DISTRIBUIÇÃO DESIGUAL
Fundo Eleitoral está reforçando distorções, diz pesquisadora
ACM Neto recebeu mais dinheiro do Fundão do que 359 candidatos baianos que já acessaram o recurso neste ano
Por João Guerra
Um estudo realizado pelo Instituto Millenium baseados em dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) aponta que em todo o Brasil, nestas eleições, 3,4% dos candidatos receberam o equivalente a 90,7 % dos recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), mais conhecido como Fundo Eleitoral ou Fundão. Em números absolutos, apenas 950 candidatos tiveram acesso a R$ 2,5 bilhões.
Além disso, até o dia 3 de setembro, data em que o Millenium finalizou o levantamento, a maioria dos candidatos ainda está sem dinheiro do fundão para investir na campanha. De acordo com o instituto, 41% dos candidatos aptos receberam algum recurso, logo, 59% não receberam nada.
A título de exemplo, na Bahia, dos mais de 1600 postulantes a cargos eleitos no pleito deste ano, apenas 716 receberam financiamento do Fundo Eleitoral. Dentre eles, o líder em recebimento do recurso, está o candidato ao governo pelo União Brasil, ACM Neto, com R$ 7.557.761,23 à disposição da sua campanha, seguidos pelos candidatos ao Senado Otto Alencar (PSD) e Cacá Leão (PP), que já receberam R$ 3.960.000,00 e R$ 3.500.000,00, respectivamente, e pelos candidatos à Câmara Lídice da Mata (PSB), que já recebeu R$ 3.000.000,00 e Uldurico Junior (MDB), com R$ 2.500.000,00.
Sozinho, o ex-prefeito de Salvador, por exemplo, recebeu mais recursos do que 359 candidatos que já receberam financiamento do Fundão este ano. A quantia recebida por Neto ainda é superior ao total de valores recebidos por todos os candidatos à Assembleia Legislativa da Bahia do União Brasil (R$ 6.657.000,00).
Criado pelo Congresso Nacional a partir da reforma eleitoral de 2017, o Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) tem como finalidade destinar recursos do Tesouro Nacional para financiar as ações eleitorais de candidatos a cargos eletivos.
A jornalista e gerente de conteúdo do Instituto Millenium, Priscila Chammas, explica que a distribuição do recurso tem sido feita seguindo dois parâmetros: quem tem mais influência dentro do partido, recebe mais dinheiro do Fundão, e as siglas injetam mais dinheiro nas campanhas que acreditam que tenham chance de vencer a eleição.
“A gente fez esse levantamento em 2018 em uma pesquisa parecida. E deu resultados semelhantes [aos de 2022]. Os candidatos que recebem mais dinheiro são os que tem mais influência política. E os que tem chance de ganhar”, apontou.
Para Chammas, quando os partidos destinam o maior montante para candidatos com mais prestígio político e mais chances de ganhar, reforça um desvio de função do Fundo Eleitoral, que, foi criado pelo Congresso Nacional a partir da reforma eleitoral de 2017 com a finalidade de destinar recursos do Tesouro Nacional para financiar as ações eleitorais de candidatos a cargos eletivos.
“O Fundo Eleitoral não vem para ajudar a renovar, não vem para reequilibrar as forças, não vem pra ajudar quem não tem condições, pelo contrário, ele vem para forçar quem já é forte”, argumentou.
Ademais, os candidatos que já estão na vida política há mais tempo têm prioridade no recebimento dos repasses dos recursos pelos partidos. O que mostra uma aposta das siglas para eleger figuras políticas já conhecidas pelo eleitorado e uma dificuldade ainda maior para os novatos.
“Os 20 candidatos que mais receberam Fundão Eleitoral são políticos de carreira ou de oligarquias políticas, ou seja, sem renovação. Além disso, desse conjunto, apenas quatro são mulheres. Dessa forma, o Fundão está reforçando distorções, argumenta a jornalista ao apontar os dados da realidade baiana em referência a dificuldade que novos candidatos têm para ter acesso ao recurso do FEFC.
No recorte por etnias, nota-se que quase todos os partidos destinaram mais recursos do Fundo Eleitoral para candidatos de etnia branca (66,2% do valor total distribuído até o momento). PROS, DC, PSDB e PT foram os que mais destinaram recursos para candidatos brancos. Já UP, PSOL e PSTU apresentam o maior percentual de recursos distribuídos entre os negros.
Segundo o Instituto Millenium, outro ponto que aponta a não valorização dos partidos no quesito representatividade é o fato de a distribuição que vem sendo feita do fundo eleitoral, que não incentiva a participação feminina na política. De todo o valor distribuído, somente 27,9% foi destinado a mulheres, ainda que haja cota para tal. O percentual, inclusive, é menor que o de candidaturas femininas (33,7%).
A pesquisa utilizou informações do TSE divulgadas até 3 de setembro deste ano. Naquela data, já tinham sido distribuídos R$ 3.101.040.192,86 (3,1 bilhões de reais) a 14.267 candidatos.
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