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Políticos destacam legado deixado por Haroldo Lima, morto por Covid-19

Publicado quarta-feira, 24 de março de 2021 às 21:08 h | Atualizado em 24/03/2021, 21:10 | Autor: Raul Aguilar
Haroldo Lima estava internado com Covid-19 no Hospital Aliança há duas semanas
Haroldo Lima estava internado com Covid-19 no Hospital Aliança há duas semanas -

A morte do militante e ex-deputado Haroldo Lima, na madrugada desta quarta-feira, 24, aos 81 anos, causou comoção no mundo político. Haroldo estava internado com Covid-19 no Hospital Aliança há duas semanas. Ele integrava o Comitê Central do PCdoB e foi também diretor-geral da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP).

Filho de Benjamin Teixeira Rodrigues Lima e da professora Adelaide Borges Rodrigues Lima, Haroldo Lima nasceu em Caetité. Ele era pertencente à tradicional família caetiteense e descendente do Barão de Caetité e do primeiro governador eleito da Bahia, dr. Joaquim Manoel Rodrigues Lima.

Amigos e familiares realizaram uma carreata para homenageá-lo na tarde de ontem. À noite, uma vigília virtual foi realizada na página oficial do PCdoB Bahia nas redes sociais, que contou com diversas personalidades do partido e de outras legendas da esquerda.

O presidente do PCdoB Bahia, Davidson Magalhães, lamentou a perda do militante que classificou como “um dos mais destacados quadros nacionais do PCdoB nas últimas décadas”.

“O exemplo de abnegação, de coragem, de firmeza, daquele que dedicou a vida à luta em defesa da democracia e da liberdade, e pela construção de uma sociedade mais justa e fraterna, é o legado que Haroldo Lima deixa para a geração que prosseguirá a luta pelo socialismo”, destacou Magalhães.

A deputada federal Alice Portugal (PCdoB) exaltou o empenho de Lima na defesa da democracia e da liberdade.

“Um itinerário de luta dos mais completos já visto em um homem público no Brasil. Que vem desde o movimento estudantil, da luta contra a ditadura até a sua participação na construção da Constituição de 1988, quando ajudou na consolidação dos direitos sociais, ajudando a organizar os sindicatos”

O deputado federal Daniel Almeida (PCdoB) também lamentou a perda do “grande companheiro”. Contou Daniel: “

Engenheiro de formação, Haroldo foi figura fundamental na luta contra a ditadura militar, sobrevivendo à Chacina da Lapa em São Paulo, onde morreram outros militantes do PCdoB, à época na ilegalidade. Chegou a ser torturado e preso em Salvador, e ainda assim permaneceu em diversas frentes de lutas, a favor de pautas de interesse social, da liberdade, da democracia, até o último dia da sua vida”.

A deputada estadual Olívia Santana (PCdoB) afirmou que a morte da referência do PCdoB causa uma “dor que nem cabe no peito” . Já a presidente nacional do PCdoB, Luciana Santos, destacou que cada membro da legenda na Bahia conta com um “pouco do jeito de ser, da sabedoria e da capacidade política de Haroldo Lima”

. Ela pontuou que o momento é de transformar “o luto em luta”, e lembrou que, “se estivesse vivo”, Haroldo “estaria estimulando, dizendo todos os dias da necessidade da gente reagir, contestar esse genocida (se referindo ao presidente da República, Jair Bolsonaro)”.

Personalidades

O governador da Bahia, Rui Costa (PT), lamentou a morte do político com quem conviveu, e lembrou que Lima foi “uma das lideranças históricas do PCdoB que dedicou sua vida à luta pela democracia e por uma sociedade mais justa na Bahia e no Brasil”.

O presidente da Assembleia Legislativa da Bahia, Adolfo Menezes (PSD), promoveu um minuto de silêncio na sessão virtual de ontem. “Grande brasileiro, defensor intransigente dos interesses do Brasil. Um lutador pela liberdade, linha de frente contra a ditadura de 1964, que defendia sua bandeira comunista, mas convivia democraticamente com todos”.

O senador Jaques Wagner (PT) destacou o empenho do político do PCdoB na luta contra a ditadura militar. “Grande referência da esquerda e principais lideranças do Brasil, Haroldo enfrentou a ditadura militar e tem uma vida dedicada à luta contra as desigualdades sociais e injustiças no nosso País”.

A deputada federal Lídice da Mata (PSB) se emocionou ao falar de Haroldo Lima. “Conheci Haroldo Lima ainda na cadeia, mas antes já conhecia seu nome, sua história. Mas pude conhecê-lo quando comecei a visitar os presídios, para, no movimento da anistia, lutar pela anistia dos presos políticos no Brasil. Fizemos uma grande amizade, Haroldo foi mais que um companheiro político, foi um grande amigo”, destacou da Mata.

O reitor da Universidade Federal da Bahia (Ufba), João Carlos Salles, também se pronunciou. "É um momento muito triste para a Bahia e o Brasil. Estão de luto pessoas e instituições. Está de luto a Universidade Federal da Bahia, que ele sempre defendeu e amou; e estão de luto, em um largo espectro de posições, todos os que lutam contra a exploração, todos os que defendem a democracia e a liberdade, todos os que defendem a vida e o conhecimento”.

