público com licitações vazias, possibilidade de greve na educação, chuvas castigam cidade e expõem a péssima qualidade da pavimentação”, avalia o deputado, que vê nas últimas pesquisas uma rejeição muito grande da atual prefeita.
Sobre a ligação da gestão com o ex-presidente, Waldenor é taxativo. “Decidiram pelo apoio a Bolsonaro e não realizaram absolutamente nada. Se não fosse o governo do estado a acidade estaria abandonada”, acrescenta o parlamentar, que aponta a troca de secretários como um “bate cabeça” da gestão Sheila Lemos. Waldenor acredita que a população sente saudades das gestões petistas. “Já deu tempo de fazer uma avaliação comparativa”.
Com oito mandatos, a vereadora mais votada da atual legislatura, Lúcia Rocha (MDB), pode ser uma alternativa para enfrentar a atual prefeita e o antipetismo do eleitorado de direita. Lúcia vem participando de reuniões com outros vereadores e lideranças petistas e, a partir das tendências apontadas pelas pesquisas, pode ser o nome escolhido para tentar repetir, de forma invertida, a fórmula bem sucedida na eleição para o governo do estado, que teve Geraldo Jr. (MDB) como vice de Jerônimo Rodrigues (PT).
Todos contra o PT
Filha de Irma Lemos (atual presidente do União Brasil em Conquista), vereadora de três mandatos e vice-prefeita no primeiro mandato de Herzem Gusmão, Sheila Lemos se lançou na política em 2018, como candidata a deputada federal, e, em 2020, ocupou o lugar da mãe na chapa encabeçada por Herzem Gusmão e assumiu o comando do Executivo municipal logo no início do segundo mandato do emedebista, que morreu em decorrência da Covid.
“Assumi num momento de muita dor, com um entendimento diferente do Governo do Estado, porque entendemos que cada região é diferente. A gente provou que nossa política deu certo”, sentencia a prefeita, encampando um pensamento comum aos bolsonaristas, que ainda hoje questionam as medidas de isolamento adotadas durante a pandemia.
Além do Covid, a gestão de Sheila Lemos ainda enfrentou a maior chuva dos últimos 50 anos, com 800 mm de precipitação em 70 dias, o equivalente a toda a chuva prevista para o ano, no final de 2021 e início de 2022.
Apesar do alinhamento com o governo Bolsonaro, Sheila se distanciou dos apoiadores do ex-presidente nas eleições do ano passado, quando apoiou o candidato do seu partido, ACM Neto, para o governo e não se posicionou com relação a disputa presidencial, apoiando Bolsonaro somente no segundo turno.
Apesar da repercussão negativa junto ao eleitorado do ex-presidente, que teve 41,69% da votação no município (84.019 votos), Sheila Lemos acredita na possibilidade de reaproximação e vem conversando com representantes do PL para uma possível composição de chapa. “As eleições serão polarizadas, nosso adversário é o PT”, diz a prefeita.
Terceira via
As lideranças do PL confirmam o diálogo, mas, em princípio, o partido pretende ter candidatura própria. Entre os nomes cotados, o do vereador Ivan Cordeiro (PTB) aparece mais forte. Terceiro mais votado do município para deputado federal (11.271 votos), Cordeiro já anunciou que vai migrar para o PL, tão logo seja homologada a fusão entre PTB e Patriotas, que vai abrir a janela para mudança partidária sem prejuízo para o edil.
Ex-secretário de serviços públicos e de mobilidade urbana no primeiro mandato de Herzem Gusmão, Cordeiro vê uma lacuna deixada pela atual prefeita junto ao eleitorado mais conservador. “Acredito que posso representar esse eleitorado, a prefeita não reúne o antipetismo que se vê na cidade como Herzem fazia”, pondera.
O vereador diz que teve sua eleição prejudicada pela aliança de seu partido com ACM Neto e não descarta uma composição de chapa com Sheila Lemos, apesar da prefeita não ter priorizado a reeleição de Bolsonaro. Cordeiro entende que o desempenho do governo Lula no plano nacional pode pesar contra o PT. “O Congresso tem maioria conservadora e o governo Lula já enfrenta dificuldades”, avalia.
Além de Ivan Cordeiro, outros dois nomes disputam a condição de pré-candidatos do PL. Edílson Gusmão é irmão do ex-prefeito Herzem. Com 4.575 votos para deputado estadual na última eleição, ele se coloca como herdeiro do legado político deixado pelo irmão e incorpora o bolsonarismo raiz.
Edílson também questiona a condução da pandemia pelo governo do estado, defende a eficácia da ivermectina e condena o fechamento do comércio e das igrejas. Ele igualmente critica o apoio da prefeita Sheila Lemos a ACM Neto e à política do “tanto faz”. “Ela se distanciou do eleitorado, ainda não se posicionou se é direita ou esquerda”, diz o pré-candidato, que advoga pela candidatura própria do seu partido. “O PL é muito grande para só fazer vereadores”, sentencia.
Vice-presidente do recém-criado diretório do PL em Conquista, o radialista Washington Rodrigues é outro que figura entre possíveis concorrentes ao Executivo municipal. Ele reforça a determinação do presidente estadual da legenda, João Roma, que planeja ter candidaturas no máximo de cidades. “A meta é fazer mil prefeitos em todo o Brasil”, anuncia Washington.
Ele afirma que o ex-presidente Jair Bolsonaro deve fazer um ‘tour’ pelo país e, possivelmente, Conquista estará no roteiro. O vice-presidente local do PL diz que a ideia é ter um nome de direita e reforça que a prefeita Sheila Lemos não representa esse eleitorado.
“Tentou agradar a todos e agora vai ter que mostrar serviço até a eleição. Já o PT vai depender muito do desempenho do Governo Federal, se não estiver bem, não vai poder evocar o nome de Lula”, projeta Rodrigues, que também não fecha a porta para uma eventual composição com a atual gestora.
A possibilidade de formação de uma chapa conjunta fica clara nas palavras do presidente do PL conquistense, Flávio Farias. Ele aguarda a chegada do vereador Ivan Cordeiro e avalia o potencial eleitoral de Washington e Edílson, sempre com o discurso de candidatura própria, mas não desconsidera apoiar a prefeita, seja no primeiro ou no segundo turno.
“Nosso maior adversário é o PT. Acho que Sheila encontra dificuldade com o pessoal mais à direita, até pelo perfil conciliador. Não é um demérito”, avalia Farias, que desconversa sobre a definição de um nome para representar o partido na eleição majoritária. “Por que escolher agora?”, indaga o presidente, que prefere manter todos os cotados motivados.
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