ENTREVISTA
“Não existe transição energética sem a mineração”, avalia Carballal
Presidente da Companhia Baiana de Pesquisa Mineral - CBPM avalia avanço do setor na Bahia
Por Claudia Lessa
A nova mineração na Bahia, tema desta edição do Caderno Municípios de A TARDE, é assunto que traz à tona questões como crescimento do setor no estado; ampliação da cadeia produtiva; transição energética; práticas sustentáveis; atuação das mineradoras em território baiano; infraestrutura com Fiol e Porto Sul, além da geração de emprego e renda e investimentos estatais. Estes e outros temas foram tratados na entrevista com o presidente da Companhia Baiana de Pesquisa Mineral (CBPM), Henrique Carballal. O gestor é categórico ao afirmar que a sociedade precisa compreender a importância da atividade minerária no desenvolvimento socioeconômico do estado e do país.
Como avalia o cenário atual da mineração na Bahia e quais as perspectivas de crescimento para os próximos anos?
Importante começar dizendo que a Bahia possui a terceira maior produção minerária do país, perdendo só para Minas Gerais e Pará. As nossas perspectivas são muito grandes porque, se somos o terceiro estado em produção, temos uma multiplicidade de minérios, fruto das nossas características geológicas. E esta característica natural nos permite enxergar uma perspectiva grandiosa no que se refere à transição energética. Não existe retirada de carbono na atmosfera sem mineração. Então, o grande ponto que todos devem compreender é que para retirar carbono da atmosfera, é preciso desenvolver atividade minerária. Por exemplo, quando se tira um carro de motor à explosão para um carro de motor elétrico, precisa das baterias e estas são feitas de minerais, como o lítio. Mas além do lítio, a gente precisa de zinco, cobalto, terras raras, grafita, cobre. Os minerais da transição energética, portanto, se encontram no solo da Bahia. Nós temos uma grande quantidade de minerais que são uma riqueza de extrema relevância para o desenvolvimento da nossa economia. Estamos em um processo, agora, de licitação de uma mina de silício, justamente para ser implantada uma indústria na Bahia de alta tecnologia de produção desse mineral. Estamos também negociando outras áreas de silício com a China, visando a implantação de fábricas de produção de placas solares.
Qual a importância da mineração para a humanidade?
As pessoas precisam entender que a mineração está em tudo na vida delas. Quando você se senta na mesa, além do prato que é feito de cerâmica e os talheres, de alumínio, prata e etc., temos a própria comida que é feita através da agricultura que, por sua vez, precisa de fertilizantes, que precisa de remineralizador do solo, e ambos são produzidos através da atividade minerária. As vacinas e os insumos dos animais também são produzidos a partir da mineração. Então, nós precisamos compreender a importância da mineração e desenvolvê-la, respeitando as políticas dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Organização das Nações Unidas (ONU) e as práticas ESG de defesa e proteção do meio ambiente. Quando as pessoas pensam em mineração, vem logo na cabeça a ideia de cavar buracos no meio ambiente. E a atividade minerária é infinitamente menor, do ponto de vista do dano ao meio ambiente, em relação, por exemplo, à agricultura e à pecuária em grande escala. A postura do governador Jerônimo é de nos apoiar com a visão de que a atividade minerária é uma fronteira econômica e que é preciso ser desbravada e ampliada e ele tem isso como um legado que quer deixar para o povo da Bahia.
A que se deve o crescimento do setor e o que esta fase positiva representa em termos de desenvolvimento socioeconômico da Bahia?
Primeiro se deve às características geológicas da Bahia e segundo é o acerto de termos a CBPM. Ao longo desses 50 anos de existência da companhia, seus técnicos, engenheiros de minas, geólogos produziram dados e conhecimentos relevantes e muito consistentes sobre onde estão as áreas de potencial mineral no nosso estado e que nos permitem apontar esse horizonte de crescimento e desenvolvimento. E agora temos um elemento que traz muita força, que é a decisão política do governador Jerônimo Rodrigues de não perder esta oportunidade que o mundo está nos dando de ampliar as fronteiras. O nosso governante entende que este é um momento importante da humanidade que corre para diminuir o carbono na atmosfera e desacelerar o processo de aquecimento global. E neste momento crucial, a Bahia pode e deve contribuir para garantir isso. A determinação do governador é que esta produção seja desenvolvida no próprio estado. A Bahia não pode ser apenas exportadora de commodities, precisamos dar um salto qualitativo. Queremos também exportar produtos com tecnologia. As fábricas de alta tecnologia serão fundamentais neste processo. É o caso da BYD, que veio graças ao esforço do governador Jerônimo, mas não veio para ser simplesmente uma montadora. Veio para ser uma fábrica de automóveis. Então, as peças serão produzidas na Bahia e um compromisso da BYD firmado com o governador é que a Bahia produzirá tecnologia nessa área.
