ELEIÇÕES 2024
Candidatos e eleitores se adaptam a pleito diferente em tudo

Por Cássio Santana, Thiago Conceição e Miriam Hermes

Uma eleição atípica, com restrição do famoso corpo a corpo na campanha, fortalecimento e intensificação de ações na internet. A pandemia tem exigido, desde março, graus distintos de distanciamento social, e as campanhas políticas se viram frente a grandes desafios.
Candidatos de diferentes legendas e matizes tiveram que encontrar soluções rápidas para cativar o eleitorado e conseguir votos. Fato é que o pleito deste ano será marcado por mudanças e adaptações, e algumas prometem ficar como legado para as próximas corridas eleitorais. As redes sociais se mostraram fundamentais neste período.
“Com a pandemia, nós potencializamos nossa presença nas redes sociais, o diálogo virtual, as lives, para debater programas, propostas para a cidade de salvador, a minha pré-campanhas foi feita com minhas lives, foi bem mais virtual do que presencial. E hoje, com abertura que há, estamos intensificando também as agendas presenciais. Mantemos a atuação nas redes sociais, mas agora com agendas presenciais, respeitando protocolos sanitários, com pequenos encontros de 50 a 60 pessoas, e fazendo muitas carreatas e caminhadas, que é a forma que encontramos para ter um contato maior com a população”, avalia a candidata do PCdoB, Olívia Santana.
O candidato democrata, Bruno Reis, atual vice-prefeito de Salvador, disse que as campanhas estão bem diferentes, mas que ele e sua equipe se adaptaram aos novos tempos: “Esta é realmente uma eleição atípica. Os grandes eventos e caminhadas deram lugar ao diálogo intimista, às conversas olhando no olho das pessoas. Iniciamos nossa campanha com a inauguração do comitê em um evento online, somente com a presença de poucos aliados. Até mesmo a nossa convenção foi virtual, transmitida pela internet, só com o prefeito ACM Neto, a nossa candidata a vice-prefeita Ana Paula Matos e eu”, disse.
“A campanha cresceu em aderência ao digital, mas o contato humano precisa existir sempre, de alguma forma, mesmo que reduzido, para evitar aglomerações. Nem que seja vendo-nos a distância, em cima de um minitrio, como fizemos no Giro 90 pelos 170 bairros de Salvador. Assim, noto que a campanha mantém a sua essência de busca por soluções às demandas da população, apenas com uma exigência maior por parte do povo”, avalia Celsinho Cotrim, candidato do PROS.
A candidata Denice Santiago (PT) se surpreendeu com o formato do pleito deste ano. Para ela, uma debutante em eleições, o contato com o eleitor foi o fator que mais chamou atenção. “As eleições deste ano foram marcadas por novos padrões de contato com o eleitor, de forma a garantir a vida das pessoas e de mostrar que a política não se sobrepõe à vida. Foi uma eleição totalmente diferente de tudo que eu já vivi como eleitora e, neste ano, como candidata pela primeira vez. O corpo a corpo foi substituído por desfiles em carros abertos e pela importância cada vez mais crescente das redes sociais. O digital ganhou proporções nunca vistas e nisso também me orgulho de ter apostado, tendo inclusive liderado o ranking de popularidade por semanas”, conta.
Cezar Leite, candidato do PRTB, disse que já utilizava as redes sociais há algum tempo, e que nisto está à frente dos outros postulantes à prefeitura de Salvador. “Este ano, em virtude da pandemia, o terreno virtual ganhou ainda mais relevância para as campanhas eleitorais. Desde 2016 eu já explorava as redes sociais para dialogar com o eleitor e, em 2020, a interação só aumentou, demonstrando uma vantagem nossa com relação aos outros candidatos, que estão começando a entender a dinâmica das plataformas online só agora. A mudança maior para nós foi mesmo a questão das limitações para realizar eventos, com as medidas restritivas diminuindo o número de pessoas em encontros e comícios”, pontua.
Às ruas
Além do campo aberto que as redes sociais ofereceram a candidatos e eleitores, as campanhas de rua continuaram, algumas seguindo protocolos de proteção, outras não. No interior do estado, a Secretaria da Saúde da Bahia (Sesab) recomendou medidas mais restritivas para campanhas políticas, e o governador Rui Costa denunciou verdadeiras “micaretas” eleitorais.
De acordo com o professor de ciência política Joviniano Soares Neto, da Universidade Federal da Bahia (Ufba), a política brasileira tem tradição de campanhas corpo a corpo, particularmente no interior. Com a pandemia, segundo o professor, há um desacordo entre essa cultura e as medidas de contenção do novo coronavírus.
“Temos a tradição da campanha corpo a corpo, isso é um fato, sobretudo no interior, onde ainda é mais forte. Com as medidas de confinamento, há uma reação da tradição contra as regras sanitárias. As duas entram em choque. O resultado desse confronto a gente vai ver nos próximos dias”, reflete.
Tanto na capital quanto no interior, caravanas e minicarreatas tornaram-se uma alternativa. O crescimento deste tipo de ação pode ser visto como uma tendência em tempos de pouco contato social, em que os candidatos precisam se esforçar mais para serem vistos.
“No início da pandemia, muitos analistas acreditavam que haveria uma proeminência de ações em redes sociais em detrimento de ações nas ruas, considerando a necessidade do isolamento social. No entanto, o que se viu foi que há vários candidatos que estão apostando na internet, assim como há vários que estão fazendo ações de rua. Muitos candidatos estão apostando no corpo a corpo para garantir votos”, pontua o cientista político Rodger Richer.
