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SALVADOR

A força do afroempreendedorismo em Pernambués

Em locais como Pernambués, empreender é, muitas vezes, a única alternativa diante de um mercado de trabalho excludente e racista

Por Joana Lopo

21/05/2025 - 17:00 h
Jhones Acessórios é exemplo de empreendedorismo em Pernambués
Jhones Acessórios é exemplo de empreendedorismo em Pernambués -

Por trás da vitrine de uma loja de acessórios, instalada em uma das principais vias de Pernambués: Rua Thomaz Gonzaga, pulsa uma história de resiliência, superação e orgulho. Jonas Santos da Costa, conhecido por todos como Jhones Acessórios, é o protagonista dessa história, que reflete muito mais do que o simples ato de vender capinhas de celular ou caixas de som. É a história de um homem negro, baiano, que transformou as adversidades em combustível para crescer e hoje é inspiração em um dos bairros mais pulsantes de Salvador.

“Eu vendia picolé, água, salgados dentro dos ônibus, principalmente ali na Estação da Lapa. Passei muito perrengue”, relembra Jhones. Antes disso, ele foi vendedor de shopping, onde também enfrentou situações de discriminação. “Aqui em Pernambués, nunca sofri preconceito, me sinto respeitado. Os clientes me conhecem, sabem da minha luta, mas já vivi situações de preconceito no shopping.”

A relação de Jhones com o bairro começou ainda na adolescência, através do pai, morador antigo da região. Há 12 anos, ele comprou sua casa e fixou raízes em Pernambués, onde encontrou acolhimento e espaço para empreender. Em plena pandemia, quando o país enfrentava uma das maiores crises sanitárias e econômicas da história, ele apostou em abrir seu próprio negócio. “Graças a Deus, vivo bem hoje”, comemora.

O sucesso, no entanto, não dispensa os desafios. Jhones chama atenção para a ausência de vagas de estacionamento rotativas, o que dificulta o acesso de clientes. Mesmo assim, ele não desanima. Ao contrário, participa ativamente da vida comunitária, como jurado do concurso Beleza Negra e apoiador de campeonatos e ações culturais locais. “Tudo que envolve a comunidade, eu tento me envolver. O bairro é completo, só falta resolver alguns problema de mobilidade mesmo”, observa.

A trajetória de Jhones se conecta a uma realidade cada vez mais presente em bairros periféricos com maioria negra: o afroempreendedorismo. Em locais como Pernambués, empreender é, muitas vezes, a única alternativa diante de um mercado de trabalho excludente e historicamente racista. Nesse contexto, emerge com força o conceito de Black Money, movimento que propõe a circulação de capital dentro da própria comunidade negra, como ferramenta de combate às desigualdades estruturais.

Jonas Santos da Costa, dono da Jhones Acessórios
Jonas Santos da Costa, dono da Jhones Acessórios | Foto: Olga Leiria | Ag. A TARDE

“Ao direcionar o dinheiro para nossos próprios negócios, a gente fortalece nossas empresas, gera empregos e aumenta a autoestima do povo preto”, explica a gestora nacional de afroempreendedorismo do Sebrae, Fau Ferreira. Segundo ela, mais da metade dos empreendedores brasileiros são negros — são 15,6 milhões de pessoas que veem no empreendedorismo um caminho para autonomia financeira e ocupação de espaços de poder.

O Sebrae, inclusive, tem sido um aliado importante no fomento aos negócios liderados por pessoas negras. O coordenador de Comércio e Serviços da entidade na Bahia, destaca a urgência da digitalização dos empreendimentos. “Quem ainda está apenas no presencial precisa estar também no digital. Isso tem que ser pra ontem”, alerta. A instituição oferece capacitações em gestão, marketing digital, finanças e inovação, além de programas como o Empretec e suporte para formalização de microempresas.

Mas a força de Pernambués vai além dos números e das análises técnicas. Ela pulsa nas ruas, nas vielas, nas salas de aula improvisadas, nas rodas de rap e nos salões de trança. É onde mora o rapper Negro Davi, que há anos usa sua arte como ferramenta de transformação. “É preciso dar voz e espaço aos pequenos artistas. A arte é cidadania, é inclusão”, defende o músico, que lidera o projeto Universidade Hip-Hop e atua em escolas públicas levando rima, batida e esperança a jovens da comunidade.

Quem também encontrou na estética negra um caminho para o sucesso foi Jo Tranças, nome artístico de uma mulher empreendedora, mãe de três filhas, que desde os 14 anos trabalha com tranças afro. “Na pandemia, depois de muitas lutas, abri meu próprio negócio. Hoje sou conhecida e respeitada. Isso nos fortalece como mulher negra, como mãe e como empreendedora”, afirma com orgulho. Com seus cursos, ela ajuda a formar outras mulheres do bairro, ampliando as possibilidades de renda e autoestima.

Do outro lado, a multitalentosa Nathaly Soares, mais conhecida pelo nome artístico que carrega com altivez. A ex-conselheira tutelar é coreógrafa, animadora, produtora e empreendedora multifacetada. “Nasci e me criei aqui. Conheço todo mundo. Sempre apoiei a comunidade. É disso que eu vivo, é pra isso que eu luto”, resume.

Histórias como essas se multiplicam no bairro, que a cada dia se consolida como território de resistência, potência e produção. Para Nathaly, “Pernambués tem crescido muito, tanto em população quanto em comércio e estabilidade. É um bairro cada vez mais bem visto em Salvador.”

Esse crescimento, no entanto, não pode ser analisado apenas sob a ótica econômica. Há um forte componente cultural e simbólico por trás da ascensão dos afroempreendedores do bairro. Ao oferecer serviços e produtos que resgatam elementos da cultura afro-brasileira — como roupas, culinária, tranças e artesanato — esses empreendedores não apenas movimentam a economia local, mas também reafirmam identidades e constroem pertencimento.