Nacional

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva pontuou que Lima, quando era presidente da ANP, chefiou o órgão “de acordo com o interesse nacional, do desenvolvimento brasileiro, em uma época que o país combinava desenvolvimento da cadeia de produção de óleo e gás com preços de combustíveis e gás de cozinha que respeitavam o povo brasileiro”.

A ex-presidente Dilma Rousseff (PT) utilizou uma rede social para desejar os seus sentimentos à família. “A Covid19, ampliada pelo descaso de um governo negacionista, matou mais de 3 mil brasileiros ontem. Entre eles está Haroldo Lima, homem que dedicou sua vida à luta pela democracia e por um Brasil justo e soberano”.

O governador do Maranhão, Flávio Dino (PCdoB), foi outro que utilizou uma rede social. “Hoje o amigo Haroldo Lima nos deixou. Grande defensor da nossa Pátria e da luta popular. Foi deputado federal por 5 mandatos e presidente da Agência Nacional do Petróleo. Conhecia como poucos o tema da Energia no Brasil. Mais uma vítima do coronavírus”.

O ex-ministro da Integração Nacional do governo Lula, Ciro Gomes (PDT), em uma postagem em sua rede social, elogiou Haroldo Lima, que “foi um guerreiro e resistiu a graves ameaças na luta contra a ditadura”. Um político que teve “sua vida dedicada à construção da democracia e de uma sociedade justa com a qual ele sempre sonhou”.

Trajetória

A trajetória de Haroldo Lima na militância política começou desde cedo, tendo, entre 1961 e 1963, participado da formação da Ação Popular, que tinha a Escola Politécnica da Universidade Federal da Bahia (UFBA) como espaço de organização das lutas por reformas de base, na época do governo de João Goulart (1961-1964); compunha o grupo Herbert José de Souza, o Betinho, Aldo Arantes e outros.

Após sua formatura como engenheiro eletricista, Haroldo Lima trabalhou durante alguns anos na Companhia de Eletricidade do Estado da Bahia (Coelba), se afastando, entre 1967 e 1968, para dedicar-se à militância política de esquerda e contra a ditadura militar, atuando por cerca de dez anos na clandestinidade.

Em 1968, na época do AI-5, que suspendeu os direitos políticos no país e que fechou o Congresso Nacional, Lima atuou como trabalhador rural em Itabuna e Buerarema com a missão de organizar politicamente os trabalhadores rurais, para o combate ao regime militar.

Em 1969, transferiu-se para São Paulo, onde coordenou a Comissão Nacional Camponesa da Ação Popular (CNCAP). Na CNCAP ele percorreu o Brasil, buscando escolher as futuras áreas de guerrilha no campo, inspirado no sucesso da revolução cubana e na tática de Mao Tse Tung. Em março de 1971, a AP adotou formalmente o marxismo leninismo e se proclamou partido com a denominação de Ação Popular Marxista-Leninista (APML). Entre 1971 e 1972, participou do núcleo principal das discussões políticas e ideológicas que resultaram na incorporação da Ação Popular Marxista Leninista do Brasil ao Partido Comunista do Brasil (PCdoB).

Em dezembro de 1976, Haroldo e colegas de militância foram alvos de uma emboscada da Ditadura Militar durante uma reunião política, em um episódio que ficou conhecido como o massacre da Lapa. Enquanto se reuniam para traçar os próximos passos na luta contra o regime, no Comitê Central do PCdoB, no bairro da Lapa, em São Paulo, os militantes foram surpreendidos por uma operação do exército brasileiro, que culminou com a morte de três dos dirigentes do partido: ngelo Arroyo, Pedro Pomar e João Batista Drumond. Haroldo Lima e os militantes Aldo Arantes, Joaquim Celso de Lima, Elza Monnerat e Maria Trindade foram presos e torturados.

Haroldo passou quase três anos entre o Presídio do Barro Branco, em São Paulo, e a Penitenciária Lemos Brito, em Salvador. Com o início do processo de abertura política, em 1979, Lima foi solto por força da anistia política. Em 1981, acabou preso novamente, acusado de ter articulado um grande "quebra-quebra" de ônibus urbanos, em protesto contra o aumento do preço das passagens em Salvador. Nessa época, junta-se a Rômulo Almeida, Waldir Pires, Francisco Pinto, Élquisson Soares e outros para fundar o Partido do Movimento Democrático (PMDB) na Bahia, onde, ao lado de Francisco Pinto e Elquisson Soares, organiza a "Tendência Popular" do PMDB.

Em 1982, tornou-se deputado estadual pelo MDB. Em 1985, com a legalização dos partidos de esquerda no Brasil, se filiou ao PCdoB, legenda pela qual atuou na formulação de emendas para Constituição de Cidadã do Brasil no Congresso Nacional, em 1988. Ele apresentou cerca de 1.200 emendas ao projeto de Constituição, conseguindo aprovar diversas, voltadas principalmente para os direitos sociais. Por isso, recebeu do DIAP nota 10 e o jornal Folha de S.Paulo o colocou entre os 40 parlamentares mais destacados dos constituintes.

Haroldo se notabilizou na defesa dos direitos humanos, da anistia política e pelo fim do regime militar.

Em 2002, no governo Lula, foi escolhido como diretor-geral da Agência Nacional do Petróleo (ANP), onde atuou na construção da política da empresa, com foco no resgate dos campos maduros e no estímulo à pesquisa que resultou na descoberta do pré-sal. Em 2011, no governo Dilma Rousseff (PT), ele deixou o comando da agência para se dedicar às atividades do PCdoB.

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