Um dos desafios do setor é a necessidade de ampliação da sua cadeia produtiva. De que forma a CBPM tem atuado neste sentido?
Quando cheguei na CBPM, tínhamos, em Jacobina, uma licitação em curso de uma mina de calcário para a produção de cimento. Eu suspendi essa licitação porque esta vai ser feita obrigatoriamente implantando uma indústria de cimento no município. Ou seja, ao invés de entregar a mina para produzir calcário a ser levado para fora, o elemento será utilizado na fábrica. Em um outro município, que ainda não posso citar o nome, a pedido da empresa, fizemos uma licitação de calcário que vai servir para a remineralização do solo e o compromisso é a montagem de uma unidade que vai produzir esse calcário para ser utilizado na agricultura baiana. Em Irecê, já posso anunciar, teremos uma produção de fosfato para produção de fertilizantes e acreditamos que em 2026, 900 empregos diretos estarão sendo criados na cidade para produção de fertilizantes, o que irá garantir que o estado se torne independente da importação desse produto da Rússia ou de qualquer outro país. Estamos para anunciar também uma fábrica de alta tecnologia voltada à energia fotovoltaica que será implementada graças à parceria de exploração de sílica na região de Belmonte. O governador deverá anunciar, ainda este ano, essa indústria que será implantada na Bahia.
Outro desafio é a afirmação de práticas sustentáveis onde as mineradoras estão instaladas. Como a CBPM tem trabalhado isso?
Vamos fazer um seminário, em novembro, com a parceria do Jornal A TARDE e a participação de várias empresas chinesas, para discutirmos a questão da mineração com sustentabilidade, visando apontar como a mineração deve respeitar as políticas ESG (Environmental, Social and Governance). Tem que respeitar o meio ambiente, tem que garantir que haja a incorporação das comunidades do entorno na divisão da riqueza. Essas comunidades que são superficiárias (proprietárias do solo onde ficam as jazidas minerais) e mesmo aquelas afetadas precisam perceber que o que se extrai do solo gera riqueza, emprego, desenvolvimento cultural, educação, saúde. A ideia é conectar a produção mineral com o desenvolvimento das atividades de preservação do meio ambiente e ajudar o mundo neste momento de transição energética e garantir o desaquecimento do planeta, ou melhor, frear o aquecimento global. E o nosso desafio é justamente fazer essas realizações, respeitando todas as comunidades que tiverem nas áreas de mineração e que elas tenham seus direitos assegurados, incluindo o de acesso a essas riquezas que é produzida.
Algum exemplo de empresa com a qual a CBPM vem tratando de perto essas questões de sustentabilidade?
A chinesa Sulamericana de Metais (SAM), que há um tempo está no Brasil, quer fazer um mineroduto vindo de Minas, passando pela Bahia, para o Porto de Ilhéus, e vão montar uma unidade de produção, que a gente chama de empelotar o minério de ferro da região de Ilhéus para exportar. Eles estão há dez anos tentando montar esse mineroduto e a CBPM, que também é uma empresa de fomento, assumiu essa implantação e estamos auxiliando na elaboração desse projeto. Estamos dialogando para que, quando o mineroduto for instalado, a água que vem com o mineral, possa ser tratada e ser reutilizada pela população para o desenvolvimento da agricultura, da pecuária ou outras atividades que essa água possa ser utilizada. A própria SAM já manifestou interesse em utilizar uma parte significativa dessa água para produzir hidrogênio verde. Ou seja, uma empresa mineradora precisa, na região em que está estabelecida, investir em cultura, educação, qualificação de mão de obra. E nós estamos trabalhando neste sentido. Inclusive, estamos resgatando o Projeto Prisma, do senador Otto Alencar, de qualificação da mão de obra na mineração e que foi realizado há décadas. Estamos dialogando com as grandes mineradoras no sentido de melhorar a comunicação para que as comunidades entendam a importância da mineração; que ela deve acontecer de forma sustentável; e que saiba que é um movimento necessário para toda a humanidade.
Qual a importância de equipamentos como a Fiol e o Porto Sul para o avanço da mineração na Bahia?