Como resume a gestora do Sebrae, Fau Ferreira, “ser negro no Brasil é uma questão política. E empreender é um ato de enfrentamento, de ocupação de espaço e de construção de futuro”. Em Pernambués, esse futuro já começou a ser escrito — com suor, coragem e muita criatividade.

Inventando caminhos: Paulo Oliveira cria um laboratório de oportunidades

Por mais de uma década, o sócio da Startei Hub de Inovação, Paulo Henrique Oliveira trilhou caminhos que o levaram a um propósito: usar sua história e conhecimento para abrir portas — muitas delas — para outros como ele. Embora não tenha morado no bairro de Pernambués, ele passou a infância e juventude circulando pelo bairro. Ele cursou o Ensino Médio no Resgate e o curso superior em Turismo e Hotelaria na Universidade Estadual da Bahia (Uneb).

Ao observar o território marcado por desigualdades históricas, mas também por uma potente rede de cultura e resistência, Paulo se tornou um dos principais articuladores do movimento Black Money, em toda a Bahia. Sua trajetória é uma espécie de inventário de luta, inovação e reinvenção, tanto pessoal quanto coletiva.

A semente do empreendedorismo foi plantada ainda na faculdade, quando foi presidente de Empresa Júnior. “Comecei a descobrir o Cabula. Fiquei muito curioso e fiz meu TCC de graduação sobre o bairro e a relação com o quilombo. Depois eu fiz tese de mestrado sobre o mesmo tema. Coordenei um projeto ligado ao turismo, quando surgiu um desejo enorme de abrir um espaço ali naquela região por conta de toda essa história”, conta Oliveira.

Loja dentro da Startei
Loja dentro da Startei | Foto: Uendel Galter | Ag. A TARDE

Foi com a economia criativa que ele encontrou terreno fértil para semear suas ideias e transformar realidades. O ponto de virada veio quando ele mergulhou em uma reflexão profunda sobre o lugar do negro na economia brasileira. Inspirado pelo conceito afrocentrado de autonomia e coletividade, ele passou a articular redes de apoio entre empreendedores negros, criando eventos, feiras e espaços de formação.

O ponto alto desse processo se deu com a fundação do “Ponto de Inventaria”, como ele gosta de chamar, Trata-se de uma proposta inovadora de loja e centro cultural no coração de Salvador: o Shopping Bela Vista. O espaço, que abriga hoje 30 marcas da economia criativa, é mais do que um ponto de venda. “A gente não chama de loja colaborativa. Estamos fazendo a reinvenção desse modelo, criando uma experiência ampla, em que os empreendedores podem usar o espaço, fazer eventos, gravar podcast, receber fornecedores e clientes. É um laboratório vivo de criatividade e conexão”, explica Paulo.

Com peças únicas, que vão de moda autoral a cosméticos e acessórios, o “Ponto de Inventaria” também se posiciona como um lugar de memória e futuro. “Ali, cada produto tem uma história, cada empreendedor carrega um território com ele. E esse território está em movimento, está vivo, está criando outros caminhos”, enfatiza. Para Paulo, o espaço é também uma resposta concreta às barreiras estruturais enfrentadas por pessoas negras no acesso ao mercado do empreendedorismo.

Mas sua atuação vai além da vitrine. Militante pela equidade racial, ele é uma das vozes mais propositivas na discussão sobre políticas públicas para o fortalecimento da economia negra. “A gente precisa pensar em crédito acessível, em formação técnica, em redes de comercialização. O empreendedor negro muitas vezes precisa ser tudo: o que produz, vende, divulga e ainda dribla o racismo institucional que tenta apagar sua existência”, argumenta. Nesse cenário, iniciativas como a do Ponto de Inventaria não são apenas inspiradoras — são urgentes.

Pedro Henrique, socio-diretor da Startei
Pedro Henrique, socio-diretor da Startei | Foto: Uendel Galter | Ag. A TARDE

E é justamente na formação que visionário enxerga uma das chaves para o futuro. “Não adianta falar de empreendedorismo sem falar de qualificação. Nossa população tem talentos incríveis, mas precisa de ferramentas para potencializar isso. E a gente precisa garantir que essas ferramentas estejam acessíveis, perto das pessoas”, reforça. Nesse sentido, o bairro de Pernambués, onde tudo começou, se transforma também em metáfora: um lugar historicamente marginalizado que, aos poucos, se torna centro de inovação, empoderamento e visibilidade negra.

“O que falta é investimento, é acesso, é visibilidade. Porque talento, ideia e força de vontade a gente tem de sobra”, afirma, com a convicção de quem conhece bem os caminhos da escassez e da superação.

STARTEI: Hub de Inovação

Com sede no Shopping Bela Vista (Asa Sul), a STARTEI é um hub de inovação que opera com metodologias autorais e inteligência coletiva para impulsionar negócios sustentáveis, alinhados aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU e critérios do conjunto de padrões e práticas que avaliam o desempenho de uma empresa em três áreas principais: Ambiental (Environmental), Social (Social) e Governança (Governance) - ESG. Oferece infraestrutura gratuita aos negócios acelerados, incluindo coworking, estúdios de mídia e o "Cria da Bahia" — loja colaborativa com mais de 30 marcas baianas parceiras.

O que o Startei Hub oferece:

  • Estudio de podcast
  • Estudio para fotos
  • Estudio para aulas online
  • Espaço para evento
  • Treinamentos
  • Espaços culturais
  • Coworking
  • Salas de reuniões
  • Programas de aceleração
  • Assessoria em captação de recursos

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