Segundo o professor Márcio André de Oliveira dos Santos, da Universidade da integração internacional da lusofonia afro-brasileira (Unilab), as aglomerações vistas no interior do estado refletem a cultura do “vale tudo”. “As aglomerações vistas em vários municípios baianos traduzem o ‘vale tudo’ tipicamente usado em épocas de campanha política. Muitos candidatos não estão preocupados com a saúde pública dos seus eleitores, promovendo dessa forma carreatas lotadas de pessoas sem máscara ou distanciamento social”, diz.
“As campanhas políticas vão variar muito dependendo do porte do município, do recorte eleitoral que o candidato quer acessar, do espectro político do candidato. Você tem uma série de elementos que complexificam as campanhas política. Primeiro ponto é entender que, apesar de as regras serem as mesmas, as formas que os candidatos vão lidar com elas variam. Vivemos em um ambiente diverso e desigual e as campanhas tentarão se adaptar a esse contexto. A pandemia igualmente impactou a população de forma desigual. As campanhas têm que se reinventar nesse contexto”, afirma o cientista político Diego Matheus Oliveira de Menezes.
Eleitorado
Adiadas para os dias 15 e 29 deste mês para se conciliar democracia com saúde pública, em tempos de pandemia da Covid-19, as eleições geram um debate entre os eleitores baianos sobre a segurança do voto em meio aos protocolos sanitários do chamado “novo normal”.
O uso obrigatório da máscara nas seções eleitorais, além de recomendações como a desinfecção das mãos com o álcool em gel 70% e uso de caneta própria para a assinatura do caderno de votação, são precauções que caminham juntas com a escolha dos prefeitos e vereadores do estado. As medidas de prevenção são indicadas pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
No Cabula, Dora Lima, de 68 anos, faz questão de exercer o direito ao voto, mesmo em momento de pandemia. Com certo receio, por causa do momento de pandemia, ela reforça a importância da adoção dos protocolos que reduzem o risco de contaminação pela Covid-19.
“Vou levar minha caneta, evitar aglomerações, usar máscara. Moro no Cabula há 60 anos, todos me conhecem e sabem como falo da importância do voto, até mesmo com os netos e outros familiares. Com a pandemia e todos os desafios sociais que estamos enfrentando, poder escolher os nossos representantes é ainda mais essencial”, diz Dora.
A estudante Ialana Souza, de 22 anos, acredita que o respeito aos protocolos de segurança vai trazer o menor risco de disseminação do novo coronavírus nas eleições.
“Moro na Engomadeira e voto desde os 18 anos. Com a necessidade de realização das eleições, mesmo com a pandemia, teremos um maior rigor no sentido de obediência de medidas como o uso das máscaras”, acrescenta a jovem.
Receio
Em Patamares, a estudante Gabriella Leite, de 23 anos, afirma que a colaboração dos eleitores é mais importante que o tipo de protocolo que será abordado nas seções eleitorais. Ela ainda afirma ter medo de levar os pais, que são hipertensos e fazem parte do chamado grupo de risco, para as urnas.
“Os meus pais são hipertensos, minha mãe cardiopata. Então sempre vai existir o maior medo por eles. É essencial que a população siga as regras, pois só assim um protocolo pode funcionar. No meu local de voto, as zonas são mais organizadas. Porém em bairros mais populares existe a tendência de maior aglomeração de pessoas, além da falta de mais informação de saúde pública”, diz Gabriella.
A preocupação com o pai idoso, condição que o coloca no grupo mais vulnerável aos efeitos da Covid-19, também traz apreensão para a artesã Marilde do Livramento, 57 anos, moradora de Barreiras e eleitora do bairro de Barreirinhas. “Quero convencer meu pai a não ir votar. Ele nem precisa mais por causa da idade, mas quer participar”, afirmou. Ela afirma que “a Justiça Eleitoral deveria proibir os idosos de votar este ano, porque a gente tenta alertar para o perigo que existe, mas nem todos aceitam”. A artesã acrescenta que, desde março, a família está mantendo as medidas de distanciamento. “Já fizemos muitos sacrifícios, não podemos descuidar agora. É importante as pessoas participarem do processo eleitoral, mas os cuidados com a saúde devem prevalecer”.
De acordo com Marilde, a mãe e as tias acataram as recomendações “e mesmo aquela que ainda tem obrigatoriedade, não vai votar este ano, por ser do grupo de risco”, destacou, aliviada. No Brasil, os alfabetizados maiores de 18 e menores de 70 anos são, por lei, obrigados a votar. O voto não é obrigatório para os analfabetos, os maiores de 70 anos, nem para os maiores de 16 e menores de 18 anos.
Funcionária pública em Vitória da Conquista, Mariângela Cordeiro, 35 anos, não tem idosos para cuidar, mas também está preocupada. “Não só comigo, mas também meu marido, filha e amigos. Conheço muitas pessoas que vão votar, apesar de estarmos na pandemia, com uma doença tão perigosa”, afirma.
Apesar de todas as recomendações, ela destaca o perigo da disseminação de Covid-19. “As campanhas eleitorais propiciaram muitas aglomerações e contatos presenciais entre as pessoas. Esse pessoal também vai votar e pode disseminar a doença”, reclamou, acrescentando que espera que tudo dê certo “e não aconteça uma nova grande onda, com aumento de infectados e mais mortos”, diz.
O comerciante Lauro Braga, 49 anos, eleitor de Feira de Santana, já está com seu kit prevenção preparado. “Vou levar álcool em gel e só vou encostar na urna eletrônica depois que confirmar sua sanitização”, destacou, afirmando que seus familiares também estão instruídos para estes cuidados.
Ele ressalta que não faltará “no compromisso assumido de votar e ajudar a escolher o prefeito e vereadores, porque a gente precisa participar, mas sem esquecer que tem um vírus circulando”.
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