Tanto a Fiol como a Porto Sul serão fundamentais para a mineração. A Ferrovia de Integração Oeste-Leste (Fiol) vai ligar o Oeste começando de Caetité, onde terá uma grande produção de ferro, e o Porto Sul, vai permitir que grandes embarcações possam chegar e, com isso, vamos ter o escoamento dessa grande produção de ferro. E, para quem não sabe, na própria região, temos várias outras mineradoras, como a Pedra Cinza, que atua na área da CBPM e vai produzir chumbo e zinco. Essa produção também vai ser escoada através da Fiol. Então, o que quero dizer, é que a infraestrutura é extremamente necessária para o desenvolvimento. A Bahia faz grandes investimentos em estradas e precisa encontrar, junto ao Governo Federal, as formas de ampliar essa logística. A Superintendência de Estudos Econômicos e Sociais da Bahia (SEI) vem assumindo com grande destaque o desenvolvimento dessas pesquisas para avançar nesses estudos e apontar como a logística pode contribuir não só para a produção minerária, como também a industrial e agrícola. Para avançar na mineração, precisamos de logística. E, hoje, temos graves problemas nesse sentido. A Coelba, por exemplo, é uma subsidiária extremamente problemática, que atrasa o desenvolvimento da Bahia. Há problemas com a Ferrovia Centro-Atlântica (FCA), que vem sendo sucateada criminosamente e nos parece ser uma ação orquestrada para justamente não permitir que a Bahia possa desenvolver e avançar em suas atividades econômicas.
Que impactos positivos estão sendo colhidos nas regiões onde há atividade de mineração e como estão sendo gerenciados os entraves?
Estamos com a expectativa de geração de muita mão de obra. Para se ter uma ideia, só a Bamin, com a construção da Fiol, já está gerando muitos empregos diretos. Só a produção de fosfato, em Irecê, vai gerar 900 empregos diretos no município. Estamos iniciando um processo de diálogo com as empresas. Existem conflitos no noroeste do estado, que envolvem duas empresas mineradoras e uma delas, a Galvani, nós a procuramos e está super aberta ao diálogo com aquela comunidade. Procuramos a outra empresa, a Tombador Iron, e não obtivemos nem respostas. Ela foi desrespeitosa comigo como presidente da CBPM, imagina com a comunidade local. A Galvani está aberta para o debate e há uma semana, uma equipe nossa, da CBPM, juntamente com outras equipes das secretarias estaduais de Reparação, de Ação Social, de Direitos Humanos e de Relações Institucionais, viajou para Juazeiro, para se reunir com as comunidades afetadas por essas duas empresas, capitaneada pelo bispo de Juazeiro, Dom Beto, e mediarmos esse conflito naquilo que concerne a intervenção do estado para garantir o direito das pessoas. Não só estamos preocupados com as empresas, no sentido de fomentar, mas também com as pessoas que vivem naquelas comunidades.
Que investimentos em tecnologias e apoio às comunidades do entorno das empresas de mineração a CBPM tem realizado?
Somos uma empresa de fomento. Semana passada, assinei a homologação em um processo licitatório para a contratação de uma empresa de estudos aerogeofísicos, com um investimento de R$ 7 milhões. Vamos avançar nos estudos de uma área no noroeste do estado. Em paralelo, estamos investindo R$ 22 milhões em testemunhos de sondagens, que são perfurações do subsolo para o reconhecimento de solos e minérios que o constituem. Continuaremos investindo em pesquisas em todo o estado da Bahia, mas a nossa intenção é mudar a modelagem de negócios da CBPM. Estamos dialogando com o governador Jerônimo e a ideia é que a CBPM, além de fomentar, se torne uma empresa mineradora. Estamos buscando construir alternativas para o desenvolvimento minerário do estado, que gere empregos e renda. Esta é a disposição do governo. O povo da Bahia pode esperar que estaremos desenvolvendo a atividade minerária com responsabilidade e a certeza de que ela é um grande avanço para a economia e também para o desenvolvimento social do nosso estado. Na CBPM, que fez 50 anos em 2022, ao longo desse tempo, surgiram boas ideias de pesquisa de desenvolvimento das áreas, mas, hoje, precisamos fomentar. A empresa vem auxiliando a Secretaria de Desenvolvimento do Estado (SDE) no sentido do fomento da mineração. Estamos de portas abertas para orientar e, inclusive, abertos a negócios de parcerias, de sociedade, de investimentos